EMENTA 

 

CONVOLAÇÃO DE REVISÃO DISCIPLINAR (REVDIS) EM PROCEDIMENTO DE CONTROLE ADMINISTRATIVO (PCA). TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DA PARAÍBA. DECISÃO DE ARQUIVAMENTO DE SINDICÂNCIA POR INSUFICIÊNCIA DE QUÓRUM QUALIFICADO PARA A INSTAURAÇÃO DE PROCESSO ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR CONTRA MAGISTRADA (PADMag). EXISTÊNCIA DE FORTES INDÍCIOS DE INFRAÇÃO DISCIPLINAR.  CONTRARIEDADE ÀS EVIDÊNCIAS DOS AUTOS. POSSÍVEL TIPIFICAÇÃO COMO CRIME. PRESCRIÇÃO AFASTADA. PROCEDÊNCIA DO PCA. INSTAURAÇÃO DO PADMag. 

I – Quando não há instauração de processo administrativo pelo tribunal local, em razão do arquivamento de investigação disciplinar por ausência do qórum constitcional, não se está diante da competência revisional do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) disciplina no artigo 82 e ss. do Regimento Interno do CNJ (RICNJ). Nessa hipótese, a competência constitucional do CNJ para reavaliar o ato de arquivamento no tribunal é originária, razão pela qual o presente procedimento deve ser convolado em PCA, na forma do artigo 91 e ss. do RICNJ. Precedentes do STF e do CNJ.

II – A possível falta funcional praticada pela magistrada pode caracterizar a subsunção a tipo penal, razão pela qual se impõe a observância dos prazos prescricionais do Código Penal.

III – No caso concreto, constata-se flagrante dissociação entre o conjunto probatório e o julgamento levado a efeito pelo tribunal de origem, tornando ilegal o ato de arquivamento do processo administrativo disciplinar contra a magistrada.

IV – Procedimento de Controle Administrativo que se julga procedente para determinar a desconstituição da decisão proferida pelo Órgão Pleno do Tribunal de Justiça do Estado da Paraíba e a instauração do competente PADMag, sem afastamento cautelar, contra a magistrada requerida, o qual deve tramitar originariamente no CNJ, nos termos da minuta de portaria anexa ao voto do Conselheiro Relator.

 ACÓRDÃO

O Conselho, por unanimidade, determinou a instauração de processo administrativo disciplinar (PAD), sem afastamento cautelar, em face da magistrada requerida, o qual deve tramitar no CNJ, aprovando desde logo a portaria de instauração do PAD, nos termos do voto do Relator. Ausente, em razão da vacância do cargo, o representante da Câmara dos Deputados. Presidiu o julgamento o Ministro Luís Roberto Barroso. Plenário, 31 de outubro de 2023. Presentes à sessão os Excelentíssimos Senhores Conselheiros Luís Roberto Barroso, Luis Felipe Salomão, Vieira de Mello Filho, Mauro Pereira Martins, Salise Sanchotene, Jane Granzoto, Richard Pae Kim, Marcio Luiz Freitas, Giovanni Olsson, Pablo Barreto, João Paulo Schoucair, Marcos Vinícius Jardim Rodrigues, Marcello Terto e Luiz Fernando Bandeira de Mello. Manifestou-se oralmente o Subprocurador-Geral da República José Adonis Callou de Araújo Sá. Sustentaram oralmente: pelo Requerente, o Advogado Leonardo Rufino Capistrano - OAB/DF 29.510; pela Interessada, o Advogado Eugênio Gonçalves da Nóbrega - OAB/PB 8.28; e, pela Requerida, o Advogado Alexandre Pontieri - OAB/SP 191.828.

Conselho Nacional de Justiça

Autos: REVISÃO DISCIPLINAR - 0004861-87.2022.2.00.0000
Requerente: BANCO BRADESCO S/A
Requerido: RITAURA RODRIGUES SANTANA


Revisão Disciplinar nº 0004861-87.2022.2.00.0000  

Requerente:  Banco Bradesco S/A

Requerido: Ritaura Rodrigues Santana 

 

 

 

RELATÓRIO

 

Trata-se de procedimento de Revisão Disciplinar (RevDis), com pedido de afastamento cautelar de magistrado, proposto pelo BANCO BRADESCO S/A, para instauração de processo administrativo disciplinar em desfavor da JUÍZA DE DIREITO RITAURA RODRIGUES SANTANA, tendo em vista o arquivamento do Processo Disciplinar de Sindicância nº 0000356-78.2018.815.1001 pelo Pleno do Tribunal de Justiça do Estado da Paraíba (TJPB), por falta de quórum de julgamento.

O requerente se insurge contra a decisão colegiada que resultou na absolvição da magistrada, a despeito das condutas que reputa configurarem desvios funcionais graves e dos vícios procedimentais havidos no Processo Judicial nº 0003998-32.2012.8.15.0011.

Sustenta que, no decorrer do mencionado procedimento administrativo disciplinar (PAD), teriam ocorrido diversas irregularidades, dentre as quais vício do quórum de julgamento, uma vez que, dos 19 desembargadores que compõem o órgão colegiado competente, 3 se declararam suspeitos; 2, impedidos; e um estava ausente.  Ainda assim, dos 13 julgadores aptos a votar, 9 deles acompanharam o voto do relator, que propunha a instauração do PAD.

Destaca que, conforme jurisprudência deste CNJ, a dificuldade na composição do quórum de deliberação no julgamento de processos administrativos disciplinares, somada aos elementos de prova que indicariam a necessidade de instauração do PAD, justificaria o recebimento da Reclamação Disciplinar até de ofício. Transcreve, para tanto, os julgados na RD - Reclamação Disciplinar - 0005126-31.2018.2.00.0000 - Rel. HUMBERTO MARTINS - 300ª Sessão Ordinária - julgado em 05/11/2019[1]; e no PP - Pedido de Providências - Corregedoria - 0000577-75.2018.2.00.0000 - Rel. HUMBERTO MARTINS - 302ª Sessão Ordinária - julgado em 17/12/2019[2].

Relata que a requerida exerce jurisdição na Ação de Prestação de Contas nº 0003998-32.2012.8.15.0011, proposta por IPELSA INDÚSTRIA DE PAPEL DA PARAÍBA S/A contra o BANCO BRADESCO S/A, na qual se discute lançamentos efetuados na conta corrente da primeira relativos a empréstimos firmados com o banco requerente.

Anota que, na Reclamação Disciplinar RD - nº 0009858-89.2017.2.00.0000, sobrestada pela Corregedoria Nacional de Justiça, para aguardar a conclusão das investigações no curso do Inquérito Policial IP - nº 0007051-74.2019.815.0011, apontou-se que a conduta da requerida motivara a determinação de bloqueio, nas contas do requerido, de valores da ordem de R$ 16.000.000,00 (dezesseis milhões de reais), que só não foram levantados pela parte adversa em virtude de liminar concedida pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ), sendo que essa constrição persiste até a data da propositura desta RevDis, conquanto tenha sido atribuída à demanda o valor de R$ 1.000,00 (mil reais).

Aponta como atos lesivos praticados pela requerida (i) o despacho citatório que permitiu o prosseguimento da ação proposta em petição inicial inepta (genérica e desprovida de documentos indispensáveis) e sem reunir as condições da ação (cumulação de ritos inadequados – prestação de contas e revisional); (ii) a tramitação açodada e incomum do feito, que, em apenas 4 meses, sofreu mais de 15 movimentações relevantes; e (iii) a nomeação da senhora SONIA MARIA FERREIRA GUEDES como perita, a despeito de não ter qualquer expertise comprovada, não fazer parte do quadro de peritos do Tribunal de Justiça da Paraíba, como determina a Resolução nº 233/2016, nem estar regularmente inscrita no Conselho Federal de Contabilidade – CFC e no Conselho Regional de Contabilidade da Paraíba – CRCPB.

