Conselho Nacional de Justiça

 

Autos: PEDIDO DE PROVIDÊNCIAS - 0002176-73.2023.2.00.0000
Requerente: MANOEL AFONSO DE ARAUJO
Requerido: SLC EMPREENDIMENTOS E AGRICULTURA LTDA e outros

 

 

 

EMENTA: RECURSO ADMINISTRATIVO. PEDIDO DE PROVIDÊNCIAS. MATRÍCULAS. IMÓVEIS. NULIDADE. MATÉRIA JURISDICIONAL. INCOMPETÊNCIA DO CNJ. MANUTENÇÃO DA DECISÃO RECORRIDA. RECURSO CONHECIDO E, NO MÉRITO, DESPROVIDO.

 

 ACÓRDÃO

O Conselho, por unanimidade, negou provimento ao recurso, nos termos do voto do Relator. Presidiu o julgamento a Ministra Rosa Weber. Plenário Virtual, 18 de agosto de 2023. Votaram os Excelentíssimos Conselheiros Rosa Weber, Luis Felipe Salomão, Vieira de Mello Filho, Mauro Pereira Martins, Salise Sanchotene, Jane Granzoto, Richard Pae Kim, Marcio Luiz Freitas, Giovanni Olsson, João Paulo Schoucair, Marcos Vinícius Jardim Rodrigues, Marcello Terto, Mário Goulart Maia e Luiz Fernando Bandeira de Mello. Não votou, em razão da vacância do cargo, o representante do Ministério Público da União.

Conselho Nacional de Justiça

Autos: PEDIDO DE PROVIDÊNCIAS - 0002176-73.2023.2.00.0000
Requerente: MANOEL AFONSO DE ARAUJO
Requerido: SLC EMPREENDIMENTOS E AGRICULTURA LTDA e outros


 

Relatório

Trata-se de Recurso Administrativo interposto em face de decisão proferida nos autos do presente Pedido de Providências (PP), proposto por MANOEL AFONSO DE ARAÚJO, em desfavor da CORREGEDORIA DAS COMARCAS DO INTERIOR DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DA BAHIA (CCIBA) e OUTROS, por meio do qual o recorrente requer ao CNJ que declare a nulidade dos títulos dominiais nº 552, 1.533, 1.534, 1.535, 1.536, 1.537 e 2.946, oriundos do Cartório de Registro de Imóveis de Formosa do Rio Preto/BA.

O relatório da decisão recorrida (Id 5155870) foi assim sistematizado:

Trata-se de Pedido de Providências (PP), com pedido liminar, formulado por MANOEL AFONSO DE ARAÚJO, em face da CORREGEDORIA DAS COMARCAS DO INTERIOR DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DA BAHIA (CCIBA) e outros, por meio do qual requer ao CNJ se declare a nulidade dos títulos dominiais n.s 552, 1.533, 1.534, 1.535, 1.536, 1.537 e 2.946, do Cartório de Registro de Imóveis de Formosa do Rio Preto/BA. 

 

O requerente impugna, em síntese, a cadeia dominial oriunda do desmembramento da Fazenda Bom Jardim. Aduz que, com a suposta contribuição dos requeridos, ter-se-ia originado frações ideais do referido imóvel, constituídas a partir da prática da vulgarmente denominada “grilagem de terra”, com superposição de diversas matrículas relacionadas ao mesmo imóvel. Cita: 

 

I) Matrícula nº 4.617 (DOC.06) denominada Fazenda Bom Jardim com 500 (quinhentas) Braças de terra no valor de Cr$ 33,40 que coube ao herdeiro José Francisco Nogueira Paranaguá Neto, advindo do arrolamento e partilha de bens deixados pelo Falecimento de Elsa Nogueira Paranaguá e Lago e João Antônio Pereira e Lago, que posteriormente foi assentada no CRIH de Formosa do Rio Preto, com o número de ordem sob o nº 1.535, 34(DOC. 07) transformada em uma área de 6.010,88 (seis mil e dez hectares e oitenta e oito ares);

