Conselho Nacional de Justiça

Gabinete do Conselheiro Valtércio de Oliveira

 

Autos: CONSULTA - 0001005-57.2018.2.00.0000
Requerente: CORREGEDORIA GERAL DA JUSTIÇA DO ESTADO DO MARANHÃO
Requerido: CORREGEDORIA NACIONAL DE JUSTIÇA

 

 

EMENTA: CONSULTA. NOMEAÇÃO DO SUBSTITUTO MAIS ANTIGO COM VÍNCULO DE PARENTESCO COM O EX-TITULAR. 15ª META DA CORREGEDORIA NACIONAL DE JUSTIÇA PARA AS CORREGEDORIAS LOCAIS PARA OS SERVIÇOS EXTRAJUDICIAIS. REVOGAÇÃO DAS DESIGNAÇÕES QUANDO CONFIGURADA OFENSA AOS PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS DA MORALIDADE E DA IMPESSOALIDADE.  CONSULTA RESPONDIDA. 

1.           Existência da 15ª Meta para cumprimento pelas Corregedorias estaduais até junho de 2018: realizar levantamento da existência de nepotismo em nomeação de interinos. 

2.           Indaga-se se para o cumprimento da meta imposta seria pertinente a revogação das nomeações de interinos designados anteriormente ao julgamento do PCA 0007449-43.2017.2.0000.00, que entendeu, em sede de tutela cautelar, pela configuração de nepotismo no caso de assunção à interinidade do substituto mais antigo, nos termos do art. 39, §2º da Lei nº 8.935/94, que possua algum vínculo de parentesco com o anterior delegatário. 

3.           Pertinência da revogação da nomeação dos substitutos mais antigos quando configurada ofensa aos princípios constitucionais da moralidade e da impessoalidade, mesmo diante da iminência das nomeações dos delegatários aprovados em concurso público, adotando-se como fundamento o entendimento consagrado no PCA nº 0007256-33.2014.2.00.0000, ainda que a titularidade tenha sido extinta pela morte do titular dos serviços. Precedentes.

4.           Consulta respondida.

 

 

 ACÓRDÃO

O Conselho, por unanimidade, respondeu à consulta, nos termos do voto do Relator. Ausentes, justificadamente, os Conselheiros Daldice Santana e André Godinho e, em razão da vacância do cargo, o representante do Ministério Público da União. Presidiu o julgamento a Ministra Cármen Lúcia. Plenário, 26 de junho de 2018. Presentes à sessão os Excelentíssimos Senhores Conselheiros Cármen Lúcia, João Otávio de Noronha, Aloysio Corrêa da Veiga, Iracema do Vale, Valtércio de Oliveira, Márcio Schiefler Fontes, Fernando Mattos, Luciano Frota, Arnaldo Hossepian, Valdetário Andrade Monteiro, Maria Tereza Uille Gomes e Henrique Ávila.

RELATÓRIO

  

Trata-se de Consulta formulada pela Corregedoria-Geral da Justiça do Maranhão, na qual questiona sobre o cumprimento da 15ª Meta da Corregedoria Nacional de Justiça.

O consulente colaciona os termos da 15ª Meta, assim redigida: realizar levantamento detalhado da existência de nepotismo na nomeação de interinos do serviço extrajudicial, revogando os atos de nomeação que afrontam o princípio da moralidade.

Relata que, em levantamento preliminar, identificou-se “17 (dezessete) casos possíveis de configuração de nepotismo em serventias que se encontram em situação de interinidade, mas cujo provimento está previsto para ocorrer provavelmente a partir de abril de 2018, quando deve se realizar a audiência de escolha das serventias do concurso público que se encontra em andamento.”

Diante disso, questiona se seria “pertinente a revogação da nomeação dos interinos designados antes do julgamento do PCA nº 00074494320172000000, que entendeu pela configuração de nepotismo no caso de o interino ser o substituto mais antigo, nos termos do art. 39§2º, da Lei nº 8.935/94, que goza de algum parentesco com o anterior delegatário” - e se o entendimento é extensivo aos casos de interinidades decorrentes do falecimento do titular, “vale dizer, se tal situação também se enquadra na regra do nepotismo de que trata a Meta 15 da Corregedoria Nacional.”

É o relatório.   