Por isso, o requerido defende que a decisão foi contrária à prova dos autos, de forma que requer a revisão disciplinar, para instauração do PAD, com afastamento cautelar nos termos dos artigos 83, I, c/c 75, parágrafo único, do Regimento Interno do CNJ (RICNJ).

Por último, observamos, em diligência, que, na Reclamação Disciplinar nº 0009858-89.2017.2.00.0000, depois do despacho de sobrestamento da então e. Corregedora Nacional de Justiça, em 26 de agosto de 2022, o ora requerente noticiou a apresentação desta RevDis, para assegurar o cumprimento do prazo decadencial previsto na norma regimental, e, em 12 de setembro último, a Delegada de Polícia Civil Maria Ferreira de Sousa Lima informou os motivos do atraso na conclusão do Inquérito Policial nº 0007051-74.2019.815.0011, destacando o grave fato de que a referida perita judicial nomeada pela ora requerida não poderia atuar nessa condição em razão da baixa da sua inscrição no CRC – Conselho Regional de Contabilidade, desde 2011 (Id. 4862009).

No que diz respeito à liminar, deixei para analisar o pedido de afastamento cautelar da magistrada, em plenário, depois de oportunizado o contraditório. 

Devidamente intimado, o TJPB, no Id 4931344, informa que o Processo Disciplinar nº 0000356-78.2018.815.1001 teve seu trâmite normal e, depois do arquivamento da sindicância e recurso próprio interposto pelo ora requerente, os autos foram remetidos ao então Presidente do TJPB, para distribuição perante os componentes do Tribunal Pleno.

Relata que, em um primeiro momento, o Desembargador Marcos Cavalcanti de Albuquerque averbou seu impedimento; em seguida, redistribuídos os autos, o Desembargador Abraham Lincoln da Cunha Ramos averbou sua suspeição; novamente redistribuídos, foi a vez da Desembargadora Maria das Graças Morais Guedes averbar sua suspeição; vindo a aportar os autos, finalmente, sob a relatoria do Desembargador Leandro dos Santos, em 19 de agosto de 2021.

Narra que, não obstante o Tribunal Pleno tenha reconhecido a intempestividade do recurso, contrariando, assim, o voto do Relator (que reconhecia a sua tempestividade), o Desembargador Márcio Murilo da Cunha Ramos, redator do acórdão, em questão de ordem, na sessão seguinte, determinou, de ofício, a correção de erro material, que culminou no afastamento da intempestividade e decidiu pela continuidade do procedimento, para a deliberação sobre a instauração, ou não, do PAD.

Conta que a sessão inicialmente pautada para o dia 20 de outubro de 2021 foi adiada, por falta de quórum, vindo o processo a ser julgado na sessão do dia 3 de novembro de 2021, ocasião em que o Relator Desembargador Leandro dos Santos votou pela instauração do PAD, sem afastamento da magistrada, mas, novamente por falta de quórum, o Tribunal Pleno determinou o arquivamento do feito.

O Ministério Público Federal, no Id 4956767, manifestou-se pela procedência da presente RevDis, ao fundamento sintetizado na ementa abaixo:

Revisão Disciplinar. Magistrada.

1. Pretensão de reexame de acórdão do Pleno do Tribunal de Justiça do Estado da Paraíba que determinou o arquivamento do Procedimento nº 0021833-38.2018.4.01.8000, instaurado em desfavor da Juíza Ritaura Rodrigues Santana.

2. Apontada a prática de faltas funcionais pela requerida: despacho citatório que permitiu o prosseguimento da ação proposta em petição inicial inepta e sem reunir as condições da ação (Processo nº 0003998-32.2012.8.15.0011); tramitação açodada e incomum do feito; e nomeação da senhora Sonia Maria Ferreira Guedes como perita, a despeito de não ter expertise comprovada, não fazer parte do quadro de peritos do Tribunal de Justiça do Estado Paraíba, como determina a Resolução nº 233/2016, nem estar regularmente inscrita no Conselho Federal de Contabilidade – CFC e no Conselho Regional de Contabilidade da Paraíba – CRCPB.

3. A decisão de arquivamento proferida pela Corte de Justiça foi de encontro às evidências trazidas aos autos, as quais permitem concluir pela existência de indícios de faltas funcionais praticadas pela Magistrada Ritaura Rodrigues Santana, com possível infração aos deveres constantes do inc. I do art. 35 da LOMAN e descumprimento dos preceitos éticos previstos nos arts. 1º, 8º e 37 do Código de Ética da Magistratura Nacional.

4. Contrariedade às evidências dos autos caracterizada. A instauração do procedimento administrativo disciplinar é medida que se impõe para a apuração das condutas imputadas à Magistrada. Manifestação pela procedência do pedido de revisão disciplinar, com a consequente instauração de procedimento administrativo disciplinar.

 

A magistrada, representada pela Associação dos Magistrados da Paraíba (AMPB), apresentou defesa, no Id 5033731, em que alegou que teve o seu direito de defesa cerceado nos autos da sindicância promovida pela Corregedoria do TJPB, porque não teria sido citada para se defender, bem assim como teria havido irregularidade no julgamento do recurso interposto pelo requerente, por não terem sido intimados os servidores que integravam o polo passivo daquele procedimento preliminar, sendo intimada tão somente a magistrada.

Defende que o requerente tenta alterar a realidade de situação definida em sede jurisdicional.

Argumenta que o requerente concorreu de forma decisiva para a revelia no processo judicial referenciado e esconderia, aqui, em procedimento disciplinar, suas frustrações nas incursões recursais, uma vez que todas as suas decisões teriam sido mantidas pelo TJPB e pelo STJ.

Sustenta a intempestividade do recurso administrativo interposto, ainda na origem, contra o arquivamento da sindicância e que isso, consequentemente, implicaria na intempestividade do presente procedimento revisional.

Aduz que a pretensão revisional sob exame não seria cabível, porque pretende rever decisões jurisdicionais confirmadas pelo juízo ad quem, o que revelaria o intuito de puni-la pelo conteúdo de suas decisões que, aliás, não teriam violado o Código de Ética da Magistratura, já que não houve liberação de nenhum valor nos autos do processo jurisdicional.

Diz que a 1ª Vara Cível da Comarca de Campina Grande é marcada pela celeridade, agilidade e presteza, recebendo reiteradas premiações do TJPB.

No Id 5041100, determinei a intimação do requerente, do TJPB e do MPF, para se manifestarem sobre o possível transcurso do prazo prescricional previsto no artigo 24 da Resolução nº 135/2011.

Em resposta, o requerente, no Id 5062403, e o MPF, no Id 5082758, pugnam pela aplicação dos prazos prescricionais previstos no Código Penal, dada a gravidade da conduta da magistrada.

O TJPB, no Id 5082227, limitou-se a alegar que não teria contribuído para a prescrição dos fatos praticados pela magistrada reclamada.

A magistrada sustenta que a pretensão punitiva estaria prescrita, porque os fatos citados no presente feito são de conhecimento deste Conselho Nacional de Justiça desde o ano de 2017, nos autos do Procedimento nº 9858-89.017.2.00.0000 (Id 5125516).

 É o relatório. Passo ao voto.



