Conselho Nacional de Justiça

 

Autos: PEDIDO DE PROVIDÊNCIAS - 0001836-52.2022.2.00.0813
Requerente: ANÔNIMO
Requerido: LUDMILA LINS GRILO

 

 

 

EMENTA

 

 PEDIDO DE PROVIDÊNCIAS. CUMPRIMENTO DO ART. 28 DA RESOLUÇÃO CNJ N. 135/2011.  INFRAÇÃO DISCIPLINAR IMPUTADA A JUÍZA ESTADUAL. PUBLICAÇÃO EM REDE SOCIAL DE MENSAGEM COM CONTEÚDO DEPRECIATIVO À DECISÃO DE ÓRGÃO JUDICIAL. VIOLAÇÃO DO DISPOSTO NOS ARTS. 35, I e VIII, 36, III, da LC 35/79 (LOMAN), NOS ARTS. 1°, 2°, 13, 16 e 22 DO CÓDIGO DE ÉTICA DA MAGISTRATURA, BEM COMO DE DISPOSITIVOS DA RESOLUÇÃO 305/2019 DO CNJ. INSTAURAÇÃO DE PROCESSO ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR, COM AFASTAMENTO CAUTELAR DA MAGISTRADA.


 

1. Nos termos do artigo 28 da Resolução CNJ n. 135/2011, os tribunais comunicarão à Corregedoria Nacional de Justiça as decisões de arquivamento dos procedimentos prévios de apuração, de instauração e os julgamentos dos procedimentos administrativos disciplinares relativos aos magistrados que lhes são vinculados, à exceção do Supremo Tribunal Federal.

2. A instauração desse pedido de providências na Corregedoria Nacional ocorreu em virtude da comunicação de arquivamento de expediente por parte da Corregedoria-Geral do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais.

3. À luz do disposto nos incisos III e V do § 4º do artigo 103-B da Constituição de 1988, quando o Tribunal local não procede à instauração de PAD (determinando, consequentemente, o arquivamento da investigação preliminar), exsurge a competência originária do CNJ para reavaliar tal decisão, e não a competência revisional materializada na figura da Revisão Disciplinar (RevDis) prevista no artigo 82 e seguintes do Regimento Interno (CNJ - REVDIS - Processo de Revisão Disciplinar - Conselheiro - 0004541-76.2018.2.00.0000 - relator LUIS FELIPE SALOMÃO - 361ª Sessão Ordinária - julgado em 6/12/2022).

 

4.   A par da jurisprudência do CNJ admitir a denúncia anônima como início de prova, há de se autorizá-la ainda quando instruída com publicação em rede social de que se verifique o seu conteúdo e o perfil do magistrado.

5. A liberdade de expressão não constitui direito absoluto e, no caso dos magistrados, deve se coadunar com o necessário à afirmação dos princípios da magistratura. 

6. Publicações feitas por magistrados em redes sociais, mesmo que privadas, devem observar o disposto na Resolução CNJ n. 305/2019, na medida em que seus deveres éticos não se esvaem com o fim do expediente forense. 

7. Configura infração disciplinar a conduta consistente em publicar mensagem manifestando juízo depreciativo de decisão proferida pelo Órgão Especial do TJMG que havia aplicado a penalidade de advertência à requerida também por comentário em rede social.

8. Elementos indiciários apontam afronta a normas éticas e disciplinares, autorizando a instauração de PAD com afastamento cautelar das funções para o aprofundamento das investigações pelo CNJ.

 

 

 ACÓRDÃO

O Conselho, por unanimidade, decidiu pela instauração de processo administrativo disciplinar em desfavor da magistrada com a imposição de seu afastamento cautelar do cargo, aprovando desde logo a portaria de instauração do PAD, nos termos do voto do Relator. Presidiu o julgamento o Ministro Luís Roberto Barroso. Plenário Virtual, 1º de dezembro de 2023. Votaram os Excelentíssimos Conselheiros Luís Roberto Barroso, Luis Felipe Salomão, Vieira de Mello Filho, Mauro Pereira Martins, Salise Sanchotene, Jane Granzoto, Richard Pae Kim, Marcio Luiz Freitas, Giovanni Olsson, Pablo Coutinho Barreto, João Paulo Schoucair, Marcello Terto e Luiz Fernando Bandeira de Mello. Não votaram os Excelentíssimos Conselheiros Marcos Vinícius Jardim Rodrigues e, em razão da vacância do cargo, o representante da Câmara dos Deputados.

Conselho Nacional de Justiça

Autos: PEDIDO DE PROVIDÊNCIAS - 0001836-52.2022.2.00.0813
Requerente: ANÔNIMO
Requerido: LUDMILA LINS GRILO


RELATÓRIO

O EXMO. SR. MINISTRO LUIS FELIPE SALOMÃO, CORREGEDOR NACIONAL DE JUSTIÇA:   

 

1. Cuida-se de pedido de providências instaurado a fim de cumprir o disposto na Resolução CNJ n. 135/2011, no qual a Corregedoria-Geral da Justiça do Estado de Minas Gerais informou o arquivamento de procedimento investigatório em desfavor da magistrada LUDMILA LINS GRILO, Juíza de Direito da comarca de Unaí/MG.

