EMENTA

 

PROCEDIMENTOS DE CONTROLE ADMINISTRATIVO. PRECATÓRIO. COISA JULGADA. DISCUSSÃO RELATIVA AOS JUROS DE MORA E ÍNDICE DE CORREÇÃO MONETÁRIA APLICÁVEIS. MARCOS TEMPORAIS. RESOLUÇÃO CNJ N. 303/2019. SÚMULA VINCULANTE N. 17. ART. 100, § 12 DA CF. ADI N. 4.357/DF. CAPITALIZAÇÃO DE JUROS. SÚMULA 121 DO STF. RE N. 870.947. TEMA DE REPERCUSSÃO GERAL COM JULGAMENTO AINDA NÃO CONCLUÍDO. MATÉRIA INDIVIDUAL. IMPOSSIBILIDADE DE IMPUTAR-SE A MORA NO PAGAMENTO AO ENTE DEVEDOR E AO TRIBUNAL. PCAS JULGADOS IMPROCEDENTES.

1.  Cuida-se de PCAs nos quais se requer (i) aplicação de juros de mora de 6% ao ano (0,5% ao mês) “durante todo o período de incidência, até o efetivo pagamento, conforme expresso na coisa julgada formada na fase de conhecimento” e (ii) incidência do índice de correção monetária IPCA-e entre a data de liquidação do crédito e a data de liberação do alvará.

2.   O TJMS observou o art. 22 da Resolução CNJ n. 303/2019, vigente à época da expedição do precatório, o qual dispunha que, não se tratando de crédito de natureza tributária, incidirão juros de mora no período compreendido entre a data-base informada pelo juízo da execução e a data da efetiva requisição de pagamento, qual seja, o dia 1º de julho.

3.     No recurso administrativo improvido, manteve-se a aplicação da taxa de juros prevista no título executivo (6% ao ano) até a data da expedição do precatório e, a partir de então, a taxa de juros da poupança, respeitado o período de graça constitucional, nos termos da Súmula Vinculante nº 17, §12 do art. 100 da Constituição Federal, e por força dos efeitos prospectivos do quanto decidido pelo Supremo na ADI 4357/DF.

4.   O cálculo pretendido pela requerente considera a aplicação de juros sobre base de cálculo que não exclui a parcela de juros de mora do crédito principal, em prática vedada pelo ordenamento (Súmula 121 do STF).

5.    A questão invocada foi reconhecida como sendo objeto de Tema de Repercussão Geral pelo Supremo por meio do Tema 1170, sob a denominação temática de “validade dos juros moratórios aplicáveis nas condenações da Fazenda Pública, em virtude da tese firmada no RE 870.947 (Tema 810), na execução de título judicial que tenha fixado expressamente índice diverso” (RE 1.317.982, rel. Min Nunes Marques, DJe 27/10/2022). A publicação do acórdão que reconheceu a repercussão geral da matéria, ainda pendente de análise sobre o seu mérito, foi posterior ao julgamento do aludido recurso administrativo sem que tenha havido por parte do Supremo qualquer determinação de suspensão nacional em relação aos feitos que discutem a matéria.

6.  O debate relativo aos índices aplicáveis e aos valores devidos à autora configura, nitidamente, matéria de interesse individual, a qual não é dado a este Conselho apreciar. Precedentes do CNJ.

7.    Impossibilidade de imputar-se a mora no pagamento ao ente devedor, nem tampouco ao TJMS, de modo a fazer incidir o IPCA-e entre a data da liquidação do crédito e a da liberação do alvará. Os procedimentos adotados observaram a Resolução CNJ n. 303/2019, tendo ocorrido, ainda, demora da credora para indicação da conta em que deveriam ser depositados os valores a ela devidos.

8.    Procedimentos de controle administrativo que se julga improcedentes.

 ACÓRDÃO

O Conselho, por unanimidade, julgou improcedentes os pedidos dos Procedimentos de Controle Administrativos 0002412-59.2022.2.00.0000 e 00002414-29.2022.2.00.0000, nos termos do voto do Relator. Ausente, em razão da vacância do cargo, o representante da Câmara dos Deputados. Presidiu o julgamento o Ministro Luís Roberto Barroso. Plenário, 14 de novembro de 2023. Presentes à sessão os Excelentíssimos Senhores Conselheiros Luís Roberto Barroso, Luis Felipe Salomão, Vieira de Mello Filho, Mauro Pereira Martins, Salise Sanchotene, Jane Granzoto, Richard Pae Kim (Relator), Marcio Luiz Freitas, Giovanni Olsson, Pablo Barreto, João Paulo Schoucair, Marcos Vinícius Jardim Rodrigues, Marcello Terto e Luiz Fernando Bandeira de Mello.