[1] RECLAMAÇÃO DISCIPLINAR. AUSÊNCIA DE QUÓRUM QUALIFICADO PARA INSTAURAÇÃO DE PAD NO TRIBUNAL DE ORIGEM. NÚMERO SIGNIFICATIVO DE AUSÊNCIA DECORRENTE DE FÉRIAS E LICENÇA MÉDICA. NECESSIDADE DE REVISÃO DISCIPLINAR. (...) 2. A reclamação disciplinar foi arquivada pela não obtenção do quórum qualificado determinado no art. 14, § 5º, da Resolução n. 135 do CNJ, restando prejudicada a proposta de instauração de PAD pelo voto do relator,

Corregedor Regional. (...) 4. A decisão do TRT da 9ª Região é flagrantemente contrária às evidências dos autos, as quais apontam para a presença de fortes indícios de que o magistrado atuou de forma negligente, causando prejuízos aos jurisdicionados, gerando desconfiança em relação aos trabalhos do Poder Judiciário e dando causa a reiteradas nulidades declaradas por aquele Tribunal. 5. A jurisprudência do Conselho Nacional de Justiça admite a instauração de revisão disciplinar quando constata-se que a decisão que arquivou representação contra magistrado é contrária às evidências dos autos, porque estes evidenciam a ocorrência de negligência no exercício da atividade judicante. Conclusão pela necessidade de instauração, de ofício, de revisão de processo disciplinar, nos termos dos arts. 82 e 86 do RICNJ. (CNJ - RD - Reclamação Disciplinar - 0005126-31.2018.2.00.0000 - Rel. HUMBERTO MARTINS - 300ª Sessão Ordinária - julgado em 05/11/2019).

 

[2] ... 5. Considerando que, no caso presente, a grande quantidade de alegações de suspeição e impedimento manifestada – 8 (oito) dos 19 (dezenove) Desembargadores do Tribunal de Justiça da Paraíba – impossibilita a formação de quórum adequado para julgamento por maioria do Processo Administrativo Disciplinar n. 0000734- 35.2015.8.15.0000, legítima a avocação do mencionado processo para julgamento pelo Conselho Nacional de Justiça. Processo Administrativo Disciplinar avocado. (CNJ - PP - Pedido de Providências - Corregedoria - 0000577-75.2018.2.00.0000 - Rel. HUMBERTO MARTINS - 302ª Sessão Ordinária - julgado em 17/12/2019).

 



[1] RECLAMAÇÃO DISCIPLINAR. AUSÊNCIA DE QUÓRUM QUALIFICADO PARA INSTAURAÇÃO DE PAD NO TRIBUNAL DE ORIGEM. NÚMERO SIGNIFICATIVO DE AUSÊNCIA DECORRENTE DE FÉRIAS E LICENÇA MÉDICA. NECESSIDADE DE REVISÃO DISCIPLINAR. (...) 2. A reclamação disciplinar foi arquivada pela não obtenção do quórum qualificado determinado no art. 14, § 5º, da Resolução n. 135 do CNJ, restando prejudicada a proposta de instauração de PAD pelo voto do relator,

Corregedor Regional. (...) 4. A decisão do TRT da 9ª Região é flagrantemente contrária às evidências dos autos, as quais apontam para a presença de fortes indícios de que o magistrado atuou de forma negligente, causando prejuízos aos jurisdicionados, gerando desconfiança em relação aos trabalhos do Poder Judiciário e dando causa a reiteradas nulidades declaradas por aquele Tribunal. 5. A jurisprudência do Conselho Nacional de Justiça admite a instauração de revisão disciplinar quando constata-se que a decisão que arquivou representação contra magistrado é contrária às evidências dos autos, porque estes evidenciam a ocorrência de negligência no exercício da atividade judicante. Conclusão pela necessidade de instauração, de ofício, de revisão de processo disciplinar, nos termos dos arts. 82 e 86 do RICNJ. (CNJ - RD - Reclamação Disciplinar - 0005126-31.2018.2.00.0000 - Rel. HUMBERTO MARTINS - 300ª Sessão Ordinária - julgado em 05/11/2019).

 

[2] ... 5. Considerando que, no caso presente, a grande quantidade de alegações de suspeição e impedimento manifestada – 8 (oito) dos 19 (dezenove) Desembargadores do Tribunal de Justiça da Paraíba – impossibilita a formação de quórum adequado para julgamento por maioria do Processo Administrativo Disciplinar n. 0000734- 35.2015.8.15.0000, legítima a avocação do mencionado processo para julgamento pelo Conselho Nacional de Justiça. Processo Administrativo Disciplinar avocado. (CNJ - PP - Pedido de Providências - Corregedoria - 0000577-75.2018.2.00.0000 - Rel. HUMBERTO MARTINS - 302ª Sessão Ordinária - julgado em 17/12/2019).

 


 

Conselho Nacional de Justiça

 

Autos: REVISÃO DISCIPLINAR - 0004861-87.2022.2.00.0000
Requerente: BANCO BRADESCO S/A
Requerido: RITAURA RODRIGUES SANTANA

 


VOTO

 

I- DA CONVOLAÇÃO DA REVISÃO DISCIPLINAR EM PROCEDIMENTO DE CONTROLE ADMINISTRATIVO

 

O Plenário deste CNJ, na 361 ª Sessão Ordinária, realizada em 6 de dezembro de 2022, no PCA nº 0004541-76.2018.2.00.0000, assentou que, “quando não há instauração de processo administrativo pelo tribunal local, mas arquivamento de uma investigação, diante da tipicidade constitucional acima apresentada, a reavaliação desse ato não pode ser buscada neste Conselho através de sua competência revisional, que vem materializada regimentalmente pela REVISÃO DISCIPLINAR (artigo 82 do Regimento Interno), conhecida como REVDIS. Nessa hipótese, a competência constitucional do CNJ para reavaliar o ato é aquela chamada pela Suprema Corte de originária.”

De fato, nos termos regimentais, conforme observação destacada em Plenário pelo e. Corregedor Nacional de Justiça, Ministro Luis Felipe Salomão, por ocasião do julgamento deste processo, para o exercício dessa competência originária, ou se movimenta a Corregedoria Nacional de Justiça, por meio de reclamação ou pedido de providências, ou, então, movimenta-se o Plenário por meio de Procedimento de Controle Administrativo (PCA).

Dispõe o artigo 91, caput, que o “controle dos atos administrativos praticados por membros ou órgãos do Poder Judiciário será exercido pelo Plenário do CNJ, de ofício ou mediante provocação, sempre que restarem contrariados os princípios estabelecidos no art. 37 da Constituição, especialmente os de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência...”. E o parágrafo único estatui que: “não será admitido o controle de atos administrativos praticados há mais de cinco anos, salvo quando houver afronta direta à Constituição”.

Em suma, quando um interessado legitimado pretende que o CNJ reanalise um ato administrativo que rejeitou a abertura de processo administrativo disciplinar, ou ele provoca diretamente a Corregedoria Nacional de Justiça ou, se pretender reavaliação direta pelo Plenário, ele terá à sua disposição, nos termos do Regimento Interno do CNJ (RICNJ), a via do Procedimento de Controle Administrativo (PCA).

Nestes autos, o CNJ foi chamado por interessado a apreciar se o ato administrativo do TJPB que, por falta de quórum qualificado previsto na Constituição da República Federativa do Brasil (CRFB), rejeitou a proposta de instauração de processo administrativo disciplinar contra a magistrada requerida, está correto ou não. Logo, se não houve instauração de PADMag, o procedimento adequado para provocar originariamente o controle de ato administrativo é o PCA, e não a REVDIS.

Nesse sentido, por se tratar de competência originária, determino a convolação da presente REVDIS em PCA.

 

II- DAS PRELIMINARES

II-1- Das alegadas nulidades da Sindicância nº 000356-78.2018.8.15.1001 

A magistrada alega que teria sido tolhida do seu direito de defesa, por não ter sido citada para se defender nos autos da sindicância referenciada, assim como pela suposta ausência de intimação, na fase recursal, dos demais envolvidos no procedimento investigatório.

Não procede, porém, a alegada nulidade, uma vez que consoante “entendimento pacífico do STF, do STJ e do CNJ, as irregularidades existentes no decorrer da sindicância não têm o condão de macular o processo administrativo disciplinar instaurado a partir dela, porquanto a sindicância é um procedimento que se reveste de dispensabilidade e de mera apuração de fatos, sendo até mesmo dispensada a participação do investigado e do seu procurador(CNJ - RA – Recurso Administrativo em PCA - Procedimento de Controle Administrativo - 0007083-33.2019.2.00.0000 - Rel. VALTÉRCIO DE OLIVEIRA - 58ª Sessão Virtual - julgado em 13/12/2019).

