Conselho Nacional de Justiça

 

Autos: ATO NORMATIVO - 0004320-20.2023.2.00.0000
Requerente: CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA - CNJ
Requerido: CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA - CNJ

 

ATO NORMATIVO. RECOMENDAÇÃO. ADOÇÃO DE MEDIDAS PERANTE O PODER EXECUTIVO. FOMENTO DA INCLUSÃO DE PREVISÃO ORÇAMENTÁRIA DESTINADA À IMPLEMENTAÇÃO DA POLÍTICA NACIONAL DE ALTERNATIVAS PENAIS E DA POLÍTICA DE ATENÇÃO ÀS PESSOAS EGRESSAS DO SISTEMA PRISIONAL. APROVAÇÃO.


 

 ACÓRDÃO

O Conselho, por unanimidade, aprovou a Recomendação, nos termos do voto do Relator. Presidiu o julgamento a Ministra Rosa Weber. Plenário Virtual, 18 de agosto de 2023. Votaram os Excelentíssimos Conselheiros Rosa Weber, Luis Felipe Salomão, Vieira de Mello Filho, Mauro Pereira Martins, Salise Sanchotene, Jane Granzoto, Richard Pae Kim, Giovanni Olsson, João Paulo Schoucair, Marcos Vinícius Jardim Rodrigues, Marcello Terto, Mário Goulart Maia e Luiz Fernando Bandeira de Mello. Não votaram os Excelentíssimos Conselheiros Marcio Luiz Freitas e, em razão da vacância do cargo, o representante do Ministério Público da União.

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RELATÓRIO

 

Trata-se de proposta de recomendação aos Tribunais, magistrados e magistradas visando à adoção de medidas junto ao Poder Executivo dos Estados e do Distrito Federal para fomentar a inclusão de previsão orçamentária destinada à implementação da Política Nacional de Alternativas Penais e da Política de Atenção às Pessoas Egressas do Sistema Prisional em seus instrumentos de planejamento e orçamento.

A proposição em apreço foi elaborada pelo Departamento de Monitoramento e Fiscalização do Sistema Carcerário e do Sistema de Execução de Medidas Socioeducativas (DMF), no exercício de suas atribuições legais e regulamentares. 

Concluída a análise da proposta normativa, foi determinada a instauração do presente procedimento de ato normativo pela Secretaria-Geral do Conselho, nos termos do art. 6º, XIII, e art. 102, § 1º, todos do Regimento Interno do CNJ, com distribuição ao meu gabinete em razão de minha designação como Supervisor do DMF (Id. 5208144).

É o relatório.


Conselho Nacional de Justiça

 

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VOTO


Consoante brevemente relatado, o presente feito versa sobre proposta de recomendação aos Tribunais, magistrados e magistradas visando à adoção de medidas junto ao Poder Executivo dos Estados e do Distrito Federal para fomentar a inclusão de previsão orçamentária destinada à implementação da Política Nacional de Alternativas Penais e da Política de Atenção às Pessoas Egressas do Sistema Prisional em seus instrumentos de planejamento e orçamento.

A iniciativa partiu da constatação do DMF quanto à necessidade de estabelecer medidas efetivas para implementação da Política Nacional de Alternativas Penais e da Política de Atenção às Pessoas Egressas do Sistema Prisional, mediante o estímulo à previsão de dotação orçamentária e cargos públicos que viabilizem a estruturação e consolidação dessas políticas.

A proposição normativa busca dar cumprimento ao que determinou o Supremo Tribunal Federal no âmbito da Medida Cautelar na Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental n. 347, quando foi consignado que o quadro de violação massiva e persistente de direitos fundamentais no sistema carcerário brasileiro, decorrente de falhas estruturais e da falência de políticas públicas, caracteriza um estado de coisas inconstitucional, cuja superação demanda a atuação concertada de todos os Poderes e instituições públicas para a adoção de medidas abrangentes de natureza normativa, administrativa e orçamentária.

