Conselho Nacional de Justiça

 

Autos: PROCEDIMENTO DE CONTROLE ADMINISTRATIVO - 0006294-92.2023.2.00.0000
Requerente: FATIMA APARECIDA DE OLIVEIRA SILVA
Requerido: JUÍZO DA VARA DA INFÂNCIA E JUVENTUDE E DO IDOSO DA COMARCA DE ARARAQUARA - SP e outros

 


 

EMENTA: RECURSO ADMINISTRATIVO. PROCEDIMENTO DE CONTROLE ADMINISTRATIVO. SERVIDORA DO TJSP. INDEFERIMENTO DE LICENÇA-SAÚDE. ATO ADMINISTRATIVO. INTERESSE INDIVIDUAL. INCOMPETÊNCIA DO CNJ. REPETIÇÃO DOS ARGUMENTOS CONTIDOS NO REQUERIMENTO INICIAL. AUSÊNCIA DE FATOS NOVOS.

1. Recurso Administrativo no Procedimento de Controle Administrativo no qual se objetiva reforma da decisão monocrática final que não conheceu dos pedidos de desconstituição dos atos administrativos que indeferiram pedidos de licença saúde a servidora do TJSP e que ensejaram descontos em proventos, com a instauração de processo administrativo disciplinar e, por conseguinte, das consequências legais e administrativas decorrentes de tais atos.

2. Ato afeto ao interesse individual da requerente. Precedentes pela incompetência do CNJ.

3. Não se verificou ilegalidade nos atos administrativos que indeferiram o pedido de licença para tratamento da saúde e que, em decorrência, culminaram em apontamento de faltas injustificadas nos assentos funcionais e instauração de PAD para apuração da inassiduidade.

4. Este Conselho não atua como instância recursal revisora, tampouco pode substituir os tribunais em suas decisões administrativas

5. Recurso conhecido e não provido.

 ACÓRDÃO

O Conselho, por unanimidade, negou provimento ao recurso, nos termos do voto da Relatora. Presidiu o julgamento o Ministro Luís Roberto Barroso. Plenário Virtual, 24 de maio de 2024. Votaram os Excelentíssimos Conselheiros Luís Roberto Barroso, Luis Felipe Salomão, Caputo Bastos, José Rotondano, Mônica Autran, Alexandre Teixeira, Renata Gil, Daniela Madeira, Guilherme Feliciano, Pablo Coutinho Barreto, João Paulo Schoucair, Daiane Nogueira de Lira e Luiz Fernando Bandeira de Mello. Não votaram, em razão da vacância dos cargos, os Conselheiros representantes da Ordem dos Advogados do Brasil.

Conselho Nacional de Justiça

Autos: PROCEDIMENTO DE CONTROLE ADMINISTRATIVO - 0006294-92.2023.2.00.0000
Requerente: FATIMA APARECIDA DE OLIVEIRA SILVA
Requerido: JUÍZO DA VARA DA INFÂNCIA E JUVENTUDE E DO IDOSO DA COMARCA DE ARARAQUARA - SP e outros


 

Relatório

 

A Excelentíssima Senhora Conselheira DANIELA PEREIRA MADEIRA (Relatora):


Trata-se de RECURSO ADMINISTRATIVO interposto por FATIMA APARECIDA DE OLIVEIRA SILVA contra a Decisão (Id 5334151) que não conheceu dos pedidos do presente PEDIDO DE PROVIDÊNCIAS e determinou arquivamento do feito.

A requerente, servidora atualmente aposentada do Tribunal de Justiça de São Paulo – TJSP, ajuizou o presente PCA objetivando a desconstituição de atos administrativos perpetrados pelo Tribunal de Justiça de São Paulo, quais sejam: i) de indeferimento de dois pedidos de licença para tratamento de saúde formulados pela requerente, ii) de realização de descontos nos proventos da requerente em razão de inassiduidade decorrente das licenças indeferidas, e iii) de instauração de Processo Administrativo em desfavor da requerente para apuração das faltas injustificadas lançadas em virtude do indeferimento das licenças então pretendidas.

Aduziu a requerente, em sua inicial, que enquanto servidora ativa do TJSP esteve em período de licença para tratamento de saúde durante a pandemia da Covid 19, e em certa ocasião foi instada, informalmente e a pedido do magistrado titular de seu local trabalho, a retornar ao trabalho de forma remota com a suposta garantia de que, em caso de retorno ao trabalho presencial, seria feito o possível para que ela permanecesse trabalhando remotamente. Em virtude da citada oferta, após o término da licença, a requerente não fez outro pedido de afastamento e retornou ao trabalho de forma remota.

