Conselho Nacional de Justiça

 

Autos: PROCESSO ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR EM FACE DE MAGISTRADO - 0008529-03.2021.2.00.0000
Requerente: CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA - CNJ
Requerido: ROSSELBERTO HIMENES

 


PROCESSO ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR EM FACE DE MAGISTRADO. TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO AMAZONAS. INOBSERVÂNCIA DE DEVERES IMPOSTOS À MAGISTRATURA. ARTIGOS 35, I E VIII, DA LOMAN, E ARTIGOS 1º, 5º, 8º, 24 E 25 DO CÓDIGO DE ÉTICA DA MAGISTRATURA NACIONAL.

1. Processo administrativo disciplinar instaurado contra juiz do Tribunal de Justiça do Estado do Amazonas, a quem se imputa violação dos artigos 35, I e VIII, da Lei Complementar 35/1979, e arts. 1º, 5º, 8º, 24 e 25, do Código de Ética da Magistratura Nacional.

2. Em se tratando de imputação que engloba o conteúdo de decisão judicial, a matéria atrai a incidência do art. 41 da Lei Complementar 35/1979.

3. Insuficiência de provas aptas a demonstrar qualquer influência externa ao deferimento de liminares reconhecida pelo Ministério Público Federal.

4. A fundamentação per relationem é admitida em nosso ordenamento jurídico (Tese 18 do STJ) e, assim, ao menos em tese e sem nenhum outro elemento agravante, não pode ser considerada uma violação ético-disciplinar

5. As operações de “copia e cola” em algumas decisões judiciais, acaso ausente demonstração de que estariam submetidas a influências externas, não configura, de per se, violação dos deveres éticos do magistrado.

6. Impossibilidade de aplicação da pena de censura requerida por conduta subsidiária (decisões judiciais proferidas em operações de “copia e cola”) em estando ausente demonstração do núcleo essencial da imputação (influências externas).

7. Insuficiência de provas aptas ao édito condenatório. Materialidade e autoria da infração funcional não comprovadas.

8. Absolvição que se impõe.

 

 

 ACÓRDÃO

O Conselho, por unanimidade, decidiu pela absolvição do magistrado e determinou o arquivamento do feito, nos termos do voto do Relator. Votou a Presidente. Ausente, em razão da vacância do cargo, o representante do Ministério Público da União. Presidiu o julgamento a Ministra Rosa Weber. Plenário, 19 de setembro de 2023. Presentes à sessão os Excelentíssimos Senhores Conselheiros Rosa Weber, Luis Felipe Salomão, Vieira de Mello Filho, Mauro Pereira Martins, Salise Sanchotene, Jane Granzoto, Richard Pae Kim, Marcio Luiz Freitas, Giovanni Olsson, João Paulo Schoucair, Marcos Vinícius Jardim Rodrigues, Marcello Terto, Mário Goulart Maia (Relator) e Luiz Fernando Bandeira de Mello. Manifestou-se o Subprocurador-Geral da República Alcides Martins. O Advogado do Requerido dispensou a sustentação oral nos termos do artigo 125, §1º, do RICNJ.

Conselho Nacional de Justiça

Autos: PROCESSO ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR EM FACE DE MAGISTRADO - 0008529-03.2021.2.00.0000
Requerente: CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA - CNJ
Requerido: ROSSELBERTO HIMENES


 

RELATÓRIO  

O EXMO. SR. CONSELHEIRO MÁRIO GOULART MAIA (RELATOR): Trata-se de Processo Administrativo Disciplinar (PAD) instaurado pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ), por meio da Portaria n. 20 – PAD, de 17 de novembro de 2021 (id 4544098), contra ROSSELBERTO HIMENES, Juiz de Direito do Tribunal de Justiça do Estado do Amazonas.

O processo foi a mim distribuído (id 4544172), tendo determinado a intimação do Procurador-Geral da República para que se manifestasse nos termos do art. 16 da Resoolução CNJ 135/2011 (id  4543934). 

O Ministério Público Federal requereu a produção de prova documental (id  4560699), a saber: a) cópia integral dos autos onde prolatada a decisão liminar (Processo 0602168-13.2015.8.04.0001), incluindo os memoriais recebidos neste processo; b) ficha funcional do magistrado; c) lista de servidores do gabinete do juiz à época dos fatos; d) cópia integral dos autos do Processo 1565.01013.2015, referente à Notícia de Fato. 

