Conselho Nacional de Justiça

 

Autos: PEDIDO DE PROVIDÊNCIAS - 0001998-27.2023.2.00.0000
Requerente: ANTONIO MARCOS VENANCIO DE ALCANTARA
Requerido: TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DA PARAÍBA - TJPB e outros

 


EMENTA

 

 

PEDIDO DE PROVIDÊNCIAS. TRF5ª. RESOLUÇÃO CNJ Nº 345/2020. JUÍZO 100% DIGITAL. DESCUMPRIMENTO. FACULDADE DAS PARTES PROCESSUAIS. NEGÓCIO PROCESSUAL. RESOLUÇÃO CNJ Nº 354/2020. ANÁLISE SISTEMÁTICA. PEDIDO CONHECIDO. PROCEDÊNCIA PARCIAL.

1. Denuncia-se o descumprimento do artigo 5º da Resolução CNJ nº 345/2020 por unidade judiciária vinculada ao Tribunal Regional Federal da 5ª Região que vem designando indiscriminadamente audiências presenciais a despeito da opção das partes da relação processual pelo regime do “Juízo 100% Digital”.

2. Em unidade jurisdicional que aderiu ao "Juízo 100% Digital", compete às partes a decisão quanto à submissão dos ritos processuais ao seu regime, devendo a prática ser incentivada pelos titulares das unidades jurisdicionais, consoante inteligência do artigo 3º, § 4º, da Resolução CNJ nº 345/2020.

3. As disposições da Resolução CNJ nº 345/2020 e da Resolução CNJ nº 354/2020 devem ser interpretadas sistemática e harmonicamente, de modo que só será possível a imposição de realização de audiência presencial, nos processos que tramitam sob o regime do "Juízo 100% Digital", nas excepcionais hipóteses em que ficar inviabilizada a sua realização de forma telepresencial ou virtual retratadas em decisão individualizada e fundamentada do juízo competente.

4. Pedido conhecido e julgado parcialmente procedente.

 ACÓRDÃO

O Conselho, por unanimidade, julgou parcialmente procedente o pedido, para determinar que o Tribunal Regional Federal da 5ª Região determine à 9ª Vara Federal da Seção Judiciária da Paraíba, Subseção de Campina Grande/PB que cumpra integralmente as disposições da Resolução CNJ nº 345/2020, nos termos do voto do Relator. Presidiu o julgamento a Ministra Rosa Weber. Plenário Virtual, 30 de junho de 2023. Votaram os Excelentíssimos Conselheiros Rosa Weber, Luis Felipe Salomão, Vieira de Mello Filho, Mauro Pereira Martins, Salise Sanchotene, Jane Granzoto, Richard Pae Kim, Giovanni Olsson, Sidney Madruga, João Paulo Schoucair, Marcos Vinícius Jardim Rodrigues, Marcello Terto, Mário Goulart Maia e Luiz Fernando Bandeira de Mello. Não votou o Excelentíssimo Conselheiro Marcio Luiz Freitas.

Conselho Nacional de Justiça

Autos: PEDIDO DE PROVIDÊNCIAS - 0001998-27.2023.2.00.0000
Requerente: ANTONIO MARCOS VENANCIO DE ALCANTARA
Requerido: TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DA PARAÍBA - TJPB e outros


 

RELATÓRIO


Trata-se de Pedido de Providências (PP), com pedido liminar, formulado por ANTÔNIO MARCOS VENÂNCIO DE ALCANTARA em face do TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DA PARAÍBA – TJPB e do TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 5ª REGIÃO - TRF 5, em que requer a apuração do descumprimento do artigo 5° da Resolução CNJ nº 345/2020 por algumas unidades judiciárias vinculadas aos requeridos, bem assim como a adoção de medidas para assegurar a sua integral observância.

O requerente relata que os requeridos vêm descumprindo o disposto na Resolução CNJ nº 345/2020, já que, não obstante a escolha pelo “Juízo 100% Digital” pelas partes, várias audiências e sessões têm sido designadas e realizadas de forma presencial, em violação ao artigo 5º da citada Resolução.

Cita como exemplo a comunicação feita pelo Juízo da 9ª Vara Federal da Seção Judiciária do Estado da Paraíba, Subseção de Campina Grande, por meio do sistema CRETA, a todos os interessados que, a partir do mês de abril de 2023, findarão as pautas virtuais e as audiências de instrução e julgamento passarão a ser conduzidas de maneira presencial, sendo realizadas remotamente apenas em casos excepcionais, mediante prévio deferimento judicial.