Continuou aduzindo que, após algum tempo, houve retorno gradativo dos servidores do TJSP ao trabalho presencial, sendo que os servidores que desejassem continuar trabalhando remotamente deveriam fazer um pedido administrativo nesse sentido por plataforma online do próprio TJSP, no Portal do Servidor, possibilidade que não foi permitida à requerente posto que ela não tinha avaliação de desempenho funcional recente pelo fato de que estivera gozando de licença saúde.

Asseverou que, então, retornou ao trabalho presencial mas, dada sua condição de saúde, teve de ingressar com novo pedido de licença para tratamento da saúde, o que lhe foi deferido. Após o término da citada licença, solicitou mais dois períodos de afastamento (de 30/11/2022 a 27/02/2023 e de 28/02/2023 a 28/05/2023), os quais restaram, contudo, indeferidos.

Argumentou que o indeferimento das licenças requeridas nos períodos supracitados resultou no lançamento, em seu prontuário funcional, de faltas injustificadas nos períodos respectivos e, ainda, na instauração de processo administrativo para apuração da inassiduidade, o qual, a depender de seu resultado, pode ensejar na cassação de sua aposentadoria, requerida logo após ter sido informada acerca da possibilidade de instauração do PAD.

Em despacho inicial, o relator do processo à época postergou a análise da liminar à apresentação de informações pelo TJSP (Id 5309392).

Em informações, o TJSP (Id 5325409) asseverou que não foram apresentados documentos que comprovassem a necessidade do afastamento, bem como que foram realizadas perícias médicas, as quais constataram que a requerente possuía aptidão para exercer seu cargo. Ainda, afirmou que “a licença para tratamento de saúde constitui ato administrativo vinculado, que pressupõe a inaptidão do servidor para o trabalho, constatada em inspeção médica própria para tanto”. Por fim, entendeu que não há ilegalidade no desconto dos proventos da requerente em razão do indeferimento de licença saúde, e que o processo administrativo nº 0006849- 71.2023.8.26.0037 foi instaurado em desfavor da servidora para apuração de ausências ao serviço, sem causa justificável, por 50 (cinquenta) dias consecutivos no período de 10/02/2023 a 31/03/2023, com fundamento no artigo 241, inciso I, Lei nº 10.261/1968.

Posteriormente, em informações complementares (id 5335635), o TJSP mencionou sobre esclarecimentos prestados por sua Secretaria de Gestão de Pessoas quanto aos pedidos de licença-saúde da requerente, no sentido de que a junta médica composta por dois ortopedistas e um especialista em psiquiatria indicou a manutenção da readaptação funcional e foi contrária aos afastamentos pretendidos.

Vindos os autos para decisão, o então relator do presente PCA não conheceu dos pedidos formulados e determinou o arquivamento do feito, ao fundamento de que: i) a questão posta refoge à competência do CNJ, porquanto se trata de pretensão de cunho individual e que não possui relevância para todo Poder Judiciário, consoante Enunciado Administrativo nº 17/CNJ; e ii) o CNJ não é órgão revisor de toda e qualquer decisão administrativa dos tribunais, pois a pretensão, além de não possuir interesse geral para todo Poder Judiciário, transformaria este Conselho em verdadeira instância recursal (Id 5334151).

Inconformada, a requerente interpôs recurso administrativo solicitando sua submissão à análise do soberano Plenário do CNJ, a fim de que fossem deferidos os pedidos feitos inicialmente (Id 5348218).

Intimado para contrarrazões, o Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, reiterando os argumentos dispostos nas informações anteriormente prestadas, requereu o não provimento do recurso administrativo  (Id 5363714)

É o relatório.

 

Conselho Nacional de Justiça

 

Autos: PROCEDIMENTO DE CONTROLE ADMINISTRATIVO - 0006294-92.2023.2.00.0000
Requerente: FATIMA APARECIDA DE OLIVEIRA SILVA
Requerido: JUÍZO DA VARA DA INFÂNCIA E JUVENTUDE E DO IDOSO DA COMARCA DE ARARAQUARA - SP e outros

 


Voto

 

 

A Excelentíssima Senhora Conselheira DANIELA PEREIRA MADEIRA (Relatora):


Recebo o recurso administrativo por ser tempestivo e próprio, nos termos do art. 115 do Regimento Interno do CNJ (RICNJ).

