Conselho Nacional de Justiça

 

Autos: PROCEDIMENTO DE CONTROLE ADMINISTRATIVO - 0008063-72.2022.2.00.0000
Requerente: RAFAEL JOSE MONTEIRO DE CASTRO SANTOS
Requerido: CONSELHO SUPERIOR DA JUSTIÇA DO TRABALHO - CSJT e outros

 

JULGAMENTO CONJUNTO. PROCEDIMENTOS DE CONTROLE ADMINISTRATIVO. RESOLUÇÃO CSJT Nº 353/2022. PROGRAMA DE RESIDÊNCIA JURÍDICA. UNIFORMIZAÇÃO DA TEMÁTICA NO ÂMBITO DA JUSTIÇA DO TRABALHO. OBSERVÂNCIA DO INTERESSE PÚBLICO E DAS PECULARIDADES DAQUELE SEGMENTO DE JUSTIÇA. AUSÊNCIA DE FLAGRANTE ILEGALIDADE. AUTONOMIA DOS TRIBUNAIS PRESERVADA. PEDIDOS JULGADOS IMPROCEDENTES.

1. Procedimentos em que se questionam a Resolução nº 353/2022, editada pelo Conselho Superior da Justiça do Trabalho, que dispõe sobre o programa de residência jurídica no âmbito da Justiça do Trabalho.

2. A Resolução CNJ nº 439/2022 define as orientações e diretrizes mínimas para a instituição do programa de residência jurídica, outorgando-se aos Tribunais a regulamentação da temática mediante ato normativo local, com observância das disposições insculpidas naquele normativo.

3. Nesse diapasão e buscando-se conferir tratamento uniforme à matéria no ramo trabalhista, mormente em razão dos possíveis impactos orçamentários a serem suportados por aquele segmento, o Conselho Superior da Justiça do Trabalho, no exercício de suas competências constitucionais, deliberou pela aprovação da Resolução CSJT nº 353/2022.

4. O normativo foi resultado da atuação zelosa e prudente do CSJT, ao constatar, entre outros, a adesão mínima das Cortes Regionais ao programa, bem como pela verificação de que os regramentos locais em vigor seriam evidentemente discrepantes no que tange, especialmente, ao número de vagas ofertadas e ao valor da bolsa-auxílio.

5. Nesse particular, o CSJT atraiu, para si, legitimamente a tarefa de aprofundar os estudos destinados à uniformização da temática no âmbito da Justiça do Trabalho, para, ao final, estabelecer parâmetros gerais para a definição do número de residentes a serem admitidos e do respectivo valor da bolsa-auxílio, bem como a padronização dos critérios mínimos de admissão, de avaliação e de conclusão dos programas de residência jurídica.

6. Por fim, não se vislumbra situação de patente interferência na autonomia das Cortes Regionais, uma vez que, pautado pela preservação do interesse público e à luz das regras mínimas definidas na Resolução CNJ nº 439/2022, cabe ao CSJT apenas estabelecer as normas gerais afetas à instituição e à regulamentação dos programas de residência jurídica no âmbito da Justiça do Trabalho, franqueando-se aos TRTs, após a superveniência da norma do CSJT, a complementação da legislação aplicável para atender às suas peculiaridades locais. 

7. Pedidos julgados improcedentes.

 

 ACÓRDÃO

O Conselho, por maioria, julgou improcedentes os pedidos, nos termos do voto do Relator. Vencidos os Conselheiros João Paulo Schoucair, Marcio Luiz Freitas, Richard Pae Kim, Marcos Vinícius Jardim Rodrigues, Marcello Terto, Mário Goulart Maia e Luiz Fernando Bandeira de Mello. Votou a Presidente. Presidiu o julgamento a Ministra Rosa Weber. Plenário, 20 de junho de 2023. Presentes à sessão os Excelentíssimos Senhores Conselheiros Rosa Weber, Luis Felipe Salomão, Vieira de Mello Filho, Mauro Pereira Martins, Salise Sanchotene, Jane Granzoto, Richard Pae Kim, Marcio Luiz Freitas, Giovanni Olsson, Sidney Madruga, João Paulo Schoucair, Marcos Vinícius Jardim Rodrigues, Marcello Terto, Mário Goulart Maia e Luiz Fernando Bandeira de Mello. Sustentou oralmente pela Interessada Federação Nacional dos Trabalhadores e Trabalhadoras do Judiciário Federal e Ministério Público da União - FENAJUFE, o Advogado João Marcelo Arantes Moreira e Souza - OAB/DF 71.811.

Conselho Nacional de Justiça

Autos: PROCEDIMENTO DE CONTROLE ADMINISTRATIVO - 0008063-72.2022.2.00.0000
Requerente: RAFAEL JOSE MONTEIRO DE CASTRO SANTOS
Requerido: CONSELHO SUPERIOR DA JUSTIÇA DO TRABALHO - CSJT e outros

 

RELATÓRIO


 

Trata-se de procedimentos de controle administrativo (PCAs) em que se questionam a Resolução nº 353/2022, editada pelo Conselho Superior da Justiça do Trabalho (CSJT), que dispõe sobre o Programa de Residência Jurídica no âmbito da Justiça do Trabalho.

Considerando a multiplicidade de demandas relacionadas à mesma temática, os PCAs 0007991-85.2022.2.00.0000, 0008008-24.2022.2.00.0000, 0008063-72.2022.2.00.0000 e 0008072-34.2022.2.00.0000 foram reunidos para julgamento conjunto em sessão plenária, de modo a otimizar os trabalhos deste Conselho e, sobretudo, conferir uniformidade às decisões a serem prolatadas.

Nessa perspectiva, são apresentados os relatórios dos processos referenciados.

 

PCA 0007991-85.2022.2.00.0000

O requerente alega que o Tribunal Regional do Trabalho da 3ª Região (TRT 3), mediante a Instrução Normativa GP nº 77/2022, instituiu o Programa de Residência Jurídica no âmbito daquela Corte, com fundamento na Resolução CNJ nº 439/2022.

Aduz que, em 11/7/2022, foi publicado o Edital de Processo Seletivo nº TRT3/DG/01/2022 destinado “à seleção de candidatos para o preenchimento de até 300 vagas existentes e à formação de cadastro de reserva para admissão ao Programa de Residência Jurídica do Tribunal Regional do Trabalho da 3ª Região, instituído pela Instrução Normativa GP n. 77, de 24 de março de 2022, obedecida a ordem classificatória, durante o prazo de validade de 2 (dois) anos, prorrogável por igual período, a critério da Presidência do Tribunal”.

Explica que a prova teria sido realizada em 21/8/2022 e que, no dia 3/11/2022, 114 aprovados, entre eles o autor, teriam iniciado o programa de residência jurídica, firmando-se os respectivos termos de compromisso com o TRT 3.

