Conselho Nacional de Justiça

 

Autos: PROCEDIMENTO DE CONTROLE ADMINISTRATIVO - 0001761-27.2022.2.00.0000
Requerente: JORGE SUSUMU SEINO
Requerido: JUÍZO DA VARA ÚNICA DA COMARCA DE PONTAL DO PARANÁ - PR

 


 

PROCEDIMENTO DE CONTROLE ADMINISTRATIVO. TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO PARANÁ. SERVENTIA EXTRAJUDICIAL VAGA. DESIGNAÇÃO DE INTERINO. AVALIAÇÃO POR ESPECIALIDADE. APLICAÇÃO DA CF/88, DA LEI Nº 8.935/94 E DO PROVIMENTO CNJ/CN Nº 77/2018. NÃO HÁ OBRIGAÇÃO DE ACEITAR A DESIGNAÇÃO PARA INTERINIDADE. ANULAÇÃO DA PORTARIA DE DESIGNAÇÃO. PEDIDO JULGADO PROCEDENTE.

1. Procedimento em que se questiona a designação precária do requerente para responder interinamente pelo Serviço de Registro de Pessoas Naturais, de Títulos e Documentos e Civil das Pessoas Jurídicas do Município de Pontal do Paraná/PR, sem sua concordância.

2. O indicado à designação interina pode aceitar ou não a incumbência, de acordo com seu juízo de conveniência e oportunidade, assim como aquele que estiver no exercício da designação interina pode renunciar ao encargo a qualquer tempo.

3. Há expressa vedação à designação interina de quem não detenha uma das atribuições do serviço vago, conforme o artigo 5º, caput, do Provimento CNJ nº 77/2018, o qual sinaliza que, em caso de impossibilidade ou inexistência de substituto hábil à incumbência, a designação deverá recair sobre delegatário no mesmo município ou em município contíguo que detenha uma das atribuições da serventia vaga.

4. É imperativa a manutenção, não só da regularidade do serviço, como, também, da necessária qualidade na execução dos atos de sua competência, circunstância que enseja a designação de responsável interino com igual expertise, razão pela qual, independentemente de o delegatário ser da mesma comarca ou de comarca contígua, há a exigência de que detenha uma das atribuições do serviço vago. Precedentes do CNJ.

5. Necessidade de anulação da Portaria nº 08/2022, que designou o requerente para responder pelo Serviço de Registro Civil das Pessoas Naturais, Serviço de Registro de Títulos e Documentos e Civil das Pessoas Jurídicas da Comarca de Pontal do Paraná, tendo em vista a contrariedade expressa do mencionado ato administrativo ao texto da Constituição Federal, à Lei nº 8.935/94 e ao Provimento CNJ nº 77/2018.

6. Procedência do pedido.

 

 ACÓRDÃO

O Conselho, por unanimidade, julgou procedente o pedido, para anular a Portaria nº 08/2022, que designou o requerente para responder pelo Serviço de Registro Civil das Pessoas Naturais, Serviço de Registro de Títulos e Documentos e Civil das Pessoas Jurídicas da Comarca de Pontal do Paraná (CNS 15.482-3), tendo em vista a contrariedade expressa do mencionado ato administrativo ao texto da Constituição Federal, à Lei nº 8.935/94 e ao Provimento CNJ nº 77/2018, nos termos do voto do Relator. Presidiu o julgamento o Ministro Luís Roberto Barroso. Plenário Virtual, 9 de fevereiro de 2024. Votaram os Excelentíssimos Conselheiros Luís Roberto Barroso, Luis Felipe Salomão, Guilherme Caputo, José Rotondano, Mônica Autran, Jane Granzoto, Renata Gil, Daniela Madeira, Giovanni Olsson, Pablo Coutinho Barreto, João Paulo Schoucair, Marcos Vinícius Jardim Rodrigues, Marcello Terto, Daiane Nogueira e Luiz Fernando Bandeira de Mello.