Nessa senda, o artigo 11 da Resolução CNJ 135/2011[1] faculta o acompanhamento pelo sindicado da sindicância instaurada, mas não torna obrigatória a sua citação para apresentação de defesa, como pretende fazer crer a magistrada.

Sendo, portanto, dispensável a sindicância, bem como a considerar o fato de que à magistrada investigada foi oportunizado o acompanhamento de todo o procedimento investigativo, não há de se falar em nulidade.

Rejeito a preliminar.

 

II.2- Da intempestividade

A magistrada ataca a decisão que reconheceu a tempestividade do recurso interposto pelo ora promovente nos autos da sindicância em comento, com o objetivo de sustentar a intempestividade do presente procedimento.

Isso porque, segundo alega, o recurso foi interposto contra a decisão do Corregedor-Geral do TJPB que determinara o arquivamento do procedimento data de 27/8/2019, ao tempo em que a decisão foi publicada em 28/6/2019, de modo que teria sido extrapolado o prazo regimental de 15 dias para a insurgência recursal.

Para a magistrada, portanto, o termo inicial de contagem do prazo de um ano para a RevDis seria a data de 27/8/2019, e não a data de publicação do último acórdão (3/11/2021), o que resultaria na intempestividade da revisão disciplinar.

Inobstante, o TJPB informou que seu Tribunal Pleno acolheu, à unanimidade, a questão de ordem suscitada pelo Desembargador Márcio Murilo da Cinha Ramos, que sustentara sobre a existência de erro material ocorrido no julgamento anterior e, de ofício, reconheceu a tempestividade do recurso e decidiu pela continuidade do julgamento do feito.

Desse modo, uma vez reconhecida a tempestividade do recurso pelo Tribunal Pleno do TJPB, não compete a este Conselho Nacional intervir nessa decisão, sob pena de interferência indevida, máxime porque este órgão censor não atua como instância recursal.

Rejeito a preliminar.

 

III- DO MÉRITO

Em um primeiro momento, os fatos descritos na peça revisional foram trazidos ao conhecimento deste Conselho Nacional de Justiça, por meio da Reclamação Disciplinar autuada sob o nº 0009858-89.2017.2.00.0000, proposta pelo Banco Bradesco S/A, ocasião em que o então Ministro Corregedor Nacional de Justiça João Otávio de Noronha determinou a apuração dos fatos denunciados no órgão censor local, mantendo-se o acompanhamento concomitante do feito (Id 2327978- RD 9858-89.2017).

Foi instaurada, na origem, por força dessa determinação, a Reclamação Disciplinar nº 0000039-80.2018.8.15.1001, no bojo da qual foi prolatado despacho, da lavra do Juiz Corregedor Ricardo da Costa Freitas, opinando pela instauração da sindicância, por meio da Portaria de Sindicância nº 07/2018, para apurar eventual responsabilidade funcional, relacionada a suposta fraude processual nos Autos nº 0003998-32.2012.8.15.0011, mais tarde autuada sob o nº 0000356-78.2018.8.15.1001 (Id 4813201 e Id 4813442 fls. 92).

Depois de instruído o procedimento investigativo, adveio a decisão do Corregedor-Geral de Justiça, Desembargador Marcelo da Fonseca Oliveira, que homologou o parecer do Juiz Corregedor Antônio Silveira Neto e determinou o arquivamento da sindicância (Id 5033742 pg.3).

Em 3 de novembro de 2021, o recurso interposto contra a indigitada decisão homologatória foi julgado pelo Tribunal Pleno do TJPB, em acórdão assim ementado:

RECLAMAÇÃO DISCIPLINAR. SINDICÂNCIA. ARQUIVAMENTO DETERMINADO PELA CORREGEDORIA-GERAL DE JUSTIÇA. IRRESIGNAÇÃO. DESVIO DE CONDUTA FUNCIONAL PRATICADO POR MAGISTRADA E SERVIDORES DA 1ª VARA CÍVEL DA COMARCA. VIOLAÇÃO AO PRINCÍPIO DA IMPARCIALIDADE E PROCEDIMENTO INCORRETO. INDÍCIOS SUFICIENTES À INSTAURAÇÃO DO PAD. QUORUM DE INSTAURAÇÃO NÃO ATINGIDO – 9 VOTOS PELA INSTAURAÇÃO; 4 VOTOS PELA MANUTENÇÃO DO ARQUIVAMENTO. DESPROVIMENTO DO RECURSO COM COMUNICAÇÃO AO CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA.

- Não atingido o quórum de instauração do PAD, é de ser mantido o arquivamento determinado pela Corregedoria Geral de Justiça, com comunicação ao Conselho Nacional de Justiça. 

No voto do Desembargador Relator Leandro dos Santos, depois de analisar pormenorizadamente a acusação e documentos instrutórios da sindicância, concluiu pela abertura do PAD, sem afastamento cautelar da magistrada, com base nos seguintes fundamentos (Id 4931351):

(...)

Por fim, sobre a aparente quebra do princípio da imparcialidade para beneficiar a Autora, algumas considerações precisam ser feitas.

O reclamante aponta as seguintes movimentações do processo que seriam prova dessa quebra da parcialidade.

09/04/2014 – contas apresentadas pela Autora;

14/04/2014 – processo concluso;

15/04/2014 – despacho que ordena a perícia técnica;

15/04/2014 – apresentação pela autora das guias de diligência para intimação da perita;

23/04/2014 – mandado expedido para a perita;

25/04/2014 - manifestação de aceite da perita;

28/04/2014 – conclusão;

05/05/2014 – despacho intimando a Autora para pagar honorários da perita;

20/05/2014 – apresentação pela Autora do comprovante de pagamento dos honorários periciais;

22/05/2014 – mandado expedido para a perita;

29/05/2014 – carga dos autos à perita;

04/07/2014 – apresentação do laudo;

16/07/2014 – despacho intimando a Autora sobre o laudo;

22/07/2014 – concordância da autora sobre o laudo; 01/08/2014 – proferida sentença homologatória;

 

Ao examinar os autos, identifiquei outros movimentos da Ação que merecem atenção:

 

12/11/2013 – sentença publicada;

12/11/2013 – sentença registrada;

13/11/2013 – certidão de nota de foro;

26/11/2013 – certidão de trânsito em julgado.

22/01/2014 – certidão de juntada de petição da Autora;

27/01/2014 – expedição de carta de intimação;

 

Na primeira relação de atos citados pela Reclamante, constata-se que, entre 09/04/2014 a 01/08/2014; ou seja: menos de 04 meses, o processo recebeu cerca de 15 movimentações, o que não é pouco, considerando o movimento forense de uma vara cível na Comarca de Campina Grande, que não possibilita, como sabemos, que a juíza possa dispensar tanto atenção a um só processo.

E como destaquei, entre 12/11/2013 a 27/01/2014, foram cerca de seis movimentos, em um curto espaço de tempo de pouco mais de 02 meses, o que é absolutamente incomum, a princípio, sabendo-se da quantidade de feitos que igualmente precisam de impulso em unidades dessa competência jurisdicional cível em Comarca de grande porte.

Estes dois fenômenos, entendo, precisam de esclarecimentos por intermédio de uma instrução mais detalhada, inclusive, para possibilitar que a DITEC, pelos meios técnicos disponíveis, possa avaliar a realidade daquela unidade judiciária e examinar a movimentação de outros processos, naquele período, em comparação com os presentes autos. É que a sindicância não se debruçou sobre esse detalhamento, e tal providência é indispensável quando se apura o que fora denunciado.

