Conselho Nacional de Justiça

Gabinete da Conselheira Jane Granzoto

 

Autos: PROCEDIMENTO DE CONTROLE ADMINISTRATIVO - 0000536-69.2022.2.00.0000
Requerente: DIOGO TADEU TEIXEIRA FALEIRO
Requerido: TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE MATO GROSSO DO SUL - TJMS

 

 

EMENTA: RECURSO NO PROCEDIMENTO DE CONTROLE ADMINISTRATIVO. CONCURSO PARA OUTORGA DE DELEGAÇÕES DE SERVENTIAS NO ESTADO DO MATO GROSSO DO SUL. LEI Nº 8.935/1994. RESOLUÇÕES CNJ Nº 80/2009 E 81/2009. ILEGITIMIDADE AD CAUSAM. CONHECIMENTO DE OFÍCIO. REORGANIZAÇÃO DE UNIDADES EXTRAJUDICIAS, MEDIANTE ACUMULAÇÃO/ DESACUMULAÇÃO DE SERVIÇOS, QUE NÃO SE CONFUNDE COM A CRIAÇÃO DE NOVAS SERVENTIAS. PROIBIÇÃO DE USO DE MATERIAL IMPRESSO. INEXISTÊNCIA DE VIOLAÇÃO AO PRINCÍPIO DA ISONOMIA. AUSÊNCIA DE FATOS NOVOS. RECURSO CONHECIDO E NÃO PROVIDO.  

1. Recurso Administrativo no Procedimento de Controle Administrativo contra decisão monocrática que julgou o pedido improcedente ao não reconhecer a ocorrência de ilegalidades na republicação do Edital nº 1/2019 do Concurso Público para Outorga e Delegação de Serviços Notariais e Registrais em serventias no Estado do Mato Grosso do Sul.  

2. Pedido conhecido de ofício em razão de o recorrente não ostentar a condição de interessado, pois sequer se inscreveu no certame. Precedentes.  

3. Parecer da Coordenadoria de Gestão de Serviços Notariais e de Registro da Corregedoria Nacional de Justiça – CONR/CN, pelo desprovimento do recurso.

4. A republicação do edital renovou todas as regras anteriormente veiculadas, preservando-se o direito dos(as) já inscritos(as) e dos(as) novos(as) interessados(as) de concorrerem às vagas. Não houve a ocorrência de elemento surpresa e daí preservado o princípio da vinculação ao instrumento convocatório.  

5. A reorganização dos serviços vagos operada por leis estaduais, com o inequívoco registro dessa condição no edital, não envolveu a criação de novas delegações, apenas reestruturou (acumulou/desacumulou) as atividades que já estavam destituídas de titular.  

6. As leis também não podem ser compreendidas como o marco para se definir a vacância das serventias ofertadas, já que a reorganização  não constitui causa de extinção da delegação, estas previstas no art. 39, da lei nº 8.935/1994.  

7.  A ausência de fatos novos não autoriza a modificação da decisão combatida. 

8. Recurso conhecido e, no mérito, não provido. 

 

 ACÓRDÃO

O Conselho, por unanimidade, negou provimento ao recurso, nos termos do voto da Relatora. Ausentes, em razão das vacâncias dos cargos, os representantes do Ministério Público da União e da Câmara dos Deputados. Presidiu o julgamento o Ministro Luís Roberto Barroso. Plenário, 17 de outubro de 2023. Presentes à sessão os Excelentíssimos Senhores Conselheiros Luís Roberto Barroso, Luis Felipe Salomão, Vieira de Mello Filho, Mauro Pereira Martins, Salise Sanchotene, Jane Granzoto, Richard Pae Kim, Marcio Luiz Freitas, Giovanni Olsson, João Paulo Schoucair, Marcos Vinícius Jardim Rodrigues, Marcello Terto e Luiz Fernando Bandeira de Mello.

Conselho Nacional de Justiça

Gabinete da Conselheira Jane Granzoto

Autos: PROCEDIMENTO DE CONTROLE ADMINISTRATIVO - 0000536-69.2022.2.00.0000
Requerente: DIOGO TADEU TEIXEIRA FALEIRO
Requerido: TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE MATO GROSSO DO SUL - TJMS


            RELATÓRIO

 

        A EXCELENTÍSSIMA SENHORA CONSELHEIRA JANE GRANZOTO (RELATORA): Trata-se de recurso administrativo interposto por Diogo Tadeu Teixeira Faleiro (Id. 4623385) contra decisão terminativa que julgou o pedido improcedente (Id. 4605477). 

            Reproduzo, inicialmente, o relatório da decisão recorrida: 

Trata-se de Procedimento de Controle Administrativo (PCA), com pedido liminar, proposto por DIOGO TADEU TEIXEIRA FALEIRO em desfavor do TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO MATO GROSSO DO SUL (TJMS) que teria incorrido em erros graves ao republicar o Edital nº 01/2019 do Concurso Público para Outorga e Delegação de Serviços Notariais e Registrais do Estado. 

O requerente explica que no dia 3.12.2019 o requerido publicou o referido edital, mas que não se inscreveu no concurso por não haver delegações que lhe interessassem.

Em virtude da reorganização das serventias estaduais realizadas pelas Leis nº 5.509/2020 e 5.644/2021, em 18.1.2021, relata ter havido a republicação do edital para incluir as novas unidades no certame, com reabertura das inscrições, mas que o instrumento estaria eivado dos seguintes vícios: a) há notório equívoco entre as delegações republicadas e as ofertadas depois de reorganizadas pelas leis citadas (as desacumulações e as acumulações da lei Estadual não seriam compatíveis com as serventias que foram republicadas); b) as datas de vacância das serventias recém-criadas (desacumuladas e acumuladas) estariam erradas, pois se considerou o dia em que vagou uma das serventias acumuladas, e não a de criação da nova unidade (21.05.2020); c) violação ao princípio da isonomia quando o edital estabeleceu que para a realização da prova escrita e prática estaria vedada a consulta a cópias xerográficas de legislação, obrigando, os(as) candidatos(as) a adquirirem o Código de Normas da Corregedoria-Geral da Justiça do Mato Grosso do Sul (CGJ/MS) publicado pela Associação dos Notários e Registradores do Estado do Mato Grosso do Sul (Anoreg/MS) pelo valor de R$ 199,00.

Descreve as reorganizações operadas pela Lei nº 5.644/2021, mas assevera que as localizadas nas comarcas de Batayporã, BelaVista, Deodápolis, Mundo Novo e Nioaque não existem, sendo necessária a nova publicação do edital.

Quanto à Lei nº 5.509/2020, o requerente relata a existência de equívoco nas datas das vacâncias dos serviços “que, mediante desacumulação e acumulação de serviços, promoveu a reorganização das unidades extrajudiciais das comarcas de Água Clara, Aparecida do Taboado, Bataguassu, Pedro Gomes, Rio Negro e Sonora”. Explana que, nessas localidades, os agentes delegados tiveram de optar por uma das serventias recém-criadas e aquela que permaneceu vaga por não ter sido escolhida pelo titular dos serviços desacumulados foi oferecida no concurso pelo edital nº 1/2019.

Entende, porém, que essas unidades “não foram incluídas na lista de vacância com base na data da sua criação (qual seja, 21.05.2020 – data de publicação da Lei n. 5.509/2020). O TJMS, em patente violação à realidade, adotadou como data de vacância, para essas serventias recém-criadas, o dia em que um dos serviços que compõem a nova serventia se encontrava vago” (sic).

Resume seu entendimento no seguinte trecho: “a data de vacância de um serviço acumulado não pode englobar os demais serviços que compõem a nova serventia (recém-criada) e estavam providos até o dia em que foi publicada a legislação responsável pela acumulação – [...] essa sim, portanto, que deve ser a data de vacância dessa nova serventia acumulada (recém-criada)”.

O requerente consigna que a adoção da data correta da extinção da titularidade é que define o critério de preenchimento da serventia, nos termos do art. 16, caput e parágrafo único, da Lei nº 8.435/1994: “[a]s vagas serão preenchidas alternadamente, duas terças partes por concurso público de provas e títulos e uma terça parte por meio de remoção, mediante concurso de título” e “[p]ara estabelecer o critério do preenchimento, tomar-se-á por base a data de vacância da titularidade ou, quando vagas na mesma data, aquela da criação do serviço”, sob pena de inevitável influência indevida na ordem das serventias vagas por provimento e por remoção.

Alega ainda contradição no edital quando o instrumento impõe a todos os(as) candidatos(as) a aquisição do Código de Normas da Corregedoria-Geral da Justiça do Mato Grosso do Sul, no valor de R$ 199,00 (cento e noventa e nove reais) (item 8.9), ao tempo em que isenta da taxa de inscrição preliminar, de R$ 300,00 (trezentos reais), o(as) concorrentes comprovadamente desempregados(as) ou carentes (item 3.5.2), o que violaria o princípio da isonomia. Sustenta que se o(a) candidato(a) não possui condição financeira de pagar a inscrição, também não poderia investir na compra do material exigido, que pode ser consultado gratuitamente na internet, baixado e impresso.