Conselho Nacional de Justiça

Autos: PROCEDIMENTO DE CONTROLE ADMINISTRATIVO - 0001761-27.2022.2.00.0000
Requerente: JORGE SUSUMU SEINO
Requerido: JUÍZO DA VARA ÚNICA DA COMARCA DE PONTAL DO PARANÁ - PR


 

RELATÓRIO

 

O CONSELHEIRO PABLO COUTINHO BARRETO (Relator):

Trata-se de Procedimento de Controle Administrativo (PCA) proposto por Jorge Susumu Seino, contra a Portaria n.º 08/2022, expedida pelo Juiz substituto Felipe Wollertt de França, do Juízo Único da Comarca de Pontal do Paraná/PR, que determinou a designação precária do requerente para responder pelo Serviço de Registro de Pessoas Naturais, de Títulos e Documentos e Civil das Pessoas Jurídicas do referido Município, a partir de 30/03/2022.

Sustenta que é agente delegado titular do Serviço de Registro de Imóveis de Pontal do Paraná, desde 2018, e que o Magistrado o delegou para assumir interinamente outra serventia extrajudicial, sem sua concordância, e em desrespeito ao artigo 39, § 2º, da Lei n.º 8.935/94[1] e ao art. 2º, do Provimento n.º 77/2018[2], do Conselho Nacional de Justiça.

Informa, ainda, que há escrevente substituta - Cláudia Gisele Basílio Araújo - interessada na designação para responder interinamente pelo Serviço de Registro de Pessoas Naturais, de Títulos e Documentos e Civil das Pessoas Jurídicas, de Pontal do Paraná/PR.

Requer, portanto, a suspensão dos efeitos da Portaria ora impugnada e, consequentemente, do ato de transmissão de acervo previsto para o dia 30/03/2022, às 09h. No mérito, a revogação do mencionado ato.

Em 25/03/2022, o Presidente do TJPR foi intimado para que prestasse informações, no prazo de 48 horas (Id. 4660066).

Na sequência, em 30/03/2022, às 11h41, o Desembargador Expedito Reis do Amaral, Corregedor-Geral de Justiça do Estado do Paraná, informou que, em 29/03/2022, a Juíza de Direito Cristiane Dias Bomfim Godinho, titular da Comarca de Pontal do Paraná, indeferiu o requerimento de designação da escrevente Cláudia Araújo, em razão da ausência de comprovação dos requisitos previstos no art. 3º, do Provimento CNJ n.º 77/2018[3] (Id. 4663935).

Em 01/04/2022, à vista da perda do objeto do pedido liminar, a escrevente Claúdia Gisele Basílio Araújo e o Corregedor-Geral de Justiça foram intimados para que prestassem informações complementares sobre a matéria em questão (Id. 4668586).

Ato contínuo, em 04/04/2022, o requerente reiterou o pedido liminar, tendo em vista o adiamento da transferência do acervo e destacou que a sua designação viola o art. 5º, do Provimento CNJ n.º 77/2018[4] (Id. 4670285).

O requerido apresentou informações complementares, em 11/04/2022 (Id. 4677798).

Em 23/04/2022, a escrevente Cláudia Gisele Basílio Araújo ratificou seu interesse em assumir a designação precária do Serviço de Pessoas Naturais, de Títulos e Documentos e Civil das Pessoas Jurídicas de Pontal do Paraná (Id. 4688866).

À vista das informações prestadas pela escrevente, em 25/04/2022, o Corregedor-Geral do Estado do Paraná foi intimado para manifestar-se, no prazo de cinco dias (Id. 4690136).

O requerente, em 06/05/2022, destacou que a transmissão do acervo e transmissão precária fora adiada para o dia 11/05/2022, às 09h (Id. 4705068).

Na sequência, o Corregedor-Geral informou que a escrevente Cláudia Gisele Basílio Araújo não era a substituta mais antiga de serventia extrajudicial vaga, motivo pela qual a designação temporária foi indeferida (Id. 4705592).

Com fundamento no art. 25, inciso XI, do Regimento Interno do Conselho Nacional de Justiça (RICNJ)5, a liminar foi deferida em 10/05/2022 (Id. 4709673) e, na sequência, os autos foram remetidos à Coordenadoria de Gestão de Serviços Notariais e de Registro (CONR) para manifestação, oportunidade em que apresentou parecer pela manutenção da decisão liminar e, no mérito, pela procedência do pedido (Id. 4756042).

Por fim, em 23/06/2023, o requerente informa que subsiste o interesse no prosseguimento do feito, requerendo seu total acolhimento, conforme parecer da CONR, para “confirmar a liminar e dar provimento ao presente Procedimento de Controle Administrativo, com a revogação da Portaria nº 08/2022, que designou o Requerente para responder interinamente pelo Serviço de Registro Civil das Pessoas Naturais, Serviço de Registro de Títulos e Documentos e Civil das Pessoas Jurídicas da Comarca de Pontal do Paraná”.

