Conselho Nacional de Justiça

 

Autos: PEDIDO DE PROVIDÊNCIAS - 0008108-13.2021.2.00.0000
Requerente: ASSOCIAÇÃO NACIONAL DOS MAGISTRADOS DA JUSTIÇA DO TRABALHO - ANAMATRA
Requerido: CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA - CNJ

 

RECURSO ADMINISTRATIVO. PEDIDO DE PROVIDÊNCIAS. AUXÍLIO-ALIMENTAÇÃO. MAGISTRADOS. FIXAÇÃO DE PISO MÍNIMO. PRESERVAÇÃO DA AUTONOMIA DOS TRIBUNAIS. PRINCÍPIO DA ISONOMIA. CARÁTER NACIONAL E UNITÁRIO DA MAGISTRATURA. NÃO APLICAÇÃO AO CASO EM DEBATE. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO.

1. Pedido de providências em que se busca a fixação para toda a magistratura de um piso mínimo a ser observado pelos tribunais no que tange à sistemática do pagamento do auxílio-alimentação.

2. Ao Conselho Nacional de Justiça, no exercício de suas atribuições, não cabe interferir na autonomia dos tribunais, notadamente sob o aspecto orçamentário, tampouco deve ser acionado para a obtenção de benefícios de natureza estipendiária ou funcional. Precedentes.

3. Conquanto não se desconheça o caráter unitário e nacional da magistratura, verifica-se que, na hipótese dos autos, não se estar a debater a concessão de vantagem que os juízes não possuem (auxílio-alimentação), mas sim a mera fixação de piso mínimo relativo ao pagamento do benefício, diante da simples constatação de diferenciação de valores pagos pelos Tribunais Estaduais aos seus magistrados.

4. Possíveis descontentamentos com os valores de auxílio-alimentação percebidos no âmbito do Poder Judiciário da União devem ser examinados por meios dos espaços/instrumentos próprios e adequados.

5. Inexistência de elementos ou fatos novos hábeis a reformar a decisão impugnada. 

6. Recurso conhecido e, no mérito, desprovido.

 

 ACÓRDÃO

O Conselho, por unanimidade, negou provimento ao recurso, nos termos do voto do Relator. Presidiu o julgamento a Ministra Rosa Weber. Plenário Virtual, 30 de junho de 2023. Votaram os Excelentíssimos Conselheiros Rosa Weber, Maria Thereza de Assis Moura (então Conselheira), Vieira de Mello Filho, Mauro Pereira Martins, Salise Sanchotene, Jane Granzoto, Richard Pae Kim, Giovanni Olsson, Sidney Madruga, João Paulo Schoucair, Marcos Vinícius Jardim Rodrigues, Marcello Terto, Mário Goulart Maia e Luiz Fernando Bandeira de Mello. Não votou o Excelentíssimo Conselheiro Marcio Luiz Freitas.

Conselho Nacional de Justiça

Autos: PEDIDO DE PROVIDÊNCIAS - 0008108-13.2021.2.00.0000
Requerente: ASSOCIAÇÃO NACIONAL DOS MAGISTRADOS DA JUSTIÇA DO TRABALHO - ANAMATRA
Requerido: CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA - CNJ


RELATÓRIO 

 

Trata-se de recurso administrativo interposto pela Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho (ANAMATRA) contra decisão que julgou improcedentes pedidos de uniformização para toda a magistratura de um piso mínimo a ser observado pelos tribunais no que tange à sistemática do pagamento do auxílio-alimentação.

Na petição inicial, a requerente, ao tecer considerações sobre a regulamentação do auxílio-alimentação destinado aos magistrados e respectivos valores pagos nos órgãos judiciários da União, alegou que inexiste, no âmbito dos Estados, uma uniformização do valor do referido benefício.

Nessa perspectiva, enumerou valores pagos por determinados tribunais estaduais e destacou julgado deste Conselho que teria autorizado ao Tribunal de Justiça do Estado de Pernambuco o reajuste do valor do benefício a ser recebido pelos seus magistrados (PP 0001101-38.2019.2.00.0000).

Afirmou que tais diferenças violariam a noção de unidade e afrontariam o princípio da isonomia, que devem nortear o Poder Judiciário e a magistratura, gerando, assim, discriminação entre os juízes e desiquilíbrio entre as carreiras.

Por fim, além de ter registrado a inaplicabilidade do Provimento CN 64/2017 ao caso em apreço, porquanto o auxílio-alimentação é verba indenizatória prevista na Resolução CNJ 133/2011, defendeu a uniformização dos valores atinentes ao benefício, mediante a fixação de um piso mínimo, na esteira do caráter nacional e unitário do Poder Judiciário.