Foram juntados aos autos os documentos solicitados pelo Parquet (Ids 45876000 e 4586317).

Determinei nova vista ao Ministério Público Federal (id 4646627), que requereu a) a expedição de ofício ao Tribunal de Justiça do Estado do Amazonas, para: a.1) que encaminhe cópia integral dos autos onde prolatada a decisão liminar (Processo 0664850-62.2019.8.04.0001), incluindo os memoriais recebidos neste processo; a.2) que preste informações sobre: a.2.1. os períodos e as comarcas em que o Juiz Rosselberto Himenes atuou, inclusive em substituição, durante o ano de 2015 até o presente momento; a.2.2. as regras para a substituição de magistrado em vigor durante os anos de 2015 e 2019; a.2.3. a produtividade do magistrado, com relação dos feitos de atuação, dos meses de março de 2015 e novembro de 2019; a.2.4. a eventual existência de ações de revisão de contrato em que a Associação Nacional dos Servidores Públicos ou a Associação Nacional de Defesa do Consumidor, do Cidadão e do Meio Ambiente figurem no polo ativo, em trâmite ou arquivadas, e, em caso positivo, junte aos autos as respectivas certidões de objeto e pé.”

O Tribunal de Justiça do Estado do Amazonas prestou as informações requeridas (id  4700587).

Conforme requerido, deferi nova vista ao Ministério Público Federal (id 4702198), que postulou a inquirição das testemunhas PEDRO AUGUSTO ANDRADE MAGALHÃES, FÁBIO MARACAJÁ DE ALMEIDA CARNEIRO, JORIO MACHADO DANTAS e ADILSON JOSÉ DA SILVA OLIVEIRA.  

Determinada a citação do magistrado (id 4847172), foi apresentada a defesa (id 4873532), na qual sustentou, preliminarmente, que a atividade jurisdicional não enseja atividade correicional, e, no mérito, que não recebeu influências externas, que sequer foram descritas a contento de modo a viabilizar a sua defesa, e que, assim, nenhuma das imputações configura falta disciplinar. Por outro lado, entende que a AGU usa do PAD como sucedâneo recursal, o que não se poderia admitir. Requereu a produção de prova testemunhal, arrolando as testemunhas ADILSOM OLIVEIRA e JOANA DOS SANTOS MEIRELES, e juntou documentos (ids 487535, 487536, 487537, 487538, 48539, 487540 e 487541).

Foi designada audiência de instrução (id 4900325), ficando a presidência dos trabalhos afeta ao eminente Desembargador Federal CARLOS MOEREIRA ALVES (id  4910003), tendo o ato sido realizado em 18/11/2022 (id 4963131), 23/11/2022 (id 4968162), 13/12/2022 (id 4979178) e 18/01/2023 (id 5006852).

Em 17/04/2023, o Ministério Público Federal apresentou suas razões finais (id 5111029), requerendo a condenação do magistrado, com a aplicação da pena de censura.

Em 18/5/2023, a defesa apresentou razões finais (id. 5148486), reiterando, (a) preliminarmente, que a atividade jurisdicional não enseja atividade correicional, e, no mérito, (b) que não recebeu influências externas, que sequer foram descritas a contento de modo a viabilizar a sua defesa, e que, assim, nenhuma das imputações configura falta disciplinar. Por outro lado, (c) entende que a AGU usa do PAD como sucedâneo recursal, o que não se poderia admitir.  

É o relatório.

Brasília, data registrada no sistema.

 

Mário Goulart Maia

Conselheiro

 

 

Conselho Nacional de Justiça

 

Autos: PROCESSO ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR EM FACE DE MAGISTRADO - 0008529-03.2021.2.00.0000
Requerente: CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA - CNJ
Requerido: ROSSELBERTO HIMENES

 


VOTO 

O EXMO. SR. CONSELHEIRO MÁRIO GOULART MAIA (RELATOR): Trata-se de Processo Administrativo Disciplinar (PAD) instaurado pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ), por meio da Portaria n. 20 – PAD, de 17 de novembro de 2021 (id 4544098), contra ROSSELBERTO HIMENES, Juiz de Direito do Tribunal de Justiça do Estado do Amazonas.