É concreto, pelo menos neste momento preambular de análise das provas, uma aparente tramitação diferenciada dos autos da Prestação de Contas, o que representaria privilégio odioso, com violação ao dever de imparcialidade.  

Se por algum motivo a juíza favoreceu voluntariamente a Autora, não posso fugir ao convencimento de que o PAD precisa ser instaurado para, se for o caso, aplicar a sanção correspondente a quem de direito merecê-la.

Lembro-me que nos idos de 2010, em Correição Extraordinária, essa prática foi detectada em algumas unidades judiciárias de Campina Grande, por coincidência também na 1ª Vara Cível, ensejando a instauração do competente PAD, irregularidades essas evidenciadas quando do exame detalhado de todos os atos praticados ao longo da instrução de dezenas de processos.

Por outro lado, comprovando-se que essa aparente celeridade é uma marca registrada da Vara e ocorreu em outros processos ali em tramitação, então não haverá ato disciplinar punível.

É importante destacar que o Conselho Nacional de Justiça, ao início de sua manifestação, para depois encaminhar os autos à Corregedoria Geral de Justiça deste Tribunal, expressou certa perplexidade com a história desse processo.

O arquivamento sumário de sindicância, como mecanismo de encerramento da possibilidade de instauração do PAD, exige prova convincente, estreme de dúvidas da ausência de qualquer elemento de prova sobre a prática de desvio funcional.

E não estou convencido de que não há elementos, ao menos indiciários, para a instauração do PAD, pelo que é indispensável que esses fatos sejam enfrentados com maior amplitude do que permite uma simples sindicância, e, aí sim, concluir ou não pela inexistência de falta disciplinar punível.

Neste primeiro momento, insisto, não se exige prova concreta de desvio de conduta funcional. Meros indícios são meios suficientes à instauração do PAD, para uma melhor apuração dos fatos contidos na reclamação.  

(...)

Neste caso, imputa-se à magistrada infração ao dever do cargo – dever de imparcialidade – com conotação de procedimento incorreto, que permite a aplicação de CENSURA ou outra penalidade mais grave, caso se justifique, na hipótese de procedência do PAD.

O procedimento incorreto da magistrada está delineado, a princípio, a partir dos elementos de prova já colhidos, pela consciente celeridade diferenciada dada ao processo de Prestação de Contas, ignorando, neste juízo inicial de avaliação, as demais ações da unidade judiciária que exigiam igual impulso e isonômico tratamento.

A jurisdição não se encerra com a atividade jurisdicional. A gestão cartorária, incluindo a de pessoal, também faz parte dos deveres do cargo, no contexto de fazer cumprir os atos de ofício com exatidão e respeitando as disposições legais. Ter o controle das ações dos servidores para evitar desvios de conduta também faz parte da atividade administrativa que envolve a condição de ser juiz ou juíza.

Não se pode relevar a omissão consciente da magistrada, como os indícios estão apontando, ao não se cercar de cautelas na escolha de um perito que lhe vai fornecer elementos essenciais ao desate do litígio. Por isso, ao receber um laudo pericial, não basta ao juiz expressar seu convencimento, em uma demanda que envolve milhões, ainda mais quando o pretenso credor já havia apresentado cálculos com valores elevados. É preciso estar com olhos atentos a distorções; é preciso questionar o trabalho do auxiliar da justiça para saber da correção e da expertise da pessoa encarregada da prova pericial, para captar informações sobre aquilo que foi feito. Se a magistrada não tem compromisso com a perícia que será seu guia na conclusão de matéria técnica controvertida, examinando-a com olhar crítico e pronta para detectar anomalias, é possível que termine por deixar passar vícios inconscientes ou equívocos voluntários, que se consumarão ao arrepio da imprescindibilidade da justiça.

Neste aspecto, parece-me surreal que uma perícia contábil sobre centenas e centenas de documentos, e sem a disponibilidade do contrato pactuado entre as partes para servir de parâmetro, pois não fora juntado aos autos, tenha recaída em pessoa que estava inabilitada junto ao Conselho respectivo, desde 22/03/2011, conforme declaração trazida aos autos da Sindicância, fl. 1.814, assinada pela Presidente daquele órgão.

Há dúvida, pois, de que a designação da “perita-contadora”, que não poderia exercer a profissão por estar inabilitada há vários anos, é indício de falta disciplinar?

A magistrada não tem nenhuma responsabilidade sobre essa indicação?

É possível que uma perícia judicial, que exigia conhecimentos técnicos contábeis, possa ser realizada por profissional desabilitado?

Quem indicou essa perita? Se ela não estava no cadastro do TJPB, e depois se constatou que nem habilitada estava para realizar perícia judicial, porquanto afastada do exercício da profissão há vários anos, qual o critério, se houve, que conduziu a magistrada a indicá-la para atuar em cálculos daquele processo?

Causa espécie!

São questionamentos que precisam de esclarecimento para se determinar a responsabilidade ou não sobre esse evento estranho ocorrido em um processo judicial.

Se eu opto por indicar uma perita que nem estava cadastrada no site do TJPB, eu assumo a responsabilidade, em tese, por eventuais erros ou irregularidades que essa perícia possa ter, inclusive, mais ainda, quando se descobre que a pseudo-perita era inabilitada para atuar como contadora. E ela confessa isso no seu depoimento. Como, então, achar que esse lamentável fato não gerou nenhuma responsabilidade da magistrada e que nem precisa ser apurado por intermédio do respectivo PAD qualquer desvio de conduta?

Discordo, pedindo vênia, ao entendimento exarado pelo Juiz Auxiliar da Corregedoria que discorreu sobre o referido cadastro, que, na sua visão, destinava-se aos feitos da Justiça Gratuita, pelo que a juíza não estava vinculada a pesquisá-la.

Lógico que o magistrado pode indicar um perito de sua confiança, com conhecimento técnico suficiente ao desate da controvérsia, e que não esteja na lista em referência. Só que, nesta hipótese, muito mais será a responsabilidade do juiz se a designação recair em pessoa que não poderia ou não deveria atuar no processo como auxiliar da justiça.

(...)

Nos dois diplomas, há rígidos requisitos para a atuação como perito judicial. A magistrada, ao que indicam os indícios, não cumpriu nenhum deles.

Apenas para ilustrar a seriedade da designação de um perito, seria possível indicar aqui inúmeros julgados sobre o tema, a partir do entendimento de que há nulidade do ato pericial, quando realizado por profissional sem registro no órgão de classe, e nem é preciso dizer dos prejuízos causados ao processo a ocorrência desse vício, em tese, insanável. 

O Relator chamou a atenção de seus pares para o depoimento da perita SÔNIA MARIA FERREIRA GUEDES, cujas respostas às indagações a ela dirigidas denotaram total desconhecimento sobre seu próprio trabalho, in verbis:

(...)

Perguntada se tinha registro no conselho de contabilidade, a perita respondeu que não, admitindo ter elaborado o laudo sem registro profissional, conforme trecho 09’40’’ parte 02 do seu depoimento, e quando não mais trabalhava como contadora (10’50’’ parte 02), mesmo se apresentando como tal perante a Vara munida da carteira profissional (11’05’’ e 11’45’’ parte 02).

Questionada sobre a forma de elaboração dos trabalhos, a perita informou que: “lançava os valores pelos dados que eu tinha e jogava na planilha e saia os cálculos” (8’18’’ parte 02).

Confirmou a aplicação de correção monetária e juros e, indagada se poderia especificar quais, a perita respondeu que: “só se eu tivesse pra analisar. Talvez eu lembrasse (sic)” (09’08’’ parte 02).

Quando lhe foi apresentada cópia do laudo elaborado por ela própria, respondeu: “nem vou pegar nessa planilha [...] Agora realmente se eu pegar essa planilha, eu não vou lembrar [...]” (25’00’’ parte 02).