 É o relatório.



[1] Art. 39. Extinguir-se-á a delegação a notário ou a oficial de registro por: [...] § 2º - Extinta a delegação a notário ou a oficial de registro, a autoridade competente declarará vago o respectivo serviço, designará o substituto mais antigo para responder pelo expediente e abrirá concurso.

[2] Art. 2º Declarada a vacância de serventia extrajudicial, as corregedorias de justiça dos Estados e do Distrito Federal designarão o substituto mais antigo para responder interinamente pelo expediente. § 1º - A designação deverá recair no substituto mais antigo que exerça a substituição no momento da declaração da vacância. § 2º - A designação de substituto para responder interinamente pelo expediente não poderá recair sobre cônjuge, companheiro ou parente em linha reta, colateral ou por afinidade, até o terceiro grau do antigo delegatário ou de magistrados do tribunal local.

[3] Art. 3º A designação de substituto para responder interinamente pelo expediente não poderá recair sobre pessoa condenada em decisão com trânsito em julgado ou proferida por órgão jurisdicional colegiado, nas seguintes hipóteses: I atos de improbidade administrativa; II crimes: a) contra a administração pública; b) contra a incolumidade pública; c) contra a fé pública; d) hediondos; e) praticados por organização criminosa, quadrilha ou bando; f) de redução de pessoa à condição análoga à de escravo; g) eleitorais, para os quais a lei comine pena privativa de liberdade; h) de lavagem ou ocultação de bens, direitos e valores. § 1º Na mesma proibição dos incisos I e II deste artigo, incide aquele que: a) praticou ato que acarretou a perda do cargo ou emprego público; b) foi excluído do exercício da profissão por decisão judicial ou administrativa do órgão profissional competente; c) teve suas contas relativas ao exercício de cargos ou funções públicas rejeitadas por irregularidade insanável que configure ato doloso de improbidade administrativa, por decisão irrecorrível do órgão competente; e) perdeu a delegação por decisão judicial ou administrativa.

[4] Art. 5º Não havendo substituto que atenda aos requisitos do § 2º do art. 2º e do art. 3º, a corregedoria de justiça designará interinamente, como responsável pelo expediente, delegatário em exercício no mesmo município ou no município contíguo que detenha uma das atribuições do serviço vago.

 

Conselho Nacional de Justiça

 

Autos: PROCEDIMENTO DE CONTROLE ADMINISTRATIVO - 0001761-27.2022.2.00.0000
Requerente: JORGE SUSUMU SEINO
Requerido: JUÍZO DA VARA ÚNICA DA COMARCA DE PONTAL DO PARANÁ - PR

 


 

VOTO

 

O CONSELHEIRO PABLO COUTINHO BARRETO (Relator):

Cuida-se de Procedimento de Controle Administrativo (PCA) proposto por Jorge Susumu Seino, contra a Portaria n.º 08/2022, expedida pelo Juiz substituto Felipe Wollertt de França, do Juízo Único da Comarca de Pontal do Paraná/PR, que determinou a designação precária do requerente para responder pelo Serviço de Registro de Pessoas Naturais, de Títulos e Documentos e Civil das Pessoas Jurídicas do referido Município, a partir de 30/03/2022.

Em 10/05/2022, foi concedida medida liminar (Id. 4709673), determinando a suspensão dos efeitos da Portaria nº 08/2022 e, por consequência, o ato de transmissão do acervo, até o julgamento do mérito deste procedimento.

Considerando a matéria em questão, os autos foram encaminhados à CONR para parecer (Id. 4756042), cuja manifestação deu-se no sentido do provimento do presente PCA, para o fim de revogar a Portaria nº 08/2022, que designou o requerente para responder pelo Serviço de Registro Civil das Pessoas Naturais, Serviço de Registro de Títulos e Documentos e Civil das Pessoas Jurídicas da Comarca de Pontal do Paraná, tendo em vista a contrariedade expressa do mencionado ato administrativo ao texto da Constituição Federal, à Lei nº 8.935/94 e ao Provimento CNJ nº 77/2018, nos seguintes termos:

[...]

