No dia em que o assassinato do jornalista inglês Dom Phillips e o do indigenista brasileiro Bruno Pereira completa dois anos, o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) apresentou, à Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH), algumas das ações, normativas e políticas judiciárias desenvolvidas para promover a defesa dos direitos humanos no âmbito do Poder Judiciário, assim como o trabalho da Unidade de Monitoramento e Fiscalização das decisões do Sistema Interamericano de Direitos Humanos (UMF/CNJ).
O encontro dos integrantes e da presidenta da CIDH, a ativista Roberta Clarke, com membros do CNJ ocorreu na quarta-feira (5/6), na sede do Conselho, em Brasília. A comissão está no Brasil em uma agenda com o governo brasileiro em memória de Dom Phillips e Bruno Pereira, mortos durante viagem ao Vale do Javari (AM). O andamento do processo judicial relativo ao crime contra os dois foi incluído na lista de acompanhamento pela UMF/CNJ. O departamento foi criado pelo CNJ por meio da Resolução n. 364/2021.
A secretária-geral do CNJ, Adriana Cruz, citou iniciativas preventivas em relação à violência que o CNJ desenvolve, destacou a importância da pauta na agenda do Ministro Luis Roberto Barroso e colocou a estrutura do Conselho à disposição para cooperar nos trabalhos da Comissão Interamericana.
A comitiva foi recebida também pela assessora-chefe da Presidência do CNJ, Leila Mascarenhas, que, juntamente com a secretária-geral, participa do Comitê Executivo do Observatório de Direitos Humanos do Poder Judiciário (ODH). Também estava presente a conselheira do CNJ Renata Gil, além de juízes e juízas auxiliares da Presidência do CNJ que detalharam programas, projetos e atividades do órgão em relação a temas como proteção a pessoas que defendem os direitos humanos, ambientalistas e vulneráveis, combate à violência contra mulher e prevenção ao feminicídio.
Prevenção ao feminicídio
A visita da comissão também servirá para monitorar recomendações relativas ao caso Maria da Penha, processo emblemático envolvendo o Brasil junto à CIDH. Entre as recomendações feitas pela CIDH em 2001, quando o Brasil foi condenado por omissão, negligência e tolerância em relação a crimes contra os direitos humanos das mulheres, estava a finalização do processamento penal do responsável pela agressão contra Maria da Penha, indenização simbólica e material e adoção de políticas públicas voltadas à prevenção, punição e erradicação da violência contra a mulher.
Supervisora da Política Judiciária Nacional de Enfrentamento à Violência contra as Mulheres no Poder Judiciário, a conselheira Renata Gil apresentou ações de prevenção e políticas públicas criadas após a Lei 11.340/2006 (Lei Maria da Penha), como a criação de Formulário Nacional de Risco, conjuntamente pelo CNJ e pelo Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP), para mapear o risco de feminicídio.
“Na área da violência doméstica, nosso marco foi realmente a Lei Maria da Penha que ajudou a evoluir nossa sociedade em relação à naturalização da violência e à criação de políticas públicas de responsabilização dos agressores. É uma lei bastante completa, mas que ainda não conseguiu impedir que o agressor aja contra as mulheres, mesmo que elas possuam medidas protetivas”, afirmou a conselheira, que citou a importância de o formulário ser aplicado nesses casos, a fim prevenir o escalonamento da violência.
Outro ponto citado pela conselheira em relação às ações do CNJ no enfrentamento à violência doméstica contra a mulher foi o Protocolo para Julgamento com Perspectiva de Gênero. Esse conjunto de diretrizes busca que atores do Sistema de Justiça passem a ter um olhar inclusivo em questões relacionadas a gênero, raça, etnia e direitos humanos, em perspectiva interseccional, em ações, processos e julgamentos judiciais.
“Estamos em treinamento da magistratura brasileira em relação a esse protocolo. Não apenas para quem atua nas varas de violência, mas de todos os ramos de Justiça”, disse. Ela explicou ainda que termos de cooperação têm sido assinados com o intuito de que a Defensoria Pública e o Ministério Público também apliquem a normativa de gênero em seus órgãos. Sobre a suspeita de omissão do Estado em relação ao caso Maria da Penha, a conselheira afirmou que a Corregedoria Nacional de Justiça passará a acompanhar o processo, e não mais a Corregedoria local do TJCE.
Defesa dos direitos humanos
A presidenta da Comissão Interamericana dos Direitos Humanos, Roberta Clarke, mostrou-se interessada em conhecer os diversos modelos de trabalho do CNJ em relação aos temas apresentados, pareceu disposta a colaborar com o trabalho de cooperação e capacitação do sistema de Justiça e aproveitou para pedir mais informações sobre o funcionamento da UMF/CNJ.
A coordenadora-executiva da UMF, Andrea Perdigão, explicou que a unidade contribui na adoção das providências necessárias para o cumprimento das sentenças ou medidas determinadas pela Corte Interamericana envolvendo o Estado brasileiro. “Localizada dentro do Judiciário, a unidade facilita acordos entre órgãos e o acompanhamento dos processos, respeitando a independência necessária para o andamento da Justiça”, disse.
Nesta quinta (6/6), integrantes do CNJ e membros do CIDH estarão em reunião de trabalho sobre o caso Maria da Penha e na Mesa de Trabalho Conjunta para a implementação das MC 449-22, em favor de Bruno Pereira, Dom Phillips e 11 defensores de direitos humanos dos povos indígenas do Vale do Javari (Univaja).
A Mesa de Trabalho Conjunta deve contribuir para o cumprimento integral das medidas cautelares emitidas pela Comissão para que o Brasil adote medidas necessárias para proteger a vida e a integridade pessoal de 11 pessoas ligadas à organização indígena que receberam ou recebem ameaças de morte por conta de seu trabalho em defesa dos povos indígenas daquela região.
Texto: Regina Bandeira
Edição: Sarah Barros
Agência CNJ de Notícias