 

II) Matrícula nº 4.615 (DOC. 08) denominada Fazenda Bom Jardim com 500 (quinhentas) Braças de terra  no valor de Cr$ 33,40 que coube ao herdeiro Elsio Ferdinand Nogueira Paranaguá, advindo do arrolamento e partilha de bens deixados pelo Falecimento de Elsa Nogueira  Paranaguá  e  Lago  e  João  Antônio  Pereira  e  Lago, que  posteriormente foi assentada no CRIH de Formosa do Rio Preto, com o número de ordem sob o nº 1.536 (DOC. 09), transformada em uma área de 6.005,20 (seis mil e cinco hectares e vinte ares);

 

III) Matrícula nº 4.618 (DOC. 10) denominada Fazenda Bom Jardim com 500 (quinhentas) Braças de terra valor de Cr$ 33,40 que coube ao herdeiro Maria Penuá Nogueira do Lago, advindo do arrolamento e partilha de bens deixados pelo Falecimento de Elsa Nogueira Paranaguá e Lago e João Antônio Pereira e Lago, que posteriormente foi assentada no CRIH de Formosa do Rio Preto, com o número de ordem sob o nº 1.533 (DOC. 11), transformada em uma área de 6.026,81 (seis mil e vinte e seis hectares e oitenta e um ares);

 

IV) Matrícula nº 4.619 (DOC. 12) denominada Fazenda Bom Jardim com 500 (quinhentas) Braças de terra  no valor de Cr$ 33,40 que coube ao herdeiro  Antônio Augusto Paranaguá e Lago, advindo do arrolamento e partilha de bens deixados pelo Falecimento de Elsa Nogueira Paranaguá e Lago e João Antônio Pereira e Lago, que posteriormente foi assentada no CRIH de Formosa do Rio Preto, com o número de ordem sob o nº 1.537 (DOC. 13), transformada em uma área de 6.112,34 (seis mil e cento e doze hectares e trinta e quatro ares);

 

V) Matrícula nº 4.616 (DOC. 14) denominada Fazenda Bom Jardim com 500 (quinhentas) Braças de terra  no valor de Cr$ 33,40 que coube ao herdeiro João de Lago Nogueira Paranaguá, advindo do arrolamento e partilha de bens deixados pelo Falecimento de Elsa Nogueira Paranaguá e Lago e João Antônio Pereira e Lago, que posteriormente foi assentada no CRIH de Formosa do Rio Preto, com o número de ordem sob o nº 1.534 (DOC. 15), transformada em uma área de 6.012,43 (seis mil e doze hectares e quarenta e três ares);

 

VI) Transcrição das Transmissões 2.048 (título primitivo) denominada Fazenda Bom Jardim com 500 (quinhentas) Braças de terra no valor de Cr$ 33,40 que coube ao herdeiro Correntino Nogueira Paranaguá e Lago, advindo do arrolamento e partilha de bens deixados pelo Falecimento de Elsa Nogueira Paranaguá e Lago e João Antônio Pereira e 5Lago, que posteriormente transformou-se na matrícula 552 (DOC. 05), transformada em uma área de 6.030,02 (seis mil e trinta hectares e dois ares).

 

Sustenta que, além de contribuírem para atos de “grilagem de terras”, os requeridos teriam colaborado para falsificação de documentos públicos, supostamente aptos a ocasionar graves danos a instituições financeiras, IBAMA, INEMA, INCRA e demais órgãos públicos, razão pela qual o autor reputa necessária a intervenção “de órgãos do Ministério Público Federal e Estadual, bem como da Polícia Civil e Federal”.

 

Alude, ainda, à ação de retificação de registro proposta perante a Comarca de Formosa do Rio Preto/BA (processo n. 0000161-83.1999.8.05.0081), julgada procedente, por magistrado posteriormente afastado das funções, supostamente em razão da denominada “Operação Faroeste”.