A Portaria n. 20 – PAD, de 17 de novembro de 2021 (id 4544098):

 

PORTARIA No 20, DE 17 DE NOVEMBRO DE 2021.

 

Instaura processo administrativo disciplinar em desfavor do Juiz de Direito Rosselberto Himenes do Tribunal de Justiça do Estado do Amazonas.

 

O PRESIDENTE DO CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA (CNJ), usando das atribuições previstas nos arts. 103-B, § 4o, III, da Constituição Federal e 6o, XIV, do Regimento Interno do Conselho Nacional de Justiça,

 CONSIDERANDO a competência originária e concorrente do CNJ para processar investigações contra magistrados independentemente da atuação das corregedorias e tribunais locais, expressamente reconhecida pelo Plenário do Supremo Tribunal Federal na apreciação da liminar na ADI no 4.638/DF;

CONSIDERANDO o disposto no § 5o do art. 14 da Resolução CNJ no 135/2011, e as disposições pertinentes da Lei Complementar no 35/1979 (Lei Orgânica da Magistratura Nacional), da Lei no 8.112/1990 (Regime Jurídico dos Servidores Públicos Civis da União), da Lei no 9.784/1999, e do Regimento Interno do CNJ; 

CONSIDERANDO os indícios de prática de fraude processual na concessão de medidas judicias que permitiram a interrupção de cobrança de empréstimos consignados, bem como a liberação das margens de crédito;

CONSIDERANDO a decisão proferida pelo Plenário do CNJ no julgamento do Pedido de Providências no 0000746-57.2021.2.00.0000, durante 340ª Sessão Ordinária, realizada no dia 19 de outubro de 2021;

 

RESOLVE:

 Art. 1o Instaurar processo administrativo disciplinar em desfavor de ROSSELBERTO HIMENES, Juiz de Direito do Tribunal de Justiça do Estado do Amazonas, pela presença de indícios de violação do art. 35, I e VIII, da Lei Orgânica da Magistratura; e dos arts. 1o, 5o, 8o, 24 e 25 do Código de Ética da Magistratura, em razão de possíveis influências externas e inobservância ao dever de agir com independência e prudência, ao proferir decisões que, além da identidade de trechos a decisões de magistrados de outros tribunais, não observou as circunstâncias do caso concreto e os prejuízos que poderiam provocar.

 Art. 2o Determinar que a Secretaria do CNJ dê ciência ao Presidente do Tribunal de Justiça do Estado do Amazonas da decisão tomada pelo Conselho Nacional de Justiça e da abertura de processo administrativo disciplinar objeto desta portaria, sem o afastamento do magistrado de suas funções jurisdicionais e administrativas.

Art. 3o Determinar a livre distribuição do processo  administrativo disciplinar entre os Conselheiros, nos termos do art. 74 do RICNJ.

 

Ministro LUIZ FUX 

 

 O PAD, como relatado, destina-se a apurar possível violação dos artigos 35, I e VIII, da Lei Complementar 35/1979, e arts. 1º, 5º, 8º, 24  e 25, do Código de Ética da Magistratura Nacional.

A defesa apresentou suas razões de defesa (ids 4873532 – defesa prévia – e 5148486– razões finais), sustentando que a) preliminarmente, que a atividade jurisdicional não enseja atividade correicional, e, no mérito, (b) que não recebeu influências externas, que sequer foram descritas a contento de modo a viabilizar a sua defesa, e que, assim, nenhuma das imputações configura falta disciplinar. Por outro lado, (c) entende que a AGU usa do PAD como sucedâneo recursal, o que não se poderia admitir. 

 

I – PRELIMINAR:

 

I.1.     Atos de cunho meramente jurisdicional.

A defesa alega, em preliminar, que os atos são eminentemente jurisdicionais e não desafiam a ação correicional da Corregedoria Nacional.

Analiso.

Apesar de, topograficamente, constarem na defesa como preliminar, os argumentos apresentados – e os respectivos fundamentos legais – para defender que atos jurisdicionais não desafiam a atuação disciplinar, em realidade, confundem-se com o mérito das imputações e, dessa sorte, serão analisados no item apropriado deste voto.