Em suma, foi noticiado ao Tribunal de origem, por meio de denúncia anônima, a prática dos seguintes fatos:

A magistrada Ludmila Lins Grilo utilizou, mais uma vez, de suas redes sociais para denegrir a imagem do Judiciário brasileiro, ao contestar a advertência que lhe fora imposta pelo Órgão Especial deste Egrégio Tribunal de Justiça de Minas Gerais. Segue link da publicação na rede social do Instagram https://www.instagram.com/p/Cf6ZlnkL6qW/? igshid=YmMyMTA2M2Y= . A linguagem utilizada pela magistrada não condiz com a dignidade do cargo da magistratura e merece, novamente, ser censurada, no rigor do Estatuto que rege a atividade. Ademais, urge que o Tribunal de Justiça de Minas Gerais adote ostensiva investigação quanto à conduta pública da denunciada, que é reiterada e renitente. Se ela não concorda com o regime disciplinar ao qual está submetida, deve ser excluída dos quadros da Judicatura brasileira. (id. 4828492, fl. 1)

O denunciante instruiu o pedido com a cópia da tela da rede social da magistrada (id 4828492, fl. 4).

A Corregedoria local determinou o arquivamento do procedimento investigatório por se tratar de denúncia anônima e, ainda, por não vislumbrar a existência de indícios do cometimento de falta funcional ou de infringência aos deveres da Magistratura (id. 4828492).

Confira-se (id. 4828492, fls. 5-6):

Importa consignar que, no caso em tela, a forma utilizada pelo denunciante corresponde ao anonimato, vedado pelo inciso IV do art. 5º da Constituição da República, já que na peça de ingresso não contém o nome da pessoa que a redigiu, nem a sua identificação. No âmbito estadual, a matéria encontra-se regulamentada pelos artigos 157 e 292, ambos da Lei Complementar nº 59 de 2001, cuja redação ora se reproduz:

[...]

Tem-se, portanto, que a identificação do reclamante é regra cogente para a apuração de denúncias contra magistrados e servidores do Poder Judiciário do Estado de Minas Gerais, posicionamento que tem a finalidade de preservar a dignidade do cargo público contra denúncias e representações infundadas.

Conforme entendimento consolidado, as denúncias anônimas ou representações apócrifas, somente em caráter excepcional, podem ser conhecidas na esfera de atuação da Corregedoria Geral de Justiça e, sempre, caso a caso, após análise e observância dos dados, elementos ou fatos trazidos ao conhecimento deste órgão censor e desde que plausível sua averiguação, o que não se vislumbrou no presente expediente. Isto porque o denunciante, além de não se identificar, deixou de apresentar elementos mínimos a sugerir conduta irregular por parte da Magistrada.

Certo é que na postagem mencionada pelo denunciante, colacionada sob evento 10112418, não há qualquer indício de descumprimento dos deveres legais do cargo por parte da Juíza de Direito Ludmila Lins Grilo.

Ao que se observa, a Magistrada apenas exprime sua irresignação e inconformismo em relação à pena de advertência que lhe fora aplicada pelo Órgão Especial do Tribunal de Justiça de Minas Gerais.

Tal postagem, ao meu sentir, não configura nenhuma conduta ilícita ou atentatória aos deveres dos magistrados.

Portanto, não há elementos mínimos capazes de justificar a instauração de procedimento disciplinar por esta Casa.

 Determinada a intimação da requerida para apresentar defesa prévia (Id 4898967), ela manteve-se inerte, conforme certificado em id 4963273.

 

É o relatório.

J16/F33

 

Conselho Nacional de Justiça

 

Autos: PEDIDO DE PROVIDÊNCIAS - 0001836-52.2022.2.00.0813
Requerente: ANÔNIMO
Requerido: LUDMILA LINS GRILO

 

VOTO

 

O EXMO. SR. MINISTRO LUIS FELIPE SALOMÃO, CORREGEDOR NACIONAL DE JUSTIÇA (Relator):  

 2.  2. O presente expediente teve origem na comunicação de arquivamento, pela Corregedoria-Geral de Justiça do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais - TJMG, do procedimento prévio de apuração disciplinar SEI n. 0515194-77.2022.8.13.0000, destinado a investigar a possível infração funcional cometida pela então Juíza de Direito LUDMILA LINS GRILO através de uma publicação em rede social.

A instauração desse procedimento na origem, em julho de 2022, ocorreu devido a uma denúncia anônima que relatava o uso da rede social pela magistrada para "contestar a advertência que lhe fora imposta pelo Órgão Especial deste Egrégio Tribunal de Justiça de Minas Gerais". A denúncia ainda afirmava que "a linguagem utilizada pela magistrada não condiz com a dignidade do cargo da magistratura". Na ocasião, foi fornecido o link da publicação (https://www.instagram.com/p/Cf6ZlnkL6qW/?igshid=YmMyMTA2M2Y=) e incluída uma cópia da tela da conta da magistrada no Instagram. Veja-se:

 

 

Em 09/08/2022 o Corregedor-Geral de Justiça do TJMG determinou o arquivamento do procedimento nos seguintes termos:

Trata-se de expediente formulado de forma anônima perante o "Fale com o TJMG", em desfavor da Dra. Ludmila Lins Grilo, Juíza de Direito da comarca de Unaí, in verbis:

 

"A magistrada Ludmila Lins Grilo utilizou, mais uma vez, de suas redes sociais para denegrir a imagem do Judiciário brasileiro, ao contestar a advertência que lhe fora imposta pelo Órgão Especial deste Egrégio Tribunal de Justiça de Minas Gerais. Segue link da publicação na rede social do Instagram https://www.instagram.com/p/Cf6ZlnkL6qW/?igshid=YmMyMTA2M2Y=. A linguagem utilizada pela magistrada não condiz com a dignidade do cargo da magistratura e merece, novamente, ser censurada, no rigor do Estatuto que rege a atividade. Ademais, urge que o Tribunal de Justiça de Minas Gerais adote ostensiva investigação quanto à conduta pública da denunciada, que é reiterada e renitente. Se ela não concorda com o regime disciplinar ao qual está submetida, deve ser excluída dos quadros da Judicatura brasileira. Pra ontem". (evento 9963437)

 

A Juíza Auxiliar da Corregedoria, Dra. Soraya Hassan Baz Láuar, destacou, inicialmente, que a forma utilizada pelo denunciante corresponde ao anonimato, o que é vedado pela Constituição da República Federativa do Brasil, no art. 5º, IV, e a Lei Complementar 59/01 exige a identificação do reclamante.