 

Alega “quebra da segurança jurídica” e violação ao princípio da territorialidade registral (arts. n. 170, 228 e 229, da Lei de Registro Públicos), na medida em que os atos notariais praticados pelo Cartório de Registro de Imóveis de Formosa do Rio Preto não refletiriam a realidade. 

 

Acrescenta que o caso em comento trata de questão de ordem pública, cognoscível a qualquer tempo, mormente porque a alegada superposição de áreas geraria insegurança jurídica e vícios de legalidade. 

 

Assim, o autor requer, liminarmente, ao CNJ que determine o bloqueio dos títulos dominiais de n.s 552, 1.533, 1.534, 1.535, 1.536, 1.537 e 2.946, do Cartório de Registro de Imóveis de Formosa do Rio Preto/BA. 

 

No mérito, pede a confirmação da liminar, notadamente para declaração de nulidade dos referidos títulos dominiais, expedindo-se ofício ao titular de registros responsável. 

 

Autuado o presente processo, restou certificado pela Secretaria Processual do CNJ a existência de procedimento semelhante, autuado como Pedido de Providências n. 0007312-85.2022.2.00.0000 (Id. 5087073).

 

Os autos vieram-me conclusos para decisão.

 

É o relatório.

 

No recurso administrativo (Id 5172236), o recorrente aventa ser legítimo proprietário do imóvel denominado Fazenda Livramento de Cima, sob a matrícula de nº 1.163, registrado no Cartório de Registro de Imóveis de Formosa do Rio Preto/BA. Explica que a propriedade rural, havida mediante doação, possui título imobiliário de cadeia sucessória secular; sendo, pois, incontestável a higidez do título dominial.

Alega a irregularidade das matrículas imobiliárias nº 552, 1.533, 1.534, 1.535, 1.536, 1.537 e 2.946, todas oriundas do Cartório de Registro de Imóveis de Formosa do Rio Preto/BA, o que imputa como ato de “grilagem de terras”, uma vez que o referido imóvel já possuía matrícula própria, violando, assim, o art. 176, §1º, inciso I, da Lei nº 6.015/1973 (Lei dos Registros Públicos).

Justifica a interposição do recurso entendendo presentes os elementos hábeis para o deferimento do pedido, considerando trata-se de matéria de competência deste Conselho, sendo prematuro determinar o seu arquivamento monocrático, uma vez que pleiteia, no mérito, a declaração de nulidade das matrículas mencionadas, em razão das irregularidades apontadas.

O recorrente reitera, ainda, o argumento de que as referidas irregularidades foram reproduzidas em decisão judicial, no processo de retificação de registro de imóvel (0000161-83.1999.8.05.0081), em trâmite na Comarca de Formosa do Rio Preto/BA, prolatada pelo MM. Juiz Ronald Souza Tavares Filho, magistrado que teria sido afastado de suas funções pelo TJBA e investigado na Operação Faroeste.

Por fim, pede a reconsideração da decisão e o provimento do recurso em tela, a fim de tornar nulos os títulos dominiais de nº 552, 1.533, 1.534, 1.535, 1.536, 1.537 e 2.946, todos oriundos do Cartório de Registro de Imóveis de Formosa do Rio Preto/BA e, por consequência, os que deles decorrerem.

O recorrido apresentou informações (id. 5177647), relatando o arquivamento provisório do Processo nº 0000382-80.2023.2.00.0852, em trâmite naquela Corregedoria, até nova manifestação deste E. Conselho Nacional de Justiça.

 

É o relatório. Passo ao voto.


 

Conselho Nacional de Justiça

 

Autos: PEDIDO DE PROVIDÊNCIAS - 0002176-73.2023.2.00.0000
Requerente: MANOEL AFONSO DE ARAUJO
Requerido: SLC EMPREENDIMENTOS E AGRICULTURA LTDA e outros

 


 

VOTO 

Admissibilidade

Considerando a sistemática dos recursos administrativos prevista no caput do artigo 115 do Regimento Interno do CNJ (RICNJ), considero o recurso tempestivo e, portanto, dele conheço.


