Conselho Nacional de Justiça

 

Autos: CONSULTA - 0002433-11.2017.2.00.0000
Requerente: CORREGEDORIA REGIONAL DA JUSTIÇA DO TRABALHO DA 13ª REGIÃO
Requerido: CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA - CNJ

 

 

EMENTA 

CONSULTA. MAGISTRADO. ASSOCIAÇÃO DE CLASSE DE ÂMBITO ESTADUAL. LICENÇA PREVISTA NO ART. 73, INCISO III, DA LOMAN. EXTENSÃO AO VICE-PRESIDENTE. POSSIBILIDADE DE CONCESSÃO DE AFASTAMENTO DURANTE O EXERCÍCIO INTERINO DA PRESIDÊNCIA. AUTONOMIA DO TRIBUNAL.

1.  Consulta formulada com o objetivo de esclarecer se o Juiz Vice-Presidente de associação de classe faz jus, ou não, à licença prevista no art. 73, III, da LOMAN durante as férias e/ou afastamentos esporádicos do juiz presidente da associação.  

2.  Nos termos da Resolução CNJ n. 133/2011, o afastamento para representação de classe de âmbito nacional estende-se a até três membros.

3.  Em associações cuja abrangência não seja nacional, o afastamento, a teor do art. 73, III, da LOMAN, deve ser concedido apenas ao Presidente.

4.  Durante o exercício da substituição, pode o Tribunal conceder o afastamento a quem exerce  interinamente a presidência da entidade. Autonomia do Tribunal.

 5. Consulta conhecida e respondida.

 

 ACÓRDÃO

O Conselho, por unanimidade, respondeu a consulta para assentar que, no caso de associação de classe cuja abrangência não seja de âmbito nacional, a licença assegurada no art. 73, III, da LOMAN constitui direito subjetivo apenas ao magistrado que exerce a Presidência da entidade, com a possibilidade de concessão de afastamento do substituto, quando exercer interinamente a Presidência, a critério do Tribunal, nos termos do voto do Relator. Plenário Virtual, 14 de dezembro de 2018. Votaram os Excelentíssimos Conselheiros Dias Toffoli, Humberto Martins, Aloysio Corrêa da Veiga, Daldice Santana, Valtércio de Oliveira, Márcio Schiefler Fontes, Fernando Mattos, Luciano Frota, Maria Cristiana Ziouva, Arnaldo Hossepian, Valdetário Andrade Monteiro, André Godinho, Maria Tereza Uille Gomes e Henrique Ávila. Não votou a Excelentíssima Conselheira Iracema do Vale.

Conselho Nacional de Justiça

Autos: CONSULTA - 0002433-11.2017.2.00.0000
Requerente: CORREGEDORIA REGIONAL DA JUSTIÇA DO TRABALHO DA 13ª REGIÃO
Requerido: CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA - CNJ

 

 

RELATÓRIO

 

Trata-se de Consulta formulada pela CORREGEDORIA REGIONAL DA JUSTIÇA DO TRABALHO DA 13ª REGIÃO, por meio da qual requer seja esclarecido se o Juiz Vice-Presidente de associação de classe faz jus, ou não, à licença prevista no art. 73, III, da LOMAN, durante as férias e/ou afastamentos esporádicos do Juiz Presidente da associação. 

A iniciativa da Consulta teve por base a análise de caso concreto ocorrido naquele Tribunal, referente à concessão de licença associativa ao Juiz Vice-Presidente da Associação dos Magistrados do Trabalho da 13ª Região – AMATRA13 para exercer, em substituição, a Presidência da mencionada associação, durante o período de férias de seu Presidente. 

É o relatório. VOTO.

 

 

Conselho Nacional de Justiça

 

Autos: CONSULTA - 0002433-11.2017.2.00.0000
Requerente: CORREGEDORIA REGIONAL DA JUSTIÇA DO TRABALHO DA 13ª REGIÃO
Requerido: CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA - CNJ

 

 

 

 

VOTO

     Nos termos do art. 89 do Regimento Interno do Conselho Nacional de Justiça, tem-se que o procedimento de Consulta deve ser manejado em tese, diante de questionamentos que apresentem interesse e repercussão gerais quanto à dúvida suscitada na aplicação de dispositivos legais e regulamentares concernentes à matéria de competência deste Conselho. 