Diante desses fatos, requereu fosse estabelecido um piso mínimo para o valor do auxílio-alimentação, a ser observado por todos os tribunais, fixando-o em 5% (cinco por cento) do subsídio de Juiz Titular.

Subsidiariamente, caso o CNJ não concordasse com o valor proposto, pleiteou fosse arbitrado, em caráter nacional, um valor justo e compatível com os custos que devem ser cobertos pela verba, evitando-se disparidades entre os valores adotados pelos tribunais e violação ao princípio da isonomia.

No mais, para os tribunais em que a regulamentação almejada importasse em aumento do valor a ser recebido a título de auxílio-alimentação, solicitou que o novo valor do auxílio-alimentação somente fosse implementado a partir de 1º de janeiro de 2022, em razão da restrição existente na Lei de Diretrizes Orçamentária de 2021 (art. 121, da Lei 14.116/2020).

Redistribuído ao meu gabinete em razão da vacância, por mais de 90 dias, do cargo de Conselheiro representante da Justiça Federal (art. 45-A, § 2º, do Regimento Interno do CNJ), proferi decisão julgando improcedentes os pedidos (Id. 4596663).

Irresignada, a requerente interpôs recurso administrativo (Id. 4614166), no qual repisa, em síntese, os argumentos desenvolvidos na peça vestibular.

 

É o relatório.


        

Conselho Nacional de Justiça

 

Autos: PEDIDO DE PROVIDÊNCIAS - 0008108-13.2021.2.00.0000
Requerente: ASSOCIAÇÃO NACIONAL DOS MAGISTRADOS DA JUSTIÇA DO TRABALHO - ANAMATRA
Requerido: CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA - CNJ

 

VOTO

 

Conforme relatado, a parte autora impugna decisão terminativa que julgou improcedentes pedidos de uniformização para toda a magistratura de um piso mínimo a ser observado pelos tribunais no que tange à sistemática do pagamento do auxílio-alimentação.

No tocante ao juízo de admissibilidade, verifico que o recurso administrativo ora interposto preenche os pressupostos exigidos, devendo, assim, ser conhecido.

Quanto ao mérito, há que se reconhecer a inexistência de elementos ou fatos novos hábeis a reformar a decisão impugnada, razão pela qual deve ser mantida por seus próprios fundamentos, que reproduzo abaixo:

 

“[...] A pretensão deduzida no presente procedimento cinge-se, em suma, à fixação de piso mínimo para o valor do auxílio-alimentação destinado aos magistrados, a ser observado por todos os tribunais brasileiros.

Conquanto sejam louváveis os fundamentos invocados pela requerente em sua peça vestibular, há que se reconhecer que os pedidos formulados não merecem acolhida.

Isso porque, ao Conselho Nacional de Justiça, no exercício de suas atribuições, não cabe interferir na autonomia dos tribunais, notadamente sob o aspecto orçamentário, tampouco deve ser acionado para a obtenção de benefícios de natureza estipendiária ou funcional.

Nesse sentido, a propósito, são os reiterados precedentes do CNJ:

 

RECURSO ADMINISTRATIVO. PEDIDO DE PROVIDÊNCIAS. EQUIPARAÇÃO DE VALORES DO AUXÍLIO-ALIMENTAÇÃO E DO AUXÍLIO-CRECHE ENTRE TODOS OS ÓRGÃOS DO PODER JUDICIÁRIO DA UNIÃO. AUTONOMIA DOS TRIBUNAIS. AUSÊNCIA DE REPERCUSSÃO GERAL.

1. O CNJ deve respeitar a autonomia dos tribunais superiores e de 2º grau (Constituição Federal, art. 96), especificamente quanto à escolha e forma de aplicação dos recursos financeiros.

2. Não pode o CNJ impor gastos aos Tribunais sem disponibilização de prévia dotação orçamentária, mormente em razão do limite prudencial da Lei de Responsabilidade Fiscal.

3. O requerente pretende a obtenção de vantagem patrimonial, extensível a grupo restrito de servidores do Poder Judiciário da União, não obstante apresente dimensão coletiva.

4. O CNJ não aprecia questões de natureza individual, que não tenham repercussão geral na sociedade e no âmbito do Poder Judiciário nacional (art. 103-B, § 4º e inciso I, da CF/88).

5. Recurso administrativo não-provido.

(Recurso Administrativo no Pedido de Providências – Conselheiro 0003424-94.2011.2.00.0000 - Rel. Tourinho Neto - 134ª Sessão Ordinária - julgado em 13/09/2011).