A Coordenadoria de Gestão de Serviços Notariais e de Registro da Corregedoria Nacional de Justiça entende que o corrente Procedimento de Controle Administrativo deve ser julgado integralmente procedente, com a revogação da Portaria nº 08/2022.

Desde logo, consigna-se que o artigo 5º, inciso II, da Constituição Federal de 1988, ao cristalizar o princípio da legalidade, preconiza que “ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei”. E a esse respeito, tem-se que inexiste qualquer lei federal ou estadual que estipule aos agentes delegados ou mesmo a particulares o dever/obrigação de assumir a designação de serventias extrajudiciais em caráter precário. O indicado à designação interina pode aceitar ou não a incumbência, de acordo com seu juízo de conveniência e oportunidade. E quem estiver no exercício da designação interina pode renunciar ao encargo a qualquer tempo. Desse modo, nota-se que a Corregedoria-Geral de Justiça e o Conselho da Magistratura, ao obrigarem o requerente à uma designação interina a seu desgosto, violam o Princípio Constitucional da Legalidade previsto no artigo 5º, inciso II, da CF/88.

Outrossim, não há como explicar o fato de um interino poder desistir da designação a qualquer tempo, e o delegatário não poder renunciar a uma designação imposta à força, contra sua vontade. Se um titular pode renunciar até mesmo à sua própria delegação (artigo 39, inciso IV, da Lei nº 8.935/94), quanto mais a uma designação interina, que é precária e pautada apenas no vínculo de confiança da administração pública com o designado.

Diante disso, causa perplexidade o raciocínio da Corregedoria-Geral da Justiça do Estado do Paraná e do Conselho Estadual da Magistratura, de que o exercício da interinidade é um “múnus público que inadmite recusa, salvo se por motivo absolutamente justificável” (Id. 4657323). Frise-se que não há qualquer previsão legal que respalde tão entendimento. E até onde se tem notícia, desconhece-se outra Corte de Justiça estadual que adote pensamento similar, crivado de manifesta ilegalidade.

Além do mais, como não havia obrigação legal do requerente em assumir a designação provisória da serventia, seu comportamento de não estar presente na solenidade de transmissão de acervo, agendada inicialmente para o dia 30/03/2022, às 09:00, não importa em prática de qualquer infração disciplinar, não havendo cogitar em instauração de PAD por referido motivo. Não enseja prática de infração disciplinar quem desobedece a ordem de superior hierárquico que é manifestamente ilegal, como na espécie.

Lado outro, observa-se dos autos que, ao que parece, não há óbice para a designação interina da Sra. Cláudia Gisele Basílio Araújo, atual escrevente substituta do Serviço de Registro Civil das Pessoas Naturais, e Registro de Títulos e Documentos e Civil das Pessoas Jurídicas de Pontal do Paraná/PR, tendo ela formulado pedido expresso à Corregedoria Estadual neste sentido. Em verdade, a sua designação, caso seja ela a substituta mais antiga da serventia na atualidade, estaria em fina sintonia com o artigo 39, § 2º, da Lei nº 8.935/94, e com o artigo 2º, § 1º, do Provimento CNJ nº 77/2018, os quais determinam que sobrevindo a vacância da serventia deve ser designado o escrevente substituto mais antigo para responder interinamente pelo expediente.

No ponto, insta consignar que o fato da Sra. Cláudia ter sido nomeada como escrevente substituta tão somente em 21/06/2016, e, portanto, em momento posterior à vacância da unidade que ocorreu no final do ano de 2012, não afasta a sua pretensão. Isso porque, no caso presente, como a citada serventia está vaga há quase dez anos, já tendo havido várias designações de responsáveis interinos e respectivas renúncias, por uma interpretação teleológica, deve se considerar a última renúncia como se vacância fosse, sob pena de se esvaziar a mens legis contida no artigo 39, § 2º, da Lei nº 8.935/94, e no artigo 2º, § 1º, do Provimento CNJ nº 77/2018.

Com efeito, nos casos de serventias vagas que estão sob gestão precária há muitos anos, e nas quais já houve várias trocas de interinos, como in casu, tem-se a ideia de que o substituto mais antigo da serventia à época da vacância, já foi designado como interino em oportunidade anterior, e já renunciou, sendo de bom alvitre, portanto, que seja designado o escrevente substituto mais antigo que estiver em exercício na ocasião da última renúncia.