     Nestes autos, em que pese a dúvida apresentada pela parte autora ter surgido diante de caso concreto que lhe foi posto, entendo pertinente seu conhecimento, por apresentar tema de amplo interesse do Poder Judiciário, ainda que derivado de questionamento de caso concreto.

    Com efeito, o CNJ já teve oportunidade de apreciar Consultas que veiculavam casos concretos, por apresentarem questionamentos cuja resposta seria de interesse geral para o Poder Judiciário:

CONSULTA – NEPOTISMO – READMISSÃO DE EX-SERVIDORA CUJA SITUAÇÃO ANTERIOR CARACTERIZAVA NEPOTISMO CRUZADO – IMPOSSIBILIDADE

I. Consultas sobre análise de caso concreto somente são conhecidas quando de sua resposta houver repercussão geral e de suas conclusões puder ser extraída eficácia a todo o Poder Judiciário (PPs nºs 1418, 7809, 11825, 25117; PCA nº 8188).

(...)

(CNJ - PP - Pedido de Providências - Conselheiro - 0003296-79.2008.2.00.0000 - Rel. JORGE ANTONIO MAURIQUE - 80ª Sessão - j. 17/03/2009 – grifo nosso).

    

               Superado o óbice quanto ao conhecimento, passo ao exame do mérito.

  O afastamento para fins de exercício das funções de Presidente em associações é uma prerrogativa criada para garantir de forma substantiva o direito fundamental de associação previsto no artigo 5º, inciso XVII, da Constituição Federal. 

A LOMAN, em seu art. 73, inciso III, autoriza expressamente o afastamento do Presidente de associação de classe de suas atividades jurisdicionais, sem prejuízo de seus vencimentos e vantagens: 

Art. 73 - Conceder-se-á afastamento ao magistrado, sem prejuízo de seus vencimentos e vantagens: 

[...] 

III - para exercer a presidência de associação de classe. 

Os limites do direito à liberdade de associação já foram discutidos no PCA 0008225-87.2010.2.00.0000, tendo considerado “a ausência de qualquer critério para a concessão do afastamento, seja de ordem temporal, em razão do número de associados que representa ou mesmo pela extensão territorial abrangida pela associação”. 

Em outros julgados, este Conselho fixou o entendimento segundo o qual o afastamento de magistrado para exercício de representação em associações de classe está assegurado por lei e não pode ser indeferido com fundamento em deficiência de juízes ou em razão de eventuais prejuízos aos magistrados: 

ASSOCIAÇÃO DE CLASSE. MAGISTRADO PRESIDENTE. AFASTAMENTO PREVISTO NA LOMAN. POSSIBILIDADE. 

- É associação de classe, para os fins do disposto no art. 73, III da LOMAN, a entidade de âmbito nacional composta por Presidentes dos Tribunais de Justiça cujos objetivos são, entre outros, a integração dos Tribunais de Justiça em todo o território nacional e o intercâmbio de experiências funcionais e administrativas. 

- A atividade de presidente de associação de classe de âmbito nacional demanda disponibilidade de tempo para deslocamento e cumprimento das obrigações inerentes ao seu exercício, sendo legal e legítimo o afastamento do magistrado de suas funções judicantes, parcial ou totalmente.

(CNJ - PCA - Procedimento de Controle Administrativo - 0001281-06.2009.2.00.0000 - Rel. PAULO LÔBO - 82ª Sessão - j. 14/04/2009 ).

*    *    *

PRESIDENTE DE ASSOCIAÇÃO DE MAGISTRADOS. AFASTAMENTO. LOMAN, ART. 73, 111. PEDIDO DEFERIDO.

