Conselho Nacional de Justiça

Gabinete do Conselheiro Pablo Coutinho Barreto

 

Autos: PROCEDIMENTO DE CONTROLE ADMINISTRATIVO - 0007031-32.2022.2.00.0000
Requerente: CEZAR JUNIOR CABRAL
Requerido: JUÍZA CORREGEDORA DA COMARCA DE MACAPÁ DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO AMAPÁ - AP

 

EMENTA: PROCEDIMENTO DE CONTROLE ADMINISTRATIVO. LEI DE REGISTROS PÚBLICOS (LRP) - LEI Nº 6.015/1973. COMPETÊNCIA PARA OS ATOS DE AVERBAÇÃO NOS REGISTROS E NAS MATRÍCULAS DE IMÓVEIS QUE PASSAM A PERTENCER A OUTRA CIRCUNSCRIÇÃO IMOBILIÁRIA POR FORÇA DE DESMEMBRAMENTO TERRITORIAL. PRINCÍPIO DA TERRITORIALIDADE. LEI Nº 14.382/2022 MANUTENÇÃO DA COMPETÊNCIA RESIDUAL. NATUREZA DAS TRANSCRIÇÕES (ART. 176, I, E §18, DA LRP). PEDIDO JULGADO IMPROCEDENTE. 

1. Trata-se de Procedimento de Controle Administrativo (PCA) em que se questiona a existência de competência residual para a averbação de matrículas após a instalação da 2ª Circunscrição Imobiliária da Comarca de Macapá/AP, segundo a disciplina do art. 169, da Lei nº 6.015/1973, Lei de Registros Públicos (LRP).

2. Alegou-se que o 1º Ofício estaria a realizar averbações de imóveis que seriam de competência da 2ª Circunscrição.

3. Decisão do Juízo Corregedor Permanente da Comarca que indeferiu o pedido cautelar para que o Registrador do 1º Ofício se abstivesse de praticar averbações nas matrículas pertencentes à 2ª CI, e ao final julgou o pedido improcedente.

4. A regra geral constante no art. 169, da LRP é a de que os atos de registro e de averbação sejam efetuados na serventia da situação do imóvel. Quanto às averbações, o inciso I do preceito prevê que estas “serão efetuadas na matrícula ou à margem do registro a que se referirem, ainda que o imóvel tenha passado a pertencer a outra circunscrição, observado o disposto no inciso I do § 1º e no § 18 do art. 176”.

5. Se a transcrição não possuir todos os requisitos para a abertura de matrícula, o art. 176, § 18, da LRP, prevê que os atos de averbação serão realizados à margem do título, na serventia de origem (art. 176, §18). Mas se a transcrição reunir todos os requisitos elencados para a abertura de matrícula, esta será feita no cartório da situação do imóvel (art. 176, I, LRP).

6. O art. 176, §14, da LRP faculta a abertura da matrícula na circunscrição onde estiver situado o imóvel, mediante requerimento do interessado ou de ofício, por conveniência do serviço. Nesta hipótese, o oficial comunicará o fato à serventia de origem, para o encerramento, de ofício, da matrícula anterior (art. 167, IV, LRP).

7. Validade da decisão da Juíza Corregedora que manteve a competência residual da 1ª Circunscrição Imobiliária.

8.    Pedido julgado improcedente.

 

 

 ACÓRDÃO

O Conselho, por unanimidade, julgou improcedente o pedido, nos termos do voto do Relator. Presidiu o julgamento o Ministro Luís Roberto Barroso. Plenário Virtual, 10 de maio de 2024. Votaram os Excelentíssimos Conselheiros Luís Roberto Barroso, Luis Felipe Salomão, Caputo Bastos, José Rotondano, Mônica Autran, Alexandre Teixeira, Renata Gil, Daniela Madeira, Giovanni Olsson, Pablo Coutinho Barreto, João Paulo Schoucair, Marcos Vinícius Jardim Rodrigues, Marcello Terto, Daiane Nogueira de Lira e Luiz Fernando Bandeira de Mello.

Conselho Nacional de Justiça

Gabinete do Conselheiro Pablo Coutinho Barreto

Autos: PROCEDIMENTO DE CONTROLE ADMINISTRATIVO - 0007031-32.2022.2.00.0000
Requerente: CEZAR JUNIOR CABRAL
Requerido: JUÍZA CORREGEDORA DA COMARCA DE MACAPÁ DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO AMAPÁ - AP



RELATÓRIO 

 

O CONSELHEIRO PABLO COUTINHO BARRETO (Relator): 

Trata-se de Procedimento de Controle Administrativo (PCA) proposto por Cézar Júnior Cabral, titular da 2ª Circunscrição Imobiliária (2ª CI) de Macapá/AP, no qual questiona decisão proferida pela Juíza Corregedora da mesma Comarca, que teria atribuído à 1ª Circunscrição Imobiliária (1ª CI) as averbações de registros que seriam de competência do requerente, em possível violação à Lei nº 6.015/1973.