Afirma que, mesmo quando questionado, o TJMS manteve a proibição do uso de cópias na segunda fase do concurso “que, em razão de outros tribunais não contarem com versão impressa e comercializada do Código de Normas, alguns editais permitiram a utilização de cópias impressas nas provas, o que não é o caso do TJMS, pois, seu Código de Normas foi publicado pela Anoreg/MS e também pela Livraria Spessoto”.

Ao justificar a necessidade de concessão da medida liminar para suspender a avaliação marcada para o dia 6.2.2022, além de reiterar os argumentos anteriormente expostos, se refere à delicada situação de saúde pública vivida em razão do aumento dos casos de Covid pelo avanço da variante Ômicron, levando companhias aéreas a cancelarem voos, com entendimento de que a realização da prova presencial colocaria em risco a saúde dos(as) candidatos(as) e profissionais envolvidos(as) na aplicação da avaliação.

Destaca seu atual interesse em se inscrever no certame com edital republicado de forma regular.

Assim, o requerente pugna pela concessão de medida liminar para determinar “a republicação do Edital n. 01/2019, corrigindo os três vícios apontados neste PCA e, por consequência, reabrindo o prazo para realização das inscrições; ou, caso assim não entenda, suspender a prova escrita (designada para o próximo domingo, dia 06.02.2022) até decisão de mérito a ser proferida neste PCA sobre tais vícios – tanto em respeito ao princípio da eficiência (CR/88, art. 37, caput) [...] quanto em função da gravíssima situação atual da pandemia da COVID-19, que não recomenda a realização de uma prova escrita presencial neste momento (periculum in mora).

Quanto ao mérito, requer a procedência dos pedidos para determinar ao TJMS a republicação do Edital nº 01/2019, corrigindo todos os vícios apontados no procedimento.

Reconheci a prevenção deste feito em razão da existência do Procedimento de Controle Administrativo nº 0000514-11.2022.2.00.0000, previamente distribuído à minha relatoria, que impugnou o mesmo edital de concurso, pretendendo fosse autorizado o uso de material impresso na segunda fase do concurso (Id’s 4600254, 4601189). Na oportunidade, determinei a intimação do TJMS para prestar esclarecimentos.

Em resposta, quanto à suposta divergência entre as serventias republicadas pelo edital nº 1/2019 em 18.01.2021 e aquelas reorganizadas pela lei estadual nº 5.644/2021, o TJMS explica que, quando da republicação deste, estabelecendo a reabertura das inscrições e a inclusão de novas serventias, foi publicada a relação das delegações vagas no anexo I. Enfatiza que “na relação, em decorrência da reorganização das serventias notariais e registrais das Comarcas de Batayporã, Bela Vista, Deodápolis, Mundo Novo e Nioaque, promovidas pela mencionada lei, foi incluída uma observação, na forma de dois asteriscos (**), dando conta de que, naquele momento (republicação do edital), as serventias de n° 55 (Batayporã), 56 (Bataguassu), 57 (Nioaque), 58 (Bela Vista), 59 (Deodápolis) e 60 (Mundo Novo) – tramitava proposta de reorganização das serventias notariais e registrais, visando à reorganização dos serviços (autos n° 012.152.0087/2020), o que posteriormente veio a ser confirmado com edição da lei estadual nº 5.644, de 15.4.2021”.

Esclarece que, a partir da publicação da lei, por não ter sido criado nenhum serviço novo, fez-se apenas a reorganização das delegações, garantindo aos titulares daquelas unidades que possuíam uma especialidade reorganizada o direito de permanecer com uma delas. A Corte observa que, realizado o direito de opção, a outra serventia reorganizada e que se encontrava vaga foi disponibilizada no concurso (DJ-e nº 4722, de 10.5.2021).

Relacionado às supostas inconsistências das datas de vacâncias, a Corte explica que a lei estadual nº 5.509/2020, de 20.5.2020, reorganizou as unidades de notas e de registro nas Comarcas de Água Clara, Aparecida do Taboado, Bataguassu, Pedro Gomes, Rio Negro e Sonora e em 18.1.2021 o edital foi republicado, estabelecendo a reabertura das inscrições e ofertando novas delegações.

Para melhor compreensão do tema, o TJMS faz distinção entre os institutos da acumulação, anexação e desacumulação os quais não se confundem com criação de serviço, como afirma o requerente. Segundo lições doutrinárias, “a criação consiste na constituição de nova serventia em razão de instituição de novo município ou comarca, de desmembramento da jurisdição ou desdobramento de competência de Serventia já existente, a acumulação/desacumulação diz respeito, tão somente, à movimentação de atribuições/especialidades desenvolvidas por determinados cartórios, dentro de uma mesma jurisdição territorial”, conceitos replicados no art. 1.921, do Código de Normas da Corregedoria-Geral de Justiça.

Assim, esclarece que a Lei nº 5.509/2020 não teria criado nenhuma nova delegação, mas apenas as reorganizou (mediante acumulação/desacumulação). Informa ainda que todos os cartórios extrajudiciais disponibilizados para ingresso possuem atribuição que já estavam sob a responsabilidade de interino antes da reorganização, portanto, vago na data da republicação do edital, em 18.1.2021.

A Corte explana que na desacumulação de atribuição de serventia provida e sua posterior acumulação com outro vago, sob a responsabilidade de interino, prevaleceria a data de vacância do serviço vago, como efetivamente constou no Anexo I do edital republicado, pois o instituto não está previsto no rol do art. 39, da lei nº 8.935/1994 como uma das hipóteses de extinção de titularidade.

Sobre a suposta violação ao princípio da isonomia, diante da necessidade de os(as) concorrentes adquirirem o Código de Normas da Corregedoria, ressalta que a mesma questão está sendo tratada no PCA nº 0000514-11.2022.2.00.0000. Explica que candidatos(as) ao certame questionaram a Comissão do V Concurso Público para Outorga e Delegação de Serviços Notariais e Registrais sobre o uso de material impresso na internet na fase escrita e prática a ser realizada no dia 6.2.2022, nos seguintes termos (Id 4602963):

1. Pode ser utilizado o Código de Normas impresso pelo sítio eletrônico do Tribunal de Justiça ou apenas aquele disponibilizado pela ANOREG?

2. A impressão dos Provimentos e Resoluções do CNJ para consulta é permitida?

Relata que a comissão ofertou a seguinte resposta: “permanece proibida a utilização de qualquer material impresso sem contato, sejam documentos, imagens, entre outros”, em observância aos itens 8.9 e 8.9.1 do edital de abertura, ao item II do edital de convocação para referida fase, ambos em obediência à Resolução CNJ nº 81/2009.

A Corte afirma que esclareceu aos(às) interessados(as) que, dentre o material autorizado para consulta, existiria o Código de Normas da Corregedoria-Geral de Justiça, publicado pela Anoreg-MS, e o Vade Mecum dos Cartórios do Estado de Mato Grosso do Sul, publicado por editora do Estado de São Paulo, no qual constaria normas estaduais, federais, do Conselho Nacional de Justiça, além do próprio Código de Normas local, mas que não vinculou a aquisição de nenhuma obra especificamente.

Ainda observa sobre a dificuldade de fiscalização do material impresso, caso fosse permitido, pois passível de inserção fraudulenta de conteúdo indevido.

Por não vislumbrar prejuízo aos(às) candidatos(as) ou desigualdade concorrencial, o TJMS manteve a proibição de consulta a fontes impressas ou fotocopiadas.

Avalia que a isenção da taxa de inscrição não tem correlação com a aquisição de materiais, já que a Corte não exigiu no edital a aquisição de obra de editora específica.

Todavia, ressalvou que, caso assim não se entenda e se defira o pedido liminar, pede que se observem os seguintes requisitos de validade no deferimento da medida:

1. A legislação impressa deverá ser retirada de páginas de internet oficiais, havendo obrigatoriamente impressa a fonte (endereço eletrônico) de origem, sob pena de proibição do uso;

2. O material deverá ser grampeado e/ou encadernado de forma conjunta, sem folhas soltas/avulsas;

3. Aplicam-se a estes materiais as proibições gerais dispostas no edital de convocação, quanto a comentários, anotações, marcações, post-it, etc;

4. O horário da abertura dos portões passará a ser às 11h30, recomendando-se que os candidatos compareçam com 90 (noventa) minutos de antecedência ao horário de início das provas, para que haja tempo hábil para a realização da vistoria dos materiais.

Por fim, informa que em 20.1.2022 foi proferida decisão mantendo a data prova escrita e prática do concurso para o dia 6.2.2022, com rigorosa a observância de normas de biossegurança para a realização do evento.

É o relatório.

 

            O recurso reitera toda a matéria fática exposta na exordial.

      De início, o recorrente arrazoa sobre a necessidade de adequação do edital nº 1/2019 à Lei Estadual nº 5.644/2021, pois “as serventias constantes do Edital devem estar de acordo com aquelas criadas pela legislação do ente federado, sob pena de violação ao princípio da vinculação ao instrumento convocatório”. Sustenta que as unidades constantes de projeto de lei só poderiam ser incluídas em concurso após a conversão deste, com a reorganização consolidada, no intuito de assegurar a transparência e a segurança jurídica do certame, uma vez que o serviço acumulado/desacumulado poderia gerar interesse ou desinteresse entre os candidatos.

