Conselho Nacional de Justiça

 

Autos: CONSULTA - 0009079-37.2017.2.00.0000
Requerente: ANNA JULIA FALCAO BASTOS
Requerido: CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA - CNJ

 


 

CONSULTA. ATIVIDADE JURÍDICA. RESOLUÇÃO CNJ N. 75/09. CARGO DE ESCRIVÃO DE POLICIA. NECESSIDADE DE COMPROVAÇÃO.

1.  O cargo de escrivão de polícia pode ser considerado para a comprovação de atividade jurídica, para efeitos do disposto no art. 59, III, da Resolução CNJ n. 75/09.

2. Atividade policial não envolve, necessariamente, utilização preponderante de conhecimento jurídico.

3. Necessidade de comprovação cumulativa do período de três anos de bacharelado em Direito e do exercício da atividade jurídica de escrivão de polícia mediante emissão de certidão circunstanciada, expedida pelo órgão competente, indicando as respectivas atribuições e a prática reiterada de atos que exijam a utilização preponderante de conhecimento jurídico.

4. Consulta respondida.

 

 

 ACÓRDÃO

O Conselho, por unanimidade, respondeu afirmativamente à consulta, nos termos do voto da Relatora. Ausentes, justificadamente, os Conselheiros Maria Tereza Uille Gomes e Henrique Ávila. Presidiu o julgamento o Ministro Dias Toffoli. Plenário, 23 de abril de 2019. Presentes à sessão os Excelentíssimos Senhores Conselheiros Dias Toffoli, Humberto Martins, Aloysio Corrêa da Veiga, Iracema do Vale, Daldice Santana, Valtércio de Oliveira, Márcio Schiefler Fontes, Fernando Mattos, Luciano Frota, Maria Cristiana Ziouva, Arnaldo Hossepian, Valdetário Andrade Monteiro e André Godinho.

Conselho Nacional de Justiça

Autos: CONSULTA - 0009079-37.2017.2.00.0000
Requerente: ANNA JULIA FALCAO BASTOS
Requerido: CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA - CNJ


 

RELATÓRIO

 

Trata-se de Consulta formulada por ANNA JULIA FALCÃO BASTOS, por meio da qual a Consulente questiona acerca do exercício do cargo de escrivão de polícia, para efeitos de comprovação do exercício de atividade jurídica segundo disposto no art. 59, III, da Resolução CNJ n. 75/09.

A consulta foi formulada nos seguintes termos, in verbis

“O cargo de ESCRIVÃO DA POLÍCIA CIVIL pode ser considerado para a comprovação de atividade jurídica no concurso para o cargo de Juiz de Direito Substituto.”

É o relatório.

 

Conselho Nacional de Justiça

 

Autos: CONSULTA - 0009079-37.2017.2.00.0000
Requerente: ANNA JULIA FALCAO BASTOS
Requerido: CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA - CNJ

 

VOTO

 Presentes os requisitos do art. 89 do RICNJ admito a presente Consulta.

A necessidade de comprovação de atividade jurídica é requisito para ingresso na magistratura trazido pela EC 45/2004. Encontra-se no artigo 93, I da Constituição emendada, segundo o qual, in verbis:

Art. 93. Lei complementar, de iniciativa do Supremo Tribunal Federal, disporá sobre o Estatuto da Magistratura, observados os seguintes princípios:

I - ingresso na carreira, cujo cargo inicial será o de juiz substituto, mediante concurso público de provas e títulos, com a participação da Ordem dos Advogados do Brasil em todas as fases, exigindo-se do bacharel em direito, no mínimo, três anos de atividade jurídica e obedecendo-se, nas nomeações, à ordem de classificação” 

 

Coube ao Conselho Nacional de Justiça, no exercício de sua competência regulamentar, prevista no art. art. 103-B, § 4º, inciso I, da Constituição da República, editar a Resolução CNJ n. 75/09, estabelecendo o sentido e o alcance da regra constitucional.

A propósito, confira-se no art.  59, da Resolução 75, os parâmetros para aferição do exercício da atividade jurídica:

Art. 59. Considera-se atividade jurídica, para os efeitos do art. 58, § 1º, alínea "i":

I - aquela exercida com exclusividade por bacharel em Direito;

II - o efetivo exercício de advocacia, inclusive voluntária, mediante a participação anual mínima em 5 (cinco) atos privativos de advogado (Lei nº 8.906, 4 de julho de 1994, art. 1º) em causas ou questões distintas;

III - o exercício de cargos, empregos ou funções, inclusive de magistério superior, que exija a utilização preponderante de conhecimento jurídico;

IV - o exercício da função de conciliador junto a tribunais judiciais, juizados especiais, varas especiais, anexos de juizados especiais ou de varas judiciais, no mínimo por 16 (dezesseis) horas mensais e durante 1 (um) ano;

V - o exercício da atividade de mediação ou de arbitragem na composição de litígios.