A recorrente insurge-se contra Decisão Id 5334151 que, com fundamento no art. 25, X, do RICNJ, não conheceu dos pedidos que pretendiam a revisão de decisões administrativas do TJSP que indeferiram dois pedidos de licença-saúde, bem como dos atos de lançamento de faltas justificadas em seu assentamento funcional e de instauração de processo administrativo disciplinar em decorrência das faltas injustificadas.

Sobre a alegação de que os pedidos inicialmente formulados ultrapassam o interesse individual por se tratar de suposta ilegalidade do Tribunal requerido, não se vislumbra razão, porque os atos administrativos impugnados tratam especificamente de circunstâncias funcionais concernentes à pessoa da requerente, alheias, portanto, aos demais servidores do Tribunal a ela vinculado ou a qualquer outro, o que demonstra a inexistência de impacto geral para o sistema de justiça ou da repercussão social da matéria.

Neste sentido, ainda que se pudesse admitir que houve ilegalidade nos atos administrativos impugnados (o que não restou comprovado no caso conhcreto), nenhum efeito surtiria para os demais servidores ou membros do Poder Judiciário por se tratar de questão relativa a indeferimento de pedido de afastamento para tratamento de saúde por parecer contrário de junta médica, a qual tem por atribuição a análise da situação específica e peculiar de saúde da pessoa periciada.

A própria requerente, aliás, argumentou em sua peça recursal que “não ocorreu, por parte do TJSP, uma inobservância da legalidade em caso individual da aqui recorrente", reconhecendo, assim a individualidade da questão posta, a afastar a possibilidade de subsunção na esfera de interesses gerais.

Outrossim, quanto à alegação de que ficou afastada por seis meses e teve a perícia realizada no final do quinto mês, de modo que não poderia ter descontados os dias em que ficou afastada estando à disposição da perícia para ratificação ou não da recomendação médica inicial, deve-se destacar que é de responsabilidade do servidor a ausência laborativa gerada enquanto aguarda avaliação pericial, tendo em vista que a dispensa médica só se aperfeiçoa com a homologação pela junta oficial.

O atestado emitido por médico particular, por si só, não garante a concessão de licença médica, sobretudo por sua característica de imparcialidade relativa, de modo que o afastamento só deve ser concedido ao servidor com base em perícia oficial, na forma do artigo 193 da Lei 10.261/1968 (Estatuto dos Funcionários Públicos Civis do Estado de São Paulo).

Portanto, não se verifica ilegalidade nas decisões de indeferimento de afastamento para tratamento da saúde. 

Com efeito, indeferidos os pedidos de licença médica formulados e não havendo comparecimento ao trabalho durante o período requerido sem que houvesse justificação para tanto, é de rigor o desconto no vencimento ou remuneração, conforme dispõe o Estatuto dos Funcionários Públicos Civis do Estado de São Paulo:

Artigo 110 - O funcionário perderá:

I - o vencimento ou remuneração do dia, quando não comparecer ao serviço; (NR)

II - 1/3 (um terço) do vencimento ou remuneração diária, quando comparecer ao serviço dentro da hora seguinte à marcada para o início do expediente ou quando dele retirar-se dentro da última hora.

§ 1º - Revogado.

§ 2º - No caso de faltas sucessivas, justificadas ou injustificadas, os dias intercalados — domingos, feriados e aqueles em que não haja expediente — serão computados exclusivamente para efeito de desconto do vencimento ou remuneração.

§ 3º - Não se aplica o disposto no ‘caput’ deste artigo às hipóteses de compensação de horas previstas no parágrafo único do artigo 117 desta Lei.

§ 4º - O disposto no inciso II e no § 2º deste artigo não se aplicam aos integrantes do Quadro do Magistério da Secretaria da Educação.


Artigo 111 - As reposições devidas pelo funcionário e as indenizações por prejuízos que causar à Fazenda Pública Estadual, serão descontadas em parcelas mensais não excedentes da décima parte do vencimento ou remuneração ressalvados os casos especiais previstos neste Estatuto.

(...)

Artigo 183 - Finda a licença, o funcionário deverá reassumir, imediatamente, o exercício do cargo.

(grifo nosso)

 Outrossim, o Estatuto dos Funcionários Públicos do Estado de São Paulo determina a instauração de processo disciplinar para apuração de faltas ao serviço que caracterizem inassiduidade, nestes termos:

Artigo 256 - Será aplicada a pena de demissão nos casos de:

(...)

V - inassiduidade. 