            Além disso, afirma que a ilegalidade no proceder do Tribunal estaria na oferta de serventias diversas daquelas que estariam disponíveis para escolha, já que os cartórios de Batayporã, Bela Vista, Deodápolis, Mundo Novo e Nioaque não mais existem na forma como foram republicadas no edital, após a edição da Lei nº 5.644/2021.

            Em seu entender, a decisão combatida não teria enfrentado a questão relativa à violação ao instrumento convocatório. Eventual precedente gerado com este julgamento, conferiria aos tribunais carta branca na elaboração de seus editais, caso estes apenas indiquem com asteriscos as serventias ainda não definidas, que permitiria a alteração posterior das unidades de forma discricionária.

          Refere-se também a equívocos quanto à data da vacância das delegações das comarcas de Água Clara, Aparecida do Taboado, Bataguassu, Pedro Gomes, Rio Negro e Sonora, reorganizadas pela Lei Estadual nº 5.509/2020, ao alegar que os serviços teriam se tornado vagos em 21.5.2020, data da publicação da lei, uma vez que houve verdadeira criação de novas unidades e não reorganização, assim como defendeu o TJMS.

            Explica que a “data de vacância de um serviço acumulado não pode englobar os demais serviços que compõem a nova serventia (recém-criada) e estavam providos até o dia em que foi publicada a legislação responsável pela acumulação – essa sim, portanto, que deve ser a data de vacância dessa nova serventia acumulada (recém-criada)”.

            O recorrente aduz que a adoção da data correta define o critério de preenchimento, se por provimento (duas terças partes), ou se por remoção (uma terça parte), de acordo com o que prescreve o art. 16, da Lei nº 8.935/1994, caso contrário, haverá influência indevida na ordem da lista das unidades vagas.

            Por esse motivo, defende a republicação do edital nº 1/2019 para considerar o dia 21.5.2020 (data de publicação da Lei n. 5.509/2020) como o marco das vacâncias.

            O recorrente também faz alusão à violação da isonomia, em razão da vedação editalícia do uso de apostilas/material impresso, o que obrigaria os candidatos, inclusive os beneficiados pela isenção da taxa de inscrição, a adquirir o Código de Normas da Corregedoria-Geral da Justiça do Mato Grosso do Sul, de elevado custo (R$ 199,00), argumento que alega não ter sido apreciado na monocrática, já que o ato apenas teria reproduzido as informações apresentadas pelo Tribunal.

            Por fim, pede pela reconsideração da decisão ou, se esse não for o entendimento, que haja submissão do recurso ao Plenário para ser deferido o pedido de republicação do edital, conforme sustentado.

            Em sede de contrarrazões (Id. 4642630), o Tribunal entende que o recurso não apresenta nenhum fato diverso dos já analisados, além de o prazo para impugnação ao edital, de 15 (quinze) dias, ter se esgotado há muito.

              Sobre a alegada divergência entre os cartórios constantes na republicação do edital nº 1/2019, em 18.1.2021, e aquelas reorganizadas pela lei estadual nº 5.644/2021, o recorrido explica ter inserido a observação, indicada por dois asteriscos (**), sobre a tramitação de proposta de reorganização das serventias de nº 55 (Batayporã), 56 (Bataguassu), 57 (Nioaque), 58 (Bela Vista), 59 (Deadopólis) e 60 (Mundo Novo), posteriormente confirmada com a edição da referida lei.

            Explana que, aos delegatários detentores de uma especialidade reorganizada, lhes foi garantido o direito de permanecer com uma delas, enquanto a outra serventia reorganizada e vaga foi disponibilizada no concurso, não tendo havido a criação de novos serviços.

            Ao discorrer sobre a aventada inconsistência nas datas de vacâncias em relação às serventias reorganizadas pela Lei Estadual nº 5.509/2020 (5 – Sonora; 19 - Rio Negro; 21 – Bataguassu; 26 - Aparecida do Taboado; 43 – Pedro Gomes; e 46 - Água Clara), o TJMS enfatiza que os institutos da acumulação/anexação e desacumulação não se confundem com criação de serviço, já que, segundo doutrina citada, aquela constituiria movimentação de atribuições/especialidades desenvolvidas por determinadas unidades dentro de uma mesma jurisdição territorial, cujo conceito foi consolidado no art. 1.921 do Código de Normas da Corregedoria-Geral de Justiça.

            Assinala que todas as delegações disponibilizadas no edital, e ora impugnadas, possuíam atribuição que já estava sob a responsabilidade de interino antes da reorganização, estando vaga na data da republicação do instrumento convocatório (em 18.1.2021), além de o art. 39, da Lei nº 8.935/1994, não elencar a desacumulação como uma das hipóteses de extinção da delegação.

            O recorrido afasta a ocorrência de violação à isonomia em relação à proibição de uso de material impresso, pois além de a prova já ter sido realizada, este Conselho teria apreciado a questão nos autos do PCA nº 0000514-11.2022.2.00.0000.

            Consigna que o item 5.6.1, da Resolução CNJ nº 81/2009, permite a consulta à legislação não comentada ou à anotada, mas veda a utilização de obras que contenham formulários, modelos e anotações pessoais, inclusive apostilas, o que foi seguido desde a publicação do edital de abertura em 2019.

            Pontua, além disso, a inexistência de vinculação à utilização de material fornecido por apenas uma editora e ressaltou que a isenção de taxa de inscrição não possui correlação com a aquisição de material, porquanto não se exigiu no edital a aquisição de obras específicas.

            Em 14.10.2022 solicitei parecer da Coordenadoria de Gestão dos Serviços Notariais e de Registros, da Corregedoria Nacional de Justiça, apresentado no Id 5059692.

            É o relatório. 

 

  

 

 

Conselho Nacional de Justiça

Gabinete da Conselheira Jane Granzoto

 

Autos: PROCEDIMENTO DE CONTROLE ADMINISTRATIVO - 0000536-69.2022.2.00.0000
Requerente: DIOGO TADEU TEIXEIRA FALEIRO
Requerido: TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE MATO GROSSO DO SUL - TJMS

 

 

VOTO 


            A EXCELENTÍSSIMA SENHORA CONSELHEIRA JANE GRANZOTO (RELATORA): O recurso é tempestivo, razão pela qual dele conheço (Id. 4623385). 

        Com a interposição do apelo, pretende-se a reforma da decisão terminativa, prolatada pela minha antecessora, que julgou o pedido improcedente (Id. 4605477). 

          O apelo não merece prosperar, pois não se apresentam fatos novos capazes de modificar a decisão combatida, já que a pretensão recursal é idêntica com aquela apresentada na peça de ingresso. 

                  A seguir, reproduzo os fundamentos do decisum ora atacado (Id. 4605477): 

I – PRELIMINARMENTE 

I.I. Da ilegitimidade ad causam do requerente 

Deve ser observado que diante da ausência de ilegalidades, o requerente sequer seria parte interessada para propor a anulação do certame, vez que não se inscreveu na seleção: 

Entretanto, almeja a declaração de nulidade do instrumento convocatório, após o prazo de inscrição por agora possuir interesse em participar do concurso depois de reorganizadas as serventias, como deixado patente em sua petição inicial:

 A dicção do art. 9º, inciso I, da Lei nº 9.784/1999 é clara na definição dos legitimados como interessados para o processo administrativo: pessoas físicas ou jurídicas que o iniciem como titulares de direitos ou interesses individuais ou no exercício do direito de representação.

Carece de direito aquele que sequer participa do certame, e por isso não titulariza em sua esfera jurídica a prerrogativa de fiscalizar e reclamar a participação em um processo seletivo público hígido. 

No entanto, ultrapasso a barreira da legitimidade e conheço de ofício o presente por vislumbrar a necessidade de analisar os argumentos ora colocados no intuito de averiguar eventual ilegalidade no certame para ingresso na atividade notarial e registral do Estado do Mato Grosso do Sul. 

II – DO MÉRITO 

Convém apreciar os inconformismos em tópicos distintos.

Possível equívoco entre as serventias republicadas e as ofertadas depois de reorganizadas pela Lei Estadual nº 5.644/2021:

Na peça de ingresso, o requerente alega que:

Como se vê, as serventias que foram republicadas pelo Edital n. 01/2019 (DOC_3) 18.01.2021 (em especial as localizadas nas comarcas de Batayporã, Bela Vista, Deodápolis, Mundo Novo e Nioaque) não existem, razão pela qual deve ser feita, mais uma vez, uma nova publicação desse Edital, retificando as serventias ofertadas em conformidade com a Lei Estadual n. 5.644/2021 (DOC_5) (sic).

Importante observar que os cartórios extrajudiciais citados receberam a seguinte ressalva na republicação:

Quanto ao ponto, o tribunal explica que (Id 4602963):

Quando da republicação do edital, em 18.1.2021, estabelecendo a reabertura das inscrições e a inclusão de novas serventias (mencionadas abaixo), foi publicada a relação das serventias vagas no anexo I.