 

VOTO

 

De plano, registro que o expediente atende aos requisitos de admissibilidade de que trata o artigo 89 do Regimento Interno deste Conselho, pois consubstancia tema de interesse e repercussão gerais quanto à dúvida suscitada na aplicação de dispositivos legais e regulamentares concernentes à matéria de competência do CNJ. 

A despeito de o requerimento ter sido endereçado ao Corregedor Nacional de Justiça, “uma vez que decorre do cumprimento das metas estabelecidas no I Encontro de Corregedores do Serviço Extrajudicial” devo ressaltar que os autos me foram distribuídos por se tratar de classe processual de livre distribuição entre os Conselheiros, cuja matéria não é exclusiva do Órgão Censor Nacional, conforme determina o art. 47, III, do Regimento Interno (RICNJ).

Dessa forma, passo ao exame das questões a serem respondidas.

 

A presente Consulta tem como objetivo esclarecer se é necessária a revogação da nomeação de interino, na condição de substituto mais antigo da serventia extrajudicial, que mantenha vínculo de parentesco com o ex-titular.

 

1º Questionamento:

Passo a avaliar a primeira proposição consubstanciada na seguinte pergunta:

Assim tendo em vista que tais serventias estão em vias de serem providas por delegatários concursados, e com o fim de evitar prejuízos à continuidade do serviço delegado, indaga-se se é pertinente a revogação da nomeação dos interinos designados anteriormente ao julgamento do PCA 00074494320172000000, que entendeu pela configuração de nepotismo no caso de assunção à interinidade do substituto mais antigo, nos termos do art. 39, §2º da Lei nº 8.935/94, que goza de algum parentesco com o anterior delegatário.

 

Tanto essa primeira quanto a segunda questão originaram-se de uma dentre as 20 metas da Corregedoria Nacional de Justiça para as Corregedorias locais para os serviços extrajudiciais, fruto de correições realizadas pelo Órgão Censor Nacional em delegações e divulgados no I Encontro de Corregedores.

O objeto da dúvida limita-se ao teor da 15ª Meta para cumprimento pelas Corregedorias estaduais até junho de 2018. Eis o seu teor: 

15ª: realizar levantamento da existência de nepotismo em nomeação de interinos; 

 

Quanto à titularidade das serventias extrajudiciais, é de conhecimento comum que os serviços notariais e de registro possuem previsão constitucional no art. 236 e são exercidos em caráter privado, por delegação do Poder Público, após aprovação em concurso público de provas e títulos (arts. 1º e 5º, da Lei nº 8.935/1994).

Nesse diapasão, caso a delegação seja extinta em razão de qualquer das hipóteses previstas no art. 39 da lei nº 8.935/1994 (I - por morte; II – aposentadoria facultativa; III – invalidez; IV – renúncia; V – perda, nos termos do art. 35; VI – descumprimento, comprovado, da gratuidade estabelecida na Lei 9.534/1997), a serventia deverá ser declarada vaga, ocasião em que a autoridade competente designará o substituto mais antigo para responder pelo expediente e abrirá concurso (art. 39, § 2º, da Lei 8.935/1994).

Os substitutos nomeados assumem provisoriamente a titularidade dos cartórios extrajudiciais, sendo designados para responder pelo expediente, de modo a preservar a continuidade da prestação dos serviços públicos até a realização de concurso para a seleção do titular efetivo.

Essa é, portanto, a forma de designação dos interinos.

Em razão das diversas nuances apresentadas quando da nomeação desses substitutos, algumas discussões se iniciaram no âmbito deste CNJ a respeito da interinidade, tal como a consubstanciada nos autos PCA nº 0007449-43.2017.2.00.0000, de relatoria do e. Conselheiro Henrique Ávila, conforme aponta o consulente em seu requerimento.

No entanto, em relação ao procedimento, faz-se necessário tecer algumas considerações. A situação ali enfrentada versa sobre a não ratificação da designação da substituta mais antiga em razão de ela ter sido cônjuge do ex-delegatário, este falecido. Formulou-se pedido de concessão de medida liminar, monocraticamente concedida pelo relator, mas não ratificada pelo Colegiado deste Conselho por entender que a nomeação do substituto mais antigo à interinidade submete-se à aplicação da súmula vinculante nº 13.