É que, consumados eventuais vícios, a razão de ser da prestação jurisdicional estará comprometida, diante de um descaso no exercício do cargo. Restará, então, esclarecer a ocorrência de dolo, de culpa ou mero equívoco involuntário. Mas só a instrução do processo administrativo disciplinar poderá apurar os fatos na amplitude necessária da busca da verdade. Por enquanto, o que existe é uma situação nebulosa a exigir de nós a apuração necessária e indispensável. 

Conquanto os substanciosos fundamentos do Desembargador Relator, o Plenário do TJPB, em apertada votação, determinou o arquivamento do feito, por não ter alcançado o quórum de julgamento suficiente, uma vez que, dos 19 (dezenove) desembargadores que compõem o Órgão colegiado competente, 9 (nove) votaram pela instauração do PAD; 4 (quatro) pela manutenção do arquivamento; 3 (três) se declararam suspeitos; 2 (dois) impedidos, e 1 (um) ausente mantendo-se, assim, a decisão de arquivamento da Corregedoria-Geral de Justiça. 

A narrativa das circunstâncias, no entanto, revela indícios de falta funcional grave praticada pela Juíza de Direito RITAURA RODRIGUES SANTANA.

Denota-se dos autos uma aparente anormalidade na condução da Ação de Prestação de Contas nº 0003998-32.2012.815.0011, por parte da magistrada processada, no exercício da jurisdição da 1ª Vara Cível da Comarca de Campina Grande/PB, de que é titular, com fortes indícios de quebra sobretudo do dever de imparcialidade.

Os atos lesivos supostamente praticados pela magistrada teriam se iniciado ainda na fase embrionária do citado processo judicial, com o impulsionamento da ação munida de petição inicial inepta, contendo alegações genéricas e desprovidas de documentos indispensáveis para o processamento do feito.

Soma-se a isso uma tramitação inusitadamente célere, aparentemente muito à margem da ordem cronológica de conclusão, com prolação de decisões e expedientes relâmpagos em favor da autora da ação, inclusive, deixando-se de publicar atos processuais relevantes, como a decisão que deflagrou os trabalhos técnicos, violando, em tese, também seu dever de transparência e respeito ao devido processo legal.

Como registrado no voto do Desembargador Relator, a rapidez com que fora processado o feito chama atenção quando se observa as movimentações ocorridas entre 9/4/2014 e 1º/8/2014, em que em menos de 4 (quatro) meses, o processo recebeu cerca de 15 (quinze) movimentações, incluindo a homologação dos valores relativos à segunda fase da ação de prestação de contas, o que não é pouco em uma vara cível do porte da Comarca de Campina Grande - que evidentemente não possibilita que a juíza possa dispensar tanta atenção a um só processo, dada a expressiva movimentação forense.

Ainda, entre 12/11/2013 a 27/1/2014, foram cerca de 6 (seis) movimentos em um curto espaço de tempo de pouco mais de 2 (dois) meses, o que, segundo o Desembargador Relator “é absolutamente incomum, a princípio, sabendo-se da quantidade de feitos que igualmente precisam de impulso em unidades dessa competência jurisdicional cível”.

Não se diga que a celeridade processual seja um fato a ser reprimido, sendo, ao contrário, um direito fundamental e uma providência desejável pelos jurisdicionados, não obstante, como bem ressaltado no voto em foco, essa aparente tramitação diferenciada não pode representar privilégio odioso em favor de uma das partes do processo judicial, de modo que se faz necessária “uma instrução mais detalhada, inclusive, para (...) avaliar a realidade daquela unidade judiciária e examinar a movimentação de outros processos, naquele período, em comparação com os presentes autos. É que a sindicância não se debruçou sobre esse detalhamento, e tal providência é indispensável quando se apura o que fora denunciado”.

As aparentes irregularidades não param por aí, mas ainda se agravariam com a nomeação para atuar como perita judicial da senhora SÔNIA MARIA FERREIRA GUEDES a quem se confiou a realização dos complexos cálculos para a apuração dos valores que teriam sido debitados equivocadamente das contas da empresa autora e que resultou na homologação de quantia estratosférica em desfavor do requerente.

Causa certa estranheza a magistrada reconhecer expressamente em sentença que a matéria em questão demandava, pela complexidade, “certo grau de conhecimento no âmbito das relações bancárias” (Id 4813418 fls. 31), mas nomear perita que nem sequer pertencia ao quadro de peritos cadastrados junto ao TJPB e que se encontrava inabilitada junto ao Conselho Profissional respectivo, desde 22/3/2011, tudo isso sem exigir minimamente uma comprovação quanto à sua expertise, sendo suficiente uma petição da autointitulada contabilista informando estar apta e aceitando o encargo, sem maiores exigências (Id 4813418 fls. 93).

O resultado da falta de prudência na escolha da expert está evidenciado no desacerto do laudo pericial (Id 4813491), em que, a partir de sua simples leitura, é possível identificar vários equívocos, que terminou por majorar uma dívida nominal de R$ 159.423,67 (cento e cinquenta e nove mil, quatrocentos e vinte e três reais e sessenta e sete centavos) para R$ 6.456.320,13 (seis milhões quatrocentos e cinquenta e seis mil, trezentos e vinte reais e treze centavos) e que, hoje, provavelmente, aproxima-se dos R$ 20.000.000,00 (vinte milhões de reais), que ainda não foram levantados, segundo informa o requerente, em razão da obtenção de liminar no e. Superior Tribunal de Justiça. Como bem observou o Desembargador Relator:

(...)

Não é preciso muito esforço para compreender o aparente desacerto processual da perita. Ela não poderia tomar posição revisora do pacto assinado pelas partes, pois não é da sua alçada essa competência. Mudar as regras contratuais só é viável por intermédio da ação cabível, como já foi destacado, o que exigiria severo confronto de cláusulas contratuais. Por consequência lógica, o entendimento de ter sido aplicado “taxas acima da média de mercado” não é papel do perito neste tipo de ação. Falo, obviamente, em momento de obiter dictum.

(...)

Tem mais. Na perícia dos autos em alusão, a perita textualmente emite juízo de valor sobre a taxa média de mercado ser “absurda em função do arrefecimento das transações”. Sem sombra de dúvida, a perita judicial não tem essa função de exercer um juízo crítico sobre as relações contratuais havidas entre bancos e clientes.

Se não bastasse, a perita ainda chegou a dizer: “desse modo, optamos por calcular uma taxa média a partir dos meses de janeiro de 2009 até abril de 2010”.

Sem maiores delongas, essa conclusão da perita é sem sentido, permitam-me ficar apenas neste adjetivo, e com a vênia necessária. Mais uma vez, a perita alterou as cláusulas contratuais estabelecidas pelas partes para tomar posição naquilo que era, na sua ótica, mais favorável à Empresa Autora. E nem estou falando que a própria perita reconhece textualmente que não viu nenhum contrato nos autos, o que, por si só, já colocaria em cheque suas conclusões. Mas volto a dizer: não estamos julgando a perícia em si.

Por fim, a perita também disse que “discordava” de alguns valores cobrados pelo Banco (grifei). 

Foge de qualquer lógica a suposição de que apenas cálculos de encargos a maior pudessem ter uma cifra de milhões, e considerando ter a senhora perita chegado a esses absurdos valores a partir da análise de alguns extratos bancários, sem analisar o contrato entabulado entre as partes, em uma ação cujo valor atribuído à inicial era de R$ 1.000,00 (mil reais), a magistrada simplesmente chancelou o que chamou de “boas contas” apresentadas e homologou a quantia milionária, sem maiores indagações (Id 4813418 fls. 31).

O Código de Processo Civil vigente à época dos fatos dispunha sobre rígidos requisitos para atuação como perito judicial, os quais, ao que parece, a magistrada não cumpriu nenhum, in verbis:

Art. 145. Quando a prova do fato depender de conhecimento técnico ou científico, o juiz será assistido por perito, segundo o disposto no art. 421.