RELATÓRIO

 

 

Cuida-se de procedimentos de controle administrativo propostos por DM Construtora de Obras Ltda. contra decisões proferidas pelo Conselho Superior da Magistratura do Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul no Precatório n. 0020024-59.2011.8.12.0000/5003.

A requerente deduziu primeiramente o PCA n. 0002412-59.2022.2.00.0000, distribuído à minha relatoria em 27.4.2022.

 Nestes autos, consigna ser titular do Precatório de Requisição de Pagamento n. 0020024-59.2011.8.12.0000, expedido em 2011.

Narra ter procedido a algumas impugnações dos cálculos feitos pelo Setor de Precatórios do TJMS e aduz que, não obstante a existência de questionamentos, o Setor de Precatórios passou a fazer a destinação dos valores por ele entendidos como incontroversos.

 Informa que, em dado momento, veiculou irresignação requerendo fosse retificados os cálculos com aplicação da correção pelo IPCA-e e os juros de mora legais para o período de 9.3 a 14.7.2021, o que foi indeferido sob o seguinte fundamento:

 

“Na liquidação deste precatório, não encontrado erro material (f. 367), o crédito foi atualizado, transferindo para subconta vinculada ao precatório o valor de R$ 171.078.665,04 (f. 368-371). A impugnação apresentada pela credora foi parcialmente acolhida, determinando à Coordenadoria correção do cálculo para aplicação da correção monetária até a data da liquidação (f. 414-6), sendo transferido parra subconta valor complementar de R$ 2.570.115,31, conforme extrato da subconta em anexo. Assim, a partir da transferência do valor requisitado e atualizado, ou seja, o devedor deposita o valor total do precatório na subconta vinculada aos autos, dá-se por liquidado a dívida e o crédito tem garantida correção monetária e juros de mora de acordo com a conta judicial, no caso do TJMS, os mesmos critérios de conta poupança (TR + juros da poupança). Diante disso, indefiro pedido para novo cálculo do crédito.”

 

                      Contra essa decisão, a requerente apresentou recurso administrativo, o qual foi rejeitado pelo Conselho Superior da Magistratura do TJMS sob o argumento de que

 

o depósito do crédito total pelo devedor elide a mora e, independentemente de impugnação das partes, a Fazenda Pública quita sua dívida e, assim, a atualização monetária e juros remuneratórios são devidos pelo banco depositário e não mais pelo ente devedor.

 

                        Tal decisão teria assentado ainda que

 

precatório, que, todavia, continuou tramitando face a insurgência da credora em relação à atualização do seu crédito e do valor da constrição. Esse depósito, em conta especial de pagamento de precatórios, já conta com remuneração específica prevista em lei (8.177/1991) e a cargo da instituição financeira depositária, não sendo justo após o pagamento continuar a exigir da fazenda pública remuneração nos critérios previstos para o período da mora (IPCA-E e juros de poupança).

 

O requerente ainda opôs embargos de declaração, os quais foram rejeitados.

No inconformismo veiculado junto ao CNJ, o requerente defende que o entendimento adotado pelo tribunal requerido não pode prosperar, pois a realização do cálculo de liquidação do precatório e pretensa alocação administrativa de seus valores em conta interna do TJMS não são justificativas para alteração do índice de correção monetária e da taxa de juros aplicáveis ao crédito.

Em sua visão, trata-se de mero procedimento administrativo do tribunal, o qual não pode, nem deve alterar a situação jurídica da suplicante.

Sustenta que os parâmetros definidos em sentença transitada em julgada devem ser mantidos até o efetivo pagamento, o qual somente ocorre com a destinação dos valores ao credor. Nesse ponto, invoca os arts. 21, inciso XII e 24 da Resolução CNJ n. 303/2019.

