Acordo com a Vale traz benefícios imediatos para Minas Gerais

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Foto: Cecilia Pederzoli/TJMG
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“Estamos gratificados por ter participado da mediação do acordo entre a Vale, o estado e as instituições públicas. A tragédia completou dois anos no dia 25 de janeiro. Era preciso dar uma resposta de imediato à população atingida pelo rompimento da barragem”. Assim, o 3º vice-presidente do Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG), desembargador Newton Teixeira Carvalho, resume acordo celebrado no último 5 de fevereiro, com intermediação do Judiciário mineiro.

O Judiciário mineiro intermediou essas negociações entre a Vale, o estado e as instituições públicas que culminaram com a celebração desse acordo histórico na valor de R$ 37,7 bilhões. Como se deu essa intermediação?

Newton Teixeira – O TJMG desempenhou um papel de suma importância na intermediação desse acordo. O assunto estava a cargo da 2ª Vara na Fazenda Pública e Autarquias da capital, sem que as partes chegassem a alguma composição. As discussões não avançavam. Assim, há três meses nós trouxemos as partes para a mesa de negociações. Pudemos então, juntamente com elas, discutir cada cláusula das mais de 130 laudas redigidas. Com o passar dos dias – foram inúmeras sessões – as pessoas foram adquirindo confiança, e sentimos que o acordo iria surgir. No início havia uma desconfiança entre as partes e o que fizemos foi aquilo que a mediação exige: uma aproximação entre elas e a criação de um ambiente de confiança. A partir daí, o trabalho foi conjunto.

A conciliação e a mediação são exaltadas como métodos que permitem a construção dialogada da solução para um conflito, com benefícios para ambas as partes. No caso desse acordo, que vantagens ele representa para o estado, a Vale e a população?

NT – O acordo foi importante porque estávamos em uma fase muito difícil do processo, que era a de apuração de valores, que poderia se arrastar por muito tempo. Agora, com o acordo celebrado, inúmeras obras já poderão ser realizadas e irão se prolongar pelos próximos cinco ou seis anos. Para a população também foi muito significativo, porque ela não fica na expectativa de algo que poderia levar 10 ou mais anos para finalizar… Diversos municípios serão beneficiados com a construção de escolas, de hospitais e de estradas, que irão movimentar a economia local. Esses benefícios são agora, para o momento presente. Além disso, com o tempo e uma eventual desvalorização da nossa moeda, as partes poderiam ser prejudicadas. Nós sentíamos que a empresa queria fazer o acordo, mas dentro de uma realidade. Por isso, foi um acordo ganha/ganha: ganhou o estado, a população e a Vale.

Uma preocupação que surgiu entre os atingidos, logo depois do anúncio do acordo, foi em relação às ações individuais. Esses processos continuam tramitando normalmente, uma vez que não foram abarcados pelo acordo?

NT – Exato. Consta de cláusula do próprio acordo que as ações individuais não são abrangidas nesse acordo, tampouco as criminais. Os responsáveis pelo rompimento da barragem irão responder normalmente, dentro do tempo que levam os processos criminais. O que houve aqui foi um acordo em torno de danos ambientais compensatórios com relação ao estado de Minas Gerais. Tanto que a Defensoria Pública, nas questões individuais, já firmou mais de 8 mil acordos. Outras pessoas que se sentem prejudicadas podem fazer um acordo também, por meio da Defensoria Pública ou ajuizando uma ação. Questionou-se a participação popular no processo de negociações. Nesse acordo, o autor da ação era o estado de Minas Gerais. Há, inclusive, uma ressalva em relação a possíveis danos futuros – o que foi negociado diz respeito apenas aos danos apurados até o momento.

Esse acordo lançou luz na conciliação e na mediação, métodos que ainda são pouco buscados pelos cidadãos. Mas outros acordos importantes também já foram construídos com a mediação do Judiciário?