Relata que entrou em exercício em 13/7/2021, quando a “[...] capital do Estado do Amapá (AP) passou a ter duas Circunscrições Imobiliárias instaladas (1ª CI e 2ª CI), pendente apenas de instalação da terceira, a qual o titular da 1ª CI ocupa de forma precária”.

Aponta que, por meio de decisão administrativa prolatada nos autos do Pedido de Providência nº 0023205-65.2021.03.0001, do TJAP, a juíza corregedora da comarca de Macapá-AP determinou que os títulos protocolados perante o Cartório da 1ª Circunscrição (Cartório Eloy Nunes), “[...] até a data que antecedeu a comunicação da entrada em exercício do Registrador Cézar Júnior Cabral na Segunda Circunscrição Imobiliária (13/07/2021), devem ser finalizados pelo próprio Cartório Eloy Nunes, porque não são nulos, ao contrário, são validos e legais”, mantendo, ainda, a competência deste para prática dos atos de averbação.

Narra que, após ter conhecimento sobre a homologação de um acordo entre o Município de Macapá e o advogado do registrador da 1ª CI (processo nº 0023661-49.2020.8.03.0001, da 1ª Vara Cível e de Fazenda Pública da Comarca de Macapá/AP), que envolvia registros imobiliários de competência da circunscrição do requerente, a 2ª CI, ingressou com novo Pedido de Providência junto à Corregedoria Local (nº 0006425-16.2022.8.03.0001).

Salienta que, no procedimento, teria solicitado que “[...] o titular da 1ª CI se abstivesse de realizar averbações nas matrículas pertencentes a 2ª CI, uma vez que a MP nº 1.085, de 27/12/2021, havia revogado o inciso I do art. 169, isto é, extinguiu a suposta competência residual”. 

Sobre a MP, destaca que, após a conversão desta na Lei nº 14.383/2022, a competência residual inicialmente extirpada do ordenamento jurídico retornou à vigência, contudo, com outra definição legal, em virtude da nova redação dada ao inciso I do art. 169 c/c o § 1º, inciso I, e § 18, ambos do art. 176 , da Lei nº 6.015/1973, que possibilita a averbação no registro de origem somente quando se tratar de transcrição que não possua todos os requisitos para a abertura de nova matrícula na circunscrição onde estiver situado o imóvel.  

Aduz que a Juíza Corregedora da comarca de Macapá-AP, ao apreciar o pedido de tutela, determinou que “a competência para o ato de averbação permaneça no Registro de Imóveis da origem, sendo obrigatória a abertura da matrícula na nova Circunscrição imobiliária somente para os atos de Registro”, pendente a apreciação do mérito. 

Ao final, o requerente pleiteia:  

a) em sede liminar, suspender, em caráter de urgência, a decisão da Juíza Corregedora que indeferiu a tutela de urgência pleiteada nos autos do PP nº 0006425-16.2022.8.03.0001, que tramita administrativamente no TJ/AP, haja vista a ilegalidade e violações suscitadas, determinando-se, em sede URGÊNCIA que a Corregedoria intime o Registrador da 1ª CI de Macapá para que:  

i. se abstenha de realizar averbações nas matrículas pertencentes à 2ª CI, de titularidade do requerente, excetuado o caso do §18, do art. 176, da Lei 6.015/73, a qual dispõe possibilidade de averbar na origem quando a transcrição não tem elementos suficientes para abertura de nova matrícula no RI competente;

ii. promova o imediato CANCELAMENTO dos atos de averbação praticados nas matrículas dos imóveis pertencentes ao 2º RI de Macapá, averbações estas praticadas a partir tanto da vigência da MP 1085/2021 quanto da vigência da Lei 14.382/2022, eis que eivados do vício de nulidade em virtude de terem sido praticados por serventia incompetente, e, consequentemente, devolvendo aos usuários os emolumentos percebidos pela prática dos atos e orientando-os a procurar a serventia competente para a prática dos atos;

b) no mérito, julgar procedente o presente Procedimento de Controle Administrativo, anulando a decisão administrativa da corregedoria local, que indeferiu a tutela de urgência pleiteada, determinando-se que a Corregedoria intime o Registrador da 1ª CI de Macapá para que proceda os atos descritos nas alíneas “i” e “ii”, do item anterior, sob pena de sujeição a infração funcional. (grifos do original)

Em 9/11/2022, a Presidência do Tribunal de Justiça do Estado do Amapá (TJAP) foi intimada para prestar informações (Id. 4934325), posteriormente apresentadas em 21/11/2022, pela juíza corregedora permanente da comarca de Macapá (Id. 4945168).