Invoca, também, entendimento do Supremo Tribunal Federal segundo o qual, para os precatórios expedidos até 1º de julho e não pagos pelo Poder Público até o último dia do exercício financeiro seguinte, correrão juros de mora do primeiro dia do exercício financeiro seguinte ao fim do prazo constitucional até a data do efetivo pagamento (Rcl-AgR n. 13.684).

Prossegue defendendo que o fato de o valor do precatório ter sido depositado em subconta interna do TJMS é indiferente, pois além de tal procedimento não encontrar previsão na legislação, o depósito unilateral sem a ciência da requerente e sem que essa possa dispor do montante não elide a mora.

Alega, ainda, que o entendimento esposado na decisão agravada faz tábula rasa do decidido pelo STF nas ADIs n. 4357 e 4425 e que a não aplicação do IPCA-E e dos juros de mora de 6% ao ano no período compreendido entre 9.3.21 e 14.7.2021 importou em prejuízo de mais de 7,6 milhões à requerente.

Requer seja reformada a decisão do Conselho da Magistratura do TJMS, a fim de determinar-se que o crédito global do precatório seja atualizado pelo IPCA-E e acrescido de juros de 6% ao ano, coma determinação de realização de novo cálculo pelo Setor de Precatórios do tribunal requerido para o período compreendido entre 9.3.21 e 14.7.2021.

Notificado, o Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul apresentou as informações Id 4715219.

Posteriormente, a requerente distribuiu também o Procedimento de Controle Administrativo n. 00002414-29.2022.2.00.0000, com objetivo de questionar os cálculos feitos no Precatório de Requisição de Pagamento n. 0020024-59.2011.8.12.0000, mas agora com relação a outro ponto.

Os autos foram distribuídos inicialmente ao eminente Conselheiro Mário Maia, que por sua vez remeteu-os ao meu gabinete para análise de possível prevenção.

Em 1º.7.2022, reconheci a prevenção, determinei a redistribuição do PCA ao meu gabinete e ordenei fossem os autos reunidos aos do PCA 2412-59.2022.

Neste segundo PCA, a requerente alega ter impugnado a conta de liquidação apresentada para a data-base de 9.3.2021, sustentando a ocorrência de erro quanto ao cálculo dos juros de mora que devem incidir sobre o crédito, os quais foram contados pela remuneração da poupança e não conforme determinado na sentença condenatória (6% ao ano/ 0,5% ao mês), em violação à coisa julgada.

A impugnação foi rejeitada sob as seguintes alegações:

 

“Vistos, etc.

DM Construtora de Obras Ltda impugnou os cálculos de f. 413-6 alegando que foram aplicados equivocadamente juros simples de poupança, quando o correto seriam juros simples de 0,50% ao mês. A Agência Estadual de Gestão de Empreendimentos – Agesul, às f. 431/2, concordou com o cálculo.

Bem analisadas as questões postas, entendo improcedente a impugnação da credora, uma vez que foi aplicado corretamente o índice previsto para compensação da mora em precatórios

...

Cumpre esclarecer que a regra é diferente somente para precatórios de natureza tributária, quando são aplicados os mesmos juros de mora incidentes sobre o crédito tributário, diante do princípio constitucional da isonomia, conforme julgamento do Supremo Tribunal Federal na ADI 4425.

Neste ponto, observa-se que foi aplicado percentual dos juros de mora incidentes sobre a caderneta de poupança, portanto, não há o que ser retificado. Convém ressaltar que não pode esta Vice-Presidência, em sede administrativa de pagamento de precatórios, deixar de observar a Constituição Federal ou ato normativo do Conselho Nacional de Justiça (Res. 303/2019).

                                      Com relação ao valor e acréscimos da constrição efetivada em cautelar incidental a ação civil pública será decidido nos embargos de declaração                                       pendentes de apreciação”.