No entanto, afirma que o Plenário do Conselho Superior da Justiça do Trabalho, em sessão realizada no dia 25/11/2022, decidiu aprovar, por maioria, a edição da Resolução CSJT nº 353/2022, que, entre outros aspectos, determina o cancelamento de todos os processos seletivos em andamento ou concluídos pelos Tribunais Regionais para a admissão de residentes jurídicos, devendo os TRTs, no prazo de 30 dias, promover a dispensa de residentes jurídicos eventualmente já admitidos (arts. 2º e 3º).

Ressalta que, formulada pretensão perante o CSJT visando à modulação dos efeitos do normativo em referência, para preservar, no âmbito do TRT 3, os termos de compromisso já firmados, não se teria logrado êxito.

Diante desse insucesso, pontua que o TRT 3, em 14/12/2022, comunicou que, em cumprimento à decisão do Conselho Superior da Justiça do Trabalho (Resolução CSJT nº 353/2022), os termos de compromisso do programa de residência jurídica seriam rescindidos no dia 20/12/2022 (Ofício nº SEDP 146/2022).

Nessa perspectiva, defende que, nos termos da Resolução CNJ nº 439/2022, caberia aos Tribunais a instituição dos programas de residência jurídica e que sua regulamentação se daria por meio de ato normativo local (arts. 1º e 2º), sendo, portanto, inconteste a competência do TRT 3 para disciplinar o programa no seu âmbito, independentemente de resolução emanada do CSJT.

Ademais, tece considerações acerca de voto divergente proferido no julgamento que culminou com a edição da Resolução CSJT nº 353/2022, asseverando, sobretudo, que o programa de residência jurídica é constitucional e que o Tribunal Regional do Trabalho da 3ª Região possui competência para regulamentá-lo localmente.

Por fim, em razão da existência de processo seletivo já concluído e que foram firmados 114 termos de compromisso com o TRT 3, sustenta que, em observância aos princípios da segurança jurídica, da proteção da confiança e da boa-fé, o CSJT deveria ter modulado os efeitos da Resolução CSJT nº 353/2022, a fim de manter os termos de compromisso já celebrados, evitando-se, assim, os “imensuráveis prejuízos materiais e emocionais” que a dispensa causará aos residentes.

Mercê desses fatos, requer liminar para que seja determinada a suspensão da Resolução CSJT nº 353/2022 e do Ofício nº SEDP 146/2022, enviado pelo TRT da 3ª Região ao autor, impedindo-se a rescisão do termo de compromisso do programa de residência jurídica em face da Resolução CSJT nº 353/2022, até o julgamento definitivo do presente procedimento, comunicando-se, ainda, ao Tribunal Regional do Trabalho da 3ª Região sobre a decisão.

No mérito, pleiteia a anulação da Resolução CSJT nº 353/2022 e do Ofício nº SEDP 146/2022, enviado pelo TRT da 3ª Região ao autor, impedindo-se a rescisão do termo de compromisso do programa de residência jurídica em face da Resolução CSJT nº 353/2022.

Subsidiariamente, pugna pela modulação dos efeitos da Resolução CSJT nº 353/2022, atribuindo-se apenas efeitos prospectivos, a fim de preservar o termo de compromisso do programa de residência jurídica firmado pelo autor com o Tribunal Regional do Trabalho da 3ª Região.

Em 16/12/2022, foi deferido o pedido liminar para “suspender os efeitos da Resolução CSJT nº 353/2022 e, por consequência, do Ofício nº SEDP 146/2022, expedido pelo TRT da 3ª Região, impedindo-se, assim, a rescisão dos termos de compromisso do Programa de Residência Jurídica em face da Resolução CSJT nº 353/2022” (Id. 4980131).

Incluído o feito na 1ª Sessão Virtual de 2023 para ratificação da liminar, o julgamento não foi concluído em razão de pedido de destaque do Conselheiro Luiz Philippe Vieira de Mello Filho (Id. 5022629).

Ainda na tramitação do processo, foi negada a pretensão de suspensão da decisão concessiva da medida liminar (Id. 4988916); foram admitidos terceiros interessados (Ids. 4988916 e 5043437); e o Conselho Superior da Justiça do Trabalho apresentou informações (Id. 5019125).

 

PCA 0008008-24.2022.2.00.0000

A requerente alega que a Resolução CNJ nº 439/2022 teria autorizado os Tribunais a instruírem programas de residência jurídica, cuja regulamentação seria realizada mediante ato normativo local, obedecendo-as disposições normativas da própria norma deste Conselho (arts. 1º e 2º).

Aduz que, atento à Resolução CNJ nº 439/2022, o Tribunal Regional do Trabalho da 3ª Região (TRT 3) teria editado a Instrução Normativa nº 77/2022, disciplinado o programa de residência jurídica em seu âmbito.

Nesse particular, entre várias questões atinentes à atuação do TRT 3, registra a inauguração de processo seletivo para o ingresso de residentes jurídicos (Edital nº TRT3/DG/01/2022), sendo que, realizadas as provas objetivas e discursivas, foram convocados, inicialmente, 114 candidatos para iniciar as suas atividades em 3/11/2022.

Explica, no entanto, que o Conselho Superior da Justiça do Trabalho, em 25/11/2022, teria aprovado a Resolução CSJT nº 353/2022, que, em suma, teria vedado aos Tribunais Regionais do Trabalho dispor sobre o programa de residência jurídica, determina o cancelamento de todos os processos seletivos em andamento ou concluídos, além do prazo de 30 dias para a promoção da dispensa de residentes jurídicos eventualmente já admitidos (arts. 1º, 2º e 3º).

Nessa perspectiva, afirma que todos os TRTs, que deram imediato cumprimento à Resolução CNJ nº 439/2022, teriam até o dia 25/12/2022 para dispensar os residentes jurídicos admitidos, dado o efeito vinculante da decisão do CSJT (art. 111-A, § 2º, II, da CFRB/88).

Pontua, ademais, que o TRT 3 teria interrompido a 2ª fase de convocação dos residentes e que, em 1º/12/2022, teria requerido a modulação dos efeitos da deliberação plenária do CSJT, não logrando êxito.

Diante desse insucesso, indica que o TRT 3, mediante o Ofício nº SEDP 146/2022, teria informado aos residentes jurídicos locais que os termos de compromissos assinados seriam rescindidos em 20/12/2022.

Nesse cenário, defende, entre outros, que: i) o TRT 3 teria dado cumprimento imediato aos ditames previstos na Resolução CNJ nº 439/2022, regulamentando a temática afeta ao programa de residência jurídica por meio da Instrução Normativa nº 77/2022; ii) a literalidade da Resolução CNJ nº 439/2022 não daria margem para qualquer outro tipo de interpretação a não ser a de que os Tribunais devem regulamentá-la em seu âmbito; iii) o CSJT teria extrapolado as suas competências, contrariando, notadamente, a Resolução CNJ nº 439/2022.

Por fim, tece considerações acerca da ofensa aos princípios da legalidade e eficiência, asseverando, sobretudo, que o CSJT não teria respeitado a situação em que se encontra o TRT 3, tampouco a situação dos residentes jurídicos, além de ignorar dispositivos constitucionais e legais.