Logo, também não se verifica ilegalidade nos apontamentos de faltas injustificadas nos assentamentos da requerente e na instauração de processo administrativo disciplinar para apuração da inassiduidade.

Sobre a matéria merece transcrição decisão do STJ em que não se reconheceu ilegalidade em apontamento de falta injustificada e instauração de PAD em razão de indeferimento de pedido de licença médica:

PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ORDINÁRIO. MANDADO DE SEGURANÇA. SERVIDORA PÚBLICA PORTADORA DE TRANSTORNO MENTAL. DEPRESSÃO GRAVE. ATESTADOS PARTICULARES. LAUDO PERICIAL SUBSCRITO POR JUNTA MÉDICA. PROVA PRÉ-CONSTITUÍDA. NECESSIDADE DE CONTRADITÓRIO. DILAÇÃO PROBATÓRIA. VIAS ORDINÁRIAS. AUSÊNCIA DE DIREITO LÍQUIDO E CERTO. AGRAVO REGIMENTAL NÃO PROVIDO.
1. Cuida-se, na origem, de Mandado de Segurança impetrado pela recorrente contra ato do Juiz Dirigente do 1º NUR e do Corregedor-Geral de Justiça do Estado do Rio de Janeiro, que indeferiu o pleito de concessão de licença médica e determinou a instauração de Processo Administrativo Disciplinar e o desconto em folha de pagamento das faltas injustificadas, referente ao período em aberto pelo indeferimento da licença médica.
2. O Tribunal a quo denegou a segurança e assim consignou: "Nesse processo administrativo foi determinada a avaliação médico-pericial da Impetrante, realizada no dia 08.05.2014, que concluiu que não houve redução da capacidade funcional da servidora. Observe-se que este Tribunal de Justiça possui departamento próprio para a análise dos pedidos de licença médica, com profissionais habilitados para tanto, tendo o laudo sido subscrito por junta médica integrada por quatro profissionais, sendo três psiquiatras, fls. 67, indexador nº 00055. A impetrante não apresentou qualquer prova a desqualificar a perícia realizada, não podendo sua declaração médica se sobrepor à perícia realizada por este Tribunal. Assim, não verifica ilegalidade no indeferimento da licença médica.(...)Assim, levando-se em consideração o princípio da presunção de veracidade e legitimidade dos atos administrativos, caberia a impetrante o ônus de comprovar de plano a ilegalidade dos atos impugnados, o que não se verificou na hipótese. Para tanto, faz-se necessária uma dilação probatória, impossível nos estreitos limites desta via mandamental."
(fl. 146, grifo acrescentado).
3. Adotado como razão de decidir o parecer do Ministério Público Federal, exarado pelo Subprocurador-Geral da República Antonio Fonseca, que bem analisou a questão. Transcrevo: "O aresto recorrido não merece reparos. A via estreita do writ não se revela adequada em razão da necessidade de dilação probatória para aferir a capacidade funcional e laborativa da recorrente, no período de 09.04.2015 a 08.05.2015. Ademais, a existência de atestados ou laudos particulares não são suficientes para garantir o direito buscado pela impetrante, sendo necessário o contraditório. Registre-se que não se questiona no ordinário a capacidade da equipe de psicólogos que avaliou a recorrente, nem foi apresentada prova capaz de desconstituir a conclusão daquela junta pericial."
(fl. 147, grifo acrescentado).
4. Verifica-se, como bem destacado pelo Parquet Federal no seu parecer, que os atestados particulares, por si sós, não demonstram violação de direito líquido e certo, sendo necessário o contraditório.
5.
"Nesse contexto, a impetrante deve procurar as vias ordinárias para o reconhecimento de seu alegado direito, já que o laudo médico que apresenta, atestado por profissional particular, sem o crivo do contraditório, não evidencia direito líquido e certo para o fim de impetração do mandado de segurança."(REsp 1.115.417/MG, Rel. Ministro Castro Meira, Segunda Turma, DJe 5/8/2013).

(grifo nosso)

Por derradeiro, reafirmo a fundamentação do Conselheiro relator (à época) em sua decisão prolatada, no sentido de que o CNJ não é órgão revisor de toda e qualquer decisão administrativa dos tribunais, pois a pretensão, além de não possuir interesse geral para todo Poder Judiciário, transformaria este Conselho em instância recursal administrativa (Id 5334151).

Diante do exposto, conheço do recurso interposto e, no mérito, nego-lhe provimento.

É o voto. 

 

Após as comunicações, arquive-se.

 

Conselheira DANIELA PEREIRA MADEIRA

Relatora