 

A requerente recorreu, mas seu recurso administrativo foi rejeitado pelo Conselho Superior da Magistratura do TJMS sob os argumentos de que

 

 

“Convém esclarecer que créditos contra a fazenda pública são atualizados em dois momentos distintos: no primeiro momento são observados os critérios fixados na sentença no período compreendido entre a data-base informada pelo juízo da execução e a data da efetiva requisição de pagamento (1º de julho), nos termos do art. 22 da Res. 303/2019, do CNJ; no segundo momento, expedido o ofício requisitório no valor atualizado, na via administrativa para pagamento no Tribunal de Justiça, o cálculo é realizado de acordo com os parâmetros constitucionais e legais para a atualização do precatório”

 

E de que

 

“Dessa forma, no caso, ao crédito requisitado em quantia da R$99.467.390,35 foi aplicado o critério definido no título executivo judicial – correção monetária pelo IGPM/FGV e juros moratórios de 6% ao ano, de 1º/04/2011 até 1º/07/2011.

A partir daí, o crédito passou a ser atualizado com base na Taxa Referencial – TR, até 25/03/2015, acrescido de juros de mora da poupança, de 1º/01/2013 até 09/03/2021, respeitando o período da graça constitucional (Súmula Vinculante 17), conforme art. 100, § 12, da CF e por força do efeito prospectivo definido pelo Supremo Tribunal Federal no julgamento da ADI 4357.

Após 25.03.2015, o crédito passou a ser corrigido pelo Índice de Preços ao

Consumidor Amplo Especial (IPCA-E) e juros de poupança até a liquidação (f. 414-16).

O cálculo de liquidação elaborado pela Coordenadoria de Cálculo e Liquidação de Precatórios está em perfeita consonância com os parâmetros definidos na sentença de mérito transitada em julgado, bem como pelas regras previstas na Constituição Federal e Resolução nº 303/2019 do CNJ”.

 

A requerente aduz que que a decisão do Conselho da Magistratura contrariou sentença transitada em julgado que determinou que a taxa de juros moratórios aplicável a partir de 1º.1.2013 fosse de 6% ao ano e considerou, para o período, juros simples moratórios de poupança mensal, o que teria culminado no cômputo de taxa inferior à devida.

Alega que tal proceder ofende o art. 5º, inciso XXXVI da Constituição, bem como o art. 6º da LINDB e os arts. 502, 503, caput e 505 do Código de Processo Civil.

Afirma que as disposições do art. 100, § 12º da CF e do art. 22 da Resolução CNJ n. 303/2019 não alteram essa situação, tampouco o julgamento da ADI n. 4.425/DF, eis que, no presente caso, prevaleceria a coisa julgada em relação aos percentuais de juros de mora fixados por decisão transitada em julgado. 

 Defende que havendo coisa julgada sobre o percentual dos juros em condenação imposta à Fazenda Pública, esse percentual não pode ser alterado em sede de cálculos no âmbito do precatório, o que teria sido confirmado no julgamento do tema 905 da Sistemática dos Recursos Repetitivos, ocasião na qual o Superior Tribunal de Justiça fez expressa ressalva sobre a não aplicação da orientação aos casos que já contassem com decisão transitada em julgado.

Ao fim, requer a reforma da decisão do Conselho Superior da Magistratura do TJMS a fim de garantir que ao valor total do crédito da requerente sejam adicionados juros de mora de 6% ao ano (0,5% ao mês) durante todo o período de incidência até o efetivo pagamento.

A manifestação do TJMS encontra-se acostada no Id 4769407 (fls. 83 e seguintes).

Em 15.12.2022 determinei a remessa dos autos ao FONAPREC, para elaboração de parecer.

Em 6.3.2023, juntou-se aos autos o parecer Id 5047885, assim ementado:

 

EMENTA

PRECATÓRIO DECORRENTE DE SENTENÇA CONDENATÓRIA PROFERIDA EM SEDE DE AÇÃO CIVIL PÚBLICA NO ÂMBITO DO TJ/MS.

1. Valores já pagos com base no regramento vigente, submetidos à análise do Conselho Nacional de Magistratura local, mediante o recurso cabível.

 

2. Critérios de atualização do precatório nº 0020024-59.2011.8.12.0000. Ausência de irregularidades passíveis de correção por meio do presente expediente.

 

É o relatório. 

 

 

VOTO

 

                        Os pleitos deduzidos não merecem acolhida.

                        As questões a serem dirimidas nos PCAs são, em essência, as seguintes:

 

1)     Aplicação dos juros de mora de 6% ao ano (0,5% ao mês) “durante todo o período de incidência, até o efetivo pagamento, conforme expresso na coisa julgada formada na fase de conhecimento” (PCA 2412-59.2022).