Mercê desses fatos, requer liminar para que seja determinada a suspensão da Resolução CSJT nº 353/2022 e, consequentemente, o reestabelecimento do programa de residência jurídica no âmbito do TRT 3, tornando-se sem efeito o Ofício nº SEDP 146/2022, expedido por aquela Corte Regional, para que os termos de compromisso do programa firmados localmente não sejam rescindidos.

Alternativamente, caso já tenham sido rescindidos os termos de compromisso celebrados entre o TRT 3 e os residentes jurídicos, sejam estes imediatamente reestabelecidos, dando-se continuidade ao programa de residentes no âmbito daquela Corte Regional.

No mérito, pleiteia a declaração de nulidade da Resolução CSJT nº 353/2022 e, consequentemente, o reestabelecimento do programa de residência jurídica no âmbito do TRT 3, tornando-se sem efeito o Ofício nº SEDP 146/2022, expedido por aquela Corte Regional, para que os termos de compromisso do programa firmados localmente não sejam rescindidos.

Alternativamente, caso já tenham sido rescindidos os termos de compromisso celebrados entre o TRT 3 e os residentes jurídicos, sejam estes imediatamente reestabelecidos, dando-se plena execução ao programa de residência jurídica no âmbito do TRT 3, inclusive com a contratação dos residentes já convocados e que se classificaram dentro das vagas ofertadas pelo programa.

Subsidiariamente, caso não seja acolhido o pedido anterior, pede a manutenção do programa apenas em relação aos residentes que foram contratados em 3/11/2022 e já iniciaram o programa educacional da Residência Jurídica, em observância ao ato jurídico perfeito e às situações jurídicas já consolidadas.

Em 23/12/2022, foi deferido o pedido liminar para “suspender os efeitos da Resolução CSJT nº 353/2022 e, por consequência, do Ofício nº SEDP 146/2022, expedido pelo TRT da 3ª Região, impedindo-se, assim, a rescisão dos termos de compromisso do Programa de Residência Jurídica em face da Resolução CSJT nº 353/2022” (Id. 4988775).

Incluído o feito na 1ª Sessão Virtual de 2023 para ratificação da liminar, o julgamento não foi concluído em razão de pedido de destaque do Conselheiro Luiz Philippe Vieira de Mello Filho (Id. 4989083).

Instado, o Conselho Superior da Justiça do Trabalho apresentou informações (Id. 5019142).

 

PCA 0008063-72.2022.2.00.0000

O requerente alega que o Tribunal Regional do Trabalho da 3ª Região (TRT 3), mediante a Instrução Normativa GP nº 77/2022, instituiu o programa de residência jurídica no âmbito daquela Corte, com fundamento na Resolução CNJ nº 439/2022.

Aduz que, em 11/7/2022, foi publicado o Edital de Processo Seletivo nº TRT3/DG/01/2022 destinado “à seleção de candidatos para o preenchimento de até 300 vagas existentes e à formação de cadastro de reserva para admissão ao Programa de Residência Jurídica do Tribunal Regional do Trabalho da 3ª Região, instituído pela Instrução Normativa GP n. 77, de 24 de março de 2022, obedecida a ordem classificatória, durante o prazo de validade de 2 (dois) anos, prorrogável por igual período, a critério da Presidência do Tribunal”.

Explica que a prova teria sido realizada em 21/8/2022 e que, no dia 3/11/2022, 114 aprovados teriam iniciado o programa de residência jurídica, firmando-se os respectivos termos de compromisso com o TRT 3.

Posteriormente, em 9/11/2022, mais 125 aprovados, inclusive o requerente, teriam sido convocados para providenciar a documentação necessária à assinatura do termo de compromisso com a Corte Regional, que iria ocorrer no dia 1º/12/2022.

No entanto, afirma que o Conselho Superior da Justiça do Trabalho, em sessão realizada no dia 25/11/2022, decidiu aprovar, por maioria, a edição da Resolução CSJT nº 353/2022, que, entre outros aspectos, determina o cancelamento de todos os processos seletivos em andamento ou concluídos pelos Tribunais Regionais para a admissão de residentes jurídicos, devendo os TRTs, no prazo de 30 dias, promover a dispensa de residentes jurídicos eventualmente já admitidos (arts. 2º e 3º).

Ressalta que, em cumprimento à decisão do CSJT, teria sido suspensa a admissão ao programa de residência jurídica, pelo TRT 3, dos candidatos convocados para a 2ª Turma no dia 9/11/2022.

Além de tecer considerações acerca da situação particular do requerente e de outros candidatos aprovados, defende que a Resolução CSJT nº 353/2022 não pode prevalecer, sobretudo porque, nos termos da Resolução CNJ nº 439/2022, caberia aos Tribunais a instituição dos programas de residência jurídica e que sua regulamentação se daria por meio de ato normativo local (arts. 1º e 2º), sendo, portanto, inconteste a competência do TRT 3 para disciplinar o Programa de Residência Jurídica no seu âmbito, independentemente de resolução emanada do CSJT.

Por fim, sustenta, entre outros argumentos, que não seria dado ao CSJT discutir a constitucionalidade do programa, visto que a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal já assentou a possibilidade de instituição de programas de residência jurídica, sendo que o CNJ teria chancelado sua possibilidade (Ato Normativo nº 0004888-17.2015.2.00.0000).

Diante desses fatos, requer liminar para suspender os efeitos da Resolução CSJT nº 353/2022, possibilitando-se a continuidade do programa de residência jurídica no âmbito do TRT 3, regulamentado pela Instrução Normativa GP nº 77/2022 daquela Corte.

No mérito, pleiteia a anulação da Resolução CSJT nº 353/2022, possibilitando-se a continuidade do programa de residência jurídica no âmbito do TRT 3.

Subsidiariamente, pugna pela modulação dos efeitos da Resolução CSJT nº 353/2022, atribuindo-se apenas efeitos prospectivos, a fim de preservar os direitos dos candidatos já aprovados e/ou convocados para participarem do programa de residentes no TRT 3.

Em 23/12/2022, foi deferido o pedido liminar para “suspender os efeitos da Resolução CSJT nº 353/2022, sem prejuízo da implementação de ações, no exercício da autonomia do TRT 3, atinentes aos candidatos convocados para a 2ª Turma do Programa de Residência Jurídica local” (Id. 4988780).

Incluído o feito na 1ª Sessão Virtual de 2023 para ratificação da liminar, o julgamento não foi concluído em razão de pedido de destaque do Conselheiro Luiz Philippe Vieira de Mello Filho (Id. 5022628).

Instado, o Conselho Superior da Justiça do Trabalho apresentou informações (Id. 5019137), as quais foram impugnadas pelo peticionante (Id. 5021730).

 

PCA 0008072-34.2022.2.00.0000

As requerentes alegam que a Resolução CNJ nº 439/2022 teria autorizado os Tribunais a instituírem programas de residência jurídica, sendo que, no âmbito do Tribunal Regional do Trabalho da 3ª Região (TRT 3), tal matéria teria sido regulamentada pela Instrução Normativa GP nº 77/2022.