§ 1º Os peritos serão escolhidos entre profissionais de nível universitário, devidamente inscritos no órgão de classe competente, respeitado o disposto no Capítulo Vl, seção Vll, deste Código. (Incluído pela Lei nº 7.270, de 10.12.1984)

§ 2º Os peritos comprovarão sua especialidade na matéria sobre que deverão opinar, mediante certidão do órgão profissional em que estiverem inscritos. (Incluído pela Lei nº 7.270, de 10.12.1984)

§ 3º Nas localidades onde não houver profissionais qualificados que preencham os requisitos dos parágrafos anteriores, a indicação dos peritos será de livre escolha do juiz. (Incluído pela Lei nº 7.270, de 10.12.1984)

Art. 146. O perito tem o dever de cumprir o ofício, no prazo que Ihe assina a lei, empregando toda a sua diligência; pode, todavia, escusar-se do encargo alegando motivo legítimo.

Parágrafo único. A escusa será apresentada dentro de 5 (cinco) dias, contados da intimação ou do impedimento superveniente, sob pena de se reputar renunciado o direito a alegá-la (art. 423). (Redação dada pela Lei nº 8.455, de 24.8.1992)

Art. 147. O perito que, por dolo ou culpa, prestar informações inverídicas, responderá pelos prejuízos que causar à parte, ficará inabilitado, por 2 (dois) anos, a funcionar em outras perícias e incorrerá na sanção que a lei penal estabelecer.

Aqui, vale a transcrição das considerações do voto vencido sobre o ponto:

(...)

Por isso, ao receber um laudo pericial, não basta ao juiz expressar seu convencimento, em uma demanda que envolve milhões, ainda mais quando o pretenso credor já havia apresentado cálculos com valores elevados. É preciso estar com olhos atentos a distorções; é preciso questionar o trabalho do auxiliar da justiça para saber da correção e da expertise da pessoa encarregada da prova pericial, para captar informações sobre aquilo que foi feito. Se a magistrada não tem compromisso com a perícia que será seu guia na conclusão de matéria técnica controvertida, examinando-a com olhar crítico e pronta para detectar anomalias, é possível que termine por deixar passar vícios inconscientes ou equívocos voluntários, que se consumarão ao arrepio da imprescindibilidade da justiça.

(...)

Se eu opto por indicar uma perita que nem estava cadastrada no site do TJPB, eu assumo a responsabilidade, em tese, por eventuais erros ou irregularidades que essa perícia possa ter, inclusive, mais ainda, quando se descobre que a pseudo-perita era inabilitada para atuar como contadora. E ela confessa isso no seu depoimento. Como, então, achar que esse lamentável fato não gerou nenhuma responsabilidade da magistrada e que nem precisa ser apurado por intermédio do respectivo PAD qualquer desvio de conduta?

(...) 

Lógico que o magistrado pode indicar um perito de sua confiança, com conhecimento técnico suficiente ao desate da controvérsia, e que não esteja na lista em referência. Só que, nesta hipótese, muito mais será a responsabilidade do juiz se a designação recair em pessoa que não poderia ou não deveria atuar no processo como auxiliar da justiça (grifei). 

Em decorrência da atuação temerária da perita, o requerente informa que os supostos atos ilícitos praticados por ela estão sendo processados na Ação Penal tombada sob o nº 0007051-74.2019.8.15.0011, na 4ª Vara Criminal da Comarca e Campina Grande, em que responde como incursa nos crimes dos artigos 299 e 342 do Código Penal brasileiro e artigo 47 da Lei de Contravenções Penais (Id. 4813440 fls. 34). 

Todos esses fatos geram muitas dúvidas e questionamentos que devem ser esclarecidos, como o que levou a magistrada a nomear a dita perita sem qualificação, sem pertencer a seus quadros de peritos e inabilitada para a função, quem a teria indicado, qual o critério de escolha, o que motivou a tramitação açodada do feito, se haveria ou não interesse na demanda, entre outras.

Esses esclarecimentos demandam um espaço instrutório maior no bojo do processo administrativo disciplinar, sob o crivo do contraditório e da ampla defesa. A instrução do PAD poderá colher esses dados para se determinar a ocorrência ou não de privilégios na tramitação da ação judicial em foco, tendo em vista a aparente sucessão de conclusões, despachos, decisões, e outros diversos atos cartorários de impulsionamento noticiados pelo requerente.

As questões apontadas, que obviamente compreendem aspectos jurisdicionais, podem indicar desvio funcional, uma vez que a convicção do magistrado, tanto na condução quanto na decisão do processo, não pode servir como salvaguarda à violação do devido processo legal ou justificativa para eventual inversão tumultuária do processo.

Destarte, as evidências constantes nos autos indicam que a conduta da requerida aparenta ser contrária aos deveres de cumprir e fazer cumprir, com independência, serenidade e exatidão, as disposições legais e os atos de ofício, bem como diante da não observação da imparcialidade, prudência e transparência, dignidade, honra e decoro de suas funções, circunstâncias que vão de encontro à decisão de arquivamento, e que, em tese, caracterizam uma afronta ao artigo 35, inciso I, da LOMAN, combinado com os artigos 1º, 8º, 11, 24, 25 e 37 do Código de Ética da Magistratura Nacional. 

 Presentes robustos indícios do cometimento de falta funcional, a abertura do competente processo disciplinar para a apuração dos fatos é medida que se impõe, conforme orienta a sedimentada jurisprudência do CNJ.

Por derradeiro, considerando a dificuldade de formação de quórum adequado para julgamento na origem, com grande número de desembargadores impedidos ou suspeitos, recomenda-se que o PAD seja processado no âmbito deste CNJ (CNJ - PP - Pedido de Providências - Corregedoria - 0000577-75.2018.2.00.0000 - Rel. HUMBERTO MARTINS - 302ª Sessão Ordinária - julgado em 17/12/2019).

 

IV. DA PRESCRIÇÃO

De acordo com o artigo 24 da Resolução CNJ 135/2011, o prazo de prescrição de falta funcional praticada pelo magistrado é de cinco anos, contado a partir da data em que o tribunal tomou conhecimento do fato, salvo quando configurar tipo penal, hipótese em que o prazo prescricional será o do Código Penal.

Uma vez capitulada a infração administrativa como crime, ainda que ação penal não tenha sido deflagrada, o prazo a ser observado é o constante no Código Penal, cujo termo a quo será o dia em que o em que o ilícito se consumou (art. 111, I, do CP).

O e. Supremo Tribunal Federal, no AgR. em RMS n. 31.506, de Relatoria do Ministro Barroso, entendeu que quando a falta funcional do magistrado também configurar, em tese, infração penal, a prescrição deverá obedecer aos prazos estabelecidos no Código Penal. Sobre a questão o e. Ministro expôs:

(...)

4. Assim, não merece reparo acórdão recorrido, consentâneo com o entendimento desta Corte, no sentido de que, capitulada a infração administrativa como crime, o prazo prescricional da respectiva ação disciplinar tem por parâmetro o estabelecido na lei penal (art. 109 do CP), conforme determina o art. 142, § 2º, da Lei nº 8.112/1990, independentemente da instauração de ação penal. A orientação decorre não só da disposição expressa e clara da norma legal, a qual não vincula a aplicação do prazo prescricional diferenciado à existência de ação penal em curso (“[o]s prazos de prescrição previstos na lei penal aplicam-se às infrações disciplinares capituladas também com o crime”), mas, também, do princípio da independência entre as esferas penal e administrativa.

A posição sustentada pelo agravante pauta-se no fundamento de que, sem a deflagração da iniciativa criminal, seria incerto o tipo em que o servidor seria incurso e, portanto, não seria razoável a aplicação do art. 142, § 2º, da Lei nº 8.112/1990. Tal argumento, no entanto, é frágil, já que nem mesmo no âmbito da ação penal instaurada há garantia de não alteração da capitulação dos fatos(art. 383 do CPP).

