Conselho Nacional de Justiça

 

Autos: CONSULTA - 0001892-65.2023.2.00.0000
Requerente: REJANE RIBEIRO FAVA GEABRA
Requerido: CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA - CNJ

 


EMENTA: 

CONSULTA. JUÍZO 100% DIGITAL. AUDIÊNCIA TELEPRESENCIAL. CASO CONCRETO. INADEQUAÇÃO DA VIA ELEITA. NÃO CONHECIMENTO.

1. A consulta formulada não está de acordo com o disposto no art. 89 do RICNJ, pois direcionada para solução de caso concreto, com o evidente viés recursal, envolvendo decisão judicial proferida em Reclamação Trabalhista na qual a consulente é advogada da parte autora, portanto diretamente interessada na solução do feito.

2. A orientação consolidada pelo Plenário deste Conselho é no sentido de não conhecer de consultas que tenham por objeto dirimir dúvidas jurídicas do interessado ou antecipar a solução de casos concretos, inclusive nas hipóteses que envolver caráter recursal de decisão judicial, apresentados sob a forma de situações hipotéticas.

 3. Consulta não conhecida.

 

 ACÓRDÃO

O Conselho, por unanimidade, não conheceu da consulta e determinou seu arquivamento, nos termos do voto do Relator. Presidiu o julgamento a Ministra Rosa Weber. Plenário Virtual, 16 de junho de 2023. Votaram os Excelentíssimos Conselheiros Rosa Weber, Luis Felipe Salomão, Vieira de Mello Filho, Mauro Pereira Martins, Salise Sanchotene, Jane Granzoto, Richard Pae Kim, Marcio Luiz Freitas, Giovanni Olsson, Sidney Madruga, João Paulo Schoucair, Marcos Vinícius Jardim Rodrigues, Marcello Terto, Mário Goulart Maia e Luiz Fernando Bandeira de Mello.

Conselho Nacional de Justiça

Autos: CONSULTA - 0001892-65.2023.2.00.0000
Requerente: REJANE RIBEIRO FAVA GEABRA
Requerido: CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA - CNJ


RELATÓRIO

Trata-se de Consulta formulada por Rejane Ribeiro Fava Geabra, na qual solicita esclarecimentos do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) acerca da obrigatoriedade da realização de audiência telepresencial nos processos de “Juízo 100% Digital”, considerando a Resolução CNJ n.° 481/2022.  

De acordo com a consulente, com redação alterada pela referida norma, o art. 3° da Resolução CNJ n.° 354/2020 passou a asseverar que as audiências só poderão ser realizadas na forma telepresencial a pedido das partes e que a decisão da sua realização no modo presencial cabe ao juiz. Defende, contudo, que não houve esclarecimento quanto a obrigatoriedade de aplicação do dispositivo em processos de “Juízo 100% Digital”. 

Neste sentido, apresenta como exemplo o despacho disponibilizado no DEJT n.° 3677 – Pág. 384, de 07 de março de 2023, em que foi indeferido pedido de realização de audiência por videoconferência em processo trabalhista com opção ao “Juízo 100% Digital” e que, ainda, houve a aplicação de multa por litigância de má-fé, em caso de irresignação das partes. 

Visando afastar possível divergência na aplicação da norma, requer que seja "esclarecido se é obrigatória a realização de audiência no modelo telepresencial nos processos de “Juízo 100% Digital”, como previsto no primeiro dispositivo ou se a previsão do segundo dispositivo concedeu a faculdade ao juiz natural de definir o modelo da audiência, se presencial ou telepresencial, inclusive nos processos de “Juízo 100% Digital””. 

A Comissão Permanente de Eficiência Operacional, Infraestrutura e Gestão de Pessoas, instituída no âmbito deste Conselho por meio da Portaria n.° 204/2022 e atualmente presidida pelo e. Conselheiro Luiz Philippe Vieira de Mello Filho, apresentou Parecer Técnico junto ao Id 5121520.

É o relatório. Passo ao voto.

 

 

 

 

VOTO 

 

Enquanto procedimento administrativo, a Consulta tem previsão regimental nos artigos 89[1] e 90[2]  do Regimento Interno do CNJ (RICNJ).

Pela interpretação literal dos mencionados dispositivos, a disciplina desta espécie processual é limitada às hipóteses em que, observados o interesse e a repercussão geral, há fundadas dúvidas na aplicação de dispositivos legais e regulamentares concernentes às matérias administrativas de competência deste Conselho. Por conseguinte, deve ser direcionada para solução de questionamento em tese, não sendo adequada para obtenção de orientação jurídica acerca de situação pessoal.