Aduz que o TJPB publicou, em 16 de fevereiro de 2023, a Resolução nº 9/2023, em que se estabeleceu, no artigo 4º que as “audiências somente poderão ser efetuadas na modalidade telepresencial mediante requerimento da parte, ressalvando o disposto no parágrafo primeiro, bem como nos incisos I a IV do parágrafo segundo do artigo 185 do Código de Processo Penal, competindo ao magistrado deliberar acerca da conveniência de sua realização em formato presencial”.

Liminarmente, requer que seja determinado aos tribunais requeridos que cumpram integralmente o artigo 5º da Resolução CNJ nº 345/2020, no sentido de que todas as audiências e sessões no âmbito do "Juízo 100% Digital" sejam realizadas, preferencialmente, mediante a utilização de sistemas de videoconferência.

Intimado (Id 5110317), o TJPB, no Id 5134616, informa que editou a Resolução TJPB nº 30/2021, que dispõe sobre a sua adesão ao “Juízo 100% Digital” e que, a despeito das alegações genéricas contidas na inicial, afirmou que cumpre integral e fielmente a Resolução CNJ nº 345/2020, desde 25 de agosto de 2021, de modo que seria imprescindível a especificação do descumprimento do normativo, para viabilizar a sua devida análise.

No Id 5134453, o TRF5 informa que: a) a Seção Judiciária do Rio Grande do Norte comprovou que realiza audiências nas varas federais e nas turmas recursais nas formas virtuais e híbrida; b) a Seção Judiciária de Alagoas comunicou que a adesão da 1ª Vara ao Juízo 100% Digital ocorreu em momento anterior à assunção do atual magistrado e que essa condição poderá ser alterada oportunamente, e nas 2ª, 3ª, 4ª, 8ª e 11ª varas realizam audiências preferencialmente por videoconferência, em cumprimento ao artigo 5º da Resolução CNJ 345/2022, ao passo que a 12ª Vara não aderiu ao Juízo 100% Digital; c) a Seção Judiciária de Pernambuco comunicou as audiências estão em consonância com o artigo 5º da Resolução CNJ nº 345/2022; d) a Seção Judiciária do Ceará informou que das 23 unidades judiciárias da Seção Judiciária do Ceará que aderiram ao Juízo 100% Digital, 19 se manifestaram (3ª; 5ª; 6ª; 7ª; 10ª; 11ª; 12ª; 16ª; 19ª; 20ª, 22ª 23ª; 24ª; 25ª; 27ª; 29ª; 30ª; 31ª e 32ª Varas e 1ª; 2ª e 3ª Turmas Recursais) no sentido de que as audiências têm sido realizadas preferencialmente por videoconferência, em cumprimento ao art. 5º da Resolução CNJ nº 345/2022. A 35ª Vara indicou que estão se realizando preferencialmente de forma presencial, com anuência das partes; e) a Seção Judiciária da Paraíba noticiou que 2ª; 4ª; 5ª; 8ª; 10ª; 11ª; 12ª; 14ª; 15ª; 16ª Varas, Cejusc da JFPB cumprem integralmente o art. 5º da Resolução CNJ n. 345/2020 e que a 6ª e 9ª Varas justificaram algumas ressalvas em razão de particularidades; e f) a Seção Judiciária de Sergipe informou que todas as Varas e Turmas Recursais que aderiram ao Juízo 100% digital.

 É o relatório.  Passo ao voto.


 

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Autos: PEDIDO DE PROVIDÊNCIAS - 0001998-27.2023.2.00.0000
Requerente: ANTONIO MARCOS VENANCIO DE ALCANTARA
Requerido: TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DA PARAÍBA - TJPB e outros

 


 

VOTO

Como relatado, trata-se de Pedido de Providências (PP), com pedido liminar, formulado por ANTÔNIO MARCOS VENÂNCIO DE ALCANTARA em face do TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DA PARAÍBA – TJPB e do TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 5ª REGIÃO - TRF 5, em que requer a apuração do descumprimento do artigo 5° da Resolução CNJ nº 345/2020 por algumas unidades judiciárias vinculadas aos requeridos, bem assim como a adoção de medidas para assegurar a sua integral observância.

A Resolução CNJ nº 345/2020 instituiu o “Juízo 100% Digital”, que consiste, não em uma nova modalidade de unidade judiciária, mas em um regime de prática de atos processuais, que serão realizados exclusivamente por meio eletrônico, ressalvadas situações excepcionais de atos que apenas possam ser praticados de modo presencial ou de apoio fornecido por outros setores do tribunal (art. 1º, §§ 2º e 3º).