Naquela relação, em decorrência da reorganização das serventias notariais e registrais das Comarcas de Batayporã, Bela Vista, Deodápolis, Mundo Novo e Nioaque, promovidas pela mencionada lei, foi incluída uma observação, na forma de dois asteriscos (**), dando conta de que, naquele momento (republicação do edital), as serventias de n° 55 (Batayporã), 56 (Bataguassu), 57 (Nioaque), 58 (Bela Vista), 59 (Deodápolis) e 60 (Mundo Novo) – tramitava proposta de reorganização das serventias notariais e registrais, visando à reorganização dos serviços (autos n° 012.152.0087/2020), o que posteriormente veio a ser confirmado com edição da lei estadual nº 5.644, de 15.4.2021.

 Veja-se que a proposta de Projeto de Lei que dispôs sobre a reorganização das serventias notariais e de registros (incluídas na republicação do edital) na sede das Comarcas de Batayporã, Bela Vista, Deodápolis, Mundo Novo e Nioaque, foi aprovada pelo Órgão Especial deste Tribunal de Justiça, em 16.12.2020, sendo o projeto encaminhado e recebido na Assembleia Legislativa de Mato Grosso do Sul em 17.12.2020, com a posterior aprovação na lei estadual nº 5.644, de 15.4.2021.

Portanto, resta evidente que, quando da republicação do edital, em 18.1.2021, já tramitava na Assembleia Legislativa o supramencionado projeto de lei, conforme anexo.

Assim, com a publicação da lei estadual em questão, como não foi criado nenhum serviço novo, fez-se a reorganização das serventias, garantindo aos delegatários (titulares) daquelas serventias que possuem uma especialidade reorganizada o direito de permanecer com uma daquelas especialidades.

Com isso, em razão do direito de opção realizado pelo titular, a outra Serventia reorganizada e que se encontrava vaga está disponibilizada no V concurso, com a conseguente publicação no diário da justiça nº 4722, em 10.5.2021, bem como na página oficial do concurso, da relação de todas as serventias notariais e de registro vagos e disponibilizados no concurso (sic).

Em linhas rápidas, o que o TJMS expõe é que houve registro no edital sobre a existência da proposta de reorganização das serventias assinaladas. Em 18 de janeiro de 2021, republicou-se o edital enquanto tramitava na Assembleia Legislativa o projeto de lei respectivo, que devidamente aprovado, veio ao mundo jurídico posteriormente, em 15.4.2021.

Porém, os titulares das serventias que detinham uma especialidade reorganizada exerceram o direito de permanecer com uma delas e por isso houve a modificação da descrição da natureza da unidade ofertada no concurso.

Assim, não assiste razão ao requerente.

Necessidade de adequação do Edital n. 01/2019 à Lei Estadual n. 5.509/2020: inconsistência na data de vacância das novas serventias criadas pela referida legislação do ente federado

Novamente o requerente se equivoca já que a lei em questão é clara ao enunciar sobre a “reorganização” e não criação de serventias, como se depreende da leitura da rubrica da norma (Id 4600240):

 

Se observa que novamente o TJMS incluiu no edital a ressalva quanto à tramitação de proposta de reorganização das unidades mencionadas pelo requerente (Id 4600243):

 

Com efeito, desde a primeira publicação houve o destaque para a situação das delegações.

Portanto, resta claro o entendimento de que o termo inicial da vacância não seria a data da publicação da Lei nº 5.509, de 20 de maio de 2020, mas aquela em que ocorreu uma das hipóteses de extinção da delegação, previstas no art. 39, da Lei nº 8.935/1994 (morte; aposentadoria facultativa; invalidez; renúncia; perda da delegação; descumprimento, comprovado, da gratuidade estabelecida na Lei no 9.534, de 10 de dezembro de 1997), como bem observou o TJMS.

Por percucientes, novamente reproduzo trecho das informações da Corte:

Assim, como visto, a argumentação do postulante não prospera.

Suposta violação à isonomia: compra obrigatória, para participar da prova escrita, do Código de Normas da Corregedoria-Geral da Justiça do Mato Grosso do Sul junto à ANOREG/MS pelo valor de R$ 199,00

Sobre as normas que regem o certame na referida fase, vale destacar os termos do edital de abertura e o de convocação quando estabeleceram as seguintes regras (Id’s 4600243; 4600241):

Edital de abertura:

Republicação de 19.1.2021:

A minuta da Resolução CNJ nº 81/2009, que dispôs sobre os concursos públicos de provas e títulos para a outorga das Delegações de Notas e de Registro, estabelece que:

5.6. A Prova Escrita e Prática consistirá numa dissertação e na elaboração de peça prática, além de questões discursivas.

5.6.1. Será permitida, na Prova Escrita e Prática, a consulta à legislação não comentada ou anotada, vedada a utilização de obras que contenham formulários, modelos e anotações pessoais, inclusive apostilas.

 

Da leitura dos dispositivos, observa-se que, embora o edital tenha minudenciado as hipóteses proibitivas, não destoou do espírito almejado pela norma deste Conselho que foi o de vedar o uso de material potencialmente suscetível de alteração, que poderia viabilizar a ocorrência de fraudes diante das dificuldades naturais para a fiscalização minuciosa dos impressos e ocasionar a concorrência desleal.

A existência de publicações oficiais, assim como referido pelo Tribunal, supriria eventual necessidade de os(as) candidatos(as) consultarem fontes impressas para a realização da prova escrita e prática.

E quanto aos Tribunais que permitem o uso do material da forma como pretende o requerente, em sua maioria, assim o fazem por não disporem de publicações oficiais de suas normas. Hipótese diversa ocorre quando essas edições não existem e para que os(as) concorrentes não restem prejudicados(as), é comum que as Cortes promoventes do concurso autorizem o uso de impressões obtidas em sites oficiais.

O fato de o requerente não ter se inscrito no concurso e fatalmente não realizar a prova no dia 6.2.2022, o destitui da condição de interessado na suspensão da fase por razões de proteção da saúde contra a transmissão do Corona vírus.

Outrossim, segundo informações do Consórcio formado pelos veículos Folha, UOL, O Estado de S. Paulo, Extra, O Globo e G1, o Brasil possui 70,2% da população brasileira com o ciclo vacinal completo, o que demonstra que embora as variantes do vírus ainda circulem entre nós, há um número grande de imunizados(as) que, aliado aos cuidados de proteção e higiene, reduz-se significativamente a transmissibilidade do vírus.

Dessa forma, é preciso compatibilizar os interesses para que haja a continuidade da prestação dos serviços públicos por delegatários regularmente aprovados em concurso público.

Por todo exposto, JULGO IMPROCEDENTE o pedido formulado na inicial, nos termos do artigo 25, X, do Regimento Interno do Conselho Nacional de Justiça. Prejudicado o pedido liminar.

Após as comunicações de praxe, arquivem-se os autos.

Brasília, data registrada no sistema.

Tânia Regina Silva Reckziegel

Conselheira relatora

 

Como se observa, a monocrática apreciou os pedidos feitos pelo recorrente que, nesta sede recursal, foram renovados. 

Relembro que o pedido foi conhecido de ofício em razão de o recorrente não ostentar a condição de interessado, pois sequer se inscreveu no certame. Em julgamentos pretéritos desta Casa, se deliberou pela ausência de legitimidade ad causam “para impugnar edital de concurso público terceiro não inscrito ou que não seja representante legítimo de algum interessado”[1](CNJ - RA – Recurso Administrativo em PP - Pedido de Providências - Conselheiro - 0006125-57.2013.2.00.0000 - Rel. GILBERTO MARTINS - 183ª Sessão Ordinária - julgado em 25/02/2014). 

Sob esse entendimento, o mérito da questão foi apreciado, no intuito de averiguar a existência de eventual ilegalidade, que não se revelou. 

Além disso, quanto às referências feitas no recurso quanto à motivação “extremamente simplória” da decisão combatida e da ausência de fundamentação, cumpre-me lembrar que a jurisprudência da Suprema Corte afirma que o “art. 93, IX, da Constituição Federal exige que o acórdão ou decisão sejam fundamentados, ainda que sucintamente, sem determinar, contudo, o exame pormenorizado de cada uma das alegações ou provas” (AI 791292 QO-RG, Relator(a): GILMAR MENDES, julgado em 23/06/2010, REPERCUSSÃO GERAL). 

Entrementes, para o exame recursal, solicitei subsídios técnicos da Coordenadoria de Gestão dos Serviços Notariais e de Registros, da Corregedoria Nacional de Justiça, que assim se manifestou (Id. 4902478):

[...]

2. A questão cinge-se a três alegações.

A primeira, de que as serventias constantes do edital republicado não corresponderiam à realidade, na medida em que houve posterior reorganização pela Lei Estadual n. 5.644/2021 sem que se procedesse à nova republicação do edital, agora em conformidade com a Lei n. 5.644/2021, e nova abertura de inscrição.

Conforme o Documento de Comprovação acostado aos autos (Id 4603168), verifica-se que o Tribunal procedeu à atualização das atribuições das serventias reorganizadas pela Lei Estadual n. 5.644/21, com a consequente publicação no diário da justiça em 10/05/2021, bem como na página oficial do concurso:

“Diante da edição da Lei Estadual n.º 5.644/2021, de 15 de Abril de 2021, que dispôs sobre a reorganização das referidas serventias, mediante acumulação e desacumulação dos serviços, a relação atualizada dos serviços notariais e de registros vagos consta no Anexo I deste Edital, já considerando o exercício do direito de opção pelos titulares, conforme Autos n.ºs 126.624.0036/2021, 126.624.0037/2021, 126.624.0038/2021, 126.624.0039/2021 e 126.624.0040/2021.”