 

RECURSO ADMINISTRATIVO. SERVIDORES DO PODER JUDICIÁRIO DE TRIBUNAL DE JUSTIÇA ESTADUAL. AUXÍLIO ALIMENTAÇÃO. EQUIPARAÇÃO. ISONOMIA. IMPOSSIBILIDADE. SÚMULA N. 339 DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. AUTONOMIA DOS TRIBUNAIS. MATÉRIA DE ÂMBITO LOCAL. AUSÊNCIA DE CARÁTER NACIONAL. INCOMPETÊNCIA DO CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA. RECURSO NÃO PROVIDO.

1. Não viola o princípio da isonomia a impossibilidade de se estender aos Servidores do Poder Judiciário, o valor do auxílio-alimentação fixado para os magistrados, pelo Tribunal de Justiça do Estado do Acre, por constituírem carreiras distintas, com regimes jurídicos distintos.

2. A matéria relativa aos valores aplicados ao auxílio alimentação e demais indenizações pagas pelos Tribunais de Justiça estão vinculadas à autonomia administrativa destes órgãos. Tratando-se de carreiras distintas, com regimes jurídicos próprios, negar ao Tribunal de Justiça a possibilidade de diferenciação, quanto aos valores pagos a título de auxílio-alimentação, é negar a autonomia financeira do Tribunal. Precedentes.

3. A jurisprudência do Conselho Nacional de Justiça tem firmado orientação no sentido de que o exercício da competência de controle administrativo deve contemplar situações que importem repercussão coletiva. A demanda de natureza local, sem repercussão nacional, afasta a competência deste Conselho.

4. A tutela de interesses individuais de magistrados ou servidores do judiciário, em especial os de natureza remuneratória, constitui pretensão que deve ser requerida na via ordinária judicial.

5. Recurso administrativo conhecido e improvido.

(Recurso Administrativo no Procedimento de Controle Administrativo 0002570-95.2014.2.00.0000 - Rel. Deborah Ciocci - 191ª Sessão Ordinária - julgado em 16/06/2014).

 

RECURSO EM PROCEDIMENTO DE CONTROLE ADMINISTRATIVO. RESOLUÇÃO 294 DO CNJ. INSTITUIÇÃO DO PROGRAMA DE ASSISTÊNCIA À SAÚDE SUPLEMENTAR PARA MAGISTRADOS. RECOMPOSIÇÃO SALARIAL DE SERVIDORES NÃO IMPLEMENTADA. AUSÊNCIA DE ILEGALIDADE. FONTES DE CUSTEIO DIVERSAS. RECURSO A QUE SE NEGA PROVIMENTO.

1. A ausência de recursos orçamentários na Fonte 001 (Tesouro do Estado) não impede o pagamento do benefício do auxílio-saúde, custeado pela Fonte 003 (Fundo Especial de Despesa), inexistindo qualquer irregularidade na implementação do Programa de Assistência à Saúde Suplementar em razão da não concessão da revisão geral anual aos servidores.

2. Inexistindo ilegalidade no ato praticado pelo Tribunal contra o qual se insurge a Requerente, eventual controle extrapolaria as competências constitucionais deste Conselho Nacional, dado que a pretensão formulada se depara com a barreira intransponível da autonomia constitucional conferida aos Tribunais, segundo disposto no art. 96, I, “a” e “b”, da Constituição Federal, sendo indevida a autuação desse órgão de controle para intervir na autogestão orçamentária dos órgãos do Poder Judiciário.

3. Recurso que se conhece e nega provimento.

(Recurso Administrativo no Pedido de Providências 0000982-09.2021.2.00.0000 - Rel. André Luiz Guimarães Godinho - 93ª Sessão Virtual - julgado em 24/09/2021).

 

Portanto, embora não se desconheça a competência deste Conselho para o controle da atuação administrativa e financeira do Poder Judiciário, tal prerrogativa, por óbvio, não deve desbordar das balizas constitucionais, com vistas a invadir a autonomia conferida aos tribunais, sobretudo para impor gastos aos órgãos judiciários.

Ante o exposto, JULGO IMPROCEDENTES os pedidos formulados na inicial e determino o arquivamento dos autos, com fulcro no art. 25, X, do Regimento Interno do CNJ.”

 

 

Em que pese o esforço argumentativo empregado pela recorrente em suas razões recursais, a decisão combatida reflete adequadamente a jurisprudência iterativa e pacífica deste Conselho sobre a temática, não merecendo, portanto, qualquer reparo.