A magistrada assevera que, da leitura do novo texto da Lei nº 14.382/2022, a competência residual anteriormente prevista na Lei nº 6.015/1973 foi mantida, ainda que com alteração do texto da norma, compartilhando do entendimento apresentado pela ANOREG/PA, constante do Id. 49451714, “de que a competência para o ato de averbação permanece no Registro de Imóveis da origem, sendo obrigatória a abertura da matrícula na nova Circunscrição imobiliária somente para os atos de Registro”.

Ao final, alega ter indeferido o pedido liminar pleiteado pelo requerente, sem que tenha havido a apresentação de recurso ou de reconsideração.

Na data de 28/11/2022, o feito foi remetido à Coordenadoria de Gestão de Serviços Notariais e de Registro (CONR) para emissão de parecer sobre a matéria (Id. 4954514), oportunidade em que esta se manifestou em 10/5/2023  pelo não conhecimento do pedido, para se evitar desarrazoada supressão da competência administrativa do Tribunal de origem, haja vista a ausência de decisão definitiva da questão pela: “[...] Administração Pública local, já que, na origem, houve a devida instauração de processo administrativo, com regular tramitação, para dirimir a questão conflituosa” (Id. 5138142).

Antes, porém, da apresentação do parecer, o requerente peticionou voluntariamente para informar sobre a superveniência da sentença no PP nº 0006425-16.2022.8.03.0001. No ensejo, apresentou emenda à inicial para que os pedidos do item 5 da petição inicial passassem a ser os seguintes (Id. 5053740):

a)  em sede liminar, suspender, em caráter de urgência, a sentença (que confirmou o indeferimento da tutela) da Juíza Corregedora autos do PP nº 0006425-16.2022.8.03.0001, que tramita administrativamente no TJ/AP, haja vista a ilegalidade e violações suscitadas, determinando-se, em sede URGÊNCIA que a Corregedoria intime o Registrador da 1ª CI de Macapá para que:

i.   se abstenha de realizar averbações nas matrículas pertencentes à 2ª CI, de titularidade do requerente, excetuado o caso do §18, do art. 176, da Lei 6.015/73, a qual dispõe possibilidade de averbar na origem quando a transcrição não tem elementos suficientes para abertura de nova matrícula no RI competente;

ii.   promova o imediato CANCELAMENTO dos atos de averbação praticados nas matrículas dos imóveis pertencentes ao 2º RI de Macapá, averbações estas praticadas a partir tanto da vigência da MP 1085/2021 quanto da vigência da Lei 14.382/2022, eis que eivados do vício de nulidade em virtude de terem sido praticados por serventia incompetente, e, consequentemente, devolvendo aos usuários os emolumentos percebidos pela prática dos atos e orientando-os a procurar a serventia competente para a prática dos atos;

b)  no mérito, julgar procedente o presente Procedimento de Controle Administrativo, anulando a sentença administrativa da corregedoria local nesse ponto, que manteve o indeferimento da tutela de urgência, determinando-se que a Corregedoria intime o Registrador da 1ª CI de Macapá para que proceda os atos descritos nas alíneas “i” e “ii”, do item anterior, sob pena de sujeição a infração funcional.    

 

Diante da opinião técnica, determinou-se a intimação do requerente, ocasião em que alegou a juntada aos autos da sentença definitiva prolatada no expediente de origem (Id. 5053740), e não haveria de se falar em não conhecimento do pedido por falta de apreciação da matéria pela Corte local, bem como registrou o interesse no prosseguimento do feito e apreciação do pleito liminar, sem necessidade de nova remessa à Corregedoria Nacional de Justiça (Id. 5181739).

Este novamente se manifestou nos autos no Id 5378078 para reiterar as alegações sobre a ilegalidade da decisão da juíza corregedora da comarca de Macapá nos autos do PP nº 0006425-16.2022.8.03.0001, por avalizar condutas contrárias à LRP praticadas pelo oficial da 1ª CI, e por isso insistiu na concessão de liminar para que se suspendesse a deliberação.

Em 28/6/2023, a CONR foi novamente instada a se manifestar sobre o pleito (Id. 5197667), todavia, por meio do despacho de Id. 5382232, os autos foram restituídos ao gabinete deste subscritor, haja vista a reiteração do pedido liminar pelo requerente, nos termos da petição de Id. 5378078.