Assim, não há que se falar em incompatibilidade entre as serventias constantes do Edital e a Lei, visto que o Tribunal devidamente procedeu à atualização da lista.

Ademais, também não há que se falar em reabertura das inscrições após a publicação da Lei Estadual n. 5.644/21. Isso porque não houve adição de serventias vagas ao certame. A lista de unidades continuou a mesma. O que houve foi apenas alteração das atribuições de algumas serventias. Não parece razoável reabrir as inscrições e recomeçar o concurso sempre que houver alteração de especialidade de serventia, dado que tal fato não altera a lista de unidades vagas ofertadas inicialmente.

Por fim, em nenhum momento o TJMS faltou com o dever de informação, eis que desde o início assinalara no edital as unidades que poderiam ter suas especialidades alteradas em razão da proposta de reorganização.

Dessa forma, não se verifica irregularidade no Edital quanto a esse primeiro ponto.

Em segundo lugar, questiona-se a data de vacância dos novos serviços criados pela Lei Estadual n. 5.509/20, eis que deveria se adotar a data da publicação da Lei.

Em adição ao já explanado anteriormente, acrescentar ou retirar atribuição de uma serventia não altera o fato que deu origem à vacância daquela unidade (art. 39, da Lei 8.935/94), de modo que não há que se falar em modificação das datas de vacância das serventias constantes do edital. Usando do próprio exemplo mencionado na inicial, se um Tabelionato de Protesto de Títulos, que já se encontrava vago desde 2018, é acumulado com o serviço de Notas, sua data de vacância continua sendo 2018.

Assim, não se vislumbra irregularidade no Edital quanto a esse segundo ponto.

A terceira alegação é a de que a vedação à consulta de cópias xerográficas da legislação durante a prova violaria o princípio da isonomia.

A matéria já foi decidida no PP 0000514-11.2022.2.00.0000, com trânsito em julgado administrativo, entendendo pela possibilidade de vedação à utilização de material impresso no V Concurso Público para outorga e delegação de serventias do Estado do Mato Grosso do Sul. Decisão a seguir:

O requerente objetiva a autorização de uso de material impresso de sites oficiais na prova do V Concurso Público para outorga e delegação de serventias do Estado do Mato Grosso do Sul.

Em seu entender, “[a comissão] permitir a impressão de leis, provimentos do CNJ e código de normas de sites da internet não causa desequilíbrio algum no concurso, bem pelo contrário, fortalece a igualdade entre os candidatos que não tem acesso a compra de materiais de livrarias oficiais”.

[...]

Da leitura dos dispositivos, observa-se que, embora o edital tenha minudenciado as hipóteses proibitivas, não destoou do espírito almejado pela norma deste Conselho que foi o de vedar o uso de material potencialmente suscetível de alteração, que poderia viabilizar a ocorrência de fraudes diante das dificuldades naturais para a fiscalização minuciosa dos impressos e ocasionar a concorrência desleal.

A existência de publicações oficiais, assim como referido pelo Tribunal, supriria eventual necessidade de os(as) candidatos(as) consultarem fontes impressas para a realização da prova escrita e prática.

E quanto aos Tribunais que permitem o uso do material da forma como pretende o requerente, em sua maioria, assim o fazem por não disporem de publicações oficiais de suas normas. Hipótese diversa ocorre quando essas publicações não existem e para que os(as) concorrentes não restem prejudicados(as), é comum que as Cortes promoventes do concurso autorizem o uso dessas impressões.

Por todo exposto, JULGO IMPROCEDENTE o pedido formulado na inicial, nos termos do artigo 25, X, do Regimento Interno do Conselho Nacional de Justiça. Prejudicado o pedido liminar.

3. Com essas ponderações, a Coordenadoria de Gestão de Serviços Notariais e de Registro da Corregedoria Nacional de Justiça – CONR/CN opina pelo desprovimento do recurso.

É o parecer.

Brasília, data registrada pelo sistema.

Daniela Pereira Madeira

Juíza Auxiliar da Corregedoria Nacional de Justiça

 

Bem elaborado o parecer, adoto-o como fundamento das razões de decidir, acrescido das considerações que a seguir passo a expor.

De início, destaque-se que a pretensão possui um ponto em comum quanto à apontada divergência entre as serventias ofertadas pelo edital publicado em 18/1/2021 e as reorganizadas pela Lei nº 5.644/2021, e o pedido relacionado à inconsistência na data de vacância das unidades reorganizadas pela Lei nº 5.509/2020.

Nas duas situações, após a edição das leis, não houve criação de novos cartórios extrajudiciais, mas apenas a reorganização das atribuições das serventias vagas, seja por acumulação, seja por desacumulação, medidas essas que não estão enumeradas como hipóteses de extinção da delegação, assim como se infere da redação do art. 39, da Lei nº 8.935/1994:

Art. 39. Extinguir-se-á a delegação a notário ou a oficial de registro por:

        I - morte;

        II - aposentadoria facultativa;

        IV - renúncia;

        V - perda, nos termos do art. 35.

        VI - descumprimento, comprovado, da gratuidade estabelecida na Lei no 9.534, de 10 de dezembro de 1997.  

Pelos equívocos conceituais apresentados pelo recorrente, torna-se necessária a menção aos dispositivos legais que tratam da matéria e poderão trazer mais clareza às argumentações. A exemplo, tem-se o art. 7º, da Resolução CNJ nº 80, de 9 de junho de 2009, que declarou a vacância dos serviços notariais e de registro ocupados em desacordo com as normas constitucionais pertinentes à matéria. Veja: 

Art. 7º Os Tribunais de Justiça dos Estados e do Distrito Federal e Territórios formalizarão, no prazo de 30 dias a contar da publicação desta resolução, por decisão fundamentada, proposta de acumulações e desacumulações dos serviços notariais e de registro vagos (artigos 26 e 49 da Lei n. 8.935/1994), a qual deverá ser encaminhada à Corregedoria Nacional de Justiça; 

§ 1º Sempre que necessário, e também por meio de decisão fundamentada, serão propostas as providências previstas no art. 26, parágrafo único, da Lei Federal 8.935/94.

§ 2º Serão observados os seguintes critérios objetivos para as acumulações e desacumulações que devam ser feitas nas unidades vagas do serviço de notas e de registro, assim como acima declaradas:

a) nas Comarcas de pequeno movimento, quando não estiver assegurada a autonomia financeira, poderão ser acumuladas, excepcionalmente, em decisão fundamentada, todas as especialidades do serviço de notas e de registro, em uma única unidade;

b) nas demais Comarcas, observado o movimento dos serviços de notas e de registro, sempre que possível serão criadas unidades especializadas, evitando-se a acumulação de mais de uma das competências deferidas a notários e registradores na Lei Federal 8.935/94;

c) nas Comarcas que não comportem uma unidade para cada uma das especialidades, os serviços serão organizados de modo que os tabelionatos (tabeliães de notas e tabeliães de protestos) sejam acumulados em uma ou mais unidades; enquanto os serviços de registro (imóveis, títulos e documentos, civil de pessoa natural e civil das pessoas jurídicas, e os outros previstos na lei) componham uma ou mais unidades diversas daquelas notariais;

 

E pela pertinência, reproduzo a conceituação de criação e de desacumulação dada pelo Código de Normas da Corregedoria-Geral da Justiça do Mato Grosso do Sul:

Art. 1921 - Para os efeitos deste Código considera-se:

I - criação: é a constituição de uma nova serventia extrajudicial, notarial ou registral, em virtude de instituição de novo município ou comarca, de desmembramento da circunscrição ou de desdobramento da competência de serventia existente;

[...]

V - desacumulação: ocorre em virtude de nova distribuição de funções notariais ou de registro, entre delegatários situados em uma mesma circunscrição territorial, sempre que as funções exercidas por uma serventia venham a ser atribuídas a outra unidade extrajudicial já existente e localizado no mesmo município;

[...]

Art. 1925 - A reorganização e reestruturação dos serviços notariais e de registro depende da vacância da(s) respectiva(s) titularidade(s) afetadas, a fim de se preservar o equilíbrio econômico financeiro da delegação, reconhecendo-se ao notário e ao registrador o direito à manutenção da jurisdição territorial vinculada à sua serventia, quando provida por concurso público de provas e títulos. (Destaquei)

 

Registre-se, ainda, a “criação de novas serventias e a acumulação ou desacumulação de especialidades são providências dependentes da prévia existência de Lei autorizativa” (CNJ - RA – Recurso Administrativo em PP - Pedido de Providências - Corregedoria - 0005845-42.2020.2.00.0000 - Rel. MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA - 92ª Sessão Virtual - julgado em 10/09/2021), o que sabidamente ocorreu no âmbito do Estado. 

Com esse ponto em comum, passo a analisar os pedidos separadamente.

 

Suposto equívoco entre as serventias republicadas pelo edital de 18.01.2021 e as reorganizadas pela Lei Estadual nº 5.644, de 15 de abril de 2021.  