Nos termos do artigo 8º, caput, do indigitado ato normativo, compete aos tribunal decidir a respeito da adoção do Juízo 100% Digital, podendo abranger ou não todas as unidades judiciárias de mesma competência territorial e material. Nas unidades que contam com mais de uma competência material, o “Juízo 100% Digital” poderá abarcá-las total ou parcialmente (art. 8º, §3º). Essa flexibilidade permite que o tribunal decida, com base em critérios como acesso efetivo à justiça, eficiência e natureza do conflito, se adotará o "Juízo 100% Digital" apenas para certos tipos de processos.

Uma vez adotado o "Juízo 100% Digital", cabe às partes a decisão quanto à sua utilização, por meio de um negócio processual (art. 3º), devendo a prática ser, inclusive, incentivada pelo magistrado, consoante inteligência do artigo 3º, § 4º, segundo o qual: “a qualquer tempo, o magistrado poderá instar as partes a manifestarem o interesse na adoção do “Juízo 100% Digital”, ainda que em relação a processos anteriores à entrada em vigor desta Resolução, importando o silêncio, após duas intimações, aceitação tácita”.

No presente caso, o requerente denuncia que várias unidades judiciárias vinculadas aos requeridos estariam descumprindo a Resolução CNJ nº 345/2020, porquanto, a despeito da opção pelo “Juízo 100% Digital” pelas partes da relação processual, as audiências estariam sendo designadas de forma presencial, contrariando, assim, o artigo 5º do referido normativo.

Em relação ao TJPB, a mera edição do apontado artigo 4º da Resolução TJPB nº 09/2023 não representa, por si só, violação à Resolução CNJ nº 345/2020, na medida em que tão somente reproduz a literalidade do artigo 3º da Resolução CNJ nº 354/2020, que dispõe sobre o cumprimento digital de ato processual e de ordem judicial e dá outras providências, in verbis:

Resolução TJPB nº 09/2023

Art. 4º As audiências só poderão ser realizadas na forma telepresencial a pedido da parte, ressalvado o disposto no § 1º, bem como nos incisos I a IV do § 2º do art. 185 do CPP, cabendo ao juiz decidir pela conveniência de sua realização no modo presencial. Em qualquer das hipóteses, o juiz deve estar presente na unidade judiciária.

§ 1º O juiz poderá determinar excepcionalmente, de ofício, a realização de audiências telepresenciais, nas seguintes hipóteses:

I – urgência;

II – substituição ou designação de magistrado com sede funcional diversa;

III – mutirão ou projeto específico;

IV – conciliação ou mediação no âmbito dos Centros Judiciários de Solução de Conflito e Cidadania (Cejusc);

V – indisponibilidade temporária do foro, calamidade pública ou força maior.

§ 2º A oposição à realização de audiência telepresencial deve ser fundamentada, submetendo-se ao controle judicial.

§ 3º Nas hipóteses em que for realizada videoconferência no exercício da magistratura, conforme disciplinado no art. 2º da Resolução CNJ nº 465/2022, em que 1 (um) ou mais participantes estiverem em local diverso, deve o magistrado estar presente na unidade jurisdicional

 

Resolução CNJ nº 354/2020

Art. 3º As audiências só poderão ser realizadas na forma telepresencial a pedido da parte, ressalvado o disposto no § 1º, bem como nos incisos I a IV do § 2º do art. 185 do CPP, cabendo ao juiz decidir pela conveniência de sua realização no modo presencial. Em qualquer das hipóteses, o juiz deve estar presente na unidade judiciária. (redação dada pela Resolução n. 481, de 22.11.2022)

§1º O juiz poderá determinar excepcionalmente, de ofício, a realização de audiências telepresenciais, nas seguintes hipóteses: (redação dada pela Resolução n. 481, de 22.11.2022)

I – urgência; (redação dada pela Resolução n. 481, de 22.11.2022)

II – substituição ou designação de magistrado com sede funcional diversa; (redação dada pela Resolução n. 481, de 22.11.2022)

III – mutirão ou projeto específico; (redação dada pela Resolução n. 481, de 22.11.2022)

IV – conciliação ou mediação no âmbito dos Centros Judiciários de Solução de Conflito e Cidadania (Cejusc); (redação dada pela Resolução n. 481, de 22.11.2022)

V –  indisponibilidade temporária do foro, calamidade pública ou força maior. (redação dada pela Resolução n. 481, de 22.11.2022)

§2º A oposição à realização de audiência telepresencial deve ser fundamentada, submetendo-se ao controle judicial. (redação dada pela Resolução n. 481, de 22.11.2022)

Ademais, o TJPB noticia que houve adesão ao “Juízo 100% Digital” conforme Resolução TJPB nº 30/2021, que cumpre fiel e integralmente suas disposições.