Rejeito a prefacial.  

 

I.2.     Utilização do CNJ como sucedâneo recursal pela AGU.

Alega a defesa estar a Advocacia Geral da União utilizando-se de denúncia à Corregedoria Nacional como sucedâneo recursal para visar a modificação das decisões judiciais na origem.

Rejeito.

A afirmação não tem qualquer cabimento ou qualquer amparo aderente à realidade dos autos.           Observe-se que a alegação defensiva não veio acompanhada de qualquer elemento probatório, cuidando-se, logo, de mera conjectura desprovida de amparo fático.  

Por outro lado, tendo o Plenário deste Egrégio Conselho Nacional de Justiça entendido haver justa causa para abertura do PAD, os motivos que levaram a AGU a noticiar os fatos não são de qualquer modo relevante à solução do presente caso.

Rejeito a alegação, em preliminar.

II –    NO MÉRITO:

A Portaria n. 20, de 17 de novembro de 2021 (id 4544098), da Presidência deste Conselho Nacional de Justiça e que materializou a instauração do presente PAD, registra, como apontado no relatório, que o presente Processo Administrativo Disciplinar fora instaurado contra o Juiz de Direito Rosselberto Himenes, Juiz de Direito do Tribunal de Justiça do Estado do Amazonas, para apuração de eventuais infrações aos artigos 35, I e VIII, da Lei Complementar 35/1979[1], e arts. 1º[2], 5º[3], 8º[4], 24[5] e 25[6], do Código de Ética da Magistratura Nacional.

Colhe-se da Portaria que a acusação ao magistrado seria a prática de “envolvimento de magistrado na prática de fraude processual por meio da concessão de medidas judiciais objetivando a interrupção de cobrança de empréstimos consignados, assim como a liberação das margens de crédito”.

Mas não apenas isso, estariam estas decisões judiciais maculadas em razão “peculiaridades que indicam possível influência externa, ante a coincidência de redação entre decisões de magistrados vinculados a tribunais diversos.” 

 Deste modo, em se tratando de imputação de violação ético-disciplinar que contempla o conteúdo de decisões judiciais, a matéria atrai a incidência do art. 41 da Lei Complementar 35/1979, que estatui:  

“Art. 41 - Salvo os casos de impropriedade ou excesso de linguagem o magistrado não pode ser punido ou prejudicado pelas opiniões que manifestar ou pelo teor das decisões que proferir.” (grifou-se).

Em outras palavras, pelo teor das decisões que proferir o magistrado apenas pode ser punido quando estas contiverem excesso de linguagem ou impropriedade.  

O caso concreto não traz hipótese de se cogitar de excesso de linguagem, mas, à toda evidência, cuida de impropriedade, no conceito da LOMAN.

E sobre quais condutas configurariam, em tese, a impropriedade no caso concreto, verifica-se do acórdão que determinou a abertura do presente PAD, da lavra da eminente Corregedora de Justiça, Ministra MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA (id 4544102), o seguinte:

PEDIDO DE PROVIDÊNCIAS. TJAM. JUIZ DE DIREITO. CONCESSÃO DE LIMINARES PARA A LIBERAÇÃO DE MARGENS DE CONSIGNADOS. ARQUIVAMENTO PELA CORREGEDORIA-GERAL DE JUSTIÇA. INDÍCIOS DE INFRAÇÃO DISCIPLINAR. INSTAURAÇÃO DE PROCESSO ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR. 

1. Procedimento investigatório criminal que verificou a possibilidade de envolvimento de magistrado na prática de fraude processual por meio da concessão de medidas judiciais objetivando a interrupção de cobrança de empréstimos consignados, assim como a liberação das margens de crédito.

2. Inobservância ao dever de prudência e de agir de forma cautelosa, tendo em vista a inobservância das circunstâncias concretas ao deferimento de liminares, além de peculiaridades que indicam possível influência externa, ante a coincidência de redação entre decisões de magistrados vinculados a tribunais diversos.  