Com efeito, conforme previsto na Constituição Federal (art. 5º, LXV, LXVI) e nos tratados internacionais sobre direitos humanos dos quais o país é signatário (art. 5º, § 2º), como as Regras Mínimas Padrão das Nações Unidas para a Elaboração de Medidas Não Privativas de Liberdade (Regras de Tóquio), a prisão é medida extrema, de ultima ratio, a ser aplicada somente nos casos expressos em lei e quando não cabível nenhuma das alternativas penais menos gravosas.

Diante disso, desde a Lei n. 6.416/1977, a legislação brasileira evoluiu para inserir mecanismos alternativos de responsabilização criminal, como a suspensão condicional da pena, as penas restritivas de direitos, a conciliação, a transação penal e a suspensão condicional do processo e, mais recentemente, o detalhado rol de medidas cautelares diversas da prisão da Lei n. 12.403/2011.

Nos anos de 1980, em especial em 1984, a legislação sofreu uma profunda modificação, passando o Código Penal a contar com uma seção disciplinando as chamadas penas restritivas de direitos. Na metade da década de 1990, a Lei n. 9.099/1995 instituiu os Juizados Especiais Criminais, já previstos na Constituição Federal de 1998, e estabeleceu a conciliação, a transação penal e a suspensão condicional do processo como mecanismos alternativos ao processo e à pena de prisão, inserindo paradigmas novos no trato da questão criminal.

A Lei n. 9.714/1998, por sua vez, modificou os requisitos para aplicação das penas restritivas de direito e ampliou as suas modalidades, passando a prever: prestação pecuniária, perda de bens e valores, proibição para frequentar determinados lugares e prestações de outra natureza. Mais recentemente, a Lei n. 12.403/2011, conhecida como Lei das Cautelares, com o objetivo de enfrentar o encarceramento provisório, passou a prever um extenso rol de medidas cautelares diversas da prisão e estabeleceu um regime cautelar em que o encarceramento constitui estratégia absolutamente excepcional e subsidiária em relação às demais medidas. 

Contudo, diversos estudos científicos demonstram o persistente uso sistemático, abusivo e desproporcional da prisão provisória no país, em casos de pessoas que ao final do processo são absolvidas ou têm penas alternativas aplicadas, a exemplo de levantamentos do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada - IPEA publicados em 2015[1]. As conclusões da pesquisa apontam que em “37,2% dos casos pesquisados em que os réus estiveram presos provisoriamente não houve condenação à prisão ao final do processo”. Em número absolutos, isso significa um total de cerca de 90 mil homens e mulheres encarcerados em casos que serão absolvidos ou terão penas alternativas aplicadas.

Para fazer frente a esse cenário, as Alternativas Penais existentes no Brasil partem do princípio de uma intervenção penal mínima, desencarceradora e restaurativa. Trata-se de compreender que o cárcere reforça o ciclo da violência ao contribuir para a ruptura dos vínculos familiares e comunitários da pessoa privada de liberdade, que sofre ainda com a estigmatização e as consequentes dificuldades de acesso ao mercado de trabalho, ampliando a situação de marginalização e a chance de ocorrerem novos processos de criminalização.

Mais recentemente, somando-se a esse movimento de fortalecimento das penas e medidas alternativas, as audiências de custódia no Brasil foram implementadas, a partir de 2015 e do protagonismo do Poder Judiciário e particularmente deste Conselho Nacional de Justiça. A implementação das audiências de custódia representou uma importante evolução ao introduzir um momento processual de avaliação em contraditório da necessidade de se aplicarem prisões provisórias, proporcionado um espaço de uso racional da cautelar extrema.

Segundo a Resolução CNJ 213/2015, em seu Protocolo I – “conforme previsto nos Acordos de Cooperação nº 05, nº 06 e nº 07, de 09 de abril de 2015, firmados entre o Conselho Nacional de Justiça e o Ministério da Justiça, as medidas cautelares diversas da prisão aplicadas no âmbito das audiências de custódia serão encaminhadas para acompanhamento em serviços instituídos preferencialmente no âmbito do Poder Executivo estadual, denominados Centrais Integradas de Alternativas Penais ou com outra nomenclatura, bem como às Centrais de Monitoração Eletrônica, em casos específicos. Caberá ao Departamento Penitenciário Nacional, órgão vinculado ao Ministério da Justiça, em parceria com o Conselho Nacional de Justiça, elaborar manuais de gestão dessas práticas, com indicação das metodologias de acompanhamento dessas medidas”.