A tutela cautelar foi por mim deferida em 14/12/2023 e submetida à ratificação do Plenário nas 3ª e 5ª Sessões do Plenário Virtual (Id’s 5484518 e 5523072), em que houve pedido de vista na primeira assentada. Retornado à pauta retirei o processo de julgamento.

O titular do 1º CI manifestou-se nos autos na condição de terceiro interessado (Id. 5441048). Expõe seu entendimento quanto à natureza individual do pedido, por estar evidente o benefício particular e exclusivamente financeiro do requerente já que, se este impedir que o peticionante realize os atos de averbação como previsto em lei, obrigaria o proprietário do imóvel a requerer a abertura de matrícula e, em seguida, a averbação, com o pagamento de emolumentos em favor do requerente.

Alega que, ao contrário do afirmado na petição inicial, a Lei nº 14.382/2022 teria preservado a atribuição residual da circunscrição original para realizar as averbações e apenas teria acrescentando a parte final para que fossem observadas as exceções previstas no inciso I do § 1º e no § 18 do art. 176, da LRP, na hipótese de o registro originário ser uma transcrição.

Prossegue diferenciando os atos de (i) registro e de averbação e (ii) a sistemática de registro de matrícula e a de transcrição das transmissões. Nesse raciocínio, explica que a Lei nº 6.015/1973 criou matrículas únicas para cada imóvel, concentrando todos os atos referentes ao imóvel dentro dessa mesma matrícula, que corresponde à identificação única deste dentro da circunscrição territorial do registro. Resume que “o registro, como regra, trata da transmissão ou modificação da propriedade do imóvel e de direitos reais”, enquanto “a averbação serve, como regra, para dar publicidade às alterações nos atos já registrados na matrícula” por representarem situações diversas, teriam recebido tratamento diferenciado pela LRP. 

Defende que o art. 169, da LRP, taxativamente e expressamente, afirma que somente as averbações serão realizadas na matrícula da antiga circunscrição (inciso I), enquanto não encerrada por força da abertura da nova matrícula (inciso IV), interpretação que seria reforçada pelo art. 176, §1º, I e §18 do mesmo artigo.

Didaticamente, apresenta o seguinte resumo:

1.   No primeiro ato de registro a matrícula será aberta na nova circunscrição (art. 176, § 1º, I, primeira parte);

2.  As averbações serão realizadas na matrícula da circunscrição de origem (art. 169, I), até que seja encerrada com a abertura da matrícula na nova circunscrição (art. 169, IV);

3.   A averbação, cujo registro anterior seja uma transcrição que contenha os requisitos, ensejará a abertura de matrícula na nova circunscrição (art. 176, § 1º, I, segunda parte);

4.   A averbação, cujo registro anterior seja uma transcrição que não tenha os requisitos, será realizada à margem da transcrição na circunscrição de origem (art. 176, § 18).

Quanto aos fundamentos do deferimento liminar, alega que estes não se sustentem, e daí a necessidade da imediata revogação da medida, em razão de a publicação do Instituto de Registro Imobiliário do Brasil (IRIB) se tratar de uma publicação doutrinária que expressa exclusivamente a opinião do autor, absurda e inteiramente contrária aos dispositivos legais, e não revela ser a interpretação institucional do instituto, e que a Corregedoria Geral de Justiça do Estado de São Paulo teria se precipitado nas conclusões sobre as alterações promovidas pela Lei nº 14.382/2022.

Apresenta a alegação da existência de dano inverso, pela obrigação imposta ao usuário do serviço de requerer a averbação na nova circunscrição, obrigando-o, ainda, a pedir a abertura de nova matrícula, aumentando para este o custo do serviço, o que desestimulará as averbações. Nessa hipótese, a averbação deixaria para ser feita só quando do registro, “ocasionando uma perigosa deficiência de informações do fólio real”.

Ao final, pede por sua admissão como terceiro interessado; o arquivamento liminar dos autos, pois ausente interesse geral; a reconsideração da decisão que concedeu a tutela liminar; a submissão desta ao Plenário, caso não haja a reconsideração.

No mérito, requer a improcedência total do pedido.

Há nova petição do terceiro interessado em que reitera o pedido de revogação da tutela liminar baseado nos argumentos já apresentados (Id 5519245).

O requerente pleiteou pela petição de Id 5530164 a manutenção da medida liminar e a procedência deste PCA. 

 

É o relatório.