Correlacionando a norma regimental ao caso em exame, observa-se que a consulta formulada não está de acordo com o disposto no art. 89 do RICNJ, pois direcionada para solução de caso concreto, com o evidente viés recursal, envolvendo decisão judicial proferida em Reclamação Trabalhista na qual a consulente é advogada da parte autora (Id 5071265), portanto diretamente interessada na solução do feito. Cite-se:

 

Processo Nº ATSum-0024173-91.2023.5.24.0001

AUTOR: MOISES DOS SANTOS

ADVOGADO: REJANE RIBEIRO FAVA GEABRA (OAB: 6966/MS)

ADVOGADO: FERNANDO ISA GEABRA(OAB: 5903/MS)

RÉU: EMPRESA BRASILEIRA DE CORREIOS E TELEGRAFOS

Intimado(a)/Citado(a):

- MOISES DOS SANTOS

PODER JUDICIÁRIO

JUSTIÇA DO

Fica V. Sa. intimado para tomar ciência do Despacho ID 999ff69 proferido nos autos.

DESPACHO

Vistos, etc.

Sobre o tema objeto de questionamento pela parte lrresignada (realização de audiência presencial), dispõe a Resolução de número 481 do CNJ, de 22/11/2022, dispõe no artigo 4° o seguinte:

Art. 4° O art. 3° da Resolução CNJ n. 354/2020 passa a vigorar com a seguinte alteração:

Art. 3° As audiências só poderão ser realizadas na forma telepresencial a pedido da parte, ressalvado o disposto no § 1º, bem como nos incisos I a IV do § 2° do art. 185 do CPP, cabendo ao juiz decidir pela conveniência de sua realização no modo presencial. Em qualquer das hipóteses, o juiz deve estar presente na unidade judiciária.

Considero que a presença física das partes, dos advogados e das testemunhas, é a que melhor possibilita ao magistrado promover e coleta das provas orais, motivo pelo qual mantenho a designação de audiência na forma presencial.

A renovação de pedido visando a alteração da modalidade da audiência acima designada importa em abuso processual e caracteriza empecilho para a solução rápida e razoável do processo (art. 5°, LXXVIII da CF - julgamento final do que está sendo discutido), motivo pelo qual fixo em R$ 500,00 multa processual a título de litigância de má-fé para qualquer das partes que renove pedido de modificação de audiência (de presencial para telepresencial), tudo nos termos dos artigos 79 a 81 do CPC.

Intime-se a parte autora.

CAMPO GRANDE/MS, 07 de março de 2023.

(...)

Juiz do Trabalho Substituto

(Grifo nosso) 

 

Nesse contexto, a orientação consolidada pelo Plenário deste Conselho é no sentido de não conhecer de consultas que tenham por objeto dirimir dúvidas jurídicas do interessado ou antecipar a solução de casos concretos, inclusive nas hipóteses que envolver caráter recursal de decisão judicial, apresentados sob a forma de situações hipotéticas. Confira-se:

 

RECURSO ADMINISTRATIVO – CONSULTA – CASO CONCRETO – INADEQUAÇÃO DA VIA ELEITA – INOBSERVÂNCIA DO ART. 89 DO RICNJ – AUSÊNCIA DE ARGUMENTOS RECURSAIS APTOS A ALTERAR O ENTENDIMENTO ADOTADO NA DECISÃO COMBATIDA. RECURSO NÃO PROVIDO.

1.  A “Consulta” não tem por escopo a apreciação de caso concreto, nem tampouco a impugnação de atos praticados por Órgãos do Poder Judiciário, mas sim, nos termos do art. 89, do RICNJ, tem por objetivo aclarar – em tese – os questionamentos relacionados a matérias de interesse e repercussão gerais que envolvam a aplicação dos dispositivos legais e regulamentares inerentes aos temas inseridos na competência administrativa do CNJ.

2. Na hipótese, sob o pretexto de que a medida abarcaria, em tese, tema de interesse e repercussão gerais, à luz do decidido pelo Plenário deste Órgão em casos que reputa simétricos ao questionamento veiculado na presente “Consulta”, exsurge nítido que o ora recorrente, na realidade, expõe uma narrativa de índole nitidamente individual e concreta, ou seja, pela via transversa e inadequada, tenciona a prolação de decisão com caráter normativo, no intuito de nortear a própria atuação administrativa do Tribunal de Justiça do Estado de Sergipe frente à situação exposta na peça vestibular e viabilizar o pleno acesso do Consulente às demandas propostas diretamente por ele próprio perante o Juizado Especial (causas inferiores a 20 salários mínimos). 

