O primeiro dia do 3º Encontro Nacional dos Grupos de Monitoramento e Fiscalização do Sistema Carcerário e do Sistema de Execução das Medidas Socioeducativas (GMFs) reuniu nesta quinta-feira (8/8), em Porto Velho, dezenas de juízes e juízas de todo o Brasil para discutir a atuação e a importância desses grupos nos tribunais. O evento é organizado pelo Departamento de Monitoramento e Fiscalização do Sistema Carcerário e do Sistema de Execução de Medidas Socioeducativas (DMF/CNJ) e pelo Tribunal de Justiça de Rondônia (TJRO), o GMF de Rondônia e a Escola da Magistratura de Rondônia (Emeron), além da parceria da Associação dos Magistrados do Estado de Rondônia (Ameron).
É a primeira vez que o encontro acontece no Norte do país. A mesa de autoridades composta para abrir a solenidade contou com a presença do conselheiro do CNJ e Supervisor do DMF, José Edivaldo Rocha Rotondano; do ministro do Superior Tribunal de Justiça, desembargador Otávio Augusto de Almeida Toledo; o juiz auxiliar da Presidência do CNJ e Coordenador do DMF, Luís Lanfredi; o presidente do TJRO, desembargador Raduan Miguel Filho; o Supervisor do GMF-RO, José Jorge Ribeiro da Luz, e o desembargador Isaías Fonseca, representando a Escola da Magistratura de Rondônia (Emeron).
Ao tratar sobre os desafios históricos da realidade brasileira, como a violação massiva de direitos humanos das pessoas presas e adolescentes que cumprem medidas socioeducativas, o conselheiro do CNJ e supervisor do DMF, José Edivaldo Rocha Rotondano, destacou o compromisso conjunto do Poder Judiciário em trabalhar para superar o estado de coisas inconstitucional (ECI) do sistema carcerário brasileiro. “Esse encontro se propõe a apresentar caminhos, reforçar conceitos, diretrizes e disseminar estratégias práticas de atuação em cada fase dos ciclos de responsabilização. Cada tribunal poderá se apropriar das estratégias de forma customizada à sua realidade, em uma perspectiva de desenvolvimento contínuo e aprimoramento de suas capacidades institucionais”.
O enfrentamento ao ECI é o objetivo principal do Plano Pena Justa, desenvolvido pelo CNJ e pela União conforme determinado pelo Supremo Tribunal Federal (STF) no julgamento da Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 347, também relembrado pelo coordenador do DMF, Luís Lanfredi, em sua fala inicial. “Os GMFs são células fundamentais na estrutura de cada tribunal e nelas conseguimos reunir alguns dos melhores quadros da Justiça criminal e do socioeducativo brasileiro, para repensar a jurisdição a partir de seus resultados. É um espaço para idealizar formas para um melhor e mais efetivo exercício do Poder e ao cumprirmos de modo mais estruturado e racionalizado essa finalidade, ganha a população. Nosso encontro está estruturado a partir de discussões atuais e relevantes para todas e todos os presentes, e esperamos que a concertação dos propósitos deste encontro fortaleça cada vez mais os juízes na ponta, mas sobretudo a unidade e a sensibilidade do Judiciário acerca dos temas centrais da justiça criminal e socioeducativa brasileira”, completou Lanfredi.
O ministro do STJ Otávio Toledo lembrou que participou da criação do GMF no Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) e desejou que a experiência em reunir os GMFs brasileiros seja frutífera, de modo que todos os magistrados presentes repliquem os conhecimentos adquiridos aos tribunais de origem. Os GMFs são estruturas dos Tribunais de Justiça e dos Tribunais Regionais Federais vinculados ao DMF que atuam no monitoramento e supervisão de políticas judiciárias para os sistemas prisional e socioeducativo em cada território. Foram criados a partir da necessidade de maior acompanhamento da execução penal e das condições oferecidas nos presídios, diante dos dados provenientes dos mutirões carcerários promovidos pelo CNJ em todo o país em 2008.
