As contribuições de especialistas com esclarecimentos técnicos que auxiliam a quantificação de danos ambientais foram apresentadas na quinta-feira (27/7) durante audiência pública realizada pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ). Entre as contribuições, estão indicações de instrumentos e ferramentas disponíveis atualmente para auxiliar nas decisões judiciais e sugestões de aperfeiçoamento.
Os participantes, que atenderam ao edital de convocação, responderam questões formuladas pelo chamamento à audiência para a elaboração de parâmetros adequados à quantificação do impacto de dano ambiental na mudança climática global. O tema atende ao artigo 14, da Resolução CNJ n. 433/21, que instituiu a Política Nacional do Poder Judiciário para o Meio Ambiente. Ao todo, 27 pessoas, entre representantes de órgãos governamentais, de entidades e de empresas privadas, tiveram inscrições deferidas para falar na audiência pública.
A experiência do juiz Alexandre Saliba, da 1ª Vara Federal de Santos (SP), cidade que abriga o maior porto da América do Sul, fundamentou a recomendação de cuidado com a replicação de experiências de outros países no Brasil. “Na hora da importação dos institutos, muitas vezes, ante a realidade brasileira, fica muito difícil colocar isso em prática, são vários biomas, a diversidade é grande”, disse.
Já a Associação Brasileira de Membros do Ministério Público Ambiental (Abrampa) expôs a preocupação com a simplificação e com a adoção de métodos exequíveis no interior do Brasil. “É muito importante que uma normativa seja simples de ser usada por quem está na ponta, o promotor de justiça e o magistrado, naquela cidade pequena, que não dispõe de uma perícia técnica qualificada”, disse o promotor de Justiça do Ministério Público do Mato Grosso do Sul e vice-presidente da Abrampa, Luciano Loubet, que também destacou a publicação Diretrizes para Valoração de Danos Ambientais, do Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP).
Instrumentos para julgar
De acordo com o professor do Grupo de Pesquisa em Direito Ambiental da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) Jose Rubens Morato Leite, não é possível haver uma lesão sem que haja reparação e, para o cálculo da indenização, já existe um progresso na avaliação social e econômica dos danos a natureza.
Do Poder Executivo, duas representantes fizeram exposição durante a audiência pública. A analista ambiental do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio) Kelly Borges destacou o uso dos recursos de geomonitoramento e geoprocessamento para o acompanhamento das 335 unidades de conservação federais do Brasil, o equivalente a 9% do território nacional e a 20% da área marinha pertencente ao País. “São informações detalhadas, de rápida atualização, recursos que subsidiam a nossa atuação e a nossa fiscalização”, explicou.
Os consultores jurídicos da Petrobras Margareth Michels Bilhalva e Nélson da Silva Alves abordaram o artigo 11, da Resolução 433. O texto registra que “os(as) magistrados(as) poderão considerar as provas produzidas exclusivamente por sensoriamento remoto ou obtidas por satélite no acervo probatório das ações judiciais ambientais”. Margareth alegou que ferramentas de geoprocessamento são métodos indiretos de comprovação e defendeu a retirada da palavra ‘exclusivamente” por entender que se trata de ferramentas que necessitam de outras provas. “São necessários outros métodos para haver a segurança na decisão”, avaliou.
O também advogado Luis Antonio Monteiro de Britto acrescentou a preocupação com que as imagens de satélite e sensoriamento remoto não sejam o único elemento comprobatório, destacando os casos de desmatamento em que não se pode aferir a autoria com base somente na informação visual.
Conhecimento técnico
Ainda sobre instrumentos legais para que a Justiça decida sobre questões ambientais, a engenheira civil Ana Carolina Valério Nadaline, que participou da audiência representando o Instituto Brasileiro de Avaliações e Perícias de Engenharia (Ibape), lembrou que o Código do Processo Civil prevê a possibilidade de o juiz ser assistido por profissional especializado quando necessitar de algum conhecimento técnico ou científico. “O cálculo de um recurso ambiental, por exemplo, envolve diversas questões que precisam ser quantificadas por meio de métodos que consideram fatores econômicos e sociais”, argumentou, ao defender a contratação de profissionais especializados para emissão de pareceres.
No Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama), a busca pela reparação integral do dano ambiental é um desafio complexo e de magnitude, que requer esforços para a qualificação do pessoal, a adoção de normas e a disseminação de conhecimentos técnicos. “Assim como o Ibama é frustrado com o baixo índice de pagamento das sanções administrativas, tenho que reconhecer que o índice de reparação também é baixo”, avaliou, durante a sua apresentação na audiência pública, a coordenadora de Recuperação Ambiental do Ibama, Raquel Lacerda.
O perito criminal Mauro Mendonça Maliano, da Polícia Federal, elogiou a iniciativa do CNJ com a audiência pública. “É o tema no qual trabalhamos diariamente e ver quem decide se aproximar disso é muito bom”. Ele esclareceu dúvidas acerca do sistema de monitoramento do meio ambiente utilizado pela PF dentro do Programa Brasil Mais, que utiliza nano-satélites. Contando com 180 satélites que cobrem 8,5 milhões de quilômetros quadrados, o sistema vem sendo utilizado por 309 instituições.
O sistema da Polícia Federal foi destacado também pelo analista ambiental Werner Luis Ferreira Gonçalves, do Centro Nacional de Monitoramento e Informações Ambientais (Cenima), pertencente ao Ibama. Ele mencionou como referências o USGS EarthExplorer, mantido pelo Serviço Geológico dos Estados Unidos (USGS), o Copernicus Open Access Hub, que integra o programa Copernicus da Agência Espacial Europeia (ESA) e o sistema do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe).
O analista também chamou a atenção para o fato de que o satélite não é a única ferramenta de sensoriamento remoto, a exemplo das imagens de qualidade feitas por drones bem como as imagens de radar obtidas pelo Ibama em parceria com a agência japonesa na Amazônia, região em que há alta concentração de nuvens.
Representando a União Brasileira de Advocacia Ambiental, a advogada Adelia Alves Rocha defendeu que a reparação in natura seja prioritária, mas ponderou a necessidade de que não haja uma padronização que engesse a avaliação do Judiciário.
A íntegra da Audiência Pública sobre Quantificação de Dano Ambiental pode ser acessada no canal do CNJ no YouTube
Texto: Luis Cláudio Cicci, Mariana Mainentti e Margareth Lourenço
Edição: Sarah Barros
Agência CNJ de Notícias