A Organização Não-Governamental Human Rights Watch reconhece nas audiências de custódia um esforço do Brasil para combater violações de direitos humanos, de acordo com o relatório anual da entidade, divulgado na quarta-feira (27/1). Implantada em 2015 pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ) e pelos tribunais em todos os estados brasileiros, a nova política do Conselho foi citada no relatório da ONG por se tratar de uma iniciativa do Poder Judiciário que tenta solucionar as violações de direitos humanos que representam a superlotação no sistema carcerário, além da tortura e dos maus-tratos cometidos contra pessoas que são presas.
“Violações crônicas de direitos humanos assolam o Brasil, incluindo execuções extrajudiciais pela polícia, a superlotação das prisões, tortura e maus-tratos a pessoas detidas. Alguns esforços recentes para reformar o sistema de Justiça criminal procuraram solucionar alguns desses problemas, mas outras iniciativas poderiam agravá-los. Em 2015, o Poder Judiciário trabalhou em conjunto com os governos estaduais para garantir que as pessoas detidas sejam conduzidas sem demora à presença de um juiz, conforme exigido pela legislação internacional”, afirma a ONG no relatório.
Ao realizar uma triagem dos presos que são enviados aos presídios e penitenciárias brasileiras, as audiências de custódia se contrapõem a essas violações de direitos previstos em tratados internacionais seguidos pelo Brasil. Nessas audiências, o preso (em flagrante ou por mandado de prisão) é apresentado a um magistrado, que avalia o crime atribuído à pessoa detida, na presença do Ministério Público e da Defensoria Pública – ou da defesa particular do acusado. De acordo com a pena prevista para o crime cometido, o perfil do preso e outras circunstâncias da detenção, o juiz pode decidir por não manter a pessoa em uma unidade prisional enquanto não ocorre o julgamento. Assim, as prisões deixam de abrigar homens e mulheres que ainda não foram julgados pelos crimes pelos quais foram detidos.
“Com o apoio do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), que supervisiona o Poder Judiciário em todo o país, todos os estados brasileiros começaram a conduzir os detidos à presença de um juiz logo após sua prisão, conforme exigido pela legislação internacional – embora os programas estejam circunscritos apenas a certas localidades em cada estado, por enquanto. Na ausência dessas ‘audiências de custódia’, pessoas presas frequentemente têm de esperar muitos meses até sua primeira audiência perante um juiz, contribuindo para a superlotação das prisões”, afirma a Human Rights Watch em seu relatório. Implantadas inicialmente nas capitais de todos os estados, as audiências de custódia começam a chegar ao interior dos estados e já recebeu adesão da Justiça Federal.
População carcerária – No diagnóstico da situação dos direitos humanos no Brasil, a Human Rights Watch destacou o aumento nos últimos anos da população carcerária, que atingiu cerca de 600 mil detentos, número que supera a capacidade das casas prisionais em 60%. A superlotação, na avaliação da ONG, é responsável por tornar os presos “vulneráveis à violência e às facções criminosas”, além de colocar em risco a saúde dos detentos. Citando dados do Infopen, sistema de informações estatísticas do sistema penitenciário, o relatório afirma que “a prevalência de infecções pelo HIV nas prisões brasileiras é mais de 60 vezes superior à média da população do país, e a prevalência de tuberculose é cerca de 40 vezes maior. A ausência de uma triagem, prevenção e tratamento adequados, aliada às condições precárias de ventilação e saneamento, contribuem para a disseminação de doenças entre os presos”.
Ao permitir que magistrados identifiquem indícios de tortura cometida durante as prisões, as audiências de custódia também contribuem para inibir as violações de direitos humanos das pessoas detidas. Nas audiências de custódia, os presos são perguntados pelo magistrado se sofreram alguma violência policial ou por outros agentes do estado do momento em que foram presos até a apresentação perante a autoridade judicial.
“Essas audiências também permitem que os juízes identifiquem sinais de tortura ou maus-tratos aos detidos, um grave problema no Brasil. No Rio de Janeiro, quase 20 por cento das pessoas que tiveram uma audiência de custódia durante o primeiro mês de funcionamento do programa relataram ter sofrido “violência policial”, de acordo com a Defensoria Pública do Estado”, afirma a ONG em seu relatório.
Estatísticas – Até a primeira quinzena de novembro, 28,8 mil presos em flagrante haviam sido apresentados a um magistrado em todo o país. Como resultado, foram concedidos 13,9 mil relaxamentos do flagrante ou liberdades provisórias. Com frequência, esse tipo de liberdade é concedido sob condições que devem ser cumpridas pela pessoa presa, como ser monitorado eletronicamente e apresentar-se periodicamente em juízo, sempre que convocado.
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Manuel Carlos Montenegro
Agência CNJ de Notícias