3. Presença de elementos indiciários em reiterados processos judiciais que sugerem a prática de infração disciplinar.

4. Instauração de processo administrativo disciplinar.”

Logo, parece evidente que são os indícios de influência externa que configurariam, em tese, a impropriedade mencionada no art. 41 da Lei Complementar 35/1979 e não a mera circunstância de decisões de outros magistrados terem sido copiadas ou possuírem redação coincidentes.

No aspecto, observe-se que a fundamentação per relationem é admitida em nosso ordenamento jurídico[7] e, assim, ao menos em tese e sem nenhum outro elemento agravante, não pode ser considerada uma violação ético-disciplinar, justamente porque resolvida deve ser no âmbito do próprio processo judicial e mediante o recurso apropriado.

Dito isto, a questão central a ser examinada no presente caso concreto, diz respeito se o magistrado requerido, fazendo uso de seu cargo, recebeu influências externas para deferir liminares em cujo conteúdo constava identidade de trechos de decisões de outros magistrados.

E sobre este ponto específico, colho a análise da prova realizada pelo Ministério Público Federal em suas razões finais (id 5111029): 

“16. Quanto à matéria de fundo, conforme apontado no acórdão de instauração do PAD, “há uma sucessão de atos que, embora beirem a questão estritamente jurisdicional, põem em dúvida a atuação regular do magistrado, ainda mais quando reconhecida a possibilidade de existência de fraude por parte dos advogados”.

17. Não se verifica da prova documental ou testemunhal, elementos suficientes para se afirmar o envolvimento do magistrado na prática de fraude processual por meio da concessão das medidas judiciais.

18. Do exame das provas coligidas tem-se que não são aptas a demonstrar a existência de liame entre o magistrado e grupo supostamente criminoso responsável pela operacionalização da chamada “Ciranda dos Consignados”, em que, mediante ajuizamento de ações judiciais em todo o país, se pretendia a indevida suspensão de consignações em folha pagamento e a liberação das margens consignáveis de servidores públicos para novas contratações.

19. Com efeito, os advogados ouvidos afirmaram desconhecer o juiz e que não despacharam pessoalmente com o mesmo.

20. Quanto aos indícios de influência externa, por certo há. Contudo, não passam de indícios.

21. Com efeito, se para a instauração do processo administrativo disciplinar basta a demonstração de justa causa, isto é, de um lastro probatório mínimo indicativo de possível infração disciplinar e de sua autoria, para a condenação é necessária a certeza da infração disciplinar, o que não se verifica dos autos, neste ponto.

22. No direito disciplinar, só a certeza possui o condão de levar o acusado a condenação.

Logo, conforme o próprio Ministério Público entende, não há prova suficiente a indicar que as decisões proferidas tiveram por motivo as influências externas, o que, por si só, já seria suficiente para a absolvição do magistrado, já que este era o núcleo essencial da acusação.

Não obstante, sobre a pretensão do Ministério Público de aplicação da penalidade de censura, observe-se que o magistrado estava acusado de proferir decisões idênticas a de outros colegas juízes que atuavam em Tribunais diferentes, mas sob a suspeita de que teriam sido proferidas por influências externas.

Este o núcleo acusatório: as influências externas que teriam levado ao deferimento de liminares e o que permitiria ingressar na seara do conteúdo das decisões conforma art. 41 da Lei Complementar 35/1979.

E, deste modo, as operações de “copia e cola” em algumas decisões judiciais, ausente demonstração de que estariam sob influências externas, não configuram, de per se, violação dos deveres éticos do magistrado, já que eventual error in judicando ou error in procedendo são passíveis de correção por recurso próprio e a fundamentação per relacionem, como já dito, é admitida em nosso ordenamento jurídico.

Portanto, a ausência de provas do núcleo essencial da acusação (influências externas) não tem o condão de elevar conduta subsidiária (decisões judiciais proferidas em operações de “copia e cola” e de modo muito semelhante a outros magistrados) a suficiente gravidade ao ponto de justificar uma condenação disciplinar.

Não se ignora que o acusado se defende dos fatos imputados e não da sua qualificação jurídica. Mas o que se está aqui a sustentar é que os fatos imputados são complexos neste sentido e que o magistrado não fora acusado de repetir decisões judiciais de outros colegas, mas que esta conduta estava agravada por suspeitas de influências externas, o que geraria a impropriedade de sua edição, consoante a dicção do art. 41 da Lei Complementar 35/1979.