O mencionado Manual, denominado Modelo de Gestão de Alternativas Penais, foi desenvolvido no mesmo ano por um Grupo de Trabalho instituído no âmbito do Departamento Penitenciário Nacional do Ministério da Justiça e Segurança Pública – DEPEN/MJSP e se tornou uma referência na orientação de metodologias e modelos de acompanhamento de medidas alternativas.

Dentro da Política de Alternativas Penais, destaca-se a abordagem dos serviços de acompanhamento desenvolvidos pelas Centrais Integradas de Alternativas Penais – CIAP. Recorda-se que a Resolução CNJ 288/2019, em seu art. 4°, estabelece que: “Os órgãos do Poder Judiciário deverão firmar meios de cooperação com o Poder Executivo para a estruturação de serviços de acompanhamento das alternativas penais, a fim de constituir fluxos e metodologias para aplicação e execução das medidas, contribuir para sua efetividade e possibilitar a inclusão social dos cumpridores, a partir das especificidades de cada caso”. Estas Centrais propõem uma linguagem, mencionada no parágrafo anterior, condizente com os objetivos da política.

Quanto aos atores envolvidos, a Resolução CNJ 288/2019 traz também, em seu art. 4°, § 1° e § 2°, que para o acompanhamento das Alternativas Penais: “Nas comarcas ou seções onde ainda não houver serviços estruturais no âmbito do Poder Executivo, os Órgãos do Poder Judiciário deverão instituir, junto à vara com competência de execução penal, serviço psicossocial, com profissionais do quadro próprio do Tribunal ou cedidos pelo Poder Executivo, na forma autorizada por lei”. Além disso, propugna que: “O serviço psicossocial será responsável por constituir redes amplas para promover o cumprimento das alternativas penais e a inclusão social dos egressos, cabendo-lhe também o acompanhamento durante todo o curso das medidas”.

Assim como a Política de Alternativas Penais, a Política de Atenção às Pessoas Egressas do Sistema Prisional também busca enfrentar o “estado de coisas inconstitucional” que caracteriza o sistema prisional brasileiro, conforme reconhecido pelo Supremo Tribunal Federal - STF, na Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental – ADPF n° 347.

Induzida nacionalmente pelo CNJ, essa política é estruturada por um equipamento público chamado “Escritório Social”, no qual a pessoa egressa e seus familiares têm apoio estatal, da sociedade civil e do setor privado, objetivando promover seu acesso às políticas públicas, ao trabalho, à educação e a outros serviços públicos.

A política especializada no atendimento às pessoas egressas prioriza não apenas investimentos financeiros, mas uma nova forma de tratar a questão penal, passando pela articulação do conjunto das políticas públicas – em especial educação, qualificação profissional e oferta de trabalho ao público – como forma de reduzir as vulnerabilidades promovidas pela vivência do aprisionamento e no retorno à vida em liberdade, assim como a inibição de novas infrações penais.

No contexto do fomento da Política de Atenção à Pessoa Egressa, especialmente com a implantação do Escritório Social, no âmbito do Poder judiciário, em articulação com o Poder Executivo, as pessoas egressas são atendidas por uma equipe multidisciplinar, que define plano singular integrado, conforme o perfil de cada pessoa atendida. A partir da elaboração desse plano, as pessoas egressas poderão ser encaminhadas para serviços de acordo com suas necessidades específicas.

O Escritório Social reúne em um único equipamento público o referenciamento para todas as políticas relacionadas à ressocialização do egresso, reduzindo assim a ida a diversos órgãos e setores públicos, fazendo com que o atendimento passe a ser sistematizado com rotinas e ações visando à redução dos fatores de vulnerabilidade, propiciando ao egresso oportunidades para um recomeço digno em sua reinserção social, contribuindo, assim, em última análise, para a redução da criminalidade em âmbito nacional.