 

 

Conselho Nacional de Justiça

Gabinete do Conselheiro Pablo Coutinho

 

Autos: PROCEDIMENTO DE CONTROLE ADMINISTRATIVO - 0007031-32.2022.2.00.0000
Requerente: CEZAR JUNIOR CABRAL
Requerido: JUÍZA CORREGEDORA DA COMARCA DE MACAPÁ DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO AMAPÁ - AP

 

VOTO

O CONSELHEIRO PABLO COUTINHO BARRETO (Relator): 

 

Trata-se de procedimento em que se questiona a existência de competência residual para a averbação de matrículas após a instalação da 2ª Circunscrição Imobiliária da Comarca de Macapá/AP. 

O requerente narra ter entrado em exercício na titularidade do 2º Ofício de Registro de Imóveis da referida Comarca em 13/7/2021 e, após sua investidura, Macapá passou a ter duas Circunscrições Imobiliárias instaladas, mas que o 1º Ofício estaria a realizar averbações de imóveis que seriam de competência da 2ª Circunscrição. 

Por entender que o 1º CRI estaria usurpando de sua competência, o requerente provocou o Juízo Corregedor Permanente da Comarca que decidiu, liminarmente, o seguinte (Id 4914475, fl. 4): 

Os títulos protocolados perante o Cartório Eloy Nunes até a data que antecedeu a comunicação da entrada em exercício do Registrador Cézar Júnior Cabral na Segunda Circunscrição Imobiliária (13/07/2021) devem ser finalizados pelo próprio Cartório Eloy Nunes, porque não são nulos, ao contrário, são validos e legais. Além disso, mantém-se a competência do Cartório do 1º Ofício para a prática dos atos de averbação, tudo nos moldes da decisão e artigos acima citados.  

 

Posteriormente, em decisão definitiva datada de 2/2/2023, o que ensejou a apresentação de emenda à inicial pelo requerente (Id 5053736), a juíza corregedora proferiu sentença administrativa indeferindo a pretensão do requerente para que o 1º Ofício se abstivesse de realizar averbações em desacordo com o art. 169, da Lei nº 6.015/1973 (Lei de Registros Públicos – LRP) (Id 5053741). 

Finalizadas as apreciações sobre o tema no âmbito do TJAP, o requerente combate as decisões da magistrada por meio deste procedimento. 

Na análise da tutela cautelar aqui proposta, em um primeiro olhar sobre a matéria, deferi o pedido e determinei a suspensão parcial “dos efeitos da Decisão da Juíza Corregedora da Comarca de Macapá-AP (Id. 5053741) e para determinar que a 1ª Circunscrição Imobiliária da Comarca de Macapá-AP se abstenha de realizar averbações nas matrículas de imóveis de competência da 2ª Circunscrição Imobiliária da Comarca de Macapá-AP, excetuados os casos previstos no § 18, do art. 176, da Lei nº 6.015/73, até o julgamento final deste PCA” (Id 5394935).

Entretanto, ao analisar o mérito da causa – momento em que é possível um exame mais aprofundado de todo o contexto fático e jurídico da causa – e diante dos fortes argumentos apresentados nos votos divergentes consignados em relação à ratificação da liminar outrora deferida e levada a julgamento Plenário na 3ª Sessão Virtual (Id’s 5394935 e 5484518) – entendo que o caso é de improcedência do PCA. 

De fato, as divergências apresentadas pelo Corregedor Nacional de Justiça, o Ministro Luis Felipe Salomão, e pelo Conselheiro José Edivaldo Rocha Rotondano seguiram a mesma diretriz ao entender pela existência da competência residual e por isso a possibilidade de realização de atos de averbação na matrícula originária de imóveis que passaram a pertencer à circunscrição diversa daquela que realizou registro, assim como dispõe o art. 169, I, da LRP, com a redação dada pela Lei nº 14.382/2022.

Confira-se os principais trechos dos votos:

Divergência do Corregedor-Geral de Justiça:

[...]

Destarte, é possível observar que o princípio da territorialidade (previsto no caput do supratranscrito art. 169) não é absoluto, sendo excetuado em algumas hipóteses – dentre as quais: no caso de averbação a ser feita na matrícula de origem do imóvel que tenha passado a pertencer a outra circunscrição. 

Todavia, conquanto seja possível a averbação de atos referentes a determinado imóvel, que tenha passado a pertencer a circunscrição diversa, no cartório de sua circunscrição originária (art. 169, I, LRP), isso somente pode ocorrer até a abertura de nova matrícula, para este mesmo imóvel, no cartório da sua atual circunscrição. 