Registre-se, por oportuno, que a Sra. Cláudia, além de ter formulado pedido expresso para ser designada como responsável interina da citada serventia, informou que não possui parentesco com o antigo titular e comprovou que possui larga experiência na área, havendo documentos nos autos que demonstram o exercício da função de escrevente extrajudicial desde 02/12/1998, há mais de duas décadas, portanto. Noutro ponto, observa-se que mesmo que não seja possível a designação da Sra. Cláudia Gisele Basílio Araújo, como responsável interina pelo Serviço de Registro Civil das Pessoas Naturais, e Registro de Títulos e Documentos e Civil das Pessoas Jurídicas de Pontal do Paraná/PR, o fato é que o requerente não tem como ser designado como gestor precário dessa serventia. Isso porque, em razão do postulante ser titular de um cartório que possui a única atribuição de registro de imóveis, e a serventia vaga ser de registro civil de pessoas naturais, e registro de títulos e documento e civil das pessoas jurídicas, há expressa vedação à sua designação interina pela disposição constante no artigo 5º, caput, do Provimento CNJ nº 77/2018, o qual sinaliza que, em caso de impossibilidade ou inexistência de substituto hábil à incumbência, a designação deverá recair sobre delegatário no mesmo município ou em município contíguo que detenha uma das atribuições da serventia vaga.

Esse mesmo raciocínio é reprisado na Instrução Normativa nº 18/2020 da própria Corregedoria-Geral da Justiça do Estado do Paraná, verbis:

Art. 4º-A Não havendo substituto que atenda aos requisitos do artigo anterior, o Juiz Diretor do Fórum da Comarca designará interinamente, como responsável pelo expediente, delegatário em exercício no mesmo município ou no município contíguo que detenha uma das atribuições do serviço vago.

§1º Não havendo delegatário no mesmo município ou no município contíguo que detenha uma das atribuições do serviço vago, a corregedoria de justiça designará interinamente, como responsável pelo expediente, substituto de outra serventia bacharel em direito com no mínimo 10 (dez) anos de exercício em serviço notarial ou registral.

§2º A designação de substituto para responder interinamente pelo expediente será precedida de consulta ao juiz corregedor permanente competente pela fiscalização da serventia extrajudicial.

§3º Os casos omissos serão decididos pela Corregedoria-Geral da Justiça (quando não delegada a competência para tanto) e deverão ser comunicados à Corregedoria Nacional de Justiça no prazo de 30 (trinta) dias.

A obrigatoriedade de o delegatário ser de uma serventia de mesma atribuição que a unidade vaga decorre da ideia de que tais pessoas já conhecem a função e possuem equipe treinada e habilitada para prática dos atos notariais e de registro daquela especialidade, ou seja, consoante pontuado pelo próprio requerente, “trata-se de entendimento voltado a garantir a continuidade da prestação de serviços à população por pessoas que já conhecem a atribuição, sem que isso resulte em prejuízo à qualidade dos serviços prestados, com respeito aos postulados da eficiência e da segurança jurídica, melhor atendendo aos interesses da administração pública” (Id. 4657007, fl. 8).

Nessa linha intelectiva, é a jurisprudência deste CNJ, no sentido de que “dada as diversas atribuições estabelecidas na Lei dos Cartórios (art. 5º), cada qual com suas peculiaridades e rotinas diferentes, a norma deste Conselho buscou manter não só a regularidade do serviço, como, também, a necessária qualidade na execução dos atos de sua competência, circunstância que enseja a designação de responsável interino com igual expertise. Independentemente de o delegatário ser da mesma comarca ou de comarca contígua, há a exigência de que detenha uma das atribuições do serviço vago”. (CNJ - RA – Recurso Administrativo em PCA - Procedimento de Controle Administrativo - 0000882-88.2020.2.00.0000 - Rel. ANDRÉ LUIZ GUIMARÃES GODINHO - 87ª Sessão Virtual - julgado em 28/05/2021)