Em sequência, esclareceu que " a identicação do reclamante é regra cogente para a apuração de denúncias contra magistrados e servidores do Poder Judiciário do Estado de Minas Gerais, posicionamento que tem a nalidade de preservar a dignidade do cargo público contra denúncias e representações infundadas". E, considerando o entendimento desta Casa no sentido de que "as denúncias anônimas ou representações apócrifas, somente em caráter excepcional, podem ser conhecidas na esfera de atuação da Corregedoria Geral de Justiça e, sempre, caso a caso, após análise e observância dos dados, elementos ou fatos trazidos ao conhecimento deste órgão censor e desde que plausível sua averiguação", o que não foi apurado no presente expediente, sobretudo porque o denunciante não se identicou e não apresentou elementos mínimos a sugerirem a conduta irregular por parte da Magistrada. Ademais, entendeu que a postagem não congura conduta ilícita ou atentatória aos deveres dos magistrados.

Por fim, como não vislumbrou indícios de falta funcional ou descumprimento de deveres  e  das  obrigações  funcionais  pela  Magistrada,  que  justifiquem  a  instauração  de procedimento disciplinar por Casa Correicional, opinou pelo arquivamento do expediente, com o encaminhamento de cópia integral dos autos à Juíza de Direito reclamada, para ciência. Opinou, ainda, pela comunicação ao CNJ, nos termos do §3º, do art. 9º, da Resolução CNJ n. 135, de 13/7/2011.

Pelo exposto, acolho o parecer da Juíza Auxiliar desta Corregedoria, contido no evento 10192254, pelos seus próprios fundamentos. Proceda-se conforme sugerido.

3.  Na presente situação, surge a competência correcional originária do CNJ, por meio de sua Corregedoria Nacional, para investigar indícios de infrações disciplinares e, se necessário, propor a instauração de um Processo Administrativo Disciplinar perante o Plenário.

Com efeito, de acordo com os incisos III e V do § 4º do artigo 103-B da Constituição de 1988, quando o Tribunal local se omite na instauração de um PAD (resultando no arquivamento da investigação preliminar), emerge a competência originária do CNJ para reavaliar essa decisão. (CNJ - REVDIS - Processo de Revisão Disciplinar - Conselheiro - 0004541-76.2018.2.00.0000 - relator LUIS FELIPE SALOMÃO - 361ª Sessão Ordinária - julgado em 6/12/2022). Isso não se trata de uma revisão disciplinar, sujeita ao prazo decadencial de um ano, mas sim de uma apuração originária (ou direta) regida pelo prazo "prescricional" de cinco anos, conforme o caput do artigo 24 da Resolução CNJ n. 135/2011.

Nessa perspectiva, a competência correcional originária do CNJ é exercida por meio da atuação: (i) da Corregedoria Nacional de Justiça em processos de Reclamação Disciplinar (RD) ou de Pedido de Providências (PP); ou (ii) do Plenário no âmbito do Procedimento de Controle Administrativo (PCA).

Portanto, o presente Pedido de Providências é a ferramenta processual adequada para que o Conselho exerça o devido controle sobre a decisão do Corregedor-Geral de Justiça do TJMG, que determinou o arquivamento do procedimento prévio disciplinar.

4. Entre os fundamentos utilizados para o arquivamento do procedimento no TJMG, destaca-se o anonimato da denunciante.

Entretanto, é importante observar que a jurisprudência do CNJ tende a admitir a denúncia anônima como início de prova. Embora não seja suficiente para iniciar um Processo Administrativo Disciplinar, também não invalida investigações prévias para avaliar a verossimilhança do relatado.

Nesse sentido, alguns precedentes podem ser citados:

PROCEDIMENTO DE CONTROLE ADMINISTRATIVO.  
1. LEGITIMIDADE DE PARTE. PROCEDIMENTO DE CONTROLE DE LEGALIDADE. Não há falar em ilegitimidade de parte se o pedido é de controle de legalidade de ato administrativo que incide sobre toda uma coletividade e que pode ser exercido de ofício, nos termos do artigo 103-B, parágrafo 4.º, inciso II, da Constituição Federal, descabendo cogitar de aplicação do rigorismo do processo civil.
Preliminares rejeitadas.
2. DENÚNCIA ANÔNIMA. APURAÇÃO PARA A COLHEITA DE ELEMENTOS. INSTAURAÇÃO DE PROCESSO ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR. POSSIBILIDADE. Ainda que o ordenamento jurídico pátrio vede o anonimato (CF, art. 5º IV) como forma de impedir a consumação de abusos no exercício da liberdade de manifestação do pensamento e na apresentação de delações apócrifas, é obrigação do Poder Judiciário, em observância aos princípios constitucionais da legalidade, impessoalidade e moralidade (CF, art. 37, caput), a apuração de denúncias, mesmo sem identificação, em ordem a verificar a verossimilhança dos fatos denunciados e, se for o caso, instaurar procedimento administrativo disciplinar formal. Isso garante, em última análise, a manutenção do fim perseguido pela Administração Pública, que é o interesse público.
Procedimento de Controle Administrativo de que se conhece e que se julga improcedente.
3. MULTA. LITIGÂNCIA DESNECESSÁRIA. NÃO-CARACTERIZAÇÃO. INAPLICABILIDADE. Verificado que os requerentes apenas exerceram regularmente o direito representar perante este Conselho, não há falar na aplicação da multa estabelecida no artigo 18 do Código de Processo Civil.
Pedido de aplicação de multa de que se conhece e que se julga improcedente.
(CNJ - PCA - Procedimento de Controle Administrativo - 0002040-04.2008.2.00.0000 - Rel. ALTINO PEDROZO DOS SANTOS - 77ª Sessão Ordinária - julgado em 27/01/2009 ).