I - O excesso de número de feitos na Vara onde titular o magistrado eleito presidente da Associação, não pode por si só justificar o indeferimento do pedido de afastamento.

II - O afastamento está previsto na Lei Complementar no 35, art. 73, III.

III - Reeleito o mesmo magistrado para um segundo biênio, se já estava afastado no mandato anterior, deve ser autorizado novamente para se afastar.

V - Pedido deferido.(CNJ - PCA - Procedimento de Controle Administrativo - 246 - Rel. Jirair Meguerian - 11ª Sessão (EXTRAORDINÁRIA) - j. 09/05/2007).

*    *    *

[...]

Relativamente ao Pedido de Providências 1165 em apenso, restando prejudicada a questão formulada na alínea “a” em face do quanto decidido no feito principal, voto em responder a questão formulada na alínea “b” no sentido de que o inc. III do art. 73 da Lei Complementar 35/79 assegura direito ao afastamento não condicionado ao juízo de conveniência da Administração. (Trecho do voto do Cons. Rel. Paulo Schmidt)

(CNJ - PP - Pedido de Providências - Conselheiro - 1165 - Rel. Paulo Schmidt - 9ª Sessão (EXTRAORDINÁRIA) - j. 17/04/2007).

Alguns desses precedentes, a propósito, chegaram a ser confirmados pelo Supremo Tribunal Federal, como são exemplos o MS 30.659 e o MS 28.140.

Com amparo nesse entendimento, o CNJ editou a Resolução n. 133/2011, que trata da simetria constitucional entre a Magistratura e o Ministério Público, a qual ampliou a concessão do afastamento para representação de associação de classe, que deixou de ser exclusiva do presidente, estendendo-se, no total, a até três membros da diretoria:

Art. 1º São devidas aos magistrados, cumulativamente com os subsídios, as seguintes verbas e vantagens previstas naLei Complementar nº 75/1993 e na Lei nº 8.625/1993:

[...]

c)Licença para representação de classe, para membros da diretoria, até três por entidade;

Todavia, como essa previsão decorre da simetria constitucional existente entre a Magistratura e o Ministério Público, a concessão de afastamento de até três membros por entidade restringe-se às associações de âmbito nacional, conforme dispõe o texto da Lei Complementar 75/1993 (Estatuto do Ministério Público):

Art. 222. Conceder-se-á aos membros do Ministério Público da União licença:

V - para desempenho de mandato classista.

§ 5º A licença prevista no inciso V será devida ao membro do Ministério Público da União investido em mandato em confederação, federação, associação de classe de âmbito nacional ou sindicato representativo da categoria, observadas as seguintes condições:

[…]

Especificamente quanto às associações de abrangência regional, prevê o art. 6º da Resolução 174 do Conselho da Justiça Federal que a licença se restringe “a um magistrado eleito para o cargo de presidente de associação de classe regional”:

Art. 6° Conceder-se-á licença ao magistrado para representação de classe, sem prejuízo do subsídio, das vantagens ou de qualquer direito inerente ao cargo.

§ 1º Farão jus à licença:

I - os eleitos para cargos de direção de associação de classe de âmbito nacional, no número máximo de três magistrados, incluído, neste limite, o magistrado afastado para o exercício da presidência da respectiva entidade;

II - um magistrado eleito para o cargo de presidente de associação de classe regional.

 

Não obstante, em caso em que se discutia a licença de magistrado para exercício do cargo de 1º tesoureiro em associação de classe estadual, embora este Conselho não tenha admitido a concessão, destaco excerto relevante, no qual a Relatora acena que cabe ao Tribunal avaliar a pertinência do afastamento de mais de um magistrado:

No contexto do requerimento posto, o art. 73, inciso III, da Lei Complementar n.º 35/79, assegura o afastamento do magistrado, sem prejuízo de seus vencimentos e vantagens, “para exercer a presidência de associação de classe”. Tal dispositivo tem recebido interpretação no sentido de garantir o pretendido afastamento do Presidente da associação, sem qualquer crivo da administração do Tribunal. Entendimento construído em razão do legislador não ter fixado critério semelhante àquele que constou do inciso I do mesmo dispositivo legal[1] (CNJ - Pedido de Providência n.º 1150 e 1165. Relator Conselheiro Paulo Schimidt).