Importa salientar que dispõe o § 1º do artigo 5º do Provimento CNJ nº 77/2018 que “não havendo delegatário no mesmo município ou no município contíguo que detenha uma das atribuições do serviço vago, a corregedoria de justiça designará interinamente, como responsável pelo expediente, substituto de outra serventia bacharel em direito com no mínimo 10 (dez) anos de exercício em serviço notarial ou registral”. Ou seja, mesmo que não se encontre titular que detenha a mesma atribuição da serventia vaga, como hipótese residual, o Provimento CNJ nº 77/2018 não autoriza que seja designado oficial ou registrador cuja atribuição seja diversa do serviço vago, impondo seja perquirido por substituto de outra serventia formado em direito e com no mínimo dez anos de experiência em serviço notarial ou registral. Disso, resulta que, à luz das disposições do Provimento CNJ nº 77/2018, não há como se designar o requerente para o exercício da interinidade do Serviço de Registro Civil das Pessoas Naturais, e Registro de Títulos e Documentos e Civil das Pessoas Jurídicas de Pontal do Paraná/PR, posto que titular de serventia cuja atribuição é distinta da unidade vaga.

Como se não bastasse, o proceder adotado pela Corregedoria-Geral da Justiça do Estado do Paraná, e pelo Conselho Estadual da Magistratura, também ofende outro postulado constitucional, além do princípio da legalidade, qual seja, o Princípio Constitucional da Igualdade ou Isonomia, constante no artigo 5º, caput, da CF/88. Isso porque, não obstante “tenha o Exmo. Corregedor-Geral da Justiça (i) deferido o pedido de renúncia formulado pelo Sr. Cláudio Roberto Bley Carneiro (atual agente interino); e (ii) acatado a manifestação de desinteresse dos Agentes Delegados dos Registros Civis da Comarca de Matinhos, Guaratuba, Paranaguá, Morretes e Antonina, impôs ao ora Requerente (de outra atribuição) o ônus da designação interina, mesmo tendo este também expressado desinteresse na função” (Id. 4657007, fl. 11). Com efeito, de todo procedente a alegação do requerente de que “se aos demais agentes delegados foi permitida a renúncia/recusa da designação, tratamento igual deve ser garantido ao recorrente, sob pena de violação à isonomia”. (Id. 4657007, fl. 12)

No mais, verifica-se que o Conselho Estadual da Magistratura do Paraná desrespeitou o seu próprio julgado anteriormente proferido, ofendendo, com isso, a coisa julgada administrativa.

De fato, constata-se que o aresto prolatado em 19/03/2021, que analisou o pedido do requerente de ser eximido da obrigação imposta de assunção da interinidade do Serviço de Registro Civil das Pessoas Naturais, e Registro de Títulos e Documentos e Civil das Pessoas Jurídicas de Pontal do Paraná/PR, onde se afirmou que “a designação nos casos de vacância da serventia é um múnus público, que inadmite recusa, salvo se for por motivo absolutamente justificável” (Id. 4657324, fl. 6) é diametralmente contrário a outro acórdão, proferido no mesmo caso do peticionário, também pelo mesmo órgão, mas em 05/10/2018, onde o colegiado concluiu que em havendo recusa expressa, seria possível a renúncia, nos termos do que preconiza o artigo 39, inciso IV, da Lei nº 8.935/94. Com efeito, com relação ao assunto, o Desembargador MARCUS VINÍCIUS DE LACERDA COSTA ressaltou, em seu voto vencido, que o segundo julgado era contraditório ao primeiro e ofendia a coisa julgada administrativa. A propósito, os seguintes fragmentos do voto (Id. 4657326):

(...)

Outrossim, não obstante entendimento do Conselho da Magistratura no sentido de que a designação nos casos de vacância da serventia é um múnus público, que inadmite recusa, salvo se for por motivo absolutamente justificável, induvidoso que o Colegiado, em julgamento datado de 05 de outubro de 2018, nos presentes autos, proveu o recurso interposto pelo ora recorrente, entendendo pela possibilidade da renúncia, na dicção do artigo 39, inciso IV, da Lei 8.935/94.

(...)

Assim, não poderia o sr. Jorge Susumo Seino ser novamente designado, em flagrante desrespeito ao julgado.

(...)

Isso porque o acórdão foi enfático ao assentar que “sem que exista obrigação decorrente de lei, não há efetivamente, como se impor ao recorrente a designação precária de serventia extrajudicial sem que tenha efetivo interesse em assumi-la”.