Aduzem que a Corte Regional, seguindo todos os requisitos da Resolução CNJ nº 439/2022, teria realizado processo seletivo para a admissão de residentes jurídicos, com convocação inicial de 114 aprovados, para iniciarem suas atividades no dia 3/11/2022.

Explicam que, em 9/11/2022, teriam sido convocados mais 125 residentes para dar início à 2ª Turma, sendo o dia 18/11/2022 a data limite para o envio da documentação necessária à celebração dos termos de compromisso. Segundo o TRT da 3ª Região, 100 pessoas convocadas teriam encaminhado os documentos e manifestado o interesse na contratação.

Nesse particular, tecem considerações acerca do início de suas atividades; da realização de curso de integração; da documentação a ser apresentada, destacando-se eventuais pedidos de licenciamento da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB); e da situação pessoal dos candidatos.

Na sequência, afirmam que o Conselho Superior da Justiça do Trabalho, no dia 25/11/2022, teria julgado o procedimento CSJT-AN - 4451-72.2022.5.90.0000, tendo deliberado pelo cancelamento de todos os processos seletivos em andamento ou concluídos pelos Tribunais Regionais do Trabalho para a admissão de residentes jurídicos, estabelecendo-se, ainda, o prazo de 30 dias para que promovessem a dispensa dos residentes já admitidos. A partir dessa decisão, foi editada a Resolução CSJT nº 353/2022.

Ademais, consignam que, no dia 1º/12/2022, data em que os convocados receberiam os termos de compromisso para assinatura, o TRT da 3ª Região teria enviado um comunicado acerca da suspensão da admissão da 2ª Turma, em virtude da decisão do CSJT (Resolução nº 353/2022).

Ao indicarem que no PCA nº 007991-85.2022.2.00.0000 teria sido deferida liminar para suspender os efeitos da Resolução CSJT nº 353/2022, cancelando-se, assim, a dispensa dos residentes jurídicos do TRT 3 em exercício, relatam que a Corte Regional não teria adotado medidas relacionadas à admissão dos residentes da 2ª Turma, sob o fundamento de que somente admitirá os aludidos convocados após a decisão definitiva daquele procedimento.

Nesse contexto, defendem, entre outros, que: i) o programa de residência jurídica seria regular; ii) a convocação realizada pelo TRT 3, no dia 9/11/2022, teria gerado para os aprovados uma expectativa em torno dos futuros 3 anos de atividade, impondo-lhes uma reorganização pessoal e familiar; iii) a suspensão da admissão dos convocados que enviaram a documentação não seria pautada nos princípios da boa-fé, da razoabilidade e da proporcionalidade; iv) a Resolução CSJT nº 353/2022 teria causado um enorme prejuízo aos convocados.

Por fim, ressaltam que, ao enviar o comunicado com a suspensão da admissão dos residentes da 2ª Turma, o TRT da 3ª Região expôs expressamente que a medida foi adotada em razão da Resolução CSJT nº 353/2022, de modo que, à luz da teoria dos motivos determinantes, advindo a decisão liminar do CNJ suspendendo a norma do CSJT, a motivação apresentada pela Corte Regional não subsistiria e o ato de suspensão da referida admissão não prosperaria.

Diante desses fatos, requerem liminar para que seja determinado ao TRT 3 que promova a imediata integração dos convocados da 2ª Turma, com o envio dos respectivos termos de compromisso para assinatura e início do curso de integração.

No mérito, pleiteiam a confirmação da liminar concedida no presente feito e no PCA nº 007991- 85.2022.2.00.0000, com o cancelamento definitivo da Resolução CSJT nº 353/2022.

Subsidiariamente, pugnam pela modulação dos efeitos para preservar o processo seletivo realizado pelo TRT 3 em sua integralidade. Em caso de não acolhimento, pedem a celebração/preservação dos contratos com os residentes da 1ª e 2ª Turma.

Em 22/12/2022, o pedido liminar foi indeferido (Id. 4988225).

Instados, o Conselho Superior da Justiça do Trabalho e o Tribunal Regional do Trabalho da 3ª Região apresentaram informações (Ids. 5000297 e 5019132).

É o relatório.

Conselho Nacional de Justiça

 

Autos: PROCEDIMENTO DE CONTROLE ADMINISTRATIVO - 0008063-72.2022.2.00.0000
Requerente: RAFAEL JOSE MONTEIRO DE CASTRO SANTOS
Requerido: CONSELHO SUPERIOR DA JUSTIÇA DO TRABALHO - CSJT e outros

 

VOTO


Considerando que as demandas se encontram devidamente instruídas e maduras para julgamento, mostra-se adequado e oportuno avançar na análise de mérito, ficando prejudicadas as ratificações das liminares deferidas nos autos dos PCAs 0007991-85.2022.2.00.0000, 0008008-24.2022.2.00.0000 e 0008063-72.2022.2.00.0000. 

Além disso, afigura-se importante ressaltar que a temática debatida nos processos ora submetidos a julgamento conjunto se resume ao exame da legalidade da Resolução nº 353/2022, editada pelo Conselho Superior da Justiça do Trabalho, que dispõe sobre o programa de residência jurídica no âmbito da Justiça do Trabalho. 

É dizer: a causa em discussão restringe-se à avaliação da compatibilidade da Resolução CSJT nº 353/2022 à Resolução CNJ nº 439/2022[1], descabendo, por consequência, revisitar questões relacionadas, notadamente, à própria norma deste Conselho, a qual, como se sabe, foi fruto de legítima atuação do Plenário do CNJ, materializada nos autos do Ato Normativo nº 0004888-17.2015.2.00.0000. 

Delimitada, portanto, a matéria a ser apreciada por este Conselho, passo, efetivamente, à apreciação dos pontos controvertidos. 

Os casos trazidos ao conhecimento do CNJ revelam que o Tribunal Regional do Trabalho da 3ª Região (TRT 3) instituiu o programa de residência jurídica por meio da Instrução Normativa GP nº 77/2022, tendo inaugurado, ainda, processo seletivo para o preenchimento de até 300 vagas existentes, além da formação de cadastro de reserva.

Vencidas as etapas do certame, 114 candidatos aprovados teriam iniciado, no dia 3/11/2022, o programa de residência jurídica, firmando-se os respectivos termos de compromisso com a Corte Regional. Ademais, 125 residentes teriam sido convocados, em 9/11/2022, para dar início à 2ª Turma.

No entanto, a superveniência da edição da Resolução CSJT nº 353/2022, em 25/11/2022, repercutiria na situação dos residentes jurídicos do TRT 3, alcançando aqueles que estariam em plena atividade e os demais convocados para a 2ª Turma.

Isso porque a Resolução CSJT nº 353/2022 preconiza que as normas gerais referentes à instituição e à regulamentação dos programas de residência jurídica no âmbito da Justiça do Trabalho serão estabelecidas pelo Conselho Superior da Justiça do Trabalho, ficando vedado aos Tribunais Regionais dispor sobre a matéria até que sobrevenha norma emanada daquele Conselho (art. 1º).

