A mobilização do Judiciário e de procuradores e procuradoras do trabalho para avançar em ações locais da Política Nacional de Trabalho no âmbito do sistema prisional (PNAT) foi tema de webinário promovido nesta semana entre o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) e o Ministério Público do Trabalho (MPT). A partir do encontro virtual, tribunais e ministérios públicos do trabalho irão alinhar planos de atuação conjunta com base na realidade local e participação em atividades formativas, com o objetivo de qualificar inspeções conjuntas, alinhar meios de financiamento de projetos de qualificação profissional, fomentar a criação de novas vagas de trabalho e potencializar a interlocução com os Escritórios Sociais e demais serviços de atenção às pessoas egressas.
A parceria entre CNJ e MPT se insere no Plano Nacional de Geração de Trabalho e Renda para Pessoas Privadas de Liberdade, firmado em novembro de 2020 e que também reúne a Confederação Nacional de Municípios (CNM). A iniciativa busca operacionalizar diretrizes da PNAT, estabelecida pelo Decreto 9.450/2018 para ampliar e qualificar a oferta de vagas de trabalho, o empreendedorismo e a formação profissional dessa população. De acordo com o Departamento Penitenciário Nacional, menos de 20% das pessoas privadas de liberdade no Brasil têm acesso a atividades de renda e qualificação profissional.
O evento reuniu mais de 100 pessoas, entre representantes do Departamento de Monitoramento e Fiscalização do Sistema Carcerário e do Sistema de Execução de Medidas Socioeducativas (DMF) do CNJ, magistrados e magistradas dos Grupos de Monitoramento e Fiscalização do Sistema Carcerário (GMFs) dos tribunais, procuradores e procuradoras regionais do trabalho e equipes estaduais do programa Fazendo Justiça. A programação incluiu apresentação da parceria, com detalhes do Termo de Cooperação Técnica entre as duas instituições, e estratégias de atuação nos estados, a partir da apresentação de experiências já em andamento, como a mobilização para a revisão e adequação de contratos de trabalho no Ceará. Os GMFs do Mato Grosso do Sul e de Santa Catarina também apresentaram iniciativas em andamento nessas localidades.
O MPT apresentou ações desenvolvidas na área, como a articulação entre secretarias estaduais para utilização de mão de obra de pessoas privadas de liberdade e egressas em obras; saúde e segurança nos ambientes de trabalho; inserção de cotas em editais do setor público; reuniões com atores para garantir segurança jurídica nessas contratações, inclusive com instalação de empresas dentro das unidades prisionais; e a reversão de recursos provenientes de ações civis públicas para estruturação de serviços.
O conselheiro do CNJ Mário Guerreiro, supervisor do DMF, destacou que a parceria com o Ministério Público do Trabalho representa o esforço bilateral para regulamentação, fomento, fiscalização e aprimoramento das ações de empregabilidade e de geração de trabalho e renda para as pessoas privadas de liberdade e egressas do sistema prisional, com foco em curto médio e longo prazo. “Acreditamos que esta parceria poderá incidir de forma precípua no fortalecimento de políticas capazes de atender aos direitos fundamentais das pessoas privadas de liberdade e egressas, comumente marginalizadas e estigmatizadas pela marca do cárcere.”
O procurador-geral do Trabalho, Alberto Bastos Balazeiro, ressaltou que a parceria institucionaliza o ingresso da entidade em uma questão de fundamental relevância. “É importante registrar a importância do tema da empregabilidade para o MPT, sobretudo voltada para a pessoa presa. Trata-se de um resgate social através do trabalho. É uma parceria que com certeza trará frutos concretos no esforço para resgatar essa população com empregabilidade e pacificação social.”
Plano de ação
O plano de trabalho conjunto prevê diferentes frentes de ação. A primeira traz a elaboração e o aprimoramento de produtos de conhecimento, como normativas e manuais, orientações técnicas sobre saúde e segurança no trabalho, além de documentos destinados ao setor público acerca das vantagens de contratação e educação em direito das pessoas presas. A segunda frente irá explorar realização de inspeções conjuntas, com estratégia para qualificação das unidades, elaboração de parâmetros e cumprimento de cotas da Resolução CNJ nº 307/2019, do Decreto 9.450/2018 de outras normativas e leis.
Já a terceira frente se comprometerá com fomento de ações de profissionalização, assim como com destinação de recursos para cursos de qualificação e incentivo a projetos de economia solidária. Finalmente, a quarta frente buscará articulação com diversos atores objetivando discussões especificas sobre parcerias que contemplem sensibilização de empregadores públicos e privados.
O juiz coordenador do DMF, Luís Lanfredi, destacou que esse conjunto de iniciativas se dá na perspectiva da Lei de Execução Penal, que reconhece a finalidade educativa e produtiva do trabalho, com atenção a pontos como remição de pena, geração de renda e reintegração social, assim como interseccionalidades de marcadores sociais das populações privada de liberdade e egressa do sistema, destacando os segmentos das mulheres, pessoas com deficiência, migrantes, pessoas sem qualificação profissional ou educacional, população LGBTI e pessoas com transtorno mental. “O trabalho, tal qual está sendo ofertado no sistema prisional, salvo raras exceções, enfrenta desafios que se expressam pela limitação na sua oferta, ausência de equidade na distribuição de oportunidades, vulnerabilidades sociais, relacionais e de estigma enfrentados por essas pessoas. É evidente que essa realidade precisa mudar.”
A procuradora do Trabalho à frente da Coordenadoria Nacional de Combate às Irregularidades Trabalhistas na Administração Pública (Conap), Ileana Neiva, ressaltou a importância de esforços conjuntos para levar dignidade a essas pessoas, inclusive com a possibilidade de diminuição do tempo em privação de liberdade. “O trabalho para uma pessoa presa não ressocializa somente a pessoa, mas toda sua família – impede, por exemplo, que seu filho esteja no trabalho infantil, pois há renda. Outro aspecto importante é que parte da remuneração pode reverter para melhorias do sistema prisional.”
As cooperações firmadas com MPT e CNM serão implementadas com o apoio do eixo de cidadania do programa Fazendo Justiça, parceria do CNJ com o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD) e apoio do Ministério da Justiça e Segurança Pública para superação de desafios estruturais da privação de liberdade. Os termos têm duração de dois anos, podendo ser prorrogados A coordenadora adjunta do eixo de cidadania do Fazendo Justiça, Pollyanna Alves, pontuou que os Escritórios Sociais – equipamentos de gestão compartilhada entre Judiciário e Executivo que prestam suporte a pessoas egressas – poderão apoiar a gestão de vagas de trabalho disponíveis.
Iuri Tôrres
Agência CNJ de Notícias
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