Sobre o possível equívoco entre as serventias republicadas e as ofertadas depois de reorganizadas por lei estadual, o recorrente alega “ser incontroverso que, nessa republicação, constam serventias diversas daquelas que estão de fato disponíveis para escolha – conforme aprovação da Lei n. 5.644/2021 (15.04.2021)”. 

Razão não lhe assiste.

O edital de 18/1/2021 expressamente enunciou sobre a reorganização das serventias notariais e de registros na sede das Comarcas de Batayporã (55), Bataguassu (56), Nioaque (57), Bela Vista (58), Deodápolis (59), Mundo Novo (60), indicando que as unidades localizadas nessas comarcas eram objeto de proposta de lei quanto à acumulação/desacumulação dos serviços (Id 4600241, fls. 40 a 41): 

 

Comarca 

Distrito/Município 

Atribuições 

Data de vacância 

Data de criação 

Situação 

Critério 

55

Batayporã**

Sede

Serviço Notarial e de Registro Civil das Pessoas Naturais e de  Interdições  e Tutelas

21/01/2020

 

VAGO

Provimento

56

Bataguassu**

Santa Rita do Pardo

Serviço Notarial e de Registro Civil das Pessoas Naturais

20/02/2020

 

VAGO

Provimento

57

Nioaque**

Sede

Serviço Notarial e De Registro Civil Das Pessoas Naturais e De Interdições e Tutelas

13/04/2020

 

VAGO

Remoção

58

Bela Vista**

Sede

Serviço Notarial, Registro de Imóveis, de Títulos e Documentos, Civil das Pessoas Jurídicas e Tabelionato de Protesto de Títulos e Outros Documentos de Dívida

28/04/2020

 

VAGO

Provimento

59

Deodápolis**

Sede

Serviço de Registro de Imóveis, de Títulos e Documentos, Civil das Pessoas Jurídicas e Tabelionato de Protesto de Títulos e Outros Documentos de Dívida.

18/05/2020

 

VAGO

Provimento

60

Mundo Novo**

Sede

Serviço de Registro de Imóveis, de Títulos e Documentos, Civil das Pessoas Jurídicas e Tabelionato de Protesto de Títulos e Outros Documentos de Dívida.

07/07/2020

 

VAGO

Remoção

**(Serventias n°s 55, 56, 57, 58, 59, 60) – Proposta de reorganização das serventias notariais e registrais, visando à acumulação/desacumulação dos serviços (PP n° 012.152.0087/2020)

 

A proposta então resultou na edição da Lei nº 5.644, de 15 de abril de 2021 (Id. 4600239), que dispôs sobre a reorganização, e não criação, insista-se, dos cartórios ofertados no edital:

Art. 1º Ficam reorganizadas as unidades extrajudiciais das comarcas de Batayporã, Bela Vista, Deodápolis, Mundo Novo e Nioaque, todas do Estado de Mato Grosso do Sul, na forma do Anexo desta Lei, mediante desacumulação e acumulação.

[...]

Art. 4º Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.

Campo Grande, 15 de abril de 2021.

 

ANEXO DA LEI Nº 5.644, DE 15 DE ABRIL DE 2021.

QUADRO PERMANENTE DOS OFÍCIOS DE JUSTIÇA DO FORO EXTRAJUDICIAL

....................................................................…

Comarca de Batayporã:

a) Serviço Notarial e Tabelionato de Protesto de Títulos e Outros Documentos de Dívida;

b) Serviço de Registro de Imóveis, de Títulos e Documentos e Civil das Pessoas Jurídicas e Civil das Pessoas Naturais e de Interdições e Tutelas;

c) Serviço Notarial e de Registro Civil das Pessoas Naturais do Município de Taquarussu.

Comarca de Bela Vista:

a) Serviço Notarial e Tabelionato de Protesto de Títulos e Outros Documentos de Dívida;

b) Serviço de Registro de Imóveis, de Títulos e Documentos e Civil das Pessoas Jurídicas e Civil das Pessoas Naturais e de Interdições e Tutelas;

c) Serviço Notarial e de Registro Civil das Pessoas Naturais do Município de Caracol.

...................................................................…

Comarca de Deodápolis:

a) Serviço Notarial e Tabelionato de Protesto de Títulos e Outros Documentos de Dívida;

b) Serviço de Registro de Imóveis, de Títulos e Documentos e Civil das Pessoas Jurídicas e Civil das Pessoas Naturais e de Interdições e Tutelas;

c) Serviço Notarial e de Registro Civil das Pessoas Naturais do Distrito de Lagoa Bonita.

....................................................................…

Comarca de Mundo Novo:

a) Serviço Notarial e Tabelionato de Protesto de Títulos e Outros Documentos de Dívida;

b) Serviço de Registro de Imóveis, de Títulos e Documentos e Civil das Pessoas Jurídicas e Civil das Pessoas Naturais e de Interdições e Tutelas;

c) Serviço Notarial e de Registro Civil das Pessoas Naturais do Município de Japorã.

....................................................................…

Comarca de Nioaque:

a) Serviço Notarial e Tabelionato de Protesto de Títulos e Outros Documentos de Dívida;

b) Serviço de Registro de Imóveis, de Títulos e Documentos e Civil das Pessoas Jurídicas e Civil das Pessoas Naturais e de Interdições e Tutelas.

............................................................” (NR)

 

Importante observar que, antes da edição da lei, as delegações vagas cumulavam, em regra, a atividade notarial com a de registros civis ou o serviço notarial com o registro de imóveis e o tabelionato de protestos, a partir do que se colhe do anexo I (relação dos serviços notariais e de registro vagos) do edital republicado (Id. 4600241, fls. 40 a 41).

Nessa conformidade, e por expressa determinação constante do art. 26, da Lei nº 8.935/1994[3], com regulamentação dada pelo art. 7º, da Resolução CNJ nº 80/2009, outrora mencionado, a regra é que não seja possível a prestação cumulativa dos serviços dispostos no art. 5º da referida lei (de notas; de registro de contratos marítimos; de protesto de títulos; de registro de imóveis; de registro de títulos e de documentos e civis das pessoas jurídicas; de registro civis das pessoas naturais e de interdições e tutelas; de registro de distribuição). Se quer dizer que as atividades enumeradas não devem estar concentradas em uma mesma delegação, a não ser que o Município não comporte, em razão do volume dos serviços ou da receita, a instalação de mais de um dos serviços[4].

Com efeito, a vacância dessas unidades invocou a regra constante no art. 49, da Lei de Cartórios, quanto à necessidade de desacumulação dos serviços[5], processo esse que não resulta na criação de nova unidade.

Sobre o tema, convém registrar a seguinte jurisprudência: 

EXTRAJUDICIAL. PEDIDO DE PROVIDÊNCIAS. ESTADO DE SÃO PAULO. PROVIMENTOS CSM  747/2000 e CSM 750/2001. LEI COMPLEMENTAR ESTADUAL 1.274/2015. PRETENSÃO DE CÚMULO, EM MUNICÍPIO ELEVADO A COMARCA, DE FUNÇÃO NOTARIAL COM FUNÇÃO DE PROTESTOS. EXIGÊNCIA DE LEI NÃO ATENDIDA. IMPROCEDÊNCIA.

1. A função notarial e a função de protestos são distintas entre si, ainda que os respectivos exercentes sejam conhecidos, por vezes de forma indistinta, como notários ou tabeliães (Lei n. 8.935/1994, artigos 7º e 11).

2 Apesar de as funções de notas e protestos poderem eventualmente ser cumuladas, nos municípios que não comportem, em razão do volume ou da receita (parágrafo único do artigo 26 da Lei n. 8.935/1994), a instalação de mais de um dos serviços, em regra, não devem ser cumuladas, conforme disposto no caput do artigo 26 da Lei n. 8.935/1994.

3. A criação de novas serventias e a acumulação ou desacumulação de especialidades são providências dependentes da prévia existência de Lei autorizativa. Em município recém elevado a comarca, a função notarial ali originariamente existente, não pode ser cumulada com a função de protestos, se não houver Lei que, de forma expressa, autorize a cumulação pretendida.

4. Recurso a que se nega provimento.

(CNJ - RA – Recurso Administrativo em PP - Pedido de Providências - Corregedoria - 0005845-42.2020.2.00.0000 - Rel. MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA - 92ª Sessão Virtual - julgado em 10/09/2021). (Destaquei)

 

Assim observado e tendo como exemplo a Comarca de Batayporã, o Serviço Notarial e de Registro Civil das Pessoas Naturais e de Interdições e Tutelas da Comarca foi ofertado no edital de 18/1/2021 (item 55). Após a edição da lei nº 5.644/2021, o registro civil foi movimentado para o registro de imóveis, resultando no Serviço de Registro de Imóveis, de Títulos e Documentos e Civil das Pessoas Jurídicas e Civil das Pessoas Naturais e de Interdições e Tutelas, enquanto o ofício de notas passou ao Serviço Notarial e Tabelionato de Protesto de Títulos e Outros Documentos de Dívida.

