Conselho Nacional de Justiça

 

Autos: PROCEDIMENTO DE CONTROLE ADMINISTRATIVO - 0002229-54.2023.2.00.0000
Requerente: AIRTON GUSTAVO VIANA DA SILVA
Requerido: CORREGEDORIA GERAL DA JUSTIÇA DO ESTADO DE MINAS GERAIS - CGJMG

 


 

RECURSO ADMINISTRATIVO. PROCEDIMENTO DE CONTROLE ADMINISTRATIVO. CORREGEDORIA-GERAL DA JUSTIÇA DO ESTADO DE MINAS GERAIS. INSTRUMENTOS PARTICULARES. REGISTRO. RECONHECIMENTO DE FIRMA. DISCIPLINA. ARTIGO 221 DA LEI DE REGISTROS PÚBLICOS. PROVIMENTO CONJUNTO 93/2020. REGULAMENTAÇÃO DA MATÉRIA. NORMAS GERAIS.

1. Recurso administrativo contra decisão que julgou improcedente pedido de declaração de nulidade de dispositivo de ato editado pela CGJMG que exige o reconhecimento de firma em instrumentos particulares levados a registro.

2. Inexiste espaço para acolher a alegação de invasão de competência privativa da União, uma vez que o dispositivo impugnado neste procedimento reproduz exigências contidas no artigo 221 da Lei de Registros Públicos relacionadas ao registro de instrumentos particulares.

3. A CGJMG não inovou no mundo jurídico ou desbordou dos limites estabelecidos pela Lei 6.015/1973 ao editar o Provimento Conjunto 93/2020, porquanto o reconhecimento de firma em instrumentos particulares levados a registro é uma exigência que decorre da lei e não foi abolida pela Medida Provisória 1.162/2023.

4. A dispensa de reconhecimento de firma para instrumentos particulares com força de escritura pública, tal como se dá na hipótese de atos praticados por de atos praticados por instituições financeiras que atuem com crédito imobiliário (artigo 61, §5º da Lei 4.380/64), é prevista no parágrafo único artigo 876 do Provimento Conjunto 93/2020.

5. Recurso improvido.

 

 ACÓRDÃO

O Conselho, por unanimidade, negou provimento ao recurso, nos termos do voto da Relatora. Presidiu o julgamento a Ministra Rosa Weber. Plenário Virtual, 18 de agosto de 2023. Votaram os Excelentíssimos Conselheiros Rosa Weber, Luis Felipe Salomão, Vieira de Mello Filho, Mauro Pereira Martins, Salise Sanchotene, Jane Granzoto, Richard Pae Kim, Marcio Luiz Freitas, Giovanni Olsson, João Paulo Schoucair, Marcos Vinícius Jardim Rodrigues, Marcello Terto, Mário Goulart Maia e Luiz Fernando Bandeira de Mello. Não votou, em razão da vacância do cargo, o representante do Ministério Público da União.

Conselho Nacional de Justiça

Autos: PROCEDIMENTO DE CONTROLE ADMINISTRATIVO - 0002229-54.2023.2.00.0000
Requerente: AIRTON GUSTAVO VIANA DA SILVA
Requerido: CORREGEDORIA GERAL DA JUSTIÇA DO ESTADO DE MINAS GERAIS - CGJMG


RELATÓRIO

A SENHORA CONSELHEIRA JANE GRANZOTO (RELATORA): Trata-se de recurso administrativo interposto por Airton Gustavo Viana da Silva contra a decisão que julgou improcedente o pedido de declaração de nulidade de dispositivo de ato editado pela Corregedoria-Geral da Justiça do Estado de Minas Gerais (CGJMG) que exige o reconhecimento de firma em instrumentos particulares levados a registro (artigo 877, caput do Provimento Conjunto 93, de 22 de junho de 2020).

Monocraticamente, foi registrado que o dispositivo impugnado neste PCA reproduz as exigências do artigo 221 da Lei de Registros Públicos no que concerne a exigência ou dispensa do reconhecimento de firma em instrumentos particulares levados a registro. Destacou-se que o Provimento Conjunto 93/2020 não inova no mundo jurídico e, em razão disso, inexiste espaço para acolher a alegação de invasão de competência privativa da União.

O requerente se manifestou no Id5171580, por meio de peça intitulada “Embargos de Declaração”,  na qual reiterou que o artigo 877 do Provimento Conjunto 93/2020 está em desacordo com disposto no inciso II do artigo 221 da Lei de Registros Públicos e pugnou pelo reexame da matéria.

A CGJMG apresentou contrarrazões no Id5181735.

É o relatório.

 

Brasília, data registrada no sistema. 