Na falta de indicação precisa, portanto, sobre suposto descumprimento por parte do TJPB, fica afastada a competência deste CNJ em relação a esse requerido.

Mesma sorte não assiste, porém, ao TRF5.

Colhe-se da inicial que a 9ª Vara Federal da Seção Judiciária do Estado da Paraíba, Subseção de Campina Grande, editou comunicado, de caráter geral, aos interessados (as) de que, a partir do mês de abril do ano de 2023, as pautas virtuais se encerrarão e as audiências de instrução e julgamento passarão a ser conduzidas de maneira presencial, em sua sede, de modo que apenas em situações excepcionais, devidamente fundamentadas pela parte envolvida, poder-se-á realizar a audiência por meio remoto, mediante prévia concessão judicial.

O TRF5, no Id 5134454, informou que, em resposta a expediente encaminhado para colheita de informações de suas unidades judiciárias, a 9ª Vara Federal de Campina Grande manifestara o seguinte:

A 9ª Vara informou (3486008), no âmbito do mesmo PA, que embora reconheça a importância do “Juízo 100% Digital” como instrumento de facilitação do acesso à justiça, na realidade concreta da unidade jurisdicional, entende que a realização de audiência de instrução e julgamento por videoconferência não se mostrou adequada para a elucidação dos fatos envolvendo trabalhadores rurais e pescadores artesanais, razão pela qual manifestou, desde já, o interesse em que esta unidade jurisdicional seja desvinculada do “Juízo 100% Digital”. Ademais, o magistrado afirmou que “A utilização simultânea dos dois formatos de audiências de instrução e julgamento nos primeiros meses deste ano de 2023 solidificou a convicção de que o contato pessoal com as partes nas demandas previdenciárias manejadas por trabalhadores rurais e pescadores artesanais é muito importante para a formação do convencimento do julgador, de modo que decidimos, com fundamento no artigo 3º, da Resolução CNJ nº 354/2020, com a redação que lhe foi dada pela Resolução CNJ nº 481/2022, que assegura caber ao juiz decidir pela conveniência da realização das audiências de modo presencial, manter integralmente toda a pauta de audiências de conciliação em formato virtual. Em relação às audiências de instrução e julgamento, a partir de 01/04/2023, elas vêm sendo realizadas, preferencialmente, de forma presencial, ressalvadas as situações excepcionais devidamente justificadas pelas partes que dificultem o comparecimento à sede deste juízo, tais como idade avançada da parte ou testemunha, enfermidade etc.

Conquanto as justificativas apresentadas, não há como legitimá-las ou compatibilizá-las com o disposto na Resolução CNJ nº 345/2020.

Em consulta ao sítio deste CNJ[1], verifica-se que a mencionada unidade jurisdicional aderiu ao “Juízo 100% Digital”:

 

O artigo 3º da Resolução CNJ nº 354/2020, acima transcrito, não se presta à finalidade de autorizar os magistrados a, indiscriminadamente, designarem audiências presenciais a despeito da escolha das partes da relação processual por sua realização por videoconferência, nos moldes previstos na Resolução CNJ nº 345/2020.

Aliás, a interpretação conferida ao dispositivo subverte o sentido da norma e viola a autonomia das partes para decidirem qual o formato do processo lhes é mais conveniente (artigo 190 do Código de Processo Civil e artigo 3º da Res. CNJ 345/2020).

À evidência, as disposições da Resolução CNJ nº 345/2020 e da Resolução CNJ nº 354/2020 devem ser interpretadas sistematicamente, de acordo com o propósito de cada qual.

A fiel compreensão do artigo 3º da Resolução CNJ nº 354/2020 não exige interpretação mais complexa do que a sua literalidade, como bem esclarecido no voto condutor do acórdão proferido no PCA nº 0002260-11.2022.2.00.0000, de relatoria do e. Conselheiro Ministro Luiz Philippe Vieira de Mello Filho, quanto ao fato de que o magistrado só poderá realizar audiências telepresenciais em 2 hipóteses: a) se houver requerimento das partes, após decisão do juiz sobre a conveniência e viabilidade do pedido; b) de ofício, nas hipóteses excepcionais destacadas nos incisos.  