Isso não implica dizer que o ofício de notas, inicialmente constante no rol de serventias vagas, não exista, assim como alega o recorrente, mas assim como previamente informado, os(as) delegatários(as) que tinham uma especialidade reorganizada tiveram o direito de permanecer com uma delas, enquanto a outra serventia reorganizada e vaga foi disponibilizada no concurso.

Além disso, é de fácil compreensão que não será a mera inserção de eventual sinal gráfico no edital que autorizará a modificação das atribuições dos cartórios ao longo do concurso. A sinalização pretendeu informar, dar notoriedade, publicidade, destaque ao estudo empreendido pelo Tribunal para a reorganização das unidades, para cientificar os(as) interessados(as) que, no decorrer do concurso, a existência do projeto de lei, ao se tornar lei, acumularia ou desacumularia os serviços indicados, sem implicar a criação de novos cartórios.

Ainda nesse norte, para que melhor se compreenda sobre a necessidade de o edital veicular de forma clara a tramitação de proposta de lei, faço um paralelo com a oferta de delegações sub judice. Em conhecido precedente da Suprema Corte quando do julgamento do MS nº 31.228, o relator, o ilustre Ministro Luiz Fux, assentou sobre a necessidade de constar de forma expressa no edital a advertência quanto às serventias sub judice. Quer se dizer, é possível a oferta dessas unidades em concurso público, desde que eventual pendência seja veiculada de forma expressa e específica no instrumento convocatório[6].

Portanto, não é a mera inserção dos asteriscos que validará condutas ilegais quanto à oferta de delegações, assim como afirma o recorrente, mas a necessidade de deixar evidente as condições das delegações vagas e constantes do edital para conhecimento dos(as) participantes do certame, uma vez que este instrumento constitui lei entre as partes e suas regras precisam ser claras, assim como ressoa da firme jurisprudência representada no seguinte aresto:

[...]

6. "O edital do concurso público constitui lei entre as partes, gerando direitos e obrigações tanto para a Administração Pública quanto para o candidato, compelidos ambos à sua fiel observância" (RMS 61.995/RS, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, SEGUNDA TURMA, DJe 1°/6/2020). Nesse mesmo sentido: STF, MS 30894, Rel. Ministro RICARDO LEWANDOWSKI, SEGUNDA TURMA, DJe 21/9/2012.

[...]

(REsp n. 1.985.602/CE, relator Ministro Sérgio Kukina, Primeira Turma, julgado em 21/6/2022, DJe de 24/6/2022.)

Portanto, há correspondência entre o que foi veiculado no edital nº 1/2021 com a resultante do processo de reorganização efetivado pela Lei nº 5.644/2021, sem qualquer comprometimento da segurança jurídica, o que dispensa a necessidade de se republicar novo instrumento convocatório.

 

Suposta necessidade de adequação do Edital nº 01/2019 à Lei Estadual n. 5.509/2020: inconsistência na data de vacância das novas serventias criadas pela referida legislação do ente federado

Alega o recorrente sobre a necessidade de adequação do edital inaugural (nº 01/2019) à Lei Estadual nº 5.509, de 20 de maio de 2020, por possível inconsistência na data de vacância das novas serventias “criadas” pela lei, o que traria prejuízos ao critério de alternância na oferta dos cartórios vagos (provimento e remoção) instituído pela Lei de Cartórios, de nº 8.935/1994.

Novamente, há equívocos ao se insistir na tese de que estas delegações teriam sido “criadas” após a acumulação/desacumulação dos serviços, em 21/5/2020, dia da publicação da lei nº 5.509/2020. Para tanto, relembre-se que há nítida diferença entre os institutos, embora ambos sejam dependentes da edição de lei.

A concentrar-me na questão, referido diploma reorganizou as unidades extrajudiciais das comarcas de Água Clara, Aparecida do Taboado, Bataguassu, Pedro Gomes, Rio Negro e Sonora, mediante desacumulação e acumulação de serviços (Id. 4600240):

Art. 1º Ficam reorganizadas as unidades extrajudiciais das comarcas de Água Clara, Aparecida do Taboado, Bataguassu, Pedro Gomes, Rio Negro e Sonora, todas do Estado de Mato Grosso do Sul, mediante desacumulação e acumulação de serviços, alterando-se parte do Anexo III da Lei nº 1.511, de 5 de julho de 1994, na forma do Anexo desta Lei.

[...]

Art. 3º Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.

 

ANEXO DA LEI Nº 5.509, DE 20 DE MAIO DE 2020.

ANEXO III

QUADRO PERMANENTE DOS OFÍCIOS DE JUSTIÇA DO FORO EXTRAJUDICIAL

Comarca de Água Clara:

a) Serviço Notarial e Tabelionato de Protesto de Títulos e Outros Documentos de Dívida;

b) Serviço de Registro de Imóveis, de Títulos e Documentos e Civil das Pessoas Jurídicas e Civil das Pessoas Naturais e de Interdições e Tutelas.

.............................................................................................................................

Comarca de Aparecida do Taboado:

a) Serviço Notarial e Tabelionato de Protesto de Títulos e Outros Documentos de Dívida;

b) Serviço de Registro de Imóveis, de Títulos e Documentos e Civil das Pessoas Jurídicas e Civil das Pessoas Naturais e de Interdições e Tutelas.

.............................................................................................................................

Comarca de Bataguassu:

a) Serviço Notarial e Tabelionato de Protesto de Títulos e Outros Documentos de Dívida;

b) Serviço de Registro de Imóveis, de Títulos e Documentos e Civil das Pessoas Jurídicas e Civil das Pessoas Naturais e de Interdições e Tutelas;

c)       ...........................................................................................................................

.............................................................................................................................

Comarca de Pedro Gomes:

a) Serviço Notarial e Tabelionato de Protesto de Títulos e Outros Documentos de Dívida;

b) Serviço de Registro de Imóveis, de Títulos e Documentos e Civil das Pessoas Jurídicas e Civil das Pessoas Naturais e de Interdições e Tutelas.

.............................................................................................................................

Comarca de Rio Negro:

a) Serviço Notarial e Tabelionato de Protesto de Títulos e Outros Documentos de Dívida;

b) Serviço de Registro de Imóveis, de Títulos e Documentos e Civil das Pessoas Jurídicas e Civil das Pessoas Naturais e de Interdições e Tutelas;

c) .............................................................................................................................

d) .............................................................................................................................

.............................................................................................................................

Comarca de Sonora:

a) Serviço Notarial e Tabelionato de Protesto de Títulos e Outros Documentos de Dívida;

b) Serviço de Registro de Imóveis, de Títulos e Documentos e Civil das Pessoas Jurídicas e Civil das Pessoas Naturais e de Interdições e Tutelas.

................................................................................................................” (NR)

DOMS de 21.5.2020, p. 2-3.

 

Sob essa ótica, referidos cartórios já constavam no Anexo I - relação dos serviços notariais e de registros vagos -,  do edital de 29 de novembro de 2019 (Id. 4602964, fls. 16 a 19):

 

COMARCA 

DISTRITO/ 

MUNICÍPIO 

ATRIBUIÇÕES 

DATA DE VACÂNCIA 

DATA DE CRIAÇÃO 

SITUAÇÃO 

CRITÉRIO 

[...]

15

Sonora

Sede

Serviço de Registro de Imóveis, de Títulos e Documentos e Civil das Pessoas Jurídicas e Tabelionato de Protesto de Títulos e Outros Documentos de Dívida

05/10/2015

 

VAGO*

Remoção

[...]

19

Rio Negro*

Sede

Serviço Notarial e de Tabelionato de Protesto de Títulos e Outros Documentos de Dívida

23/11/2015

 

VAGO*

Provimento

[...]

21

Bataguassu

Sede

Serviço de Registro de Imóveis, de Títulos e Documentos e Civil das Pessoas Jurídicas e Tabelionato de Protesto de Títulos e Outros Documentos de Dívida.

18/01/2016

 

VAGO*

Remoção

[...]

26

Aparecida

Do Taboado

Sede

Serviço de Registro de Imóveis, de Títulos e Documentos e Civil das Pessoas Jurídicas e de Tabelionato de Protesto de Títulos e Outros Documentos de Dívida

11/01/2017

 

VAGO*

Provimento

[...]

43

Pedro

Gomes

Sede

Serviço de Registro de Imóveis, de Títulos e Documentos e Civil das Pessoas Jurídicas e Tabelionato de Protesto de Títulos e Outros Documentos de Dívida

01/02/2018

 

VAGO*

Provimento

[...]

46

Água

Clara

Sede

Serviço de Registro de Imóveis, de Títulos e Documentos e Civil das Pessoas Jurídicas e de Tabelionato de Protesto de Títulos e Outros Documentos de Dívida

 

 

 

28/02/2018

 

 

 

 

 

VAGO*

Provimento

 

Na republicação, estas foram assim dispostas, após aprovada a Lei nº 5.509/2020:

 

COMARCA 

DISTRITO/ 

MUNICÍPIO 

ATRIBUIÇÕES 

DATA DE VACÂNCIA 

DATA DE CRIAÇÃO 

SITUAÇÃO 

CRITÉRIO 

[...]

15

Sonora*

Sede

Serviço Notarial e de Tabelionato de Protesto de Títulos e Outros Documentos de Dívida

05/10/2015

 

VAGO*

Remoção

[...]