Reforçando tal entendimento, merece destaque o provimento final do aresto, para o efeito de EXCLUIR o recorrente da designação para responder provisoriamente pelo Serviço de Registro Civil das Pessoas Naturais e do Serviço de Registro de Títulos e Documentos e Civil das Pessoas Jurídicas da Comarca de Pontal do Paraná.

De consequência, o acórdão expressamente reconheceu o direito de recusa do sr. Jorge. Eventual interpretação no sentido de que a exclusão estaria se dando, naquele momento, porque primeiro seria necessário consultar os demais agentes delegados não reflete o entendimento do Colegiado.

Observe-se o seguinte trecho do acórdão:

Nesses termos, sem que exista obrigação decorrente de lei, não há, efetivamente, como se impor ao Recorrente a designação precária de serventia extrajudicial sem que tenha efetivo interesse em assumi-la.

A medida nem mesmo transparece ser condizente com a conveniência da Administração, posto que o próprio Recorrente está enfatizando não dispor de vontade e nem de condições materiais para dar adequado atendimento aos serviços notariais e de registro em questão, logo, sendo temerário mantê-lo com essas atribuições.

O julgado reconhece ser impossível “impor designação precária” de serventia, sem que o recorrente tivesse interesse em assumi-la e “temerário” manter o sr. Jorge como designado para a serventia vaga, por não dispor de vontade e nem de condições materiais para prestar o atendimento adequado.

(…)

Assinale-se que não obstante a coisa julgada administrativa não possua o mesmo alcance da coisa julgada judicial, “significa que certa questão foi resolvida por definitivo administrativamente, porém, tal caso pode ser levado à análise do judiciário” (cf. escólio de José Santos Carvalho Filho, Manual de Direito Administrativo, 14ª edição, 2005, Ed. Lumen Juris).

Também, o caso em comento não enseja o exercício do poder de autotutela, reconhecido no enunciado 473 do STF: “A administração pode anular seus próprios atos, quando eivados de vícios que os tornam ilegais, porque deles não se originam direitos; ou revogá-los, por motivo de conveniência ou oportunidade, respeitados os direitos adquiridos, e ressalvada em todos os casos, a apreciação judicial”, eis que não é a ilegal, nem inconstitucional.

De mais a mais, como bem como bem pontuou a il. Min. Laurita Vaz, “não pode o administrado ficar sujeito indefinidamente ao poder de autotutela do Estado, sob pena de desestabilizar um dos pilares mestres do estado democrática do direito, qual seja, o princípio da segurança das relações jurídicas” (Resp. 645.856-RS).

Com essas considerações, a Coordenadoria de Gestão de Serviços Notarias e de Registro da Corregedoria Nacional de Justiça opina pelo provimento do presente Procedimento de Controle Administrativo, para o fim de revogar a Portaria nº 08/2022, que designou o requerente para responder pelo Serviço de Registro Civil das Pessoas Naturais, Serviço de Registro de Títulos e Documentos e Civil das Pessoas Jurídicas da Comarca de Pontal do Paraná (CNS 15.482-3), tendo em vista a contrariedade expressa do mencionado ato administrativo ao texto da Constituição Federal, à Lei nº 8.935/94 e ao Provimento CNJ nº 77/2018.

É o parecer.

 

Ante o exposto, haja vista a manifestação da Corregedoria Nacional de Justiça coaduna-se com os termos da medida liminar previamente concedida, acolho na íntegra as conclusões externadas no parecer da Coordenadoria de Gestão de Serviços Notariais e de Registro e voto pela procedência do pedido, para anular a Portaria nº 08/2022, que designou o requerente para responder pelo Serviço de Registro Civil das Pessoas Naturais, Serviço de Registro de Títulos e Documentos e Civil das Pessoas Jurídicas da Comarca de Pontal do Paraná (CNS 15.482-3), tendo em vista a contrariedade expressa do mencionado ato administrativo ao texto da Constituição Federal, à Lei nº 8.935/94 e ao Provimento CNJ nº 77/2018. 

É como voto.

Publique-se nos termos do art. 140 do RICNJ[1]. Em seguida, arquive-se independentemente de nova conclusão. 

                  À Secretaria processual para providências. 

Brasília/DF, data registrada em sistema.

 

Pablo Coutinho Barreto

Conselheiro Relator



[1] Art. 140. As decisões, atos regulamentares e recomendações do CNJ serão publicados no Diário da Justiça da União e no sítio eletrônico do CNJ.