A saber: a imputação da prática de conduta que pode gerar a nulidade da decisão por impropriedade decorrente de influências externas e mediante suspeita de pagamento é diferente daquela que geraria eventual nulidade, mas por mero error in procedendo ou error in judicando.

Assim, o ato de proferir de decisões judiciais que não guardassem relação direta com o caso concreto, tal como informado, pode ser reprovável, mas, ainda que nula ou anulável fossem tais decisões, ausente demonstração de impropriedade ou excesso de linguagem, não poderiam gerar punição ao magistrado, nos termos do art. 41 da Lei Complementar 35/1979. 

O magistrado esteve acusado e se defendeu de haver proferido decisões judiciais semelhantes a de outros juízes, mas mediante influências externas.

Se não há prova das influências externas, como é o que ocorre, a solução é a sua absolvição e não a aplicação de penalidade de censura. Em razão disso, entendo prejudicada a alegação da defesa de falta de pormenorizada descrição sobre o que consistiriam as denominadas influências externas.

Ou seja, o que se constata dos autos é a ausência de prova concreta e indispensável para alicerçar um decreto condenatório, no sentido de que o magistrado requerido, fazendo uso de seu cargo, recebeu influências externas para deferir liminares em cujo conteúdo constava identidade de trechos de decisões de outros juízes.

 

III. CONCLUSÃO 

  

Por tudo o que dos autos consta, não obstante a existência de indícios colhidos antes da instauração deste PAD, os elementos probatórios produzidos indicam que as infrações disciplinares imputadas ao requerido não restaram demonstradas de modo seguro e suficiente a embasar um édito condenatório.

 

IV. DISPOSITIVO 

Ante todo o exposto, em face da ausência de provas, não acolho as imputações feitas na Portaria n. 20 – PAD, de 17 de novembro de 2021 (id 4544098), e voto pela absolvição do Juiz de Direito do Tribunal de Justiça do Estado do Amazonas ROSSELBERTO HIMENES, com o consequente arquivamento deste Processo Administrativo Disciplinar.

É como voto.

Intimem-se.

Publique-se nos termos do art. 140, do RICNJ.

Arquive-se independentemente de nova conclusão.

 

Brasília, data registrada no sistema.

 

Mário Goulart Maia

Conselheiro

 



[1] Art 35. São deveres do magistrado:

I - Cumprir e fazer cumprir, com independência, serenidade e exatidão, as disposições legais e os atos de ofício; [...]

VIII - manter conduta irrepreensível na vida pública e particular.

 

[2] Art. 1º O exercício da magistratura exige conduta compatível com os preceitos deste Código e do Estatuto da Magistratura, norteando-se pelos princípios da independência, da imparcialidade, do conhecimento e capacitação, da cortesia, da transparência, do segredo profissional, da prudência, da diligência, da integridade profissional e pessoal, da dignidade, da honra e do decoro.

 

[3] Art. 5º Impõe-se ao magistrado pautar-se no desempenho de suas atividades  sem receber indevidas influências externas e estranhas à justa convicção que deve formar para a solução dos casos que lhe sejam submetidos.

 

[4] Art. 8º O magistrado imparcial é aquele que busca nas provas a verdade dos fatos, com objetividade e fundamento, mantendo ao longo de todo o processo uma distância equivalente das partes, e evita todo o tipo de comportamento que possa refletir favoritismo, predisposição ou preconceito.

 

[5] Art. 24. O magistrado prudente é o que busca adotar comportamentos e decisões que sejam o resultado de juízo justificado racionalmente, após haver meditado e valorado os argumentos e contra-argumentos disponíveis, à luz do Direito aplicável.

 

[6] Art. 25. Especialmente ao proferir decisões, incumbe ao magistrado atuar de forma cautelosa, atento às consequências que pode provocar.

 

[7]  Sobre o tema, o Superior Tribunal de Justiça fixou a tese nº 18: "A utilização da técnica de motivação per relationem não enseja a nulidade do ato decisório, desde que o julgador se reporte a outra decisão ou manifestação dos autos e as adote como razão de decidir".