 

RECURSO EM PROCEDIMENTO DE CONTROLE ADMINISTRATIVO. INSTAURAÇÃO DE PROCEDIMENTO INVESTIGATÓRIO, EM DECORRÊNCIA DE DENÚNCIA ANÔNIMA. POSSIBILIDADE. AFRONTA À COISA JULGADA. NÃO OCORRÊNCIA. VIOLAÇÃO DOS PRICÍNPIOS DO CONTRADITÓRIO E DA AMPLA DEFESA. INEXISTÊNCIA. INGERÊNCIA DO CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA EM SINDICÂNCIA REGULARMENTE INSTAURADA NO TRIBUNAL DE ORIGEM. EXCEPCIONALIDADE.
1. A Administração Pública não pode se furtar de investigar os fatos trazidos ao seu conhecimento por meio de denúncia anônima, desde que amparados em elementos concretos que indiquem grave violação aos deveres funcionais.
2. Não há que se falar em afronta a coisa julgada quando a Administração, exercendo seu poder hierárquico e antes da devida publicação, revoga atos proferidos por seus subordinados.
3. A sindicância, por se tratar de procedimento preliminar e inquisitorial visando apurar a ocorrência de infrações administrativas, não se submete à observância dos princípios do contraditório e da ampla defesa.
4. É pacífico o entendimento deste Conselho de que, salvo em situações excepcionalíssimas, como a presença de vícios insanáveis ou diante de provas inequívocas da inexistência de justa causa, não deve interferir na condução de procedimentos administrativos, regularmente instaurados nos Tribunais.
(CNJ - RA – Recurso Administrativo em PCA - Procedimento de Controle Administrativo - 0006976-38.2009.2.00.0000 - Rel. Milton Augusto de Brito Nobre - 98ª Sessão Ordinária - julgado em 10/02/2010 ).

 

 

No presente caso, não se trata apenas de uma investigação baseada em denúncia anônima. Foi encaminhado um elemento de prova consistente em uma publicação feita em uma rede social que continha a manifestação completa da magistrada. Esse elemento foi suficiente para justificar o início de uma investigação prévia. A equipe da Corregedoria, ao receber os autos, realizou diligências adicionais e constatou que a captura de tela fornecida pelo denunciante correspondia à publicação no perfil pessoal da juíza Ludmila Lins Grilo, acessível no endereço eletrônico: https://www.instagram.com/p/Cf6ZlnkL6qW/?igshid=YmMyMTA2M2Y=.

A referida publicação permitiu a identificação da conduta da magistrada, evidenciando possíveis infrações aos deveres ético-funcionais dos magistrados. Atualmente, a conta da magistrada no Instagram está suspensa por ordem judicial, conforme divulgado pela imprensa.

5. Em relação ao requisito da justa causa para a abertura do Processo Administrativo Disciplinar (PAD), observa-se a existência de indícios suficientes do cometimento de infração funcional pela magistrada Ludmila Lins Grilo por meio da publicação mencionada. Isso contrasta com a posição do Corregedor-Geral de Justiça do TJMG, que, ao determinar o arquivamento da investigação preliminar, baseou-se no parecer da juíza auxiliar, que argumentou que a magistrada apenas expressou sua insatisfação e inconformismo com a pena de advertência imposta pelo tribunal de origem, não configurando conduta ilícita ou atentatória aos deveres dos magistrados.

Inicialmente, é crucial ressaltar que os magistrados têm o direito à liberdade de expressão garantido pela Constituição da República (art. 5º, IV), pelo Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos (artigo 19) e pelo Pacto de San José da Costa Rica (artigo 13).

Entretanto, a liberdade de expressão, embora ampla, não é absoluta. Sua própria enunciação costuma vir acompanhada de marcos restritivos. Existem limites e responsabilidades especiais associadas a esse direito. O Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos estabelece que o direito à liberdade de expressão "implicará deveres e responsabilidades especiais" e "poderá estar sujeito a certas restrições". O mesmo ocorre com o Pacto de San José da Costa Rica.