O Escritório Social deve ser implementado com a participação das Redes Sociais, constituída por todos os órgãos do Poder Judiciário, pelo órgão gestor da Administração Penitenciária Estadual, Secretarias Estaduais ou Municipais responsáveis por políticas de Assistência Social, Saúde, Trabalho, Habitação, Educação, Cultura, Direitos Humanos, Igualdade Racial, Políticas para Mulheres, e pelas entidades públicas e privadas, inclusive Patronatos, Conselhos da Comunidade, Conselho Penitenciário, Federações empresariais, universidades e instituições de ensino fundamental, médio e técnico-profissionalizantes, bem como outras organizações da sociedade civil.

A Política de Pessoas Egressas garante às pessoas privadas de liberdade, no momento de sua soltura ou desligamento, o fornecimento da documentação civil, vale-transporte ou equivalente, permitindo o retorno ao local de sua residência anterior, inclusive se em outro Município na mesma ou em distinta Unidade da Federação, vestuário adequado, alimentação adequada e material informativo com orientações sobre serviços públicos disponíveis, inclusive quanto ao Escritório Social.

Cabe esclarecer que a parceria entre o Poder Executivo dos Estados e Distrito Federal e o Sistema de Justiça deve ser firmada por meio de Termo de Cooperação, considerando a participação do Poder Judiciário, do Ministério Público e da Defensoria Pública, no que tange à efetividade dos serviços de acordo com a legislação correlata. Ressaltando ainda que a responsabilidade pela administração, execução e controle da Política caberá ao Poder Executivo Estadual.

Apesar da relevância dessas políticas, verifica-se o incipiente envolvimento de grande parte dos estados e o insuficiente aporte de recursos seus para viabilizá-las. No caso das alternativas penais, a maioria dos estados sequer instituíram dotação orçamentária ou cargos públicos específicos para garantirem a institucionalização de tal política, em especial por meio da disseminação das Centrais Integradas de Alternativas Penais pelo país. Isso significa que, mesmo já havendo um amplo leque de Alternativas Penais instituídas legalmente e à disposição do sistema penal, na prática, a falta de estrutura que dê suporte adequado à sua execução leva tais iniciativas ao descrédito e a não aplicação.

Assim, é fundamental que os Estados e o Distrito Federal estabeleçam rubricas próprias para dar efetividade a essas políticas, bem como as instituições do Sistema de Justiça incidam junto a estas esferas para a garantia de orçamento adequado para a execução desta política, envolvendo a estruturação e manutenção dos serviços, equipes e demandas específicas, a partir das particularidades de cada Unidade Federativa.

Considerando que a receita orçamentária é a base de cálculo para definição do valor mínimo relativo aos gastos com ações e serviços das políticas de alternativas penais e de pessoas egressas, nos níveis estadual e municipal de governo, é necessário que os responsáveis pela elaboração da proposta insiram previsão orçamentária para estas políticas dentro dos estudos orçamentários realizados pelo Poder Executivo, com a respectiva memória de cálculo da estimativa da receita, dentro do prazo de entrega do projeto de lei.

Por isso, mostra-se fundamental um planejamento e previsão orçamentária dos Estados e Distrito Federal mais efetivos quanto às políticas voltadas às alternativas penais e às pessoas egressas do sistema prisional, uma vez que são políticas ora inexistentes, ora difusas, fragmentadas e com sustentabilidade limitada, sendo comumente desenvolvidas sem a garantia de fonte de recursos da Administração Pública para despesas de custeio e para investimentos, reduzindo assim a sua eficiência e efetividade.

Este cenário colabora para uma limitação dos resultados almejados por tais políticas, sobretudo numa perspectiva de redução do número de pessoas encarceradas indevidamente (quando a lei permite a responsabilização via alternativas penais), de impactos positivos nos indicadores de violência, de redução dos custos do sistema prisional, de diminuição das violações de direitos da população carcerária, assim como de enfraquecimento de grupos prisionais e da reincidência criminal.