Isso pode se dar com base em “elementos constantes do título apresentado e da certidão atualizada” do registro de origem (art. 229, LRP), mediante “requerimento do interessado ou de ofício, por conveniência do serviço” (art. 176, § 14, LRP). No caso, deve o oficial da recente serventia de situação do imóvel tão somente comunicar a abertura de matrícula “à serventia de origem, para encerramento, de ofício, da matrícula anterior” (art. 169, IV, LRP).

[...]

Pertinente registrar que tal interpretação decorre, em especial, da nova redação conferida à Lei de Registros Públicos pela Lei nº 14.382/2022, na forma supratranscrita. 

Assim, evidencia-se que, diferentemente de outrora, os incisos do art. 169, da Lei nº 6.015/73, não mais trazem ressalvas peremptórias (caracterizadas pela utilização da expressão “salvo”), e sim ponderações a serem observadas – dentre as quais, hoje consta a previsão de abertura de “matrícula na serventia da situação do imóvel” (inciso IV). Outrossim, ainda à luz dos termos atualmente constantes da Lei de Registros Públicos, “É facultada a abertura da matrícula na circunscrição onde estiver situado o imóvel, a requerimento do interessado ou de ofício, por conveniência do serviço” (art. 176, § 14) – o que denota a alternatividade, e não cumulatividade, de tais hipóteses. 

Com efeito, o entendimento expressado pelo Relator, ainda que em um exame ainda perfunctório cabível em sede de exame de pedido de liminar, segundo entendo, mediante interpretação sistemática e harmônica das regras acima expostas da Lei de Registros Públicos, que não é um conjunto caótico de regras e princípios, é possível ao registrador da serventia de origem realizar atos de averbação na matrícula imobiliária que ainda não for aberta no cartório da nova circunscrição imobiliária, o que poderá se dar por novo ato de registro, a requerimento da parte interessada ou de ofício pelo oficial da nova circunscrição. 

Se o registro anterior for uma transcrição, será aberta a nova matrícula para o ato de averbação no ofício da nova circunscrição, caso a transcrição possua todos os elementos para a abertura da matrícula (art. 176, § 1º, I, 2ª parte, da LRP) - esta é uma regra de exceção ao art. 169, I, para que a averbação seja no novo ofício, que a decisão com a qual nos brindou o douto Relator utiliza, data venia, considerou como regra geral. (Destaque no original) 

É dizer, tanto o inc. I do § 1º quanto o § 18 do art. 176 da LRP, tratam especificamente de averbações em transcrições, do que se extrai que as averbações em matrícula permanecem sendo feitas no ofício de origem, conforme prevê a regra do art. 169, I, do mesmo Diploma, de modo que entendo que a r. liminar não deve subsistir. 

Ademais, ainda que a decisão tenha natureza precária, por força da liminar, que repercute em matrículas ainda existentes na Serventia de origem, isto é, as que não foram encerradas em vista de que para tanto é necessária a criação de nova matrícula na Serventia que atualmente tem competência territorial (ato ao qual se submete o delegatário da Serventia de originária com o consequentemente encerramento da matrícula), é possível que estejam advindo transtornos diversos aos utentes do serviço que, v.g., precisem atualizar (averbação) um dado da matrícula para embasar um requerimento de inventário ou mesmo que prefiram fazer a atualização na Serventia de origem antes de alienar o bem e, então, como disciplinar a LRP,  praticar o efetivo ato registral na Serventia que atualmente detém a competência territorial . 

 3. Diante do exposto, rogando vênia ao eminente Relator, voto pela não ratificação da liminar, indeferindo-a. 

Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO 

Corregedor Nacional de Justiça 

 

Divergência do Conselheiro José Edivaldo Rocha Rotondano:

[...]

A regra de competência territorial no âmbito do registro imobiliário, prevista no art. 169 da Lei Federal n. 6.015/73, estabelece que os atos de registro e averbação deverão ser efetuados na serventia da situação do imóvel. Ou seja, no ofício da circunscrição territorial a que pertencer o imóvel. 

Todavia, o inciso I do citado dispositivo traz uma exceção à regra: as averbações serão executadas na matrícula ou à margem do registro a que se refiram, ainda que o imóvel tenha passado a pertencer a outra circunscrição. 

Trata-se de competência residual da serventia de origem (anteriormente revogada pela MP 1.085/21 e “repristinada” pela Lei 14.832/22) para as matrículas e registros de seu acervo referentes a imóveis que passaram a pertencer à circunscrição de outro ofício, ainda não encerrados em razão da abertura de uma nova matrícula neste.

Com a edição da Lei Federal n. 14.382/22, o inciso em referência manteve sua redação original e passou a ter uma ressalva: observância ao quanto disposto no inciso I do § 1º e no § 18 do art. 176 daquela Lei.

