Assistência social e documentação são principais demandas dos Escritórios Sociais

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Foto: TJES
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Assistência social e documentação foram as principais demandas em atendimentos a pessoas egressas em 2022, aponta novo Relatório de Acompanhamento dos Escritórios Sociais lançado pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ). Os Escritórios Sociais são estruturas fomentadas pelo CNJ por meio da Resolução CNJ n. 307/2019 , que institui a Política de Atenção a Pessoas Egressas do Sistema Prisional. Atualmente, são 43 unidades em funcionamento em 21 unidades da federação, e os números de 2023 apontam mais de 27 mil atendimentos realizados.

Acesse o Relatório de Acompanhamento dos Escritórios Sociais – ano 2022

Os dados da publicação correspondem ao período de julho de 2021 a maio de 2022, ainda durante a pandemia de Covid, período que registrou 13,6 mil atendimentos – as informações foram apresentadas por 27 Escritórios Sociais em 19 estados. É o segundo levantamento feito a partir da metodologia do Guia para Monitoramento dos Escritórios Sociais, sendo que o primeiro se referia a o período entre julho de 2020 a julho de 2021.

Segundo o coordenador do Departamento de Monitoramento e Fiscalização do Sistema Carcerário e do Sistema de Execução de Medidas Socioeducativas (DMF), Luís Lanfredi, o levantamento permite que o Estado identifique e qualifique sua atuação no momento de retomada da liberdade. “Os achados da pesquisa comprovam que a participação do Estado na execução penal deve ir para além do cumprimento da pena, e que o Judiciário deve atuar de forma alinhada ao que prega a Lei de Execução Penal sobre prover um retorno harmonioso à vida em liberdade. São múltiplas necessidades para a retomada de uma trajetória cidadã, que se atendidas em momento oportuno conforme a lógica de funcionamento do Escritório Social, contribuem para a redução de reentradas e de reincidências”.

O apoio técnico para o relatório, o desenvolvimento da metodologia e o fomento à expansão e qualificação dos Escritórios Sociais fazem parte do escopo de ação do programa Fazendo Justiça, coordenado pelo CNJ em parceria com o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (Pnud) e diversos apoiadores para superar obstáculos históricos e estruturais na privação de liberdade no Brasil.

O levantamento apontou que a metodologia de singularização do atendimento, desenvolvida pelo CNJ com o apoio do Fazendo Justiça, tem sido aplicada na maioria dos casos. “Historicamente, a ênfase estava na inserção das pessoas egressas no mercado de trabalho. Agora, ganha destaque a prática de atender de maneira acolhedora, buscando entender as demandas e expectativas desse público”, pontua o juiz auxiliar da Presidência com atuação no DMF, Jônatas Andrade.

Para o coordenador do eixo de Cidadania do Fazendo Justiça, Felipe Athayde, esse fenômeno reflete os resultados dos processos de formação contínua das equipes. “Foram estabelecidas matrizes de atividades adaptadas aos contextos locais, ao mesmo tempo em que incentivamos um maior aprofundamento nas metodologias de singularização, mobilização de redes e engajamento de pessoas pré-egressas”.

Atendimento

O Relatório de Acompanhamento dos Escritórios Sociais 2022 identificou que a área da assistência social totalizou o maior número de encaminhamentos, sendo 35% para acompanhamento socioassistencial e políticas de renda, e 20% eram por demandas relacionadas à insegurança alimentar. Em seguida, estão questões voltadas ao atendimento especializado para pessoas em situação de rua (23%) e para acolhimento provisório (18%).

Em relação aos encaminhamentos, a pesquisa mostrou que 2.808 deles estavam relacionados à emissão de documentos, 1.866 eram para oportunidades de trabalho e geração de renda, 1.623 referiam-se à qualificação profissional e 1.449 envolviam assistência jurídica. Esses números sinalizam as principais dificuldades enfrentadas pelas pessoas egressas, que incluem falta de documentação, problemas de moradia, acesso ao mercado de trabalho, desafios de saúde, questões jurídicas e a complexidade em restabelecer vínculos sociais e familiares.

A responsável técnica pelo Escritório Social de Parnamirim (RN), Valtércia Lima, conta sobre a importância do plano de acompanhamento que realizam com as pessoas atendidas. “Notamos um interesse genuíno em participar das propostas oferecidas pela equipe. Ao criar o plano de acompanhamento, realizamos reuniões, encontros e oficinas, e percebemos um grande envolvimento por parte das famílias. Mesmo quando há um intervalo de tempo entre os encontros, eles entram em contato conosco, perguntando sobre a continuidade das atividades. Esse nível de interesse superou nossas expectativas e é um ponto muito positivo do nosso trabalho”, aponta a assistente social.