Não bastasse isso, segundo o art. 2º do normativo, deveriam ser cancelados todos os processos seletivos em andamento ou concluídos pelas Cortes Regionais para a admissão de residentes jurídicos ou quaisquer bolsistas de estágio superior em programas similares.

Por fim, caberia aos TRTs promover, no prazo de 30 dias, a dispensa de residentes jurídicos eventualmente já admitidos (art. 3º).

Em sede de cognição sumária, somado à iminência do desligamento dos residentes jurídicos do TRT 3, entendi que a Resolução CSJT nº 353/2022 não se coadunaria com as balizas normativas constantes da Resolução CNJ nº 439/2022, que, além de autorizar aos Tribunais a instituição do programa de residência jurídica, confere a tais órgãos a atribuição para regulamentá-lo por meio de ato local, desde que observadas às disposições insculpidas no normativo deste Conselho. Confira-se:

 

Art. 1o Os tribunais ficam autorizados a instituir Programas de Residência Jurídica, objetivando proporcionar o aprimoramento da formação teórica e prática dos profissionais do Sistema de Justiça.

(...)

Art. 2o A regulamentação do Programa de Residência deve se dar por meio de ato normativo local, que deverá dispor sobre o processo seletivo para o ingresso no programa e seu conteúdo programático, a delimitação das atividades a serem exercidas pelo residente, as hipóteses de desligamento e os requisitos para obtenção do certificado final, observadas as disposições insculpidas na presente Resolução. [...] (grifo nosso)

 

Nessa perspectiva, compreendi que a proibição aos Tribunais Regionais do Trabalho de disciplinar a matéria, com determinação, ainda, de cancelamento dos processos seletivos em andamento ou concluídos, representaria possível ingerência na autonomia dos Tribunais pela própria Resolução CNJ nº 439/2022, bem como caracterizaria distanciamento de princípios orientadores da atuação da Administração Pública.

Não obstante esse panorama preambular, a partir do exame detido das questões que permeiam os processos, aliado, sobretudo, à sua instrução diligente e cuidadosa, forçoso admitir que as demandas em apreço devem ser julgadas improcedentes, mantendo-se, desse modo, hígida a Resolução CSJT nº 353/2022.

Com efeito, a Resolução CNJ nº 439/2022 define as orientações e diretrizes mínimas para a instituição do programa de residência jurídica, outorgando-se aos Tribunais a regulamentação da temática mediante ato normativo local.

E tal quadro não poderia ser diferente, na medida em que cada Tribunal (ou segmento de Justiça) possui uma realidade administrativa e financeira própria, que reclama eventuais adaptações para dar concretude e efetividade às finalidades do programa de residência jurídica.

Nesse diapasão e buscando-se conferir tratamento uniforme à matéria no ramo trabalhista, mormente em razão dos possíveis impactos orçamentários a serem suportados por aquele segmento, o Conselho Superior da Justiça do Trabalho, no exercício de suas competências constitucionais[2], deliberou pela aprovação da Resolução CSJT nº 353/2022.

O normativo foi resultado da atuação zelosa e prudente do Conselho Superior da Justiça do Trabalho, ao constatar, entre outros, a adesão de apenas 3 Cortes Regionais (TRT 3, TRT 14 e TRT 24) ao programa de residentes, com regramentos evidentemente discrepantes no que tange, especialmente, ao quantitativo de vagas oferecidas (300, 100 e 3, respectivamente) e ao valor da bolsa-estágio (R$ 4.000,00, R$ 3.000,00 e R$ 2.000,00, respectivamente). 

E, no caso específico do TRT 3, verificou-se que o programa se aproximaria mais de uma espécie de “reposição de mão-de-obra”, tendo em vista justamente a oferta excessiva de vagas (300), com impacto orçamentário de R$ 15.000.000,00 por ano, e cujo exercício das atividades ocorreria em todas as unidades da Corte.

Ademais, percebeu-se a incompatibilidade de determinadas disposições locais com os objetivos do programa, destacando a possibilidade da realização das atividades em formato virtual, o que comprometeria o acompanhamento constante e pessoal do residente jurídico e exporia à perigo a integridade dos sistemas processuais da Justiça do Trabalho. 

Estar-se-ia, em verdade, diante de um cenário de potenciais riscos de “precarização do trabalho”, com possível desvirtuamento das reais finalidades do programa de proporcionar o aprimoramento da formação teórica e prática dos profissionais do Sistema de Justiça. 

Essa conjugação de fatores impôs, então, ao Conselho Superior da Justiça do Trabalho, na condição de órgão central do sistema, a adoção de medidas para evitar a continuidade dos programas de residentes nos moldes ora delineados, sobressaindo-se a edição da Resolução CSJT nº 353/2022.

Nesse particular, o Conselho atraiu, para si, legitimamente a tarefa de aprofundar os estudos destinados à uniformização da temática no âmbito da Justiça do Trabalho, para, ao final, estabelecer parâmetros gerais para a definição do número de residentes a serem admitidos e do respectivo valor da bolsa-auxílio, bem como a padronização dos critérios mínimos de admissão, de avaliação e de conclusão dos programas de residência jurídica.

Por fim, embora as ações implementadas pelo Conselho Superior da Justiça do Trabalho possam causar, num primeiro momento, eventuais prejuízos aos TRTs que aderiam ao programa e, notadamente, aos residentes jurídicos já admitidos e/ou convocados, não se vislumbra situação de patente interferência na autonomia das Cortes Regionais, uma vez que, pautado pela preservação do interesse público e à luz das regras mínimas definidas na Resolução CNJ nº 439/2022, caberia ao CSJT apenas estabelecer as normas gerais afetas à instituição e à regulamentação dos programas de residência jurídica no âmbito da Justiça do Trabalho, franqueando-se aos TRTs, após a superveniência da norma do CSJT, a complementação da legislação aplicável para atender às suas peculiaridades locais. 

À vista dessas considerações, há que se reconhecer a ausência de flagrantes ilegalidades na Resolução CSJT nº 353/2022, devendo, por consequência, serem julgadas improcedentes as demandas ora propostas.

Ante o exposto, JULGO IMPROCEDENTES os pedidos formulados pelos requerentes nos PCAs 0007991-85.2022.2.00.0000, 0008008-24.2022.2.00.0000, 0008063-72.2022.2.00.0000 e 0008072-34.2022.2.00.0000, prejudicados os demais pleitos.

Sem prejuízo, expeça-se a certidão requerida na petição de Id. 5019493 do PCA 0008072-34.2022.2.00.0000. 

Cumpridas as comunicações de praxe, arquivem-se os feitos independentemente de nova conclusão.

É como voto.

Brasília, data registrada no sistema.

  

MAURO PEREIRA MARTINS

Conselheiro Relator




[1] Autoriza os tribunais a instituírem programas de residência jurídica.

[2] Art. 111-A [...]