Esforço coletivo e boas ideias
O anfitrião do evento, presidente do TJRO, desembargador Raduan Miguel Filho, relembrou a importância da atuação dos servidores do tribunal na organização do encontro. “Este é um momento ímpar, onde surgirão ideias e ideais, um passo importante para uma Justiça mais justa. Não podemos perder de vista que a nossa missão é garantir a Justiça, mas também assegurar que ela seja um instrumento de ressocialização e gere um impacto positivo na vida daqueles que estão sob a custódia do estado”, afirmou.
A realização do evento e a ação de fortalecimento dos GMFs estão no escopo de atuação do Programa Fazendo Justiça, coordenado pelo CNJ em parceria com o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD).
O 3º Encontro Nacional dos GMFs também marcará a criação do Colégio Nacional de Supervisores (CONASUP-GMF) e eleição da primeira Diretoria. Em um discurso que dividiu elogios ao povo de Rondônia, o desembargador supervisor do GMF-RO, José Jorge Ribeiro da Luz, afirmou que o Colégio tem a missão de unir ainda mais os GMFs brasileiros, respeitando as particularidades de cada estado.
Políticas Públicas
Após a solenidade de abertura, a desembargadora federal do TRF4 Tais Schilling Ferraz ministrou uma palestra em que falou do papel do CNJ na incidência de boas práticas para mudar a realidade do sistema carcerário e socioeducativo, questionando estratégias tradicionais do sistema penal para lidar com a criminalidade por meio da contenção e repressão.
A magistrada defendeu que a prevenção de condutas criminais é uma forma de mudar o panorama atual, hoje baseado em “ações e reações”, que envolvem sempre aumentar a pena em resposta ao aumento da criminalidade. “A substitutividade não vai eliminar o conflito, a exclusividade da pena não vai produzir paz ou reparação, pois tudo está nas relações. É preciso haver comunicação e escuta. O ofensor e vítima não são objetos, eles são sujeitos. O respeito às diferenças, a valorização do conceito e a produção de seres autônomos podem trazer mais resultados, diferentes de paradigmas como a pena reduz criminalidade”.
A palestra encerrou com exemplos de ações de caráter preventivo incentivadas pelo CNJ por meio do Programa Fazendo Justiça a exemplo da audiência de custódia e instrumentos que previnam tortura e maus tratos e reforcem a Justiça Restaurativa. A juíza mencionou ainda o fortalecimento das alternativas penais, das inspeções qualificadas nos sistemas penal e socioeducativo, a emissão e regularização de documentos de pessoas presas e o atendimento nos Escritórios Sociais, equipamentos voltados a pessoas egressas e seus familiares.
Manual dos GMFs
O evento marcou ainda o lançamento do Manual de Fortalecimento dos GMFs, destinado à magistratura e a servidores que atuam nos GMFs. O coordenador do DMF, Luís Lanfredi, contextualizou a elaboração e a importância do manual no cumprimento de normativas existentes. “Da Resolução CNJ 96/2009, que cria os GMFs, passamos para Resolução CNJ 214/2015, na qual estes grupos ganham mais atribuições e uma conformação realizadora, com mais atribuições e exigências para especializar-se em temas que vão desde a socioeducação ao prisional a raiz da efetividade dos assuntos. Essa resolução também integrou os Tribunais Regionais Federais (TRFs). De nada adianta a existência de políticas judiciárias se não tivermos a compreensão delas diante de cada Tribunal aqui presente”, disse.
O manual disseca as particularidades da Resolução CNJ 214/2015 e a integralidade da atuação dos GMFs no sistema penal e socioeducativo, bem como sua importância institucional na estrutura dos tribunais.
A primeira parte do manual é destinada à compreensão do Poder Judiciário como indutor de políticas penais e socioeducativas; o segundo capítulo trata da institucionalidade e da estruturação dos grupos em âmbito local; o terceiro destrincha conceitos de articulação e governança; no quarto capítulo, a importância dos GMFs no fomento a equipamentos e serviços como as Redes de Atenção às Pessoas Egressas do Sistema Prisional (Raesp) e Conselhos da Comunidade. Por fim, o quinto capítulo aborda o acompanhamento do cumprimento de resoluções.
Texto: Isis Capistrano
Edição: Nataly Costa
Agência CNJ de Notícias