Perfil

Enquanto 12.524 registros de atendimento foram relacionados às pessoas egressas, apenas 1.130 registros se referiram aos familiares, menos de 9% do total. O subsecretário de Participação Social de Niterói, Carlos Mário Neto, conta que a relação com o equipamento é “semelhante a um porto seguro. Isso fica evidente quando o egresso e familiares passam a utilizar todos os meios possíveis de comunicação para nos procurar, com aquela certeza que sempre haverá um técnico para atender às suas demandas cotidianas”.

Dos 27 Escritórios Sociais que participaram da pesquisa, 24 (89%) indicaram realizar registros levando em consideração marcadores de raça e gênero. A análise desses registros revelou um destaque para o recorte racial, com a maioria das pessoas atendidas se autodeclarando negras. O atendimento a mulheres negras compõe mais de 80% do público feminino atendido, enquanto as mulheres brancas representam cerca de 14%. No caso dos homens, aproximadamente 86% são negros e 13,85% são brancos. Além disso, a pesquisa revelou 0,4% de atendimentos a pessoas travestis e transexuais.

Gestão e rotatividade

A maioria dos Escritórios Sociais que responderam à pesquisa tem gestão coordenada pelo Poder Executivo (63%), enquanto em 26% a gestão é compartilhada entre Executivo e Judiciário. Em 7%, a administração é exclusiva do Judiciário e em 4%, do Legislativo. Os resultados mostram ainda que cerca de 70% das unidades dividem instalações com outros serviços.

Quanto a recursos humanos, 89% têm equipe própria para o serviço, formada, principalmente, por assistentes sociais, profissionais da psicologia, pedagogia, direito e de serviços administrativos. O levantamento apontou uma predominância de profissionais da área técnico-administrativa, indicando necessidade de maior diálogo sobre a proporção de profissionais por escritório, considerando a carga horária individual e a demanda de atendimentos.

A formação das equipes, importante para consolidação da política e implementação das metodologias, aconteceu em larga escala durante o período analisado: 42 processos formativos envolvendo 1.172 profissionais. O levantamento aponta a rotatividade entre as equipes enquanto um desafio para a incorporação do conhecimento – mudanças na equipe multidisciplinar e na gestão foram relatadas em 63% dos escritórios durante o período. Em treze escritórios sociais (48%), parte da equipe havia participado da formação inicial e parte havia ingressado no serviço após a oferta do curso; em outras dez unidades (37), toda a equipe informou ter participado, e em quatro (15%) a equipe ainda não tinha passado pelo curso.

Sobre os Escritórios Sociais

Criado em 2016, o Escritório Social funciona em esquema de gestão compartilhada entre os poderes públicos locais e oferece a pessoas egressas do sistema prisional e a familiares acesso a uma rede de serviços de apoio. Os serviços são públicos e da sociedade civil, em áreas como qualificação profissional, documentação, saúde e moradia.

Para a diretora de Cidadania e Alternativas Penais da Senappen, Mayesse Parizi, os Escritórios Sociais contribuem efetivamente pela ampliação e capilaridade dos serviços especializados de atenção à pessoa egressa em território nacional. “Esse projeto não apenas visibiliza a necessidade urgente de acompanhamento a esse público frequentemente estigmatizado e exposto a contexto de vulnerabilidade, mas também reforça a demanda por implementação de uma política pública nacional estruturada, capaz de atender às especificidades e metas únicas desse campo, promovendo humanização e qualificação da porta de saída ao sistema prisional, além da estruturação de uma rede de proteção articulada em prol da reintegração social da pessoa egressa “.

Virtual

Além das unidades de atendimento presencial, o Escritório Social também está disponível como aplicativo de celular. Desenvolvido em parceria com o Governo do Distrito Federal por meio da Fundação de Apoio à Pesquisa do Distrito Federal (FAP-DF) e Universidade de Brasília (UnB), com apoio da Kroton e da Fundação Pitágoras (Cogna Educação), a ferramenta, contabiliza mais de 5 mil downloads desde o lançamento, em abril de 2020.

O aplicativo oferece a localização de serviços da rede de equipamentos públicos sociais, como unidades de saúde, de atendimento social, abrigos, restaurantes comunitários, locais de prestação de assistência judiciária gratuita e de obtenção de documentação civil básica. Há também integração com o Sistema Eletrônico de Execução Unificada (SEEU), o que permite que egressos e familiares tenham acesso ao acompanhamento processual da pena, de forma ágil e simplificada. Além de oferta de cursos livres gratuitos e conteúdos com foco específico em geração de trabalho e renda.

O aplicativo do Escritório Social Virtual está disponível tanto para celulares com sistema Android quanto iOS.

Texto: Renata Assumpção
Edição: Nataly Costa e Débora Zampier
Agência CNJ de Notícias

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