Ademais, por inteira pertinência e relevância, transcrevo trechos do voto proferido nos autos do PP 0003424-94.2011.2.00.0000, o qual, em síntese, assenta a impossibilidade de o Conselho Nacional de Justiça ser acionado para a obtenção de benefícios de natureza estipendiária ou funcional. Confira-se:

 

“1. Trata-se de Recurso Administrativo em Pedido de Providências formulado por Antonio Carlos Ribas de Moura Júnior, pretendendo que este Conselho declare a inconstitucionalidade da diferença dos valores existentes entre os benefícios do Auxílio-Alimentação e do Auxílio Pré-Escolar dos servidores do STF, CNJ, STM, STJ e TJDFT e dos servidores dos demais órgãos do Poder Judiciário da União, igualando-se o valor desses benefícios para todos os servidores do Poder Judiciário da União. 

(...) 

O eminente Conselheiro Leomar Amorim não conheceu do pedido, com o seguinte fundamento: 

O pedido formulado pelo requerente não pode ser conhecido. 

1. O CNJ não deve ser acionado para a obtenção de benefícios de natureza estipendiária ou funcional 

O Conselho Nacional de Justiça nasceu da concepção de uma instância de controle da atuação administrativa, financeira e funcional dos órgãos e agentes jurisdicionais, do estabelecimento de diretrizes uniformizadoras da atividade administrativa da Magistratura, bem como da definição das matérias de interesse geral do Poder Judiciário, concretamente realizada quando da edição da Emenda n. 45/04, mediante a qual foi inserido o artigo 103-B no texto da Carta Magna. 

Embora o CNJ tenha competência para exercer o controle da atuação administrativa do Poder Judiciário não pode ir além dos limites impostos pela Constituição Federal, de modo a interferir na autonomia dos Tribunais para organizar seus serviços judiciários e administrativos, bem como na escolha da forma e meios de aplicação dos seus recursos, uma vez que para impor gastos aos Tribunais tem que ser observada a existência de prévia dotação orçamentária e o limite prudencial da Lei de Responsabilidade Fiscal.

(...)

Concordo com o entendimento do eminente Conselheiro. 

De fato, a pretensão do requerente esbarra em farta jurisprudência deste CNJ no sentido da não-interferência na autonomia dos Tribunais, para organizar seus serviços judiciários e administrativos, especificamente, para determinar ou escolher a forma de aplicação dos recursos financeiros.  

A imposição de gastos aos Tribunais exigiria que este CNJ disponibilizasse a prévia dotação orçamentária, observando-se, ainda, o limite prudencial da Lei de Responsabilidade Fiscal, o que, a toda evidência, refoge à competência deste Órgão. [...]” (grifos do original) 

 

Além disso, conquanto não se desconheça o caráter unitário e nacional da magistratura, verifica-se que, na hipótese dos autos, não se estar a debater a concessão de vantagem que os juízes não possuem (auxílio-alimentação), mas sim a mera fixação de piso mínimo relativo ao pagamento do benefício, diante da simples constatação de diferenciação de valores pagos pelos Tribunais Estaduais aos seus magistrados.

Fica claro, portanto, a inviabilidade do acolhimento da pretensão deduzida, sendo que eventual atuação deste Conselho, no contexto ora delineado, representaria, ao meu sentir, indevida interferência na autogestão dos tribunais, sobretudo no que tange ao aspecto orçamentário.

Por fim, sobreleva ressaltar que possíveis descontentamentos com os valores de auxílio-alimentação percebidos no âmbito do Poder Judiciário da União devem ser examinados por meio dos espaços/instrumentos próprios e adequados, sabendo-se que este Conselho, em conjunto com os demais órgãos judiciários federais, regulamentou a matéria para os juízes pertencentes aos quadros da União (Portarias Conjuntas nº 5/2011 e 1/2018), com observância, notadamente, dos limites e diretrizes orçamentárias.

À vista desse cenário, o desprovimento do recurso administrativo interposto é medida que se impõe, mantendo-se, por consequência, hígida a decisão terminativa guerreada.

Sem prejuízo das considerações supra, entendo ser oportuna a remessa de cópia integral do feito à Comissão Permanente de Eficiência Operacional, Infraestrutura e Gestão de Pessoas, para que seja avaliada a conveniência da definição de regramentos procedimentais e de concessão do benefício do auxílio-alimentação no âmbito do Poder Judiciário. 

Ante o exposto, CONHEÇO do recurso administrativo e, no mérito, NEGO-LHE provimento.

Encaminhe-se cópia integral dos autos à Comissão Permanente de Eficiência Operacional, Infraestrutura e Gestão de Pessoas. 

Cumpridas as comunicações de praxe, arquive-se o feito independentemente de nova conclusão.

É como voto. 

Brasília, data registrada no sistema. 

  

MAURO PEREIRA MARTINS 

Conselheiro Relator