Audiência pública aponta caminho da conciliação para questão indígena

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A audiência pública, realizada pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ) nesta quarta-feira (25/5) em Dourados/MS, apontou que o caminho para a solução do conflito entre indígenas e proprietários rurais no Mato Grosso do Sul é a mediação e a conciliação. “Estou convicto que é a saída mais adequada e a única possível”, afirmou Marcelo Martins Berthe, coordenador do Fórum de Assuntos Fundiários do CNJ, que, junto com o juiz auxiliar do CNJ Antonio Carlos Alves Braga Júnior, está coordenando o seminário sobre a questão indígena em Dourados.

 

Durante a audiência, índios e produtores rurais concordaram em diversos pontos, como o da ausência de política pública para os povos indígenas. Falta, na opinião das partes, ação do Estado para promover o bem-estar, a educação e a integração dos índios na sociedade. “Eles estão marginalizados”, reconheceu Berthe, que ressalta também que os dois lados anseiam por um pacto de não violência.

Os próprios fazendeiros admitem que, em determinados casos, a terra demarcada é insuficiente para a sobrevivência dos índios e a política de demarcação de terras, do jeito que é feita hoje, é insuficiente para resolver o problema dos índios. Para fazendeiros e indígenas, é necessário uma política pública que assegure aos índios capacitação profissional para a inserção dos indígenas na sociedade. A capacitação é fundamental inclusive para que eles tenham condições de explorar economicamente a terra demarcada.

Embora as reclamações apontem falhas na política do Estado, as críticas conjuntas foram dirigidas diretamente à Fundação Nacional do Índio (Funai). Já os fazendeiros acusaram também o Conselho Indigenista Missionário (CIMI), vinculado à Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), de incitar, junto com a Funai, os índios a invadirem terras.

Opressão – “O Brasil começou errado e continua errado”, resumiu Anastácio Peralta, da etnia guarani. Brasil, Paraguai e Argentina foram construídos com a mentalidade opressora europeia. “Quem estava aqui não tinha valor”, reclamou. “O boi, a soja, vale mais do que a vida de uma criança indígena”, disse ele, conclamando todos “a amolecer a alma” para construir um “país onde o índio, o negro e o branco tenham valor como pessoa, e não como animal”.

Para o Sindicato Rural de Dourados, a Funai causou insegurança ao criar grupos de trabalho para examinar a demarcação de terras indígenas em 26 municípios do Mato Grosso do Sul, sem se preocupar com uma política efetiva para assegurar cidadania aos indígenas nem com a produção agrícola. Na prática, a Funai limita-se à política do confinamento dos índios. “Há um confinamento mesmo”, denuncia Sílvio Leão Machado, da reserva indígena Guapiru, que sonha em ver os filhos brincando livremente. “No confinamento não podemos sair porque estamos invadindo terra do vizinho”, reclamou.

“É impossível segregar um povo. Todos são passiveis de serem integrados à sociedade”, comentou Dácio Queiroz, diretor e secretário da Federação da Agricultura e Pecuária do Mato Grosso do Sul (Famasul), que defende o fim do conflito. “Índios e não índios não precisam guerrear”, afirmou. “O Mato Grosso do Sul é campeão em violência contra os índios”, rebateu Dirceu Lopes, do Conselho de Integração dos Índios.

Se for para entregar a terra, os fazendeiros querem indenização, porque as terras foram compradas da União na década de 1930, no governo Getúlio Vargas. Mas, segundo eles, não vai resolver nada: os índios estão migrando do Paraguai para o Brasil. De acordo com Gilson Matos, também do Sindicato Rural, a população indígena está crescendo entre 10% e 12% ao ano, enquanto a população brasileira cresce a 1%. “O aumento da população é um problema  grave”, afirmou.

Para o juiz Antonio Carlos Alves Braga Júnior, do CNJ, a questão exige um novo posicionamento de todas as partes envolvidas, inclusive do Estado: “Se mantivermos as mesmas bases, pode passar mais um século sem solução e os problemas vão se agravar”.

Gilson Luiz Euzébio

Agência CNJ de Notícias