O que ora se propõe é recomendar que, como boa prática para a racionalização do sistema penal em seus respectivos Estados e sem descuidar do respeito ao princípio constitucional da separação de poderes, os Tribunais, magistrados e magistradas busquem fomentar junto ao Poder Executivo dos Estados e do Distrito Federal a importância de estabelecer previsões orçamentárias destinadas à implementação da Política Nacional de Alternativas Penais e da Política de Atenção às Pessoas Egressas do Sistema Prisional em seus instrumentos de planejamento e orçamento (Plano Plurianual - PPA, Lei de Diretrizes Orçamentárias - LDO e Lei Orçamentária Anual - LOA).

Entende-se como fundamental a dotação orçamentária, por meio de rubricas próprias e com recursos anuais para execução destas políticas, conforme os parâmetros nacionais, para viabilizar, por exemplo, a) implementação ou criação de novos núcleos de Centrais Integradas de Alternativas Penais, atentando-se para a necessidade de interiorização dos serviços de alternativas penais; b) a contratação de equipe multidisciplinar para compor as Centrais e outros serviços, a exemplo dos Escritórios Sociais; c) a execução de convênios ou tratativas afins para proporcionar e execução de grupos reflexivos e adoção de metodologias restaurativas; d) a estruturação ou criação de espaços físicos para funcionamento dos equipamentos de alternativas penais ou de apoio aos egressos do sistema prisional, dentre outras possibilidades.

Dessa forma, a recomendação em tela orienta a, sempre que possível, os Tribunais de Justiça, magistrados e magistradas busquem reforçar junto à sociedade civil e às demais instituições públicas, a necessidade e a oportunidade da programação de ações e da efetivação dos serviços públicos relativos às alternativas penais e às políticas de egressos, como boas práticas para a racionalização do sistema penal e garantia da justiça e da segurança pública em seus respectivos Estados.

Nesse sentido, propõe-se, ainda, que os Tribunais, particularmente por meio dos Grupos de Monitoramento e Fiscalização do Sistema Carcerário (GMFs), envidem esforços junto às secretarias de estado com atribuição para a gestão penitenciária e socioeducativas para criação de grupo de trabalho interinstitucional destinado ao acompanhamento do planejamento e da execução orçamentária relativamente à Política Nacional de Alternativas Penais e à Política de Atenção às Pessoas Egressas do Sistema Prisional, preferencialmente com a participação de representantes do Ministério Público, da Defensoria Pública, da Ordem dos Advogados do Brasil, conselhos e serviços públicos pertinentes e de associações de familiares de pessoas presas.

Cumpre assinalar, outrossim, que a presente proposta de recomendação também está alinhada com a Carta de intenções assinada entre o CNJ e a Comissão Interamericana de Direitos Humanos - CIDH, com o propósito de promover ações de capacitação e o desenvolvimento do Poder Judiciário nacional no campo dos direitos humanos.

Por fim, considerando-se, especialmente, a iminência da elaboração do Plano Plurianual (PPA) 2024 – 2027 que determinará as diretrizes, objetivos e metas da Administração Pública para despesas de capital e outras delas decorrentes e para as relativas aos programas de duração continuada para os próximos quatro anos, entende-se oportuna e necessária a aprovação da minuta de recomendação em apreço pelo Plenário do CNJ, como manifestação do compromisso do Poder Judiciário em atuar de forma harmônica e cooperativa com os demais Poderes da República para a superação do estado de coisas inconstitucional do sistema carcerário brasileiro. 

Ante o exposto, voto no sentido da APROVAÇÃO da minuta de recomendação anexa. 

Brasília, data registrada no sistema. 

  

MAURO PEREIRA MARTINS

Conselheiro Relator

 

 


MINUTA

 

 

RECOMENDAÇÃO No XXX, DE XXX DE XXXXXXX DE 2023

 

Recomenda aos Tribunais, magistrados e magistradas a adoção de medidas junto ao Poder Executivo dos Estados e do Distrito Federal para fomentar a inclusão de previsão orçamentária destinada à implementação da Política Nacional de Alternativas Penais e da Política de Atenção às Pessoas Egressas do Sistema Prisional em seus instrumentos de planejamento e orçamento.