 

Jane Granzoto

Conselheira

 

Conselho Nacional de Justiça

 

Autos: PROCEDIMENTO DE CONTROLE ADMINISTRATIVO - 0002229-54.2023.2.00.0000
Requerente: AIRTON GUSTAVO VIANA DA SILVA
Requerido: CORREGEDORIA GERAL DA JUSTIÇA DO ESTADO DE MINAS GERAIS - CGJMG

 


VOTO

 

A SENHORA CONSELHEIRA JANE GRANZOTO (RELATORA): Inicialmente, cumpre registrar que o Regimento Interno do Conselho Nacional de Justiça (RICNJ) não prevê a possibilidade de oposição de Embargos de Declaração contra as decisões monocráticas ou colegiadas. Contudo, o exame dos autos denota que a intenção do requerente, com a peça Id5171580, é a reforma da decisão que julgou o pedido improcedente.

Nesse contexto, com arrimo nos princípios da fungibilidade e da ampla defesa, recebo a manifestação do requerente como recurso administrativo, uma vez que cumpre os requisitos do caput do artigo 115 do RICNJ.

 No mais, trata-se de recurso administrativo contra a decisão que julgou o pedido improcedente, nos seguintes termos (Id5148543): 

Trata-se de Procedimento de Controle Administrativo (PCA) proposto por Airton Gustavo Viana da Silva em face de dispositivo de ato editado pela Corregedoria-Geral da Justiça do Estado de Minas Gerais (CGJMG) que exige o reconhecimento de firma em instrumentos particulares levados a registro (artigo 877, caput do Provimento Conjunto 93, de 22 de junho de 2020).

Aduziu que o Oficial de Registro de Imóveis de Várzea da Palma, com fundamento no disposto no caput do artigo 877 do Provimento Conjunto 93/2020, exigiu o reconhecimento de firma para registro de instrumento particular. Sustentou que a determinação, além de não possuir suporte legal, é inconstitucional e que a CGJMG teria invadido competência privativa da União ao legislar sobre registros públicos.

Requereu a “descontinuidade” do ato impugnado e a adoção das medidas cabíveis para que a autoridade competente decrete a inconstitucionalidade do caput do artigo 877 do Provimento Conjunto 93/2020.

Instado a se manifestar, o TJMG prestou informações no Id513374 nas quais registrou que o ato contestado pelo requerente reproduzia o artigo 221 da Lei 6.015, de dezembro de 1973. Ressaltou que a Medida Provisória 1.162, de 14 de fevereiro de 2023, alterou o citado dispositivo para dispensar o reconhecimento de firma na hipótese de atos praticados por instituições financeiras que atuam com crédito imobiliário autorizadas a celebrar instrumentos particulares com caráter de escritura pública.

Destacou que a Medida Provisória 1.162/2023 manteve a obrigação do reconhecimento de firma em instrumentos particulares e que as exigências do caput do artigo 877 do Provimento Conjunto 93/2020 são encontradas em outros Tribunais.

É o relatório. Decido.

O requerente pediu a nulidade do caput do artigo 877 do Provimento Conjunto 93/2020 ao argumento de que o TJMG teria atuado fora dos limites da Constituição Federal e invadido competência da União por editar ato que exige o reconhecimento de firma em instrumentos particulares levados a registro.

O pedido formulado nos autos é manifestamente improcedente.

Conforme registrado nas informações apresentadas pelo Tribunal mineiro, o caput do artigo 877 do Provimento Conjunto 93/2020 contém exigências presentes na antiga redação do artigo 221 da Lei de Registros Públicos, senão vejamos:

Artigo 221 da Lei de Registros Públicos 

Artigo 877, caput do Prov. Conj. 93/2020

Art. 221 - Somente são admitidos registro:

I - escrituras públicas, inclusive as lavradas em consulados brasileiros;

II - escritos particulares autorizados em lei, assinados pelas partes e testemunhas, com as firmas reconhecidas, dispensado o reconhecimento quando se tratar de atos praticados por entidades vinculadas ao Sistema Financeiro da Habitação;

III - atos autênticos de países estrangeiros, com força de instrumento público, legalizados e traduzidos na forma da lei, e registrados no cartório do Registro de Títulos e Documentos, assim como sentenças proferidas por tribunais estrangeiros após homologação pelo Supremo Tribunal Federal;

IV - cartas de sentença, formais de partilha, certidões e mandados extraídos de autos de processo. 

Art. 877. No caso de instrumento particular apresentado a registro, o instrumento deve estar assinado pelas partes e eventuais testemunhas, com todas as firmas reconhecidas, ficando uma via do instrumento arquivada no Ofício de Registro de Imóveis.

§ 1º Nas hipóteses previstas no caput deste artigo, o instrumento deverá conter todos os requisitos de conteúdo e documentação exigidos para a lavratura de escrituras públicas, devendo o oficial de registro arquivar todos os documentos apresentados em cópias autenticadas.