 

Visando tal requerimento, a requerente interpôs recurso perante o Conselho Superior da Magistratura do TJMS (RA n. 0020024-29.2011.8/12.0000/5001), não provido por considerar-se que, na forma do art. 22 da Resolução CNJ n. 303/2019, os créditos contra a Fazenda Pública são atualizados em dois momentos distintos, a saber: período entre a data-base informada pelo Juízo da execução e a data da  efetiva requisição de pagamento (1º de julho), em que são aplicados os  juros de mora constantes no título executivo e, depois, uma vez expedido o ofício requisitório e tramitando administrativamente, aplicam-se os juros constitucionais e legais pertinentes.

 

2)     Aplicação do índice de correção monetária IPCA-e de 9.3.2021 (data de liquidação do crédito) até a data de liberação do alvará (12.7.2021) (PCA 2414-29.2022).

 

Tal matéria também foi objeto de recurso administrativo analisado pelo Conselho Superior da Magistratura do TJMS, igualmente improvido, por considerar que, a partir do depósito, ocorre a elisão da mora, acarretando a cessação da responsabilidade do ente devedor ao pagamento da correção monetária e juros de mora, que passa a ser da instituição financeira (RA n. 0020024.59.2011.8.12.0000/50003).

Relativamente à aplicação dos juros de mora de 6% ao ano (0,5% ao mês), durante todo o período de incidência até o efetivo pagamento, foi bem o parecer do FONAPREC ao assentar que

 

[e]m relação ao primeiro questionamento, é necessário se perquirir se, a luz dos normativos de regência da matéria, é regular a inobservância dos critérios fixados no título transitado em julgado, a partir da requisição do precatório.

 

Depreende-se da decisão proferida pelo Conselho Superior da Magistratura do TJ/MS, em 2021, que foi observado o critério fixado pela redação do artigo 22 da Resolução CNJ 303/2019, vigente à época, a saber:

 

“Art. 22. Não se tratando de crédito de natureza tributária, incidirão juros de mora no período compreendido entre a data-base informada pelo juízo da execução e a data da efetiva requisição de pagamento, qual seja, o dia 1o de julho.

Parágrafo único. Na eventual omissão do título exequendo quanto ao percentual de juros de mora, incidirão juros legais até a data de 1o de julho, na hipótese de precatório, e até a data do envio ao ente devedor, na requisição de pequeno valor; a partir de tais datas, sendo o caso, o índice será o previsto no § 12 do art. 100 da Constituição Federal”.

 

O referido dispositivo sofreu sucessivas alterações, sendo a primeira a partir da Resolução CNJ 448, de 25 de março de 2022, a saber:

 

Art. 22. Não se tratando de crédito de natureza tributária, incidirão juros de mora no período compreendido entre a data-base informada pelo juízo da execução e a data da efetiva requisição de pagamento, qual seja, o dia 1o de julho.

Parágrafo único. Na eventual omissão do título exequendo quanto ao percentual de juros de mora, incidirão juros legais até a data de 1o de julho, na hipótese de precatório, e até a data do envio ao ente devedor, na requisição de pequeno valor; a partir de tais datas, sendo o caso, o índice será o previsto no § 12 do art. 100 da Constituição Federal.

 

E, mais recentemente, a partir da Resolução CNJ 482, de 19 de dezembro de 2022:

 

Art. 22. Na atualização da conta do precatório não tributário os juros de mora devem incidir somente até o mês de novembro de 2021, observado o disposto no § 5º do artigo anterior. (redação dada pela Resolução n. 482, de 19.12.2022)

 

No recurso administrativo improvido, manteve-se a aplicação da taxa de juros prevista no título executivo (6% ao ano) até a data da expedição do precatório (1º/07/11), e, a partir de então, a taxa de juros da poupança, respeitado o período de graça constitucional, nos termos da Súmula Vinculante nº 17, §12 do art. 100 da Constituição Federal, e por força dos efeitos prospectivos do quanto decidido pelo Supremo na ADI 4357/DF.