3. A jurisprudência deste Conselho é firme no sentido de não conhecer de Consultas que visem meramente sanar dúvidas jurídicas de feição particular do interessado ou que constituam instrumento de antecipação da solução de casos concretos apresentados sob a forma de situações hipotéticas.  Precedentes.

4. A argumentação renovada no recurso já foi objeto de ampla análise na decisão monocrática combatida e não apresenta quaisquer elementos aptos à modificação do entendimento ali adotado, inviabilizando o provimento do recurso.

5. Recurso Administrativo a que se nega provimento.[3] (Grifo nosso)

 

CONSULTA. UTILIZAÇÃO EM DECISÕES JUDICIAIS DAS EXPRESSÕES “LIVRE CONVENCIMENTO” OU “LIVRE CONVENCIMENTO MOTIVADO”. NATUREZA JURISDICIONAL. MATÉRIA ALHEIA À COMPETÊNCIA DO CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA. EXEGESE DO ARTIGO 89 DO RICNJ. NÃO CONHECIMENTO. 

I-Consulta formulada com o propósito de que o Conselho Nacional de Justiça se posicione sobre a impossibilidade de utilização pelos Magistrados das expressões “livre convencimento” ou “livre convencimento motivado”, na exposição dos fundamentos de suas decisões judiciais.

II-A matéria objeto da presente Consulta reveste-se de caráter eminentemente jurisdicional, na medida em que eventual inadequação de fundamento jurídico em decisão judicial é passível de impugnação em via própria. Logo, a questão não se insere no âmbito de atuação deste Conselho, cuja competência, nos termos do art. 103-B, § 4º, da Constituição Federal, restringe-se ao controle da atuação administrativa e financeira do Poder Judiciário e do cumprimento dos deveres funcionais dos juízes.

III-Ainda que assim não fosse, os questionamentos formulados neste feito acerca da imposição de limites aos Magistrados quanto à utilização de determinados vocábulos em decisões judiciais, os quais apenas retratam a compreensão jurídica do Julgador sobre a causa submetida a exame, representam, em última análise, tentativa de abstrair do Plenário desta Casa pronunciamento favorável à tese jurídica defendida pela Requerente, finalidade para a qual, conforme precedente deste Conselho, não se admite o uso do procedimento de Consulta.

IV-Consulta não conhecida[4]. (Grifo nosso). 

 

Registre-se, ademais, que o Parecer apresentado pela Comissão Permanente de Eficiência Operacional, Infraestrutura e Gestão de Pessoas deste Conselho (Id 5121520), com avaliação direcionada para os casos envolvendo o “Juízo 100% Digital”, é suficientemente esclarecedor para a compreensão de eventuais dúvidas acerca da referia temática.

Ante o exposto, nos termos dos artigos 25, inciso X[5] , e 89 do RICNJ, não conheço da presente Consulta e determino seu arquivamento.

É como voto.

À Secretaria Processual para as providências cabíveis.

Brasília/DF, data registrada no sistema.

 

Conselheiro João Paulo Schoucair

Relator

 



[1] Art. 89. O Plenário decidirá sobre consultas, em tese, de interesse e repercussão gerais quanto à dúvida suscitada na aplicação de dispositivos legais e regulamentares concernentes à matéria de sua competência.

[2] Art. 90. A consulta poderá ser respondida monocraticamente, quando a matéria já estiver expressamente regulamentada em Resolução ou Enunciado Administrativo, ou já tiver sido objeto de pronunciamento definitivo do Plenário ou do Supremo Tribunal Federal.

[3] CNJ - RA – Recurso Administrativo em CONS - Consulta - 0006897-39.2021.2.00.0000 - Rel. JANE GRANZOTO - 104ª Sessão Virtual - julgado em 29/04/2022 

[4] CNJ - CONS - Consulta - 0009096-68.2020.2.00.0000 - Rel. EMMANOEL PEREIRA - 90ª Sessão Virtual - julgado em 13/08/2021.

[5] Art. 25 (...) X - determinar o arquivamento liminar do processo quando a matéria for flagrantemente estranha às finalidades do CNJ, bem como a pretensão for manifestamente improcedente, despida de elementos mínimos para sua compreensão ou quando ausente interesse geral.