NT – Sim. Há algum tempo, principalmente a partir do surgimento do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) e, posteriormente, do Código de Processo Civil de 2015, essa política autocompositiva, pacificadora, vem sendo incentivada. Por meio do Centro Judiciário de Solução de Conflitos e Cidadania (Cejusc), já tivemos outros acordos de grande relevância. Por exemplo, o acordo entre o próprio governo de Minas, na gestão do governador Zema, e os municípios mineiros; o acordo entre empresas de transporte e município do Triângulo Mineiro, no ano passado, e, também, no final de 2020, o acordo envolvendo a prefeitura de Belo Horizonte e as empresas de ônibus, evitando que uma greve ocorresse e que a cidade parasse. Outro acordo de relevância foi o que pacificou disputa pela maior ocupação urbana da América Latina, a Izidora, em novembro de 2008. A conclusão dessa mediação agora entre a Vale e o governo de Minas e instituições públicas serviu para, mais uma vez, mostrar que é possível conciliar, e que a conciliação é melhor, porque restaura.

Em dezembro de 2020, o Núcleo Permanente de Métodos Consensuais de Solução de Conflitos (Nupemec), vinculado à 3ª Vice-Presidência, criou uma recomendação a juízes para estimular a autocomposição. O senhor poderia explicar o que é essa orientação?

NT – Trata-se de uma iniciativa a mais nesse esforço de disseminar e fortalecer os métodos autocompositivos. Na última reunião do Núcleo, no fim do ano passado, foi decidido recomendar aos juízes o seguinte: sempre que chegar uma ação em juízo, sem que tenha havido anteriormente uma tentativa de conciliação entre as partes, o magistrado deve suspender o processo, por 15 ou 20 dias, até que essa tentativa seja feita. A proposta é justamente acabar com a cultura demandista. Vinha acontecendo um absurdo: o advogado propunha uma ação sem sequer ouvir a outra parte, sem tentar uma conciliação. Por isso, nós precisamos do advogado como parceiro, pois ele tem o primeiro contato com a parte e pode tentar a conciliação. No Cejusc, temos o setor pré-processual: o advogado pode fazer um acordo no escritório dele e trazer para homologação. É muito mais rápido. Essa recomendação do Nupemec aos juízes, portanto, é uma contribuição do Judiciário nesse movimento de pacificação. Todos nós fomos formados em uma cultura muito belicosa. Foi apenas há cerca de dois anos que o Ministério da Educação (MEC) exigiu que os cursos de Direito tenham uma disciplina de mediação e conciliação. A mudança de cultura ainda vai demorar, mas acordos como o que envolve o rompimento da barragem de Brumadinho, entre vários outros que vêm sendo celebradas no Cejusc, contribuem para isso. Essa é a proposta do CNJ e do CPC, e que foi encampada integralmente pelo Judiciário mineiro, desde os meus antecessores – com especial lembrança à desembargadora Mariangela Meyer – e à qual estamos dando sequência. É possível, sim, conciliar, e a conciliação e a mediação encurtam o tempo que demora uma ação, do início dela até seu trânsito em julgado.

Como o Judiciário pode contribuir para disseminar na sociedade a cultura da não litigância?

NT – A cultura pacificadora será implementada em Minas Gerais a partir da 3ª Vice-Presidência, que tem essa função específica. Nós estamos instalando Cejuscs em todas as comarcas de Minas, e isso vai ao encontro da proposta do presidente Gilson Lemes. Já são mais de 200 no Estado. Quando o Cejusc chega em uma comarca, com ele chega também a política autocompositiva. Nesta gestão, criamos o Cejusc Virtual e, com isso, de qualquer lugar do mundo, as composições podem ser feitas. Além disso, em função da pandemia da Covid-19, estamos prestes a implantar o Cejusc Empresarial, para evitar quebra de empresas e despejos, por exemplo. Esse é um movimento que precisa de uma mudança de mentalidade, que exige um tempo para que ocorra. Enquanto isso, o Tribunal de Justiça de Minas pode dar o exemplo, incentivando essas políticas.

Fonte: TJMG