§ 2º Funcionarão junto ao Tribunal Superior do Trabalho:

I – [...];

II o Conselho Superior da Justiça do Trabalho, cabendo-lhe exercer, na forma da lei, a supervisão administrativa, orçamentária, financeira e patrimonial da Justiça do Trabalho de primeiro e segundo graus, como órgão central do sistema, cujas decisões terão efeito vinculante.

 

 

 

PROCEDIMENTO DE CONTROLE ADMINISTRATIVO Nº 0007991-85.2022.2.00.0000 e outros

Requerentes: HENRIQUE GONÇALVES GALIETO DE OLIVEIRA e outros

Requerido: CONSELHO SUPERIOR DA JUSTIÇA DO TRABALHO (CSJT) e outros

 

VOTO DIVERGENTE


PROCEDIMENTO DE CONTROLE ADMINISTRATIVO. JULGAMENTO CONJUNTO. RESOLUÇÃO CSJT Nº 353/2022. PROGRAMA DE RESIDÊNCIA JURÍDICA. UNIFORMIZAÇÃO DA TEMÁTICA NO ÂMBITO DA JUSTIÇA DO TRABALHO. VIOLAÇÃO DA RESOLUÇÃO CNJ Nº 439/2022. POSSIBILIDADE DE OS TRIBUNAIS TRATAREM SOBRE O TEMA ANTES DO ADVENTO DE NORMA GERAL DO CSJT. COMPETÊNCIA CONFERIDA INDEPENDENTEMENTE DE NORMA GERAL DO CSJT. AUTONOMIA ADMINISTRATIVA. RESIDENTES JURÍDICOS. DISPENSA IMEDIATA. VIOLAÇÃO AOS PRINCÍPIOS DA BOA-FÉ, SEGURANÇA JURÍDICA E PROTEÇÃO À CONFIANÇA. PEDIDOS JULGADOS PROCEDENTES.

1. Procedimento em que se questiona a Resolução nº 353/2022, editada pelo Conselho Superior da Justiça do Trabalho (CSJT), que dispõe sobre o programa de residência jurídica no âmbito da Justiça do Trabalho e veda que os Tribunais Regionais disponham sobre a matéria antes da edição de norma geral.

2. A Resolução CNJ nº 439/2022 define as orientações e diretrizes mínimas para a instituição do programa de residência jurídica, outorgando aos Tribunais a regulamentação da temática mediante ato normativo local, com observância das disposições insculpidas naquele normativo.

3. A competência dos Tribunais sobre a matéria decorre diretamente da Resolução CNJ nº 439/2022 e não está condicionada à edição de ato geral pelo CSJT.

4.Nesse contexto, a Resolução CSJT nº 353/2022, ao impedir que os Tribunais integrantes da Justiça do Trabalho regulem o tema e estabeleçam programas de Residência Jurídica antes do advento da sua norma geral, negou vigência à Resolução CNJ nº 439/2022.

5.Ademais, ao determinar que os Tribunais Regionais do Trabalho, no prazo de 30 dias, promovam a dispensa de residentes jurídicos eventualmente admitidos, a norma impugnada violou os princípios da boa-fé, segurança jurídica e proteção à confiança, o que a torna inválida.

 6. Pedidos julgados procedentes.

 

Trata-se de procedimentos de controle administrativo (PCAs) em que é questionada a Resolução nº 353/2022, editada pelo Conselho Superior da Justiça do Trabalho (CSJT), que dispõe sobre o Programa de Residência Jurídica no âmbito da Justiça do Trabalho.

Adoto, na íntegra, os relatórios lançados pelo e. relator, Conselheiro Mauro Martins. Quanto ao mérito, peço vênia a Sua Excelência para apresentar respeitosa divergência, pelas razões de fato e de direito a seguir expostas.

Inicialmente, louvo a iniciativa de realização de julgamento conjunto dos 04 (quatro) feitos em epígrafe, ante a similitude de objetos, o que decerto propiciará a necessária segurança jurídica nos resultados, sem risco de indesejáveis decisões contraditórias.

Os Requerentes trazem à apreciação deste douto plenário importante discussão acerca dos limites da atuação do colendo Conselho Superior da Justiça do Trabalho – CSJT, especialmente em tema já disciplinado expressamente pelo CNJ.

Com efeito, a Resolução CNJ nº 439/2022, aprovada à unanimidade, a partir de proposta formulada pela então Conselheira Flávia Pessoa, autorizou (reitere-se, de forma expressa) os Tribunais a instituírem, em seus âmbitos, programas de residência jurídica, voltados ao aprimoramento da formação teórica e prática dos profissionais do Sistema de Justiça. À vista da singeleza e concisão do seu texto, confira-se a íntegra:

Art. 1º Os tribunais ficam autorizados a instituir Programas de Residência Jurídica, objetivando proporcionar o aprimoramento da formação teórica e prática dos profissionais do Sistema de Justiça.

§ 1º A Residência Jurídica constitui modalidade de ensino destinado a bacharéis em Direito que estejam cursando especialização, mestrado, doutorado, pós-doutorado ou, ainda, que tenham concluído o curso de graduação há no máximo 5 (cinco) anos.

§ 2º A Residência Jurídica consiste no treinamento em serviço, abrangendo ensino, pesquisa e extensão, bem como o auxílio prático aos magistrados e servidores do Poder Judiciário no desempenho de suas atribuições institucionais.

§ 3º Os Programas de Residência poderão ter jornada de estágio máxima de 30 (trinta) horas semanais e duração de até 36 (trinta e seis) meses, não gerando vínculo de qualquer natureza com a Administração Pública.

Art. 2º A regulamentação do Programa de Residência deve se dar por meio de ato normativo local, que deverá dispor sobre o processo seletivo para o ingresso no programa e seu conteúdo programático, a delimitação das atividades a serem exercidas pelo residente, as hipóteses de desligamento e os requisitos para obtenção do certificado final, observadas as disposições insculpidas na presente Resolução.

§ 1º A admissão em Programa de Residência deve ocorrer mediante processo seletivo público, com publicação de edital e ampla divulgação, abrangendo a aplicação de provas objetiva e discursiva, de caráter classificatório e eliminatório.

§ 2º Aplicam-se aos Programas de Residência Jurídica o disposto na Resolução CNJ nº 336/2020, que dispõe sobre a promoção de cotas raciais nos programas de estágio dos órgãos do Poder Judiciário nacional.

§ 3º Os residentes deverão receber orientações teóricas e práticas sobre a atuação do Poder Judiciário ao longo do programa, contando com um magistrado orientador, bem como participar também de atividades e eventos acadêmicos realizados pelas Escolas da Magistratura.

§ 4º Os residentes não poderão exercer atividades privativas de magistrados, nem atuar de forma isolada nas atividades finalísticas do Poder Judiciário.

§ 5º É vedada a assinatura de peças privativas de integrantes da magistratura, mesmo em conjunto com o magistrado-orientador.

§ 6º Os residentes não poderão exercer a advocacia durante a vigência do Programa de Residência Jurídica.