Ocorre que, apesar da edição da Resolução CNJ n.º 133/2011, com o objetivo de ajustar a simetria constitucional entre a Magistratura e o Ministério Público (art. 129, § 4º, da CF), acolhendo a possibilidade de afastamento de “até três” magistrados para o exercício de atividade representativa da classe, o Conselho Nacional de Justiça tem firmado o entendimento de que o direito de participação nas entidades representativas de classe não é irrestrito, ficando entrincheirado na lei e nos princípios que orientam a atuação da administração pública. Vejamos:

PROCEDIMENTO DE CONTROLE ADMINISTRATIVO. CORREGEDORIA REGIONAL DA JUSTIÇA DO TRABALHO DA 1a REGIÃO. PARTICIPAÇÃO DE MAGISTRADA EM REUNIÃO ASSOCIATIVA. DIREITO DE ASSOCIAÇÃO. CF, ART. 5o, XVII E XVIII. LOMAN, ART. 36, II. INTERPRETAÇÃO TELEOLÓGICA. 1. A Constituição da República assegura o direito de associação (art. 5o, incisos XVII e XVIII) e veda a interferência estatal em seu funcionamento. A previsão, sem embargo, não deve compreender-se como permissão irrestrita para que os associados participem de todas as atividades associativas sem consideração para com seu trabalho, seja na administração pública, seja na órbita privada. 2. Se o art. 36, II, da Lei Orgânica da Magistratura Nacional (LOMAN) permite que o juiz participe da direção de suas associações, a teleologia da norma impõe concluir que o juiz, considerando sua peculiar condição funcional, está legalmente autorizado a tomar parte das reuniões e demais iniciativas da entidade, ao mesmo tempo em que deve compatibilizar esse direito de participação associativa com o cumprimento de seus deveres funcionais. 3. Situações de abuso ou negligência dos magistrados devem ser apuradas individualmente pela respectiva Corregedoria e por este Conselho, quando for o caso. Não deve a Corregedoria Regional, contudo, basear-se em suposto prejuízo, não demonstrado, pelo afastamento da juíza em caso concreto (CNJ, consulta no 0005353- 36.2009.2.00.0000). Procedência do pedido. (CNJ - PCA - Procedimento de Controle Administrativo - 0004081-36.2011.2.00.0000 - Rel. WELLINGTON SARAIVA - 137ª Sessão - j. 25/10/2011).

Nessa perspectiva, a ausência de critérios claros e objetivos, quer de ordem temporal, territorial ou mesmo em razão do número de associados que representa, destaca o requerimento de afastamento das atividades judicantes de mais um magistrado, notadamente quando já deferido o afastamento de magistrado para exercício da Presidência da associação, para o exame de conveniência e oportunidade pela Administração do Tribunal, com observação das específicas peculiaridades.

(CNJ - RA – Recurso Administrativo em PP - Pedido de Providências - Conselheiro - 0002344-90.2014.2.00.0000 - Rel. DEBORAH CIOCCI - 25ª Sessão (EXTRAORDINÁRIA) - j. 15/12/2014)

 

Ante o exposto, respondo a consulta formulada para assentar que, no caso de associação de classe cuja abrangência não seja de âmbito nacional, a licença assegurada no art. 73, III, da LOMAN constitui direito subjetivo apenas ao magistrado que exerce a Presidência da entidade.

Todavia, é possível a concessão de afastamento do substituto quando exercer interinamente a Presidência – como no caso de férias do titular, por exemplo - , a critério do Tribunal, que possui autonomia para deliberar sobre a pertinência da licença.

É como voto.

Brasília, 21 de novembro de 2018.

 

HENRIQUE ÁVILA

Conselheiro Relator

Brasília, 2018-12-17.