21

Bataguassu*

Sede

Serviço Notarial e de Tabelionato de Protesto de Títulos e Outros Documentos de Dívida

18/01/2016

 

VAGO*

Remoção

[...]

26

Aparecida Do Taboado*

Sede

Serviço Notarial e de Tabelionato de Protesto de Títulos e Outros Documentos de Dívida

11/01/2017

 

VAGO*

Provimento

[...]

43

Pedro

Gomes*

Sede

Serviço Notarial e de Tabelionato de Protesto de Títulos e Outros Documentos de Dívida

01/02/2018

 

VAGO*

Provimento

[...]

46

Água

Clara*

Sede

Serviço Notarial e de Tabelionato de Protesto de Títulos e Outros Documentos de Dívida

28/02/2018

 

 

VAGO*

Provimento

*(Serventias nºs 15, 19, 21, 26, 43 e 46) – Serventias aguardando a transmissão do acervo diante da opção determinada na Lei 5.509/2020.

 

Como deveria ser, nas duas peças convocatórias há coincidência quanto às datas de vacância de todos os cartórios acima descritos, inclusive foram ordenados, nos dois atos, em idêntica posição.

E, novamente, não se deve olvidar que o pressuposto para a reorganização de cartórios extrajudiciais é a vacância dos serviços, conclusão essa extraída do art. 49 da Lei nº 8.935/1994[7], e reproduzido no art. 7º, da Resolução CNJ nº 80/2009, como antes referido.

Considerando que a Lei nº 5.509/2020 não teria criado nenhuma unidade, a data de sua publicação não pode ser compreendida como o marco para se definir a vacância das delegações constantes do edital, já que antes disso os serviços encontravam-se sem os(as) seus(as) titulares, bem como a reorganização não está entre as hipóteses de extinção da delegação[8]Por isso, as serventias foram dispostas na mesma ordenação do primeiro edital e mantidas na republicação, para assim preservar o critério de preenchimento, se por provimento ou se por remoção, já que essa ordem teve por base a data de vacância da titularidade ou, quando vagas na mesma data, aquela da criação do serviço (art. 16, Lei nº 8.935/1994) [9].

E, igualmente, o edital foi claro e conferiu a necessária publicidade das informações quanto à situação das unidades abarcadas pela Lei nº 5.509/2020.

Estabelecer como data da vacância a da publicação da Lei nº 5.509, 21 de maio de 2020, assim como pretende o recorrente, implicará em nítida violação ao critério de alternância do provimento e invalidaria o certame, já que os cartórios oferecidos no concurso estavam desprovidos de titulares em período anterior à 2020.

Desse modo, não há de se acolher a pretensão recursal, uma vez que as regras editalícias foram suficientemente claras e tornadas públicas com o objetivo de preservar a segurança jurídica.

 

Suposta violação à isonomia na compra obrigatória, para participar da prova escrita, do Código de Normas da Corregedoria-Geral da Justiça do Mato Grosso do Sul

Como última insurgência, o recorrente aponta violação à isonomia ante a obrigação imposta pelo TJMS da compra do Código de Normas da Corregedoria-Geral da Justiça do Mato Grosso do Sul, por força da proibição de uso de material impresso.

Sempre com a lembrança de que o recorrente sequer ostenta a condição de candidato, esta etapa foi realizada no dia 6.2.2022, com a divulgação do resultado final pela Portaria nº 008, de 2 de agosto de 2022[10], situação que acarreta a perda de objeto da pretensão.

Ademais, antes mesmo da aplicação da prova, a monocrática não havia constatado a presença de ilegalidades que ensejassem na suspensão ou na anulação desta etapa.

Outrossim, além de a lembrança feita no parecer da Corregedoria sobre a análise da questão no PP nº 0000514-11.2022.2.00.0000, que julgou improcedente idêntico pedido[11], as regras do edital encontram-se em plena consonância com o que dispõe a Resolução CNJ nº 81/2009, que permite consulta à legislação não comentada ou não anotada, mas veda a utilização de obras que contenham formulários, modelos e anotações pessoais, inclusive apostilas, sendo esta a categorização de material impresso (item 5.6.1).

A ausência de fatos novos não autoriza a modificação da decisão combatida, dado que a conduta do Tribunal encontra-se em consonância com as regras de regência dos concursos para a outorga de delegações.

Ante o exposto, conheço do recurso e, no mérito, nego provimento.

É como voto.

Após as intimações de praxe, arquivem-se os autos.

 

Brasília, data registrada no sistema.

 

Jane Granzoto

Conselheira relatora



[1] Questão de ordem. Agravo de Instrumento. Conversão em recurso extraordinário (CPC, art. 544, §§ 3° e 4°). 2. Alegação de ofensa aos incisos XXXV e LX do art. 5º e ao inciso IX do art. 93 da Constituição Federal. Inocorrência. 3. O art. 93, IX, da Constituição Federal exige que o acórdão ou decisão sejam fundamentados, ainda que sucintamente, sem determinar, contudo, o exame pormenorizado de cada uma das alegações ou provas, nem que sejam corretos os fundamentos da decisão. 4. Questão de ordem acolhida para reconhecer a repercussão geral, reafirmar a jurisprudência do Tribunal, negar provimento ao recurso e autorizar a adoção dos procedimentos relacionados à repercussão geral.

(AI 791292 QO-RG, Relator(a): GILMAR MENDES, julgado em 23/06/2010, REPERCUSSÃO GERAL - MÉRITO DJe-149 DIVULG 12-08-2010 PUBLIC 13-08-2010 EMENT VOL-02410-06 PP-01289 RDECTRAB v. 18, n. 203, 2011, p. 113-118)

[2]   Art. 39. Extinguir-se-á a delegação a notário ou a oficial de registro por:

        I - morte;

        II - aposentadoria facultativa;

        IV - renúncia;

        V - perda, nos termos do art. 35.

        VI - descumprimento, comprovado, da gratuidade estabelecida na Lei no 9.534, de 10 de dezembro de 1997.  

[3] Art. 26. Não são acumuláveis os serviços enumerados no art. 5º.

Parágrafo único. Poderão, contudo, ser acumulados nos Municípios que não comportarem, em razão do volume dos serviços ou da receita, a instalação de mais de um dos serviços.

[4] Art. 5º Os titulares de serviços notariais e de registro são os:

        I - tabeliães de notas;

        II - tabeliães e oficiais de registro de contratos marítimos;

        III - tabeliães de protesto de títulos;

        IV - oficiais de registro de imóveis;

        V - oficiais de registro de títulos e documentos e civis das pessoas jurídicas;

        VI - oficiais de registro civis das pessoas naturais e de interdições e tutelas;

        VII - oficiais de registro de distribuição.

[5] Art. 49. Quando da primeira vacância da titularidade de serviço notarial ou de registro, será procedida a desacumulação, nos termos do art. 26.

 

[6]  [...]

1) As serventias vagas, embora sub judice, devem ser incluídas no edital de concurso para ingresso/remoção referente à atividade notarial e de registro. 2) A Administração do Tribunal de Justiça deve incluir no edital do concurso público a serventia extrajudicial sub judice em conjunto com a informação de que ela se encontra sob o crivo judicial.

[...]

Quanto a delegações, incluídas no edital do concurso e na relação em que classificadas segundo os critérios de ‘provimento’ e ‘remoção’, as quais, embora com pendências judiciais, puderem ser oferecidas no certame e na futura sessão de escolha (por não existirem decisões ou liminares em vigor que o impeçam), deverá haver expressa e específica advertência aos interessados no edital (caso tais pendências já existam quando de sua publicação) da presença de tal situação.

[...]

(MS 31228, Relator(a): LUIZ FUX, Primeira Turma, julgado em 04/08/2015, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-204 DIVULG 09-10-2015 PUBLIC 13-10-2015)

[7] Art. 49. Quando da primeira vacância da titularidade de serviço notarial ou de registro, será procedida a desacumulação, nos termos do art. 26.

[8] Art. 39. Extinguir-se-á a delegação a notário ou a oficial de registro por:

        I - morte;

        II - aposentadoria facultativa;        (Vide ADIN 1183)

        III - invalidez;

        IV - renúncia;

        V - perda, nos termos do art. 35.

[9] Art. 16. As vagas serão preenchidas alternadamente, duas terças partes por concurso público de provas e títulos e uma terça parte por meio de remoção, mediante concurso de títulos, não se permitindo que qualquer serventia notarial ou de registro fique vaga, sem abertura de concurso de provimento inicial ou de remoção, por mais de seis meses

Parágrafo único. Para estabelecer o critério do preenchimento, tomar-se-á por base a data de vacância da titularidade ou, quando vagas na mesma data, aquela da criação do serviço.

[10] Disponível em: https://d676e6gwpn3ec.cloudfront.net/concursos/1027/33_1133183.pdf

[11] [...]

Da leitura dos dispositivos, observa-se que, embora o edital tenha minudenciado as hipóteses proibitivas, não destoou do espírito almejado pela norma deste Conselho que foi o de vedar o uso de material potencialmente suscetível de alteração, que poderia viabilizar a ocorrência de fraudes diante das dificuldades naturais para a fiscalização minuciosa dos impressos e ocasionar a concorrência desleal”.