Qualquer restrição à liberdade de expressão deve ser compatível com o princípio democrático. Conforme ensinado por Catalina Botero Marino,  então Relatora Especial para a Liberdade de Expressão da Comissão Interamericana de Direitos Humanos de 2008 a 2014, o teste de compatibilidade é realizado por meio de um teste tripartite (In COMISSÃO INTERAMERICANA DE DIREITOS HUMANOS. Marco Jurídico Interamericano sobre o Direito à Liberdade de Expressão. Comissão Interamericana de Direitos Humanos. Washington: OEA, 2014)(disponível em: https://www.oas.org/pt/cidh/expressao/docs/publicaciones/20140519%20-%20PORT%20Unesco%20-%20Marco%20Juridico%20Interamericano%20sobre%20el%20Derecho%20a%20la%20Libertad%20de%20Expresion%20adjust.pdf.):


(1) a restrição deve ter sido definida de forma precisa e clara por meio de uma lei formal e material, (2) a restrição deve se orientar à realização de objetivos imperiosos autorizados pela Convenção Americana, e (3) a restrição deve ser necessária em uma sociedade democrática para o sucesso dos imperiosos fins buscados; estritamente proporcional à finalidade buscada; e idônea para alcançar o imperioso objetivo que procura realizar.


No específico caso dos servidores públicos, a relatora especial ainda aponta a existência de deveres próprios e gerais, relacionados à liberdade de expressão: (i) dever de pronunciar-se em certos casos, em cumprimento de suas funções constitucionais e legais, sobre assuntos de interesse público; (ii) dever especial de constatação razoável dos fatos que fundamentam seus pronunciamentos; (iii) dever de assegurar-se de que os seus pronunciamentos não constituam violações dos direitos humanos; (iv) dever de assegurar-se de que seus pronunciamentos não constituam uma ingerência arbitrária, direta ou indireta, sobre os direitos daqueles que contribuem à deliberação pública mediante a expressão e difusão de seu pensamento; (v) dever de assegurar-se de que os seus pronunciamentos não interfiram na independência e na autonomia das autoridades judiciais.

Desse contexto recolhe-se que o ordenamento jurídico pode, na medida do indispensável à promoção dos valores de uma sociedade democrática, impor restrições à liberdade de expressão. Também são possíveis restrições peculiares aos servidores públicos, desde que compatíveis com o princípio democrático e proporcionais às funções por eles exercidas.

Especificamente em se tratando dos membros da magistratura, um regime peculiar de restrições se justifica em razão de seu mister. Aos juízes é entregue a tarefa de aplicar o direito, a partir de uma posição imparcial. Para em nome do povo, desempenhar sua tarefa de resolução de disputas, os magistrados precisam demonstrar, em sua conduta, a aptidão para ouvir e compreender os diversos pontos de vista em uma sociedade plural. Decorre dos Princípios de Bangalore de Conduta Judicial a necessária responsabilidade no exercício da liberdade de expressão pelo magistrado. Dispõe a aplicação 4.6 do Princípio da Idoneidade:

4.6 Um juiz, como qualquer outro cidadão tem direito à liberdade de expressão, crença, associação e reunião de pessoas, mas ao exercer tais direitos, deve sempre conduzir-se de maneira tal que preserve a dignidade do ofício judicante e a independência do Judiciário.

Os parágrafos 134 e 136 dos Comentários aos Princípios de Bangalore ilustram como o magistrado deve abordar as próprias responsabilidades ao exercer a liberdade de expressão. Ao ser investido no cargo, um juiz não “abandona qualquer crença política anterior ou deixa de ter interesse em assuntos políticos”, mas “parcimônia é necessário para manter a confiança do público na imparcialidade e independência do Judiciário”. Cabe ao magistrado refrear o envolvimento no debate público se sua participação “poderia razoavelmente minar a confiança na sua imparcialidade” ou “expor desnecessariamente o juiz ao ataque político”, ou ainda “ser incoerente com a dignidade do ofício judicante”. A contenção se justifica porque a “verdadeira essência de ser juiz é ser hábil para abordar os vários problemas que são objetos de disputas de maneira objetiva e judicial”, e porque o “juiz deve ser visto pelo público como exibindo um tipo de abordagem desinteressada, imparcial, não-preconceituosa, de mente aberta e justa”. O comentário conclui:

Se um juiz entra na arena política e participa de debates públicos, expressa opiniões sobre assuntos controversos, entra em disputa com figuras públicas da comunidade ou critica publicamente o governo, ele não será visto como atuando judicialmente quando presidir como juiz em uma corte e decidir litígios a respeito dos quais tenha expressado opiniões em público, ou talvez mais importante, quando as figuras públicas ou departamentos do governo que ele tenha criticado anteriormente sejam partes ou litigantes ou até mesmo testemunhas em casos sob sua atuação” (Nações Unidas (ONU). Escritório Contra Drogas e Crime (Unodc). Comentários aos Princípios de Bangalore de Conduta Judicial / Escritório Contra Drogas e Crime; tradução de Marlon da Silva Malha, Ariane Emílio Kloth. – Brasília : Conselho da Justiça Federal, 2008).

 

Portanto, para exercer com responsabilidade sua liberdade de expressão, a pessoa investida na magistratura deve guardar especial atenção aos valores que informam a atividade jurisdicional. Ao magistrado cabe cultivar, em sua vida profissional e em todas as suas relações interpessoais, as qualidades que demonstram aptidão para as elevadas funções nas quais foi democraticamente investido.

A Lei Orgânica da Magistratura Nacional vai além, impondo dever de conduta irrepreensível na vida privada (art. 35, VIII, da Lei Orgânica da Magistratura Nacional) e limitando a liberdade de manifestação crítica a órgãos do Poder Judiciário.

Neste sentido, ao magistrado é vedado “manifestar, por qualquer meio de comunicação, opinião sobre processo pendente de julgamento, seu ou de outrem, ou juízo depreciativo sobre despachos, votos ou sentenças, de órgãos judiciais, ressalvada a crítica nos autos e em obras técnicas ou no exercício do magistério” (art. 36, III, da Lei Orgânica da Magistratura Nacional).