§ 7º O residente deverá receber, ao longo do período de participação, uma bolsa-auxílio mensal, cujo valor deverá ser definido por meio do ato normativo local.

Art. 3º Cumpridos os requisitos de frequência e obtida a aprovação em procedimento de avaliação, nos termos do ato normativo local, o residente fará jus ao Certificado de conclusão de Programa de Residência.

Art. 4º A participação em Programa de Residência instituído por tribunal deverá ser considerada como título, nos termos da Resolução CNJ nº 75/2009.

Art. 5º O art. 67 da Resolução CNJ nº 75/2009 passa a vigorar com a seguinte alteração:

“Art. 67. Constituem títulos:

(...)

XII – Certificado de conclusão de Programa de Residência instituído por Tribunal, com duração de pelo menos 12 (doze) meses: 0,5.” (NR)

Art. 6º Esta Resolução entra em vigor na data de sua publicação.  (Grifou-se) 

Observa-se que a norma conferiu aos Tribunais, sem qualquer condicionante, a possibilidade de instituírem os programas de residência jurídica, dispondo ainda que cada Corte teria o papel de regulamentar o tema em seu próprio âmbito.

Não por outra razão, consta dos autos que o egrégio Tribunal Regional do Trabalho da 3ª Região – TRT3 procedeu a regular processo seletivo voltado à admissão de residentes jurídicos, com início das atividades previsto para o dia 03 de novembro de 2022. Na ocasião, foram convocados 114 (cento e quatorze) candidatos aprovados e, na sequência, mais uma turma com 100 (cem) candidatos, essa com previsão de início das atividades fixado para o dia 18 de novembro de 2022.

Ocorre que, em 25 de novembro de 2022, o colendo Conselho Superior da Justiça do Trabalho – CSJT editou a Resolução nº 353, que dispõe sobre “o Programa de Residência Jurídica de que trata a Resolução CNJ nº 439/2022”, nos seguintes termos:

Art. 1º As normas gerais referentes à instituição e à [regulamentação dos programas de residência jurídica no âmbito da Justiça do Trabalho serão estabelecidas pelo Conselho Superior da Justiça do Trabalho, ficando vedado aos Tribunais Regionais dispor sobre a matéria até que sobrevenha norma emanada deste Conselho.

Art. 2º Ficam cancelados todos os processos seletivos em andamento ou concluídos pelos Tribunais Regionais para a admissão de residentes jurídicos ou quaisquer bolsistas de estágio superior em programas similares da residência jurídica.

Art. 3º Os Tribunais Regionais do Trabalho, no prazo de 30 dias, deverão promover a dispensa de residentes jurídicos eventualmente já admitidos.

Art. 4º Esta Resolução entra em vigor na data da sua publicação.

(Grifou-se) 

Vê-se, a partir da literalidade das duas normas, que, enquanto o CNJ conferiu aos Tribunais a possibilidade de instituírem os aludidos programas de residência jurídica, de forma incondicionada a qualquer outra norma que não as editadas em âmbito local, o CSJT, por sua vez, negou às Cortes trabalhistas tal possibilidade “até que sobrevenha norma emanada deste Conselho”. Patente, a meu juízo, data vênia, o desrespeito à Resolução CNJ nº 439/2022.

Como bem assentado pelo e. Relator por ocasião da medida liminar concedida nos presentes feitos, não se desconhece a competência constitucional do aludido Conselho, a quem foi conferida a relevantíssima missão de proceder “a supervisão administrativa, orçamentária, financeira e patrimonial da Justiça do Trabalho de primeiro e segundo graus, como órgão central do sistema, cujas decisões terão efeito vinculante”.[1] 

Contudo, é também certo que suas competências de modo algum autorizam a edição de atos, como os de que ora se cuida, que expressamente, concessa máxima vênia, neguem vigência às Resoluções do Conselho Nacional de Justiça, órgão que sabidamente controla e fiscaliza a atuação administrativa e financeira de todo o Poder Judiciário Nacional, à exceção da Suprema Corte.

Nessa linha de argumentação, se é certo que o CSJT possui competência para tratar do tema das residências jurídicas por meio de normas gerais - válidas e aplicáveis aos Tribunais submetidos à sua atuação -, mostra-se de todo ilegal a disposição contida em sua Resolução no sentido de que fica “vedado aos Tribunais Regionais dispor sobre a matéria até que sobrevenha norma emanada deste Conselho”.

Como já salientado, a competência dos Tribunais para o estabelecimento dos programas de residência jurídica decorre expressamente da Resolução do CNJ e não está sujeita a qualquer condição. Desse modo, enquanto não sobrevier norma do CSJT de cunho geral e observância obrigatória para os Tribunais componentes da Justiça do Trabalho, forçoso o reconhecimento de que as Cortes trabalhistas poderão, de acordo com sua própria regulamentação, realizar os aludidos programas.

A partir de consulta pública aos sítios eletrônicos de diversos Tribunais do Poder Judiciário brasileiro, constata-se que, com fundamento direto na Resolução CNJ nº 439/2022, os programas de residência jurídica vêm sendo adotados de maneira crescente, a exemplo do que já ocorre nos TRFs da 5ª e 6ª Regiões, TJs dos Estados de Goiás, Santa Catarina, entre outros, sempre a partir de regulamentação local.

De igual modo, no âmbito do Ministério Público, o tema já foi devidamente regulamentado pelo Conselho Nacional do Ministério Público (Resolução nº 42/2022) e os programas de residência jurídica vêm sendo amplamente utilizados pelo parquet dos Estados, a exemplo da Bahia, Santa Catarina, entre outros. 

Não bastassem tais argumentos, cumpre ressaltar que a Resolução CSJT nº 353/2022, ao determinar o cancelamento de todos os processos seletivos “em andamento ou concluídos” para a admissão de residentes jurídicos, bem assim a “dispensa de residentes jurídicos eventualmente já admitidos”, acabou, vênia concessa, por malferir os princípios da boa-fé, segurança jurídica e proteção à confiança.

Uma vez mais, são oportunas as palavras do e. Relator sobre o tema, por ocasião da concessão da medida de urgência nos feitos ora em análise: 

[...] caberia aos Tribunais a regulamentação da temática na esfera local, com observância, tão somente, das disposições previstas na Resolução CNJ 439/2022.

Nesse contexto, proibir os Tribunais Regionais do Trabalho de disciplinar a matéria, com determinação, ainda, de cancelamento dos processos seletivos em andamento ou concluídos, além de representar possível ingerência na autonomia conferida aos Tribunais pela própria Resolução CNJ 439/2022, caracterizaria distanciamento dos princípios da segurança jurídica, da proteção da confiança e da boa-fé, notadamente nos casos em que há o pleno exercício dasatividades por pessoas devidamente aprovadas em processo seletivo promovidos pelos Tribunais, a exemplo da hipótese dos autos. 