§ 1º É vedada, para efeito de comprovação de atividade jurídica, a contagem do estágio acadêmico ou qualquer outra atividade anterior à obtenção do grau de bacharel em Direito.

§ 2º A comprovação do tempo de atividade jurídica relativamente a cargos, empregos ou funções não privativas de bacharel em Direito será realizada mediante certidão circunstanciada, expedida pelo órgão competente, indicando as respectivas atribuições e a prática reiterada de atos que exijam a utilização preponderante de conhecimento jurídico, cabendo à Comissão de Concurso, em decisão fundamentada, analisar a validade do documento.

A hipótese que se apresenta na presente Consulta insere-se entre aquelas previstas no inciso, II do art. 59 e não é inédita neste Conselho.

Conforme decisão exarada nos autos do PP 1238, de relatoria do eminente Conselheiro Cláudio Godoy, in verbis:

“Não parece haver dúvida, pelo que se considera, de que a atuação do escrivão da polícia, quer federal, quer mesmo estadual, esteja a pressupor preparo jurídico, esteja a exigir, marcadamente, a utilização desses conhecimentos técnicos. E isto mesmo que, como no caso, para o respectivo concurso não se reclame, propriamente, curso de direito completo, mas sim qualquer curso superior. Lembre-se, a propósito, que a Resolução n. 11, em seu art. 2º, mencionou não só o bacharelato em direito, como, também, o exercício de cargo, emprego ou função que exija a utilização preponderante de conhecimento jurídico.

E, nesse sentido, ao escrivão incumbe, basicamente, a prática de atos atinentes ao desenvolvimento de inquérito policial, peça investigativa do cometimento de delitos, típicos porque previstos em lei, assim cujo conhecimento não pode ser estranho ao funcionário. Mais, trata-se de procedimento administrativo também disciplinado por normas técnicas e jurídicas de manejo constante.

Na espécie isto se confirma pelo teor da Portaria 523/89 do Ministério do Planejamento, que estabelece as funções do escrivão, dentre tantas a de dar cumprimento a formalidades processuais, lavratura de termos, autos e mandados, além da escrituração dos livros cartorários. Repita-se, atividade técnico-jurídica.” (Pedido de Providências. Extensão do conceito de atividade jurídica. Resolução CNJ n. 11. Função dos escrivães de polícia e agentes da Polícia Federal. Utilização preponderante de conhecimentos jurídicos. Submissão a previsão do art. 2º. Consulta respondida. (CNJ - PP - Pedido de Providências - Conselheiro - 1238 - Rel. Cláudio Godoy - 8ª Sessão (EXTRAORDINÁRIA) - j. 20/03/2007)

Aliás, note-se que a Resolução CNJ 58/2008, considerando as atribuições do cargo, não de escrivão de polícia, mas sim de escrivão judicial, que lida com matérias essencialmente jurídicas, exige como requisito para o provimento a conclusão de curso superior, preferencialmente, porém, não exclusivamente em Direito.

Assim sendo, e ainda com maior razão, dado que a atividade policial é típica de segurança pública e, portanto, não envolve necessariamente o uso preponderante de conhecimento jurídico, a ocupação do cargo de escrivão de polícia de per si não revela o atendimento da exigência de comprovação de exercício da atividade jurídica.

Por isso, o exercício de atividade jurídica por ocupante dos cargos de escrivão deverá ser comprovado, à luz do disposto no art. 59, § 2º, da Resolução CNJ n. 75/09, mediante a emissão de certidão circunstanciada, expedida pelo órgão competente, indicando as respectivas atribuições e a prática reiterada de atos que exijam a utilização preponderante de conhecimento jurídico, cabendo à Comissão de Concurso, em decisão fundamentada, analisar a validade do documento.

Ante o exposto, responde-se à Consulta formulada no sentido de que o cargo de escrivão de polícia pode ser considerado para a comprovação de atividade jurídica, para efeitos do disposto no art. 59, III, da Resolução CNJ n. 75/09, desde que cumulativamente seja bacharel em direito há mais de três anos e haja a comprovação pelo órgão competente das respectivas atribuições e da prática reiterada de atos que exijam a utilização preponderante de conhecimento jurídico, cabendo à Comissão de Concurso, em decisão fundamentada, analisar a validade do documento.

É como voto.

 

Conselheira MARIA CRISTIANA SIMÕES AMORIM ZIOUVA

Relatora

 

Brasília, 2019-04-24.