De seu lado, o Código de Ética da Magistratura Nacional, aprovado por Resolução do Conselho Nacional de Justiça, estabelece os princípios do comportamento judicial. As manifestações públicas dos magistrados não podem fugir aos valores expressos no Código de Ética - independência, imparcialidade, transparência, integridade pessoal e profissional, diligência, dedicação, cortesia, prudência, sigilo profissional, conhecimento, capacitação, dignidade, honra e decoro.

Os valores expressos no Código de Ética da Magistratura Nacional são coincidentes com padrões acolhidos pelos documentos que servem de orientação às melhores práticas dos juízes.

Os Princípios de Bangalore de Conduta Judicial enunciam os valores da independência, imparcialidade, integridade, idoneidade, igualdade, competência e diligência.

O Código Iberoamericano de Ética Judicial menciona independência, imparcialidade, motivação, conhecimento e capacitação, justiça, equidade, responsabilidade institucional, cortesia, integridade, transparência, segredo profissional, prudência, diligência e honestidade profissional.

Em substância, os valores descritos nos mencionados diplomas são coincidentes. Assim, em suas manifestações públicas, o magistrado deve observar esses princípios.

Deve demonstrar imparcialidade, evitando “todo o tipo de comportamento que possa refletir favoritismo, predisposição ou preconceito” (art. 8º do Código de Ética da Magistratura Nacional. Em homenagem à transparência, deve “evitar comportamentos que impliquem a busca injustificada e desmesurada por reconhecimento social, mormente a autopromoção em publicação de qualquer natureza” (art. 13 do Código de Ética da Magistratura Nacional). Para cultivar a integridade, precisa “comportar-se na vida privada de modo a dignificar a função, cônscio de que o exercício da atividade jurisdicional impõe restrições e exigências pessoais distintas das acometidas aos cidadãos em geral” (art. 16 do Código de Ética da Magistratura Nacional). Um imperativo de prudência lhe exige ter por meta “manter atitude aberta e paciente para receber argumentos ou críticas lançados de forma cortês e respeitosa” (art. 26 do Código de Ética da Magistratura Nacional).

A Resolução n. 305/2019 do Conselho Nacional de Justiça, por sua vez, “estabelece os parâmetros para o uso das redes sociais pelos membros do Poder Judiciário” e prevê o seguinte:

Art. 3º A atuação dos magistrados nas redes sociais deve observar as seguintes recomendações:

 

I – Relativas à presença nas redes sociais:

[...]

b) observar que a moderação, o decoro e a conduta respeitosa devem orientar todas as formas de atuação nas redes sociais;

[...]

II – Relativas ao teor das manifestações, independentemente da utilização do nome real ou de pseudônimo:

a) evitar expressar opiniões ou compartilhar informações que possam prejudicar o conceito da sociedade em relação à independência, à imparcialidade, à integridade e à idoneidade do magistrado ou que possam afetar a confiança do público no Poder Judiciário;

b) evitar manifestações que busquem autopromoção ou superexposição;

c) evitar manifestações cujo conteúdo, por impróprio ou inadequado, possa repercutir negativamente ou atente contra a moralidade administrativa, observada sempre a prudência da linguagem;

 

Art. 4º Constituem condutas vedadas aos magistrados nas redes sociais:


I – manifestar opinião sobre processo pendente de julgamento, seu ou de outrem, ou juízo depreciativo sobre despachos, votos ou sentenças, de órgãos judiciais, ressalvada a crítica nos autos e em obras técnicas ou no exercício do magistério (art. 36, inciso III, da Loman; arts. 4º e 12, inciso II, do Código de Ética da Magistratura Nacional);

Portanto, há um conjunto de normas que limitam a liberdade de expressão dos magistrados, a iniciar pela Constituição da República, passando pela Lei Orgânica da Magistratura Nacional e normas do Conselho Nacional de Justiça (Código de Ética da Magistratura Nacional e Resolução n. 305/2019).

 Saliento que os diplomas normativos editados pelo CNJ pouco mais fazem do que aclarar aquilo que já decorre da Constituição da República e da Lei Orgânica da Magistratura Nacional. Tratam de fixar interpretação clara quanto a deveres que já existem.

Desse panorama, o que se recolhe é que a liberdade de expressão dos magistrados pode sim ser restringida, desde que na estrita medida do necessário à afirmação dos princípios da magistratura, e que as normas editadas pelo Conselho Nacional de Justiça se prestam a aclarar e desenvolver essas restrições.

Em suma, na conciliação entre a preservação da imagem do magistrado como agente político e a manifestação de pensamento do magistrado como pessoa física, deve prevalecer a cautela, a prudência, a discrição e a economia verbal. Tal entendimento parte da premissa mais básica a ser percebida, pelas partes litigantes, quando defrontados com o Estado-Julgador em suas causas: a imparcialidade.

Do exposto resulta que, mesmo em redes sociais privadas, o magistrado deve se abster de manifestações que veiculem juízo depreciativo de despachos, votos ou sentenças de órgãos judiciais, porque a palavra do magistrado, em razão de seu cargo, tem maior alcance na formação de opinião. Aliado a isso, tem-se que o impacto das redes digitais na forma de comunicação e circulação de informações é imenso.

No caso concreto, a magistrada não observou a cautela exigida e ultrapassou os limites de sua liberdade de expressão ao publicar no aplicativo Instagram mensagem manifestando juízo depreciativo de decisão proferida pelo Órgão Especial do TJMG que havia aplicado a penalidade de advertência à requerida também por comentário em rede social. 