Desde então, nas hipóteses em que as transcrições não possuam todos os requisitos para a abertura de matrícula, admitir-se-á a realização de atos de averbação à margem do título, na serventia de origem. Enquanto que naquelas transcrições que possuam os elementos para abertura de matrícula, este procedimento será realizado na serventia da situação do imóvel, por ato de averbação.

Em resumo, a serventia de origem ainda pode praticar atos de averbação, nas hipóteses de competência residual (situações em que as matrículas que ainda não tenham sido abertas no ofício da circunscrição atualmente competente), exceto nos casos de abertura de matrícula em decorrência de transcrições que contenham os requisitos necessários para tal procedimento, que será executado no âmbito da serventia da situação do imóvel.

No caso trazido à baila, com a criação do 2º CRI da Comarca de Macapá/AP e a entrada em exercício do delegatário naquela unidade, em 13/07/2021, houve o efetivo desmembramento territorial do 1º CRI, que “perdeu” área para aquele.

Logo, o 1º CRI, por ser a serventia de origem, ainda tem competência para a prática de atos de averbação nos registros e matrículas de imóveis, cuja circunscrição passou a pertencer ao 2º CRIsem a devida abertura das matrículas correspondentes no âmbito desta unidade, exceto nos casos de abertura de matrícula decorrente de transcrição que contenha os requisitos necessários para a prática daquele ato.

[...]

Ante o exposto, rogando vênia ao d. Conselheiro Relator, acompanho a divergência apresentada pelo eminente Corregedor Nacional de Justiça, que voto pela não ratificação da liminar concedida, indeferindo-a.


José Edivaldo Rocha Rotondano

Conselheiro

 

Assentadas as premissas, sabe-se que os serviços concernentes aos Registros Públicos, dentre os quais se inclui o registro de imóveis, conferem autenticidade, segurança e eficácia aos atos jurídicos[1]. Enquanto o registro seria o ato de inscrição principal do imóvel, as averbações dizem respeito às eventuais atualizações ou modificações a serem anotadas no registro. 

Isso posto, a controvérsia emerge da divisão territorial da Comarca de Macapá/AP entre, ao menos, dois registros imobiliários, o 1º (de titularidade de Nino Jesus Aranha Nunes, terceiro interessado) e o 2º (de titularidade do requerente desde julho de 2021), que antes da entrada em exercício pelo postulante na unidade, era exercida apenas pelo 1º Ofício. 

Outro ponto que acentua a discussão é a sucessão legislativa que alterou a redação do art. 169 quanto à existência (ou não) da competência residual da serventia de origem quanto aos atos de averbação. 

Ressalte-se, de antemão, que o princípio da territorialidade previsto no art. 12, da Lei nº 8.935/1994, define que “[a]os oficiais de registro de imóveis, [...] compete a prática dos atos relacionados na legislação pertinente aos registros públicos, de que são incumbidos [...] às normas que definirem as circunscrições geográficas”[2]competindo-lhes realizar os atos registrais sobre os imóveis localizados nos limites geográficos de suas serventias, balizas que são estabelecidas na lei de organização judiciária local. 

Assentada essa premissa, a regra geral constante no art. 169 é a de que os atos de registro e de averbação sejam efetuados na serventia da situação do imóvel. Quanto às averbações, o inciso I prevê que estas “serão efetuadas na matrícula ou à margem do registro a que se referirem, ainda que o imóvel tenha passado a pertencer a outra circunscrição, como se depreende da leitura dos dispositivos incidentes: 

Art. 167 - No Registro de Imóveis, além da matrícula, serão feitos.    

I - o registro: 

[...] 

II - a averbação:  

[...] 

Art. 169. Todos os atos enumerados no art. 167 desta Lei são obrigatórios e serão efetuados na serventia da situação do imóvel, observado o seguinte:   

I - as averbações serão efetuadas na matrícula ou à margem do registro a que se referirem, ainda que o imóvel tenha passado a pertencer a outra circunscrição, observado o disposto no inciso I do § 1º e no § 18 do art. 176 desta Lei; 

[...] 

Art. 176 – [...]             

§ 1º [...]

I - cada imóvel terá matrícula própria, que será aberta por ocasião do primeiro ato de registro ou de averbação caso a transcrição possua todos os requisitos elencados para a abertura de matrícula

 [...]

