Em dois dias de evento em Porto Velho (RO), o 3.º Encontro Nacional dos Grupos de Monitoramento e Fiscalização do Sistema Carcerário e do Sistema de Execução das Medidas Socioeducativas (GMFs) reuniu cerca de 90 representantes de tribunais de todas as unidades da Federação para discutir desafios e avanços da justiça criminal e da justiça juvenil. Na sexta-feira (9), segundo e último dia de encontro, juízes, juízas e servidores(as) debateram temas como o próximo Mutirão Processual Penal e os desdobramentos estaduais do Plano Pena Justa.
Durante a manhã, o ministro do STJ Otávio de Almeida Toledo trouxe reflexões sobre as decisões da Corte da Cidadania e sua contribuição para a efetividade da justiça criminal e socioeducativa. “Consolidar a jurisprudência é uma das funções do STJ, criado para orientar a justiça no país. É um tribunal do qual emanam decisões que balizam todas as demais instâncias das justiças estadual e federal. Algumas dessas decisões são vinculantes, outras trazem parâmetros e alinhamentos necessários. E o motivo é um só: a segurança jurídica”, defendeu. O Ministro trouxe, ainda, números e estatísticas sobre o movimento processual que absorve e impacta a Corte Superior e que poderia ser minimizado fossem as decisões do STJ melhor compreendidas em suas finalidades.
O professor da Universidade Federal do Paraná André Giamberardino defendeu a criação de uma política de estado para superar o estado de coisas inconstitucional (ECI) no sistema carcerário brasileiro, citando o Plano Pena Justa, criado pelo CNJ e pela União para superar as violações massivas de direitos nas prisões brasileiras, conforme decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) na Arguição de Descumprimento de Preceito Federal (ADPF) 347.
A construção do Pena Justa teve apoio técnico do programa Fazendo Justiça, coordenado pelo Departamento de Monitoramento e Fiscalização do Sistema Carcerário e do Sistema de Execução de Medidas Socioeducativas (DMF/CNJ) em parceria com o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (Pnud). O DMF também organizou o 3.º Encontro dos GMFs, junto com o Tribunal de Justiça de Rondônia (TJRO), o GMF de Rondônia e a Escola da Magistratura de Rondônia (Emeron), além da parceria da Associação dos Magistrados do Estado de Rondônia (Ameron) e o Fazendo Justiça.
Planos estaduais
O coordenador do DMF, Luís Lanfredi, apresentou o processo de construção do Pena Justa, que contou com importante contribuição da sociedade civil em audiências e consulta pública, resultando em uma matriz de implementação com mais de 300 metas. Lanfredi explicou a estratégia para a criação dos planos estaduais e do plano distrital, que devem estar em consonância com o plano nacional. “A importância dos desdobramentos estaduais do Plano Pena Justa não pode ser subestimada. Como estratégia nacional para enfrentar o grave estado de calamidade das prisões brasileiras, a eficácia do plano nacional depende fundamentalmente da implementação de planos locais robustos. É crucial que estejam em sintonia com as diretrizes do Executivo e do Judiciário locais, além de contar com o engajamento ativo da sociedade civil. Somente com uma abordagem integrada e colaborativa conseguiremos alcançar resultados significativos e duradouros, que terão como efeito uma sociedade mais segura para todos e todas”, pontuou.
Outro ponto importante do segundo dia de evento foi a discussão sobre o próximo Mutirão Processual Penal, estratégia do CNJ que engloba a revisão de processos a partir de teses pré-definidas, e, desde 2023, emprega nova metodologia mais ágil e colaborativa para a sua realização a partir da difusão nacional do Sistema Eletrônico de Execução Unificado (SEEU). A coleta de dados e seleção dos processos estão em fase de definição pelo CNJ e devem ser divulgadas em breve.
Uma das ideias discutidas é a possibilidade de realização semestral do Mutirão, com definição de processos a serem revisados a partir de cadernos de elaboração sobre os temas e comissões estaduais definidas.
As inspeções serão acompanhadas de questionário complementar para definir comparativos de resultados, e a coleta e tratamento de informações serão aperfeiçoadas. Esse processo contará com auxílio da plataforma Codex, o repositório de dados do CNJ. A palestra também contou com breve explanação sobre a integração de sistemas dos tribunais ao BNMP.
Boas práticas pelo país
Representando o GMF do Amazonas, a juíza Ana Paula de Medeiros falou sobre o fortalecimento institucional e estruturação do grupo em âmbito estadual, que se baseou nas resoluções existentes e em ações destinadas aos povos originários, com o lançamento de cartazes sobre audiência de custódia em idiomas indígenas e formação técnica em direitos humanos para os servidores. Do TJMA, o juiz José dos Santos Costa falou sobre a criação da Divisão Socioeducativa, em 2022, responsável pela monitoração das inspeções registradas no CNIUPs, gestão de vagas, prevenção e combate à tortura, escutas com adolescentes e a expansão dos Núcleos de Atendimento Integrados (NAIs).
Eduardo Lino Bueno Fagundes, do TJPR, destacou a evolução do SEEU, criado para gerenciar a execução de penas. O sistema agora combina dados gerenciais e big data, facilitando o acompanhamento sem a necessidade de alertas manuais. Representando a corte da Paraíba, Hugo Gomes Zaher, apresentou as melhorias nas inspeções dos programas socioeducativos, com um mapeamento de 223 municípios e a criação de planilhas e prazos para monitoramento, resultando em 94% dos municípios inspecionados.
A magistrada Solange de Borba Reinberg, do TJMG, falou sobre a Central de Audiência de Custódia em BH, que realiza 40 audiências diárias com um enfoque humanizado e atendimento às vítimas. Encerrando o ciclo de palestras, Luciana Teixeira de Souza, do TJCE, abordou a questão da saúde mental, com um GT focado em desinternamento e atendimento a pessoas em cumprimento de medidas. O trabalho em saúde mental inclui comissões para fluxos de atendimento e atividades, resultando em 51 pessoas desinternadas.
O encontrou marcou ainda a criação do Colégio Nacional de Supervisores (Conasup/GMF), discutida por 22 magistrados, que decidiram em conjunto sobre a finalidade e objetivos do instituto, cuja missão é unir ainda mais os GMFs brasileiros, respeitando as particularidades de cada estado. A votação elegeu como presidente o desembargador José Jorge Ribeiro da Luz, do TJRO, tendo como vice-presidentes o desembargador Geder Luiz Rocha Gomes (TJBA) e a desembargadora Cinthia Bittencourt Schaefer (TJSC).
Texto: Ísis Capistrano
Edição Nataly Costa
Agência CNJ de Notícias