§ 2º Salvo os casos expressos em lei, é desnecessária a presença de testemunhas para o registro ou averbação de instrumentos particulares.

§ 3º No caso de cédulas e notas de crédito, bem como dos instrumentos constitutivos de sua garantia, são exigíveis unicamente os requisitos previstos em legislação específica. 

Embora o artigo 221 da Lei 6.015/1973 tenha sido alterado por meio a Medida Provisória 1.162/2023, a recente modificação especificou que a dispensa de reconhecimento de firma apenas abrange as instituições financeiras que atuam com crédito imobiliário, confira-se:

Art. 221 - Somente são admitidos registro:

I - escrituras públicas, inclusive as lavradas em consulados brasileiros;

II - escritos particulares autorizados em lei, assinados pelas partes, dispensados as testemunhas e o reconhecimento de firmas, quando se tratar de atos praticados por instituições financeiras que atuem com crédito imobiliário, autorizadas a celebrar instrumentos particulares com caráter de escritura pública;

III - atos autênticos de países estrangeiros, com força de instrumento público, legalizados e traduzidos na forma da lei, e registrados no cartório do Registro de Títulos e Documentos, assim como sentenças proferidas por tribunais estrangeiros após homologação pelo Supremo Tribunal Federal;

IV - cartas de sentença, formais de partilha, certidões e mandados extraídos de autos de processo.

V - contratos ou termos administrativos, assinados com a União, Estados, Municípios ou o Distrito Federal, no âmbito de programas de regularização fundiária e de programas habitacionais de interesse social, dispensado o reconhecimento de firma.

Como se vê, qualquer que seja a redação do artigo 221 da Lei 6.015/1973 a ser considerada, isto é, aquela em vigor ao tempo da edição do caput do artigo 877 do Provimento Conjunto 93/2020 ou o atual dispositivo, inexiste espaço para acolher o argumento do requerente no sentido de que o TJMG invadiu a competência constitucional da União. Em ambas as hipóteses, não é possível extrair a dispensa do reconhecimento de firma em instrumentos particulares levados a registro.

Nesse contexto, o TJMG não inovou no mundo jurídico ou desbordou dos limites estabelecidos pela Lei 6.015/1973, porquanto o reconhecimento de firma em instrumentos particulares levados a registro é uma exigência que decorre da lei e não foi abolida pela Medida Provisória 1.162/2023.

Portanto, inexiste plausibilidade na alegação de que o caput do artigo 877 do Provimento Conjunto 93/2020 é inconstitucional e merece ser expurgado do mundo jurídico, uma vez que o Tribunal mineiro regulamentou a matéria no âmbito de sua competência e manteve conformidade com a norma jurídica primária, a saber, o artigo 221 da Lei 6.015/1973.

 Ante o exposto, com fundamento no artigo 25, inciso X, do RICNJ, julgo o pedido improcedente e determino o arquivamento do feito.

Intimem-se as partes. Em seguida, arquivem-se os autos independentemente de nova conclusão. (sem grifos originais) 

 

Não diviso no recurso administrativo interposto pelo requerente a presença de fundamentos capazes de infirmar a decisão monocrática que julgou improcedente o pedido formulado na inicial e, por isso, inexistem motivos para reformá-la.

O recorrente reiterou o argumento de que a CGJMG ultrapassou os limites do poder regulamentar ao estabelecer, no caput do artigo 877 do Provimento Conjunto 93/2020, a necessidade de reconhecimento de firma em instrumentos particulares levados a registro, cuja redação é a seguinte:

Art. 877. No caso de instrumento particular apresentado a registro, o instrumento deve estar assinado pelas partes e eventuais testemunhas, com todas as firmas reconhecidas, ficando uma via do instrumento arquivada no Ofício de Registro de Imóveis.  

Todavia, conforme registrado na decisão Id5148543, o dispositivo impugnado na inicial reproduz exigências contidas no artigo 221 da Lei de Registros Públicos, vejamos:

Art. 221 - Somente são admitidos registro:                            

I - escrituras públicas, inclusive as lavradas em consulados brasileiros;

II - escritos particulares autorizados em lei, assinados pelas partes, dispensados as testemunhas e o reconhecimento de firmas, quando se tratar de atos praticados por instituições financeiras que atuem com crédito imobiliário, autorizadas a celebrar instrumentos particulares com caráter de escritura pública;      

III - atos autênticos de países estrangeiros, com força de instrumento público, legalizados e traduzidos na forma da lei, e registrados no cartório do Registro de Títulos e Documentos, assim como sentenças proferidas por tribunais estrangeiros após homologação pelo Supremo Tribunal Federal;

IV - cartas de sentença, formais de partilha, certidões e mandados extraídos de autos de processo.