A utilização de expressões como “opiniões lambe-botas e baba-ovos” e “adulação e o puxassaquismo são permitidos” quando se refere ao posicionamento adotado pelo órgão colegiado responsável pela aplicação da penalidade, revelam o intuito afrontoso e agressivo da juíza, indo de encontro aos deveres que deve observar quando ocupante do cargo de magistrada.

Assim, da análise dos autos não se extraem elementos, justificativas ou argumentos capazes de afastar os claros indícios de possível infração funcional. Principalmente porque, no caso vertente, a magistrada ignorou a intimação para apresentação de defesa prévia.

Portanto, a conduta narrada e delimitada pode se amoldar, em tese, aos seguintes dispositivos legais e regulamentares:

LOMAN

Art. 35 - São deveres do magistrado:

I - Cumprir e fazer cumprir, com independência, serenidade e exatidão, as disposições legais e os atos de ofício;

[...]

VIII - manter conduta irrepreensível na vida pública e particular.

Art. 36 - É vedado ao magistrado:

[...]

III - manifestar, por qualquer meio de comunicação, opinião sobre processo pendente de julgamento, seu ou de outrem, ou juízo depreciativo sobre despachos, votos ou sentenças, de órgãos judiciais, ressalvada a crítica nos autos e em obras técnicas ou no exercício do magistério.

Código de Ética da Magistratura (Resolução CNJ n. 60/2008)

 Art. 1º O exercício da magistratura exige conduta compatível com os preceitos deste Código e do Estatuto da Magistratura, norteando-se pelos princípios da independência, da imparcialidade, do conhecimento e capacitação, da cortesia, da transparência, do segredo profissional, da prudência, da diligência, da integridade profissional e pessoal, da dignidade, da honra e do decoro.

Art. 2º Ao magistrado impõe-se primar pelo respeito à Constituição da República e às leis do País, buscando o fortalecimento das instituições e a plena realização dos valores democráticos.

[...]

Art. 13. O magistrado deve evitar comportamentos que impliquem a busca injustificada e desmesurada por reconhecimento social, mormente a autopromoção em publicação de qualquer natureza. [...]

Art. 16. O magistrado deve comportar-se na vida privada de modo a dignificar a função, cônscio de que o exercício da atividade jurisdicional impõe restrições e exigências pessoais distintas das acometidas aos cidadãos em geral.

[...]

Art. 22. O magistrado tem o dever de cortesia para com os colegas, os membros do Ministério Público, os advogados, os servidores, as partes, as testemunhas e todos quantos se relacionem com a administração da Justiça. Parágrafo único. Impõe-se ao magistrado a utilização de linguagem escorreita, polida, respeitosa e compreensível.

Resolução CNJ n. 305/2019 (redes sociais)

Art. 3º A atuação dos magistrados nas redes sociais deve observar as seguintes recomendações:

I – Relativas à presença nas redes sociais:

[...]

b) observar que a moderação, o decoro e a conduta respeitosa devem orientar todas as formas de atuação nas redes sociais;

[...]

II – Relativas ao teor das manifestações, independentemente da utilização do nome real ou de pseudônimo:

a) evitar expressar opiniões ou compartilhar informações que possam prejudicar o conceito da sociedade em relação à independência, à imparcialidade, à integridade e à idoneidade do magistrado ou que possam afetar a confiança do público no Poder Judiciário;

b) evitar manifestações que busquem autopromoção ou superexposição;

c) evitar manifestações cujo conteúdo, por impróprio ou inadequado, possa repercutir negativamente ou atente contra a moralidade administrativa, observada sempre a prudência da linguagem;

Art. 4º Constituem condutas vedadas aos magistrados nas redes sociais:


I – manifestar opinião sobre processo pendente de julgamento, seu ou de outrem, ou juízo depreciativo sobre despachos, votos ou sentenças, de órgãos judiciais, ressalvada a crítica nos autos e em obras técnicas ou no exercício do magistério (art. 36, inciso III, da Loman; arts. 4º e 12, inciso II, do Código de Ética da Magistratura Nacional);

 

6. Além disso, vale ressaltar que não se trata de episódio isolado envolvendo a magistrada e suas manifestações em redes sociais.

A propósito,  esta Corregedoria Nacional, em 29.07.2022, ao arquivar o PP n. 0002259-60.2021.2.00.0000, constatou a adoção de entendimento adequado pelo Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais - TJMG quando aplicou a pena de advertência à referida magistrada por motivos semelhantes. A seu turno, no âmbito deste Conselho, foi recentemente instaurado o Processo Administrativo Disciplinar (PADMag n° 0001609-42.2023.2.00.0000), com o afastamento cautelar da magistrada, para averiguar desvios funcionais praticados pela juíza LUDMILA LINS GRILO no âmbito de meios de comunicação e rede social.

O TJMG comunicou, ainda, por meio do PP nº 0003480-10.2023.2.00.0000, a aplicação da penalidade de aposentadoria compulsória pelo Órgão Especial do tribunal, por interesse público, à requerida, no bojo do Processo Administrativo Disciplinar nº 1.0000.21.225959-2/001.