§ 18. Quando se tratar de transcrição que não possua todos os requisitos para a abertura de matrícula, admitir-se-á que se façam na circunscrição de origem, à margem do título, as averbações necessárias(Nosso o destaque)

 

Assim, percebe-se que a regra é a de se manter a competência residual do 1º RI para as averbações das matrículas dos imóveis ali registrados, mesmo depois da instalação do 2º RI.

Nesse contexto, em 27/6/2022, a Medida Provisória (MP) nº 1.085/2021 foi convertida na Lei nº 14.382/2022, que trouxe duas observações relacionadas à regra do inc. I do art. 169, conforme se observa do quadro abaixo que sintetiza a atual disciplina a partir das alterações legislativas:


Redação antes da MP nº 1.085/2021

Redação dada pela MP nº 1.085, de 27/12/2021

Redação dada pela Lei nº 14.382, de 27/6/2022

Art. 169 - Todos os atos enumerados no art. 167 são obrigatórios e efetuar-se-ão no Cartório da situação do imóvel, salvo:

Art. 169 Todos os atos enumerados no art. 167 são obrigatórios e serão efetuados na serventia da situação do imóvel, observado o seguinte:

Art. 169. Todos os atos enumerados no art. 167 desta Lei são obrigatórios e serão efetuados na serventia da situação do imóvel, observado o seguinte:  

I - as averbações serão efetuadas na matrícula ou à margem do registro a que se referirem, ainda que o imóvel tenha passado a pertencer a outra circunscrição

I – revogado

I - as averbações serão efetuadas na matrícula ou à margem do registro a que se referirem, ainda que o imóvel tenha passado a pertencer a outra circunscrição, observado o disposto no inciso I do § 1º e no § 18 do art. 176 desta Lei;

[...]

Art. 176 [...]

I - cada imóvel terá matrícula própria, que será aberta por ocasião do primeiro ato de registro ou de averbação caso a transcrição possua todos os requisitos elencados para a abertura de matrícula;  (Redação dada pela Lei nº 14.382, de 2022) 

[...]

§ 18. Quando se tratar de transcrição que não possua todos os requisitos para a abertura de matrícula, admitir-se-á que se façam na circunscrição de origem, à margem do título, as averbações necessárias.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Como se percebe, foi mantida a competência residual, se a transcrição não possuir todos os requisitos para a abertura de matrícula, hipótese em que os atos de averbação serão realizados à margem do título, na serventia de origem (art. 176, §18). Mas, se a transcrição reunir todos os requisitos elencados para a abertura de matrícula, esta será feita no cartório da situação do imóvel (art. 176, I). 

Destaque-se, ainda, que o art. 176, §14, da LRP faculta a abertura da matrícula na circunscrição onde estiver situado o imóvel, mediante requerimento do interessado ou de ofício, por conveniência do serviço. Nesta hipótese, o oficial comunicará o fato à serventia de origem, para o encerramento, de ofício, da matrícula anterior (art. 167, IV, LRP), quando essa perderá a competência residual para a realização de atos de averbação.

Logo, em uma melhor análise, entendo a decisão da Juíza Corregedora que manteve a competência residual da 1ª Circunscrição Imobiliária não merece reparos (Id 5054741).

  

Dispositivo:

Ante o exposto:

a)     Recebo a emenda à inicial apresentada pelo requerente (Id 5053740);

b) Julgo improcedente o pedido, com fundamento no art. 25, VII, do Regimento Interno deste Conselho (RICNJ)[3]; 

c)     Inclua-se como terceiro interessado Nino Jesus Aranha Nunes, conforme manifestado na petição de Id 5441048, que deverá receber o processo no estado em que se encontra;

d)    Arquivem-se os autos, após as comunicações de estilo.

 

É como voto.

 

Brasília, data registrada no sistema.  

  

Pablo Coutinho Barreto

Conselheiro relator

 



[1] Art. 1º Os serviços concernentes aos Registros Públicos, estabelecidos pela legislação civil para autenticidade, segurança e eficácia dos atos jurídicos, ficam sujeitos ao regime estabelecido nesta Lei.        

§ 1º Os Registros referidos neste artigo são os seguintes:     

[...]

IV - o registro de imóveis. 

[2] Art. 12. Aos oficiais de registro de imóveis, de títulos e documentos e civis das pessoas jurídicas, civis das pessoas naturais e de interdições e tutelas compete a prática dos atos relacionados na legislação pertinente aos registros públicos, de que são incumbidos, independentemente de prévia distribuição, mas sujeitos os oficiais de registro de imóveis e civis das pessoas naturais às normas que definirem as circunscrições geográficas.

[3] Art. 25. São atribuições do Relator:

[...]

VII - proferir decisões monocráticas e votos com proposta de ementa e lavrar acórdão quando cabível;