 

 

A PRESIDENTE DO CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA, no uso de suas atribuições legais e regimentais;

CONSIDERANDO que o Supremo Tribunal Federal reconheceu na ADPF 347 MC que o quadro de violação massiva e persistente de direitos fundamentais no sistema carcerário brasileiro, decorrente de falhas estruturais e da falência de políticas públicas, caracteriza um estado de coisas inconstitucional, cuja superação demanda a atuação concertada de todos os Poderes e instituições públicas para a adoção de medidas abrangentes de natureza normativa, administrativa e orçamentária;

CONSIDERANDO ser a prisão medida extrema que se aplica somente nos casos expressos em lei e quando não cabível nenhuma das alternativas penais, conforme previsto na Constituição Federal (art. 5º, LXV, LXVI) e nos tratados internacionais sobre direitos humanos dos quais o país é signatário (art. 5º, § 2º), como as Regras Mínimas Padrão das Nações Unidas para a Elaboração de Medidas Não Privativas de Liberdade (Regras de Tóquio);

CONSIDERANDO a Carta de intenções assinada entre o CNJ e a Comissão Interamericana de Direitos Humanos - CIDH, com o propósito de promover ações de capacitação e o desenvolvimento do Poder Judiciário nacional no campo dos direitos humanos; 

CONSIDERANDO que, desde a Lei nº 6.416/1977, a legislação brasileira evoluiu para inserir mecanismos alternativos de responsabilização criminal, como a suspensão condicional da pena, as penas restritivas de direitos, a conciliação, a transação penal e a suspensão condicional do processo e, mais recentemente, o detalhado rol de medidas cautelares diversas da prisão da Lei nº 12.403/2011;

CONSIDERANDO os estudos científicos que demonstram o uso sistemático, abusivo e desproporcional da prisão provisória no país, em casos de pessoas que ao final do processo são absolvidas ou têm penas alternativas aplicadas, a exemplo de levantamento do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada - IPEA publicado em 2015; 

CONSIDERANDO o que dispõem a Resolução CNJ n° 213/2015 e os Acordos de Cooperação nº 05, nº 06 e nº 07, de 09 de abril de 2015, firmados entre o Conselho Nacional de Justiça e o Ministério da Justiça, no sentido de que as medidas cautelares diversas da prisão aplicadas no âmbito das audiências de custódia serão encaminhadas para acompanhamento em serviços instituídos preferencialmente no âmbito do Poder Executivo estadual, denominados Centrais Integradas de Alternativas Penais ou com outra nomenclatura, bem como às Centrais de Monitoração Eletrônica, em casos específicos, cabendo ao Ministério da Justiça, em parceria com o Conselho Nacional de Justiça, elaborar manuais de gestão dessas práticas, com indicação das metodologias de acompanhamento dessas medidas; 

CONSIDERANDO a Resolução CNJ nº 288/2019, que define a política institucional do Poder Judiciário para a promoção da aplicação de alternativas penais, com enfoque restaurativo, em substituição à privação de liberdade, e estabelece que sejam firmados meios de cooperação com o Poder Executivo para a estruturação de serviços de acompanhamento das alternativas penais; 

CONSIDERANDO o papel da Política de Atenção às Pessoas Egressas do Sistema Prisional no enfrentamento do estado de coisas inconstitucional do sistema prisional brasileiro, para que a pessoa egressa e seus familiares tenham apoio estatal, da sociedade civil e do setor privado, a fim de garantir seu acesso às políticas públicas, ao trabalho, à educação e a outros serviços públicos, em especial educação, qualificação profissional e oferta de trabalho, como forma de reduzir as vulnerabilidades e inibir novas infrações penais; 

CONSIDERANDO a iniciativa do Conselho Nacional de Justiça, no contexto do fomento da Política de Atenção à Pessoa Egressa, para a implantação nacional dos Escritórios Sociais, estruturados em articulação entre os Poderes Judiciário e Executivo locais, que reúnem em um único equipamento público o referenciamento para todas as políticas relacionadas à ressocialização do egresso, com atendimento sistematizado para redução dos fatores de vulnerabilidade; 

CONSIDERANDO que o Escritório Social deve ser implementado com a participação das Redes Sociais, constituída por todos os órgãos