É importante salientar que, conforme também consignado, havia sido determinada pela Corregedoria Nacional em inspeção realizada no setor de precatórios em outubro de 2021 a retificação do índice anteriormente aplicado pelo sistema SAPRE no TJ/MS, que continha critério idêntico ao pretendido pela ora Requerente, ao aplicar o índice de juros de 0,5%, sem considerar o índice da caderneta de poupança (Id. 4715219).

Por fim, convém ressaltar que o cálculo pretendido pela Requerente considera a aplicação de juros sobre base de cálculo que não exclui a parcela de juros de mora do crédito principal, em prática vedada pelo ordenamento (Súmula 121 do STF), tal e qual já indicado pelo Tribunal de Justiça de origem.

Cabe, em acréscimo, registrar o fato de que a questão invocada foi reconhecida como sendo objeto de Tema de Repercussão Geral pelo Supremo por meio do Tema 1170, sob a denominação temática de “validade dos juros moratórios aplicáveis nas condenações da Fazenda Pública, em virtude da tese firmada no RE 870.947 (Tema 810), na execução de título judicial que tenha fixado expressamente índice diverso” (RE 1.317.982, rel. Min Nunes Marques, DJe 27/10/2022). Observa-se que a publicação do acórdão que reconheceu a repercussão geral da matéria, ainda pendente de análise sobre o seu mérito, foi posterior ao julgamento do aludido recurso administrativo (Id. 4769407), sem que tenha havido por parte do Supremo qualquer determinação de suspensão nacional em relação aos feitos que discutem a matéria (art. 1.035, §5º do CPC).

 

Ademais, o debate relativo aos índices aplicáveis e aos valores devidos à autora, o qual aqui resvalaria na discussão ou interpretação daquilo que restou decidido pelo TJMS, tomando por base o tema de repercussão geral cuja tese ainda não definida e, ainda, na interpretação oriunda de eventual redação normativa alterada posteriormente à decisão tomada pelo tribunal, configura, nitidamente, matéria de interesse individual, a qual não é dado a este Conselho apreciar.

 

Nesse sentido:


RECURSO ADMINISTRATIVO. PEDIDO DE PROVIDÊNCIAS. REVISÃO DE CÁLCULOS REFERENTES A PRECATÓRIOS. AUSÊNCIA DE COMPETÊNCIA CONSTITUCIONAL DO CNJ. INTERESSE INDIVIDUAL. MATÉRIA PREVIAMENTE JUDICIALIZADA. RECURSO CONHECIDO E NÃO PROVIDO. 

1. Impugnação à decisão do TJPB que procedeu à revisão de cálculos de precatórios no âmbito de execução de decisão judicial transitada em julgado. 

2. O Conselho não é instância recursal para toda e qualquer manifestação administrativa dos órgãos do Poder Judiciário e deve atuar nos limites do art. 103-B, § 4º da Constituição Federal.

3. A pretendida revisão da decisão TJPB afetaria sobremaneira a execução dos precatórios, alterando o curso do feito judicial e impactando diretamente a gestão dos precatórios. Neste sentido, o juízo quanto ao acerto da decisão em sede de precatórios exigiria a análise dos autos judiciais de origem, a afastar a competência deste Conselho Nacional de Justiça.

4. Parecer do Fonaprec que assenta ter o pedido natureza individual, sem repercussão geral para o Poder Judiciário, e estar a matéria  previamente judicializada. Acolhimento.

5. Recurso administrativo conhecido e não provido.

(CNJ - RA – Recurso Administrativo em PP - Pedido de Providências - Conselheiro - 0003512-88.2018.2.00.0000 - Rel. JANE GRANZOTO - 113ª Sessão Virtual - julgado em 14.10.2022)

 

RECURSO ADMINISTRATIVO. PEDIDO DE PROVIDÊNCIAS. TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO. PRECATÓRIO. QUITAÇÃO E PAGAMENTO DE VALORES DEVIDOS À REQUERENTE. INTERESSE NITIDAMENTE INDIVIDUAL QUE AFASTA A ATUAÇÃO DESTE CONSELHO. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO.

1. Recurso administrativo interposto contra decisão terminativa que não conheceu de pedidos relacionados à quitação e ao pagamento de valores que seriam devidos à parte autora, no âmbito de procedimento de precatório processado perante o Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo (TJSP).

