Para alinhar o Brasil a parâmetros nacionais e internacionais de atenção à saúde mental, cujo dia mundial de visibilidade é neste 10 de outubro, o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) está desenvolvendo um plano de ação com 18 iniciativas sob uma perspectiva de garantia de direitos. O trabalho é executado de forma transversal por setores ligados ao Departamento de Monitoramento e Fiscalização do Sistema Carcerário e do Sistema de Execução de Medidas Socioeducativas (DMF) – o programa Fazendo Justiça e a Unidade de Monitoramento e Fiscalização (UMF) das deliberações da Corte Interamericana de Direitos Humanos (Corte IDH).
Para o coordenador do DMF, Luís Lanfredi, a atuação coordenada induzida pelo Judiciário é fundamental para que o Brasil avance em campos historicamente negligenciados. “As violações em instituições manicomiais que levaram o país a ser condenado na Corte Interamericana, somada aos desafios ainda mais complexos quando esse tema cruza o campo da Justiça criminal, demandam uma resposta coordenada do Judiciário para avanços estruturantes. E o CNJ vem apoiando tribunais e magistratura nesse sentido.”
Dados do Sistema de Informações do Departamento Penitenciário (Sisdepen) apontam um cenário de 668 mil pessoas em privação de liberdade no país para cerca de 1,6 mil profissionais da saúde mental, dentre psicólogos, psiquiatras e terapeutas ocupacionais. As consultas psicológicas somam 8% e 10% do total de procedimentos de saúde realizados no período entre homens e mulheres, respectivamente.
Desde 2019, O CNJ desenvolve ações para as questões de saúde mental no contexto de privação de liberdade por meio da parceria com o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (Pnud) e apoio do Departamento Penitenciário Nacional (Depen), hoje o programa Fazendo Justiça. As ações integram as atividades de fortalecimento da Política Nacional de Atenção Integral à Saúde das Pessoas Privadas de Liberdade no Sistema Prisional, desenvolvendo um programa nacional de atenção integral destinado ao paciente judiciário.
Colaboração
Em 2006, o Brasil sofreu sua primeira condenação na Corte IDH no caso de Damião Ximenes Lopes, morto três dias após dar entrada em unidade médica de saúde mental com sinais de maus-tratos e tortura. Quinze anos depois, em abril de 2021, a Corte indicou o CNJ para acompanhar o cumprimento de medidas, e em maio, o presidente do CNJ, ministro Luiz Fux, anunciou a criação de um grupo de trabalho voltado para questões de saúde mental e direitos humanos.
Desde então, o CNJ discute o plano de ação para enfrentar desafios comuns na área. Além das atividades do grupo de trabalho, as iniciativas incluem debate sobre a EAP com o Conselho Nacional de Direitos Humanos, suporte técnico a tribunais, atuação no caso Ximenes Lopes junto à Corte IDH, inserção de quesito para perícia sobre saúde mental na Resolução 414/2019 e organização do II Seminário CNJ sobre Saúde Mental, a ser realizado em maio de 2022.
No campo de privação de liberdade, há iniciativas já em andamento pelo Fazendo Justiça em cinco tribunais estaduais – Mato Grosso do Sul, Paraná, Pernambuco, Minas Gerais e Sergipe – que instituíram grupos de trabalho para revisão e desinstitucionalização de pessoas com transtorno mental ou sofrimento psíquico, em conformidade com os parâmetros dispostos na Lei n. 10.216/2011 e em dispositivos internacionais.
Em Sergipe, de março a julho de 2021, após a implementação do colegiado, a quantidade de pessoas internadas no Hospital de Custódia e Tratamento Psiquiátrico caiu de 130 para 92. Ainda, em abril, o Tribunal de Justiça da Paraíba instituiu o Plano Estadual de Atenção Integral à pessoa com transtorno mental em conflito com a lei, fruto do trabalho do Grupo Interinstitucional de Trabalho Interdisciplinar em Saúde Mental. Iniciativas semelhantes estão em desenvolvimento em outros estados.
A necessidade de processos formativos no tema também está contemplada no planejamento de ações, tanto com o desenvolvimento de cursos para magistrados, magistradas e profissionais do Direito como na organização de webinários em parceria com os tribunais estaduais, já realizados em Mato Grosso, Ceará e Paraíba. Está prevista ainda a realização de um levantamento nacional das políticas e programas voltados às pessoas com transtorno mental ou em sofrimento psíquico em conflito com a lei no âmbito do Poder Judiciário, para desenvolvimento de diagnóstico dos principais desafios e potencialidades no dia a dia das equipes de atendimento.
O conjunto de achados será base para elaboração de guia prático para integrantes do Judiciário e Executivo, apresentando princípios e orientações para atuação junto a pessoas em sofrimento de modo a reiterar os parâmetros estabelecidos na Lei de Reforma Psiquiátrica, tendo a desinstitucionalização e o tratamento em liberdade como padrão.
Renata Assumpção
Agência CNJ de Notícias