Por certo, o ato do CSJT atingiu gravemente a esfera de direitos de candidatos regularmente aprovados no processo seletivo deflagrado pelo TRT3 e que, estando de boa-fé, possuíam a justa expectativa de manutenção de seus vínculos, nos precisos termos da Resolução CNJ nº 439/2022.

Sobre os princípios entelados, colhe-se da melhor doutrina de J. J. Gomes Canotilho:

O homem necessita de segurança para conduzir, planificar e conformar autônoma e responsavelmente a sua vida. Por isso, desde cedo se consideravam os princípios da segurança jurídica e da proteção da confiança como elementos constitutivos do Estado de Direito. (...) O princípio geral da segurança jurídica em sentido amplo (abrangendo, pois, a idéia de proteção da confiança) pode formular-se do seguinte modo: o indivíduo têm do direito poder confiar em que aos seus atos ou às decisões públicas incidentes sobre os seus direitos, posições ou relações jurídicas, alicerçadas em normas públicas vigentes e válidas, se ligam os efeitos previstos e prescritos por essas normas.[2] 

Na doutrina pátria, não é outra a reflexão de José dos Santos Carvalho Filho:

Doutrina moderna, calcada inicialmente no direito Alemão e depois de adotada no direito comunitário europeu, advoga o entendimento de que a tutela da confiança legítima abrange, inclusive, o poder normativo da Administração, e não apenas os atos de natureza concreta por ela produzidos. Cuida-se de proteger expectativas dos indivíduos oriundas da crença de que disciplinas jurídico-administrativas são dotadas de certo grau de estabilidade. Semelhante tutela demanda dois requisitos: 1º) a ruptura inesperada da legislação vigente; 2º) a imprevisibilidade das modificações. Em tais hipóteses, cabe à Administração adotar algumas soluções para mitigar os efeitos das mudanças: uma delas é a exclusão do administrado do novo regime jurídico; outra, o anúncio de medidas transitórias ou de um período de vacatio.[3]

Tem-se, assim, que o ato do CSJT feriu a justa expectativa de administrados de boa-fé, que, sublinhe-se por oportuno, adaptaram suas vidas e rotinas, confiantes na manutenção do programa de residência jurídica legitimamente deflagrado pelo TRT3 e nos quais já haviam sido selecionados, não se perdendo de vista que, em muitos casos, já havia ocorrido o início das atividades junto à Corte.

Sobre a temática, firme é o posicionamento do Supremo Tribunal Federal: 

DIREITO ADMINISTRATIVO. AGRAVO INTERNO EM RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM AGRAVO. SERVIDOR PÚBLICO. PROVIMENTO DERIVADO. SUBISTÊNCIA DO ATO ADMINISTRATIVO. PECULIARIDADES DO CASO CONCRETO. APLICAÇAO DOS PRINCÍPIOS DA SEGURANÇA JURÍDICA E DA PROTEÇÃO DA CONFIANÇA. 1. O Supremo Tribunal Federal, em algumas oportunidades, e sempre ponderando as particularidades de cada caso, já reconheceu a subsistência dos atos administrativos de provimento derivado de cargos públicos aperfeiçoados antes da pacificação da matéria neste Tribunal, em homenagem ao princípio da segurança jurídica. Precedentes. 2. O princípio da segurança jurídica, em um enfoque objetivo, veda a retroação da lei, tutelando o direito adquirido, o ato jurídico perfeito e a coisa julgada. Em sua perspectiva subjetiva, a segurança jurídica protege a confiança legítima, procurando preservar fatos pretéritos de eventuais modificações na interpretação jurídica, bem como resguardando efeitos jurídicos de atos considerados inválidos por qualquer razão. Em última análise, o princípio da confiança legítima destina-se precipuamente a proteger expectativas legitimamente criadas em indivíduos por atos estatais. 3. Inaplicável o art. 85, § 11, do CPC/2015, uma vez que não é cabível, na hipótese, condenação em honorários advocatícios (arts. 17 e 18 da Lei nº 7.347/1985). 4. Agravo interno a que se nega provimento.[4] (Grifou-se) 

Em arremate, é sabido que a administração pública deve, ao tomar suas decisões, à luz do disposto no art. 21 da LINDB[5], avaliar as consequências jurídicas e administrativas ocasionadas pela sua atuação, tendo, como parâmetro, o princípio da proporcionalidade. É dizer: não pode o poder público, em prejuízo de justos interesses dos cidadãos, adotar medida notoriamente desproporcional e cujas consequências ocasionem prejuízos excessivos, ainda mais quando outras soluções administrativas se poderiam apresentar como viáveis.

Fincadas tais premissas, resta evidente que qualquer atuação do CSJT relacionada ao tema dos programas de residência jurídica deveria adotar, como premissa inicial, o respeito à situação jurídica daqueles que já foram selecionados pelo egrégio TRT3, em absoluta observância ao espectro normativo talhado pelo Conselho Nacional de Justiça, a bem dos princípios da segurança jurídica e da proporcionalidade. 

Ante o exposto, peço vênia ao e. Relator para apresentar respeitosa divergência, julgando procedente os pedidos formulados nos PCAs nº 0007991-85.2022.2.00.0000, 0008008-24.2022.2.00.0000, 0008063-72.2022.2.00.0000 e 0008072-34.2022.2.00.0000, declarando, por conseguinte, a nulidade da Resolução CSJT nº 353, de 25 de novembro de 2022, ante a sua incompatibilidade com a Resolução CNJ nº 439, de 7 de janeiro de 2022, e restabelecendo a validade do programa de residência jurídica levado a efeito pelo egrégio Tribunal Regional do Trabalho – 3ª Região – TRT3, nos exatos termos do processo seletivo realizado pela Corte.

É como voto.

Brasília, data registrada no sistema.

Conselheiro João Paulo Schoucair

Vistor



[1] Constituição Federal, Artigo 111-A, §2º, II: “o Conselho Superior da Justiça do Trabalho, cabendo-lhe exercer, na forma da lei, a supervisão administrativa, orçamentária, financeira e patrimonial da Justiça do Trabalho de primeiro e segundo graus, como órgão central do sistema, cujas decisões terão efeito vinculante”.  

[2] CANOTILHO, J. J. Gomes. Direito Constitucional e Teoria da Constituição. Coimbra: Almedina, 2000, p. 256.

 [3] CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de Direito Administrativo. 23ª Ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2010, p. 38.

[4] STF, 1ª T., ARE 823985 AgR, Rel. Min. Roberto Barroso, DJe 11/04/2018.

[5] “Art. 21. A decisão que, nas esferas administrativa, controladora ou judicial, decretar a invalidação de ato, contrato, ajuste, processo ou norma administrativa deverá indicar de modo expresso suas consequências jurídicas e administrativas. Parágrafo único. A decisão a que se refere o caput deste artigo deverá, quando for o caso, indicar as condições para que a regularização ocorra de modo proporcional e equânime e sem prejuízo aos interesses gerais, não se podendo impor aos sujeitos atingidos ônus ou perdas que, em função das peculiaridades do caso, sejam anormais ou excessivos.” (Grifou-se)