O prazo prescricional diferenciado encontra justificativa suficiente na gravidade da infração disciplinar, razão pela qual se revela desnecessário subordinar a incidência da norma estatuária à existência de ação penal em curso, em concomitância com o PAD.

Dito isso, reitero que o arquivamento do inquérito policial instaurado contra o ora recorrente (IP nº 013/2000) não impede que a prescrição da ação disciplinar seja calculada nos termos do art. 142, § 2º da Lei nº 8.112/1990, já que a não instauração de ação penal teve por base, no caso, a insuficiência de provas para persecução criminal, e não outra causa que produzisse coisa julgada no cível. É dizer: não houve reconhecimento de estado desnecessidade, legítima defesa, estrito cumprimento de dever legal ou exercício regular de direito, nem foi afirmada, categoricamente, a inexistência do fato (e.g.,CPP, arts.65 e 66).

Nos presentes autos, considerando os elementos de prova coligidos aos autos, é possível concluir pela presença de fortes indícios de que a magistrada tenha atuado de forma parcial em detrimento do interesse da instituição bancária, com o propósito de favorecer a parte autora nos autos da multicitada ação de prestação de contas.

O motivo que pode ter levado a magistrada a ser parcial na condução de todo o processo judicial deverá ser comprovado no PAD, ou apurado no âmbito criminal, porquanto as instâncias administrativas e penais são independentes, e podem ser encontradas novas provas.

Comprovada a parcialidade, pode configurar, em tese, os crimes de corrupção passiva ou concussão, os quais deverão ser apurados na esfera criminal.

O crime de corrupção passiva, previsto no artigo 317 do Código Penal, tem pena máxima de doze anos e prescreve em dezesseis anos; o crime de concussão, previsto no artigo 316 do Código Penal, tem pena máxima de oito anos e prescreve em doze anos.

Ainda que se considere o menor prazo, de 12 (doze) anos, a pretensão punitiva não estaria prescrita.

Este CNJ assim já decidiu em caso semelhante:

REVISÃO DISCIPLINAR. TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO. INSTAURAÇÃO DE OFÍCIO. DECADÊNCIA E PRESCRIÇÃO. INOCORRÊNCIA. JULGAMENTO NA ORIGEM CONFORME A PROVA CONTIDA NOS AUTOS. IMPROCEDÊNCIA DO PEDIDO.

1. Revisão Disciplinar instaurada de ofício em face de decisão de arquivamento proferida pelo TJSP que apurava suposta quebra de imparcialidade na atuação jurisdicional de magistrado da Corte paulista.

2. Alegação de decadência afastada pela Suprema Corte no julgamento do MS 34621/DF.

3. A suposta falta funcional praticada pelo magistrado caracteriza infração criminal, razão pela qual impõe-se a observância dos prazos prescricionais do Código Penal.

4. Das dez condutas imputadas ao requerido, oito estão sendo apuradas por este Conselho, no PAD n. 0006818-36.2016.2.0000, motivo pelo qual apenas os itens “d” e “j” serão objeto desta RevDis para evitar a configuração de bis in idem.

5. Os fatos aqui apurados (itens “d” e “j”), nos processos em que a advogada Vanuza Sampaio atuou, não demonstram nexo ou ligação com a suposta relação entre o magistrado e seu marido (Luciano Ramos Volk) ou qualquer quebra de imparcialidade.

6. Dessa forma, no que tange aos fatos das alíneas “d” e “j”, a decisão de arquivamento no TJSP não se apresenta contrária a texto expresso de lei, a evidência dos autos ou a ato normativo do CNJ; não há fundamento em provas falsas; tampouco fatos novos que autorizem sua modificação, de modo que a instauração de Processo Administrativo Disciplinar deve ser rejeitada.

7. Revisão Disciplinar julgado improcedente.

(CNJ - REVDIS - Processo de Revisão Disciplinar - Conselheiro - 0006321-22.2016.2.00.0000 - Rel. MARCOS VINÍCIUS JARDIM RODRIGUES - 63ª Sessão Virtual - julgado em 17/04/2020).

 

Destarte, não há de se falar em prescrição da pretensão punitiva 

V. CONCLUSÃO

Ante o exposto, determino a convolação da presente REVDIS em PCA e, no mérito, julgo procedente o pedido, para determinar a desconstituição da decisão proferida pelo Órgão Pleno do TJPB no Processo Disciplinar/Sindicância nº 0000356-78.2018.815.1001, com a instauração do PADMag, sem afastamento cautelar do cargo, em face da Juíza de Direito RITAURA RODRIGUES SANTANA, por violação, em tese, dos deveres impostos no art. 35, incisos I, da Lei Orgânica da Magistratura Nacional, bem como pela não observância das regras de imparcialidade, independência, prudência e transparência, dignidade, honra e decoro de suas funções, previstas nos artigos 1º, 8º, 11, 24, 25 e 37 do Código de Ética da Magistratura Nacional.

É como voto.

Comuniquem-se as partes.

À Secretaria Processual, para as providências a seu cargo.

Brasília, data registrada em sistema.

 

Conselheiro Marcello Terto

Relator

 

 

 

 

PORTARIA Nº xx– PAD, DE xx DE xx DE 2023.

 

A PRESIDENTE DO CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA, no uso de suas atribuições constitucionais e regimentais,

CONSIDERANDO que o Conselho Nacional de Justiça detém competência para, nos termos do art. 88 do Regimento Interno, determinar a instauração de processo administrativo disciplinar;

CONSIDERANDO o disposto no §5º do art. 14 da Resolução CNJ n. 135, as disposições pertinentes da Lei Complementar n. 35, de 14 de março de 1979 (Lei Orgânica da Magistratura Nacional), da Lei n. 8.112, de 11 de dezembro de 1990 (Regime Jurídico dos Servidores Públicos Civis da União), da Lei n. 9.784, de 29 de janeiro de 1999, e do Regimento Interno deste Conselho;

CONSIDERANDO a decisão tomada pelo Plenário do Conselho Nacional de Justiça no julgamento da Revisão Disciplinar n. 0004861-87.2022.2.00.0000, na XXª Sessão Ordinária realizada em xx de xx de 2023;

RESOLVE:

Art. 1º Instaurar processo administrativo disciplinar, sem afastamento cautelar do cargo, em face de Ritaura Rodrigues Santana para apurar a violação, em tese, dos deveres impostos no art. 35, inciso I, da Lei Orgânica da Magistratura Nacional, bem como pela não observância das regras de imparcialidade, independência, prudência e transparência, dignidade, honra e decoro de suas funções, previstas nos artigos 1º, 8º, 11, 24, 25 e 37 do Código de Ética da Magistratura Nacional, em razão de ter supostamente atuado de forma parcial na condução da Ação de Prestação de Contas nº 0003998-32.2012.8.15.0011, causando prejuízo à instituição bancária requerida, em favorecimento da empresa autora, mediante a tramitação fora do comum do processo e a nomeação de perita não credenciada nem habilitada profissionalmente no órgão regulatório competente, sugerindo a subsunção ao tipo penal de corrupção passiva ou concussão.

Art. 2º Determinar que a Secretaria Processual do CNJ dê ciência ao Presidente do Tribunal de Justiça do Estado da Paraíba da decisão tomada pelo Conselho Nacional de Justiça.

Art. 3º Determinar que o processo administrativo disciplinar instaurado deverá tramitar neste Conselho Nacional de Justiça, nos termos da presente Portaria.

 

MINISTRO LUÍS ROBERTO BARROSO

Presidente do Conselho Nacional de Justiça



[1] Art. 11. Instaurada a sindicância, será permitido ao sindicado acompanhá-la.