Ocorre que o feito possui apenas decisão liminar, mas não de mérito, motivo pelo qual eventual ação da Corregedoria local, ora consulente, não deve estar estribada em decisões cuja cognição seja apenas sumária. Para tanto, o precedente a ser utilizado para balizar as ações do Órgão censor deve ser o consagrado no PCA nº 0007256-33.2014.2.00.0000, de relatoria do meu antecessor, o então e. Conselheiro Gustavo Tadeu Alkmim.

Neste, a então substituta mais antiga era cônjuge do ex-delegatário que renunciou à titularidade para assumir outra serventia, situação essa que violou os princípios constitucionais da moralidade e da impessoalidade e o relator entendeu por manter a decisão de Tribunal que anulou a designação da então respondente.

O julgado recebeu a seguinte ementa:

PROCEDIMENTO DE CONTROLE ADMINISTRATIVO. CARTÓRIO EXTRAJUDICIAL. LEGITIMIDADE DO ATO DO TJMS QUE ANULOU A DESIGNAÇÃO DE INTERINA ESPOSA DE EX-TITULAR QUE RENUNCIOU PARA TOMAR POSSE EM OUTRA SERVENTIA.

1. A previsão contida no art. 39, § 2º, da Lei nº 8.935/94, segundo a qual, uma vez extinta a delegação deve a autoridade competente declarar vago o serviço e designar o substituto mais antigo para responder pelo cartório, até a abertura de concurso, não se aplica a casos como o presente, quando o marido renuncia ao ofício, para tomar posse em outra serventia, restando a esposa para assumir o cartório, e o faz imediatamente após a abertura de concurso, vislumbrando, assim, uma interinidade longo prazo. Embora não caracterizado o nepotismo, na forma da Resolução 7 do CNJ, restaram violados os princípios constitucionais da moralidade e da impessoalidade.

2. Procedimento de Controle Administrativo julgado improcedente.

(CNJ - PCA - Procedimento de Controle Administrativo - 0007256-33.2014.2.00.0000 - Rel. GUSTAVO TADEU ALKMIM - 5ª Sessão Virtual - j. 01/12/2015).

 

Realizados os esclarecimentos, respondo positivamente sobre a pertinência da revogação da nomeação dos interinos designados pela configuração de nepotismo no caso de assunção à interinidade do substituto mais antigo, nos termos do art. 39, §2º da Lei nº 8.935/94, que possua algum parentesco com o anterior delegatário, não com base no entendimento adotado no PCA nº 0007449-43.2017.2.0000.00, mas sim no de nº 0007256-33.2014.2.00.0000.

Inobstante, a decisão nos autos do PCA nº 0007256-33.2014.2.00.0000 foi tomada em 1º de dezembro de 2015, momento em que eventuais dúvidas sobre a manutenção das designações em violação aos princípios constitucionais já deveriam ter sido sanadas. Por esse motivo, afirmo ser pertinente a revogação da nomeação dos substitutos mais antigos quando estes possuírem parentesco com o ex-titular desde a data em que o Colegiado julgou o PCA paradigma, em 1º de dezembro de 2015, independentemente da iminência do provimento das serventias vagas pelos delegatários aprovados em concurso público.

 

2º Questionamento

Passemos, então, à segunda indagação materializada na seguinte pergunta se o entendimento é extensivo ao caso de interinidades que decorreram de falecimento do titular, em que o substituto mais antigo então designado na serventia tem relação de parentesco até o 3º grau com o delegatário falecido”.

Mais uma vez a resolução da questão não deve estar dissociada daquela dada como resposta à primeira dúvida, já que em qualquer dos casos deverá prevalecer a observância dos princípios constitucionais da impessoalidade e da moralidade, insculpidos no caput do art. 37, da Constituição Federal.

Entrementes, esses postulados constitucionais são os que fundamentam a existência da Resolução CNJ nº 7/2005 - disciplina o exercício de cargos, empregos e funções por parentes, cônjuges e companheiros de magistrados e de servidores investidos em cargos de direção e assessoramento, no âmbito dos órgãos do Poder Judiciário e dá outras providências -, do Enunciado CNJ nº 1/2008 e da Súmula Vinculante nº 13, prontamente aplicáveis às designações das respondências em serventias extrajudiciais vagas. Eis o conteúdo das determinações:

Enunciado CNJ nº 1/2008

O) Aplica-se a Resolução 7 deste CNJ às nomeações não-concursadas para serventias extrajudiciais.