Cumpre registrar que, nos termos da jurisprudência do CNJ, “o fato de o magistrado ter sido punido com a maior penalidade administrativa prevista na Lei Orgânica da Magistratura Nacional, em Processo Administrativo Disciplinar anterior, não obsta a abertura de novo processo disciplinar para investigar conduta diversa daquela que culminou na aposentadoria compulsória” (CNJ - PCA - Procedimento de Controle Administrativo - 0004423-13.2012.2.00.0000 - Rel. CARLOS ALBERTO REIS DE PAULA - 158ª Sessão Ordinária - julgado em 13/11/2012). No mesmo sentido: REVDIS - Processo de Revisão Disciplinar - Conselheiro - 0005031-06.2015.2.00.0000 - Rel. VALDETÁRIO ANDRADE MONTEIRO - 281ª Sessão Ordinária - julgado em 06/11/2018; e PAD - Processo Administrativo Disciplinar - 0006922-57.2018.2.00.0000 - Rel. MÁRIO GUERREIRO - 57ª Sessão Extraordinária - julgado em 8/9/2020).

Possível, portanto, a abertura de novo Processo Administrativo Disciplinar em face de Magistrado já aposentado compulsoriamente.

Dessa forma, entendo pela existência de indícios suficientes do cometimento de infração disciplinar pela Magistrada requerida, fato que evidencia a necessidade de instauração de Processo Administrativo Disciplinar em seu desfavor onde devem ser apuradas as circunstâncias em que a conduta foi praticada.  

Em suma, existem elementos indiciários apontando afronta ao art. 35, I e VIII, 36, III, da LC 35/79 (LOMAN), aos arts. 1°, 2°, 13, 16 e 22 do Código de Ética da Magistratura, bem como ao art. 3º, I,“b”; II, “a”, "b” e “c” e art. 4, I ambos da Resolução CNJ nº 305/2019.

     7. Por fim, malgrado a requerida já tenha sido apenada com aposentadoria compulsória em PAD instaurado e julgado no TJMG e esteja afastada de suas funções, após decisão exarada em procedimentos disciplinares em curso neste Conselho - RDs nº 0006242-33.2022.2.00.0000 (PADMag n° 0001609-42.2023.2.00.0000) e 0007298-04.2022.2.00.0000 (PADMag n° 0001608-57.2023.2.00.0000) - creio seja recomendável expedir novo comando pelo afastamento da magistrada do cargo, a fim de corroborar a incompatibilidade da conduta que lhe é imputada com o exercício da magistratura. 

8. Ante o exposto, no exercício da competência correcional originária desta Corte, proponho a instauração de Processo Administrativo Disciplinar em desfavor da Juíza Ludmila Lins Grilo com a imposição de seu afastamento cautelar do cargo, nos termos da portaria em anexo.

                  Transitado em julgado, feitas as devidas comunicações e distribuído o PAD para o(a) respectivo(a) relator(a), arquivem-se os autos (RICNJ: Art. 74, caput, c/c Res CNJ 135/2011: Art. 14, § 7º).

                    É como voto.

 


Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO 

Corregedor Nacional de Justiça 

 

 

 

 

PORTARIA N.  , DE        DE 2023.  



 

Instaura processo administrativo disciplinar em desfavor de magistrada, com afastamento do cargo.

   

 

O PRESIDENTE DO CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA, usando das atribuições previstas nos artigos 103-B, § 4º, III, da Constituição Federal e 6º, XIV, do Regimento Interno do Conselho Nacional de Justiça; 

CONSIDERANDO a competência originária e concorrente do Conselho Nacional de Justiça para processar investigações contra magistrados independentemente da atuação das corregedorias e tribunais locais, expressamente reconhecida pelo Plenário do Supremo Tribunal Federal na apreciação da liminar na ADI nº 4.638/DF; 

CONSIDERANDO o disposto no § 5º do art. 14 da Resolução CNJ n. 135/2011, e as disposições pertinentes da Lei Complementar n.  35/79 (Lei Orgânica da Magistratura Nacional), da Lei n. 8.112/90 (Regime Jurídico dos Servidores Públicos Civis da União), da Lei n. 9.784/99, e do Regimento Interno do CNJ; 

CONSIDERANDO a decisão proferida pelo Plenário do Conselho Nacional de Justiça no julgamento do Pedido de Providências n. 0001836-52.2022.2.00.0813 durante XXª Sessão Virtual, realizada no dia xx de xxxxxxxxx de 2023; 

 

RESOLVE: 

 

Art. 1º Instaurar processo administrativo disciplinar, com afastamento cautelar do cargo, em desfavor de LUDMILA LINS GRILO, Juíza Direito da Vara Criminal, Júri e da Infância e Juventude da Comarca de Unaí-MG (TJMG), pela presença de indícios de que a magistrada descumpriu o art. 35, I e VIII, 36, III, da LC 35/79 (LOMAN), aos arts. 1°, 2°, 13, 16 e 22 do Código de Ética da Magistratura, bem como ao art. 3º, I,“b”; II, “a”,”b” e “c” e art. 4, I ambos da Resolução CNJ nº 305/2019, ao publicar no aplicativo Instagram mensagem manifestando juízo depreciativo de decisão proferida pelo Órgão Especial do TJMG que havia aplicado a penalidade de advertência à requerida também por comentário em rede social.

Art. 2º Determinar que a Secretaria do CNJ dê ciência ao Presidente do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais da decisão tomada pelo Conselho Nacional de Justiça e da abertura de processo administrativo disciplinar em desfavor da magistrada, com o seu afastamento cautelar do cargo.

Art. 3° Determinar a livre distribuição do processo administrativo disciplinar entre os Conselheiros, nos termos do art. 74 do RICNJ.  

 Ministro LUÍS ROBERTO BARROSO

 


J16/F33