2. A demanda em apreço possui caráter nitidamente individual, o que afasta a atuação deste Conselho, nos termos do Enunciado Administrativo CNJ 17/2018 e de precedentes.

3. Inexistência de elementos ou fatos novos hábeis a reformar a decisão impugnada.

4. Recurso conhecido e, no mérito, desprovido.

(CNJ - RA – Recurso Administrativo em PP - Pedido de Providências - Conselheiro - 0001766-49.2022.2.00.0000 - Rel. MAURO PEREIRA MARTINS - 110ª Sessão Virtual - julgado em 26.8.2022)

 

RECURSO ADMINISTRATIVO EM PEDIDO DE PROVIDÊNCIAS.PRECATÓRIOS. APLICAÇÃO DO IPCA-E COMO ÍNDICE DE CORREÇÃO MONETÁRIA AUSÊNCIA DE REPERCUSSÃO GERAL.INTERESSE INDIVIDUAL.INCOMPETÊNCIA DO CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA. RECURSO CONHECIDO E NÃO PROVIDO.

1. Decisão que deixou de conhecer Pedido de Providências no qual o Recorrente pretende a aplicação do IPCA-e como índice de correção monetária, conforme decidido no Recurso Extraordinário (RE) 870.947/SE (Tema 810), em precatório do qual é destinatário.

2. Não compete ao Conselho Nacional de Justiça, como órgão de controle da atuação administrativa e financeira, examinar pretensões de caráter meramente individual, sem repercussão geral para o Poder Judiciário.

3. Não cabe ao Conselho Nacional de Justiça atuar como instância ordinária revisora de toda e qualquer decisão administrativa proferida pelos tribunais que envolva o processamento de precatórios.

4. Recurso conhecido e não provido.

 

(CNJ - RA – Recurso Administrativo em PP - Pedido de Providências - Conselheiro - 0001087-49.2022.2.00.0000 - Rel. VIEIRA DE MELLO FILHO - 107ª Sessão Virtual - julgado em 10.6.2022)

 

No que diz respeito à aplicação do índice de correção monetária IPCA-e de 9.3.2021 (data de liquidação do crédito) até a data de liberação do alvará (12.7.2021), entendo não ser possível imputar a mora ao ente devedor, tampouco ao Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul.

O valor foi atualizado até a data da liquidação (9.3.2021) e imediatamente disponibilizado em conta específica atrelada ao TJMS.

Com a intimação da credora e sua impugnação aos cálculos, a insurgência foi acolhida relativamente à diferença devida com base na aplicação do índice IPCA-E referente aos meses de fevereiro e março de 2021, também com imediata disponibilização na conta específica criada pelo TJMS para tal fim, na forma do art. 27, §1º da Resolução CNJ n. 303/2019.

Em 11.3.2021, a credora foi intimada a fornecer os dados bancários para a disponibilização do crédito, o que somente ocorreu em julho de 2021, com a posterior expedição dos alvarás.

Nesse ponto, como acertadamente asseverou o FONAPREC,

 

Não se olvida que os procedimentos relacionados à tramitação de precatórios e RPVs devem guardar a celeridade necessária por meio dos procedimentos levados a efeito pelo Tribunal responsável, mormente quando já depositados os valores correspondentes pelo ente devedor. Eventual mora deve ser perquirida e objeto da fiscalização necessária por parte do Conselho Nacional de Justiça. Contudo, no caso em tela, a partir dos elementos e informações constantes nos autos não se pode imputar tal mora ao ente devedor, tampouco ao Tribunal de Justiça do Mato Grosso do Sul.

Portanto, também aqui, não se vislumbra irregularidade passível da atuação deste Conselho Nacional de Justiça, na medida em que seguidos os  critérios estabelecidos por meio da Resolução 303/2019 para a liberação imediata dos valores e, em relação à mora causada pelo credor, esta foi consignada em meio a matéria fática analisada pelo TJ/MS, ensejando a conclusão pelo não provimento do recurso.


Ante o exposto, julgo improcedentes os pedidos.

Traslade-se cópia da presente decisão para os autos do PCA n. 0002414-29.2022.2.00.0000, já arquivado.

É o voto.

 

Conselheiro RICHARD PAE KIM

 

Relator