V - contratos ou termos administrativos, assinados com a União, Estados, Municípios ou o Distrito Federal, no âmbito de programas de regularização fundiária e de programas habitacionais de interesse social, dispensado o reconhecimento de firma. 

Percebe-se que a Lei de Registros Públicos, mesmo com a recente alteração promovida pela Medida Provisória 1.162, de 14 de fevereiro de 2023, não eliminou a dispensa do reconhecimento de firma em instrumentos particulares. Esta exigência permanece para instrumentos particulares não enquadrados na ressalva do inciso II do citado artigo 221.

A seu turno, a dispensa de reconhecimento de firma para instrumentos particulares com força de escritura pública, tal como se dá na hipótese de atos praticados por de atos praticados por instituições financeiras que atuem com crédito imobiliário (artigo 61, §5º da Lei 4.380/64), é prevista no parágrafo único artigo 876 do Provimento Conjunto 93/2020, confira-se:

Art. 876. Para registro de escrituras públicas, é desnecessário o reconhecimento de firma do tabelião de notas ou escrevente que as tenha assinado, bem como de requerimento apartado solicitando seu registro.

Parágrafo único. Aplica-se aos instrumentos particulares com força de escritura pública a dispensa de reconhecimento de firma dos signatários, bem como de requerimento apartado solicitando seu registro.

Dessa forma, não há falar em inovação legislativa ou invasão de competência da União para legislar acerca da matéria, tal como sustentou o recorrente na inicial e no recurso administrativo, uma vez as exigências do caput do artigo 877 do Provimento Conjunto 93/2020 não contrariam a legislação de regência.

Por fim, a alegação do recorrente no sentido de que, em um caso concreto, foi exigido o reconhecimento de firma em ato praticado por instituição financeira que atua com crédito imobiliário (na hipótese citada nos autos, a Caixa Econômica Federal) não pode ser conhecida.

A situação narrada no recurso administrativo traduz uma questão meramente individual e sem repercussão para o Poder Judiciário, circunstâncias que não autorizam a intervenção deste Conselho, conforme se extrai do seguinte precedente:

RECURSO ADMINISTRATIVO EM PEDIDO DE PROVIDÊNCIAS. PROMOÇÃO POR MERECIMENTO AO CARGO DE DESEMBARGADOR. ACESSO AO TJRS. INTERESSE INDIVIDUAL. PRETENSÃO DE CONVOLAR O CNJ EM INSTÂNCIA RECURSAL. ALTERAÇÃO MARCO TEMPORAL PARA CÔMPUTO DE PRODUTIVIDADE EM PERÍODO PANDÊMICO. ISONOMIA ENTRE CANDIDATOS. AUSÊNCIA DE OFENSA À RESOLUÇÃO CNJ N. 106, À LEGALIDADE E AOS DEMAIS PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS INFORMADORES DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA. ILEGALIDADE. INOCORRÊNCIA. RECURSO DESPROVIDO. 1. Decisão do Órgão Especial do Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul que indeferiu pedido de alteração do termo final para avaliação de critérios de produtividade em concurso de promoção, pelo critério de merecimento, para o cargo de desembargador. 2. A jurisprudência do CNJ consolidou-se no sentido de que não cabe a este órgão conhecer pretensões que se restrinjam à esfera individual de direitos ou interesses do interessado. 3. As teses suscitadas pelo recorrente foram adequadamente enfrentadas no tribunal de origem, de modo que o ingresso no mérito do julgamento convolaria o CNJ em instância recursal, o que é rechaçado pelos precedentes. 4. Conforme sedimentado no STJ, "o julgador não está obrigado a responder a todas as questões suscitadas pelas partes, quando já tenha encontrado motivos suficientes para proferir sua decisão”, não havendo falar em omissão na decisão monocrática quanto à análise da preliminar de ofensa ao juízo natural. 5. Em sede de recurso também não há elemento novo ou razão jurídica capaz de alterar a decisão combatida. 6. Recurso Administrativo conhecido e desprovido. (CNJ - RA – Recurso Administrativo em PP - Pedido de Providências - Conselheiro - 0001134-57.2021.2.00.0000 - Rel. LUIZ FERNANDO BANDEIRA DE MELLO - 104ª Sessão Virtual - julgado em 29/04/2022)

Dessa forma, eventual irresignação do recorrente com exigências para registro de instrumento particular em um caso específico deve ser submetida a CGJMG, haja vista a competência do órgão para fiscalizar os atos praticados pelos delegatários do Estado de Minas Gerais.

Ante o exposto, nego provimento ao recurso administrativo e mantenho a decisão Id5148543 por seus próprios fundamentos.

É como voto.

Intimem-se as partes. Em seguida, arquivem-se os autos independentemente de nova conclusão.

 

Brasília, data registrada no sistema. 

 

Jane Granzoto

Conselheira