A regra, portanto, é que as audiências, de maneira geral, devem ser realizadas de forma presencial, ressalvados os casos em que as partes elegem a modalidade telepresencial ou por videoconferência, como acontece nas hipóteses submetidas ao regime instituído pela Resolução CNJ nº 345/2020 (Juízo 100% Digital), em que todos os atos processuais devem ser praticados por meio eletrônico e remoto por intermédio da rede mundial de computadores.

 Nada obstante, nas hipóteses de, excepcionalmente, ser inviável a produção de meios de prova ou de outros atos processuais de forma virtual, a sua realização de modo presencial não deve impedir a tramitação do processo no âmbito do “Juízo 100% Digital” (artigo 1º, § 2º, Res. CNJ 345/2020).

A análise quanto à viabilidade ou não da realização da audiência presencial no regime exclusivamente digital, portanto, deve se dar de maneira individualizada e fundamentada, e não em caráter geral como o fez a unidade judiciária em referência.

Nesse sentido, descabe à 9ª Vara Federal de Campina Grande/PB, enquanto vinculada ao regime do “Juízo 100% Digital”, determinar a realização de todas as audiências de forma presencial, desprezando a opção das partes, afastando as normas cogentes aprovadas pelo CNJ.

Não se diga que não seja possível que o tribunal opte pela descontinuidade do regime exclusivamente digital na unidade, ao argumento de que, “na realidade concreta da unidade jurisdicional, entende[-se] que a realização de audiência de instrução e julgamento por videoconferência não se mostrou adequada para a elucidação dos fatos envolvendo trabalhadores rurais e pescadores artesanais” (art. 8º, §§ 1º e 7º, Res. CNJ 345), porque o juízo não está autorizado, antes da suas desvinculação formal ao regime do "Juízo 100% Digital", a afastar as disposições da Resolução CNJ 345/2020.

 Não se cuida aqui de interferir na independência funcional do magistrado, mas sim de garantir a observância das políticas judiciárias nacionais estabelecidas pelo CNJ no aproveitamento das suas competências constitucionais, em carater normativo primário, assim como reconhecido na jurisprudência do Supremo Tribunal Federal (STF).

Afinal, a realidade concreta da 9ª Vara Federal de Campina Grande/PB, em relação à instrução de processos de interesse de trabalhadores rurais e pescadores artesanais, não pode ser tão distinta daquelas outras unidades jurisdicionais localizadas no vasto território nacional, inclusive no Estado da Paraíba, que continuam todas elas aderentes ao "Juízo 100% Digital", especialmente em matéria previdenciária, sem qualquer objeção também da União, por sua Procuradoria Federal, parte mais interessada na rigorosa instrução do processo, ainda que por meio virtual.

É dizer, até a sua desvinculação do regime digital, os atos processuais deverão observar integralmente as regras do referido ato normativo, em especial no que toca à realização de audiências exclusivamente por videoconferência.

Destarte, constatada a violação à Resolução CNJ nº 345/2020 por parte da 9ª Vara Federal da Seção Judiciária da Paraíba, Subseção de Campina Grande, compete ao CNJ intervir para o restabelecimento da legalidade. 

 

DISPOSITIVO

Por tais fundamentos, conheço deste PCA e, no mérito, julgo parcialmente procedente o pedido, para determinar que a 9ª Vara Federal da Seção Judiciária da Paraíba, Subseção de Campina Grande/PB, cumpra integralmente as disposições da Resolução CNJ nº 345/2020, especialmente no que toca a garantia das partes de realização de audiências por videoconferência.

Cientifique-se o TRF5, para que inspecione o cumprimento da Resolução CNJ nº 345/2020 pela unidade jurisdicional em referência.

Ademais, determino o encaminhamento de cópia dos presentes autos ao Cumprdec nº 0008831-66.2020.2.00.0000, para ciência e adoção das providências que julgar necessárias.

É como voto.

 

                                                                                            Conselheiro Marcello Terto

                                                                                                            Relator

 



[1] Disponível em <https://paineisanalytics.cnj.jus.br/single/?appid=e18463ef-ebdb-40d0-aaf7-14360dab55f0&sheet=5dcb593d-ce80-4497-9832-656d0c3b18ed&lang=pt-BR&theme=cnj_theme&opt=ctxmenu,currsel > Acesso em 25 de maio de 2023.