 

Súmula Vinculante nº 13

A nomeação de cônjuge, companheiro ou parente em linha reta, colateral ou por afinidade, até o terceiro grau, inclusive, da autoridade nomeante ou de servidor da mesma pessoa jurídica investido em cargo de direção, chefia ou assessoramento, para o exercício de cargo em comissão ou de confiança ou, ainda, de função gratificada na administração pública direta e indireta em qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, compreendido o ajuste mediante designações recíprocas, viola a Constituição Federal.

 

A resposta ao segundo questionamento está fundamentado no seguinte julgado:

PROCEDIMENTO DE CONTROLE ADMINISTRATIVO. TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO PARANÁ. EXTINÇÃO DE DELEGAÇÃO. FALECIMENTO DA TITULAR. LEI 8.935/1994. ART. 39, § 2º. DESIGNAÇÃO DE PARENTE PARA O EXERCÍCIO PRECÁRIO DOS SERVIÇOS. DECISÃO DO CONSELHO DA MAGISTRATURA. NÃO REFERENDO DO ATO. PREVALÊNCIA DOS PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS DA MORALIDADE E IMPESSOALIDADE.

1. Procedimento de controle administrativo contra deliberação administrativa de Tribunal que não referendou a designação de filha de antiga titular de serventia (falecida), por infringência aos princípios da moralidade e impessoalidade.

2. “O titular interino não atua como delegado do serviço notarial e de registro porque não preenche os requisitos para tanto; age, em verdade, como preposto do Poder Público e, nessa condição, deve-se submeter aos limites remuneratórios previstos para os agentes estatais, não se lhe aplicando o regime remuneratório previsto para os delegados do serviço público extrajudicial” (STF, MS 30180).

3. “Ao colocar titulares interinos nas atividades notariais e de registro, o Estado as presta diretamente, acumulando as ‘situações de titular e prestador do serviço’ – o que, diga-se de passagem, só é possível na vigência da Carta Política de 1988 de forma transitória e precária, dado o prazo constitucional de seis meses para a efetivação da delegação.” (STF, MS 29.083 ED-ED-AgR/DF).

4. “Sendo os interinos das serventias notarias e de registro verdadeiros prepostos do poder público e sendo-lhes aplicável o regime de direito público, em especial do teto remuneratório, não se mostra adequado afastar a sua designação dos princípios constitucionais do art. 37 da CF/88, notadamente a impessoalidade, a vedar a prática do nepotismo” (ML em PCA 0007449-43.2017.2.00.0000).

5. Extinta a delegação a notário ou a oficial de registro, a autoridade competente designará o substituto mais antigo para responder pelo expediente, desde que esse ato não viole a aplicação dos princípios constitucionais previstos no artigo 37 c/c a Súmula Vinculante 13 do STF, inteligência do artigo art. 39, § 2º, da Lei 8.935/1994

6. Improcedência do pedido.

(CNJ – PCA – Procedimento de Controle Administrativo – 0005414-13.2017.2.00.0000 – Rel. MARIA TEREZA UILLE GOMES – 32ª Sessão Virtual – 7/3/2018)

 

Nessa perspectiva, ao segundo questionamento apresentado “se o entendimento é extensivo ao caso de interinidades que decorreram de falecimento do titular, em que o substituto mais antigo então designado na serventia tem relação de parentesco até o 3º grau com o delegatário falecido”, a resposta é afirmativa, já que o definido para a primeira indagação não deve distanciar-se no preconizado no outro caso, pois em ambos os postulados constitucionais devem ser observados.

Portanto, as nomeações dos interinos, mesmo que se tratem dos substitutos mais antigos e nomeados nos termos do art. 39, §2º, da Lei nº 8.935/1994, devem ser revogadas quando mantiverem vínculo de parentesco com o ex-titular, mesmo que a delegação tenha sido extinta pela morte do titular dos serviços.

É como voto.

 

Havendo aprovação da presente decisão pela maioria absoluta do Plenário do CNJ, deve ser conferido à resposta caráter de normativo geral e vinculante, dando-se, então, ciência a todos os Tribunais de Justiça, nos termos do § 2º do art. 89 do RICNJ.

 

Brasília, data registrada no sistema. 

  

VALTÉRCIO DE OLIVEIRA

Conselheiro

 

 

 

Brasília, 2018-06-26.