Fundamentação

O recorrente impugna decisão proferida no bojo do presente PP, pela qual foi indeferido o pedido constante da petição inicial, por envolver providência que carece de judicialização, situação que, por ora, torna incabível a intervenção do CNJ.

Na hipótese dos autos, conforme relatado, pleiteia-se a declaração de nulidade de matrículas de imóveis, em razão de fraude e irregularidades cometidas em suposta prática de “grilagem de terra”.

Consoante o § 4º do art. 103-B da Constituição Federal, a atuação do CNJ está restrita ao controle da atividade administrativa e financeira do Poder Judiciário. Em razão disso, este Conselho não possui atribuição para tratar de matéria jurisdicional, especialmente a apuração da prática de atos de natureza criminal. Eis o teor da jurisprudência deste e. Conselho:

RECURSO ADMINISTRATIVO. PEDIDO DE PROVIDÊNCIAS. MATÉRIA JUDICIAL. AUSÊNCIA DE COMPETÊNCIA DESTE CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA. FALTA FUNCIONAL. PROVA DE DOLO OU DE COMPORTAMENTO DESIDIOSO. AUSÊNCIA. RECURSO DESPROVIDO.

[...]

2. Irresignação que se volta ao exame de matéria eminentemente jurisdicional, que não se insere dentre as atribuições deste Conselho Nacional de Justiça (art. 103-B, §4º, da CF/88).

(CNJ - RA – Recurso Administrativo em PP - Pedido de Providências - Conselheiro - 0002186-98.2015.2.00.0000 - Rel. NANCY ANDRIGHI - 14ª Sessão Virtualª Sessão - j. 07/06/2016). (grifou-se)

 

Nesse mesmo sentido, a decisão recorrida assim consignou (Id. 5155870):

Quanto à questão posta, imputam-se aos requeridos, servidores e autoridades públicas a autoria de crimes e fraudes, supostamente havidos no Cartório de Registro de Imóveis de Formosa do Rio Preto/BA, sob o beneplácito do Poder Judiciário local. 

Verifica-se, no entanto, que a solução da controvérsia perpassa pela análise de questões prejudiciais específicas da jurisdição, infensas às atribuições do Conselho Nacional de Justiça (art. 103-B, § 4, da Constituição Federal), como a tipificação e persecução penal relativas a crimes de loteamento ou desmembramento irregular de solo, falsificação de documentos públicos e corrupção de agentes públicos. 

Assim, o procedimento deflagrado pelo ora requerente não está restrito ao mero pedido de declaração de nulidade de matrículas imobiliárias, mas à imputação de crimes e fraudes, de forma que, para sua solução, imprescindível a prévia incidência da tutela jurisdicional, fato que, por ora, torna inviável a intervenção do CNJ no caso.

Dispositivo

Ante o exposto, com fulcro no art. 25, incisos VII e X, do Regimento Interno do CNJ, julgo sumariamente improcedentes os pedidos do requerente. Prejudicado o pleito liminar.

 

Nessa perspectiva, não encontro motivos para reformular a decisão recorrida, tendo em vista que o recurso se limita a repisar os argumentos apresentados na inicial, sem elemento novo apto a ensejar reexame de mérito.

 

Dispositivo 

Com esteio no art. 4º, XXI do RICNJ, e considerando a ausência de fatos novos aptos a alterar a decisão monocrática, VOTO pelo conhecimento do Recurso Administrativo, negando-lhe, no entanto, provimento, nos termos da fundamentação supra.

Intimem-se as partes. Após, arquive-se.

Brasília, 06 de julho de 2023.

 

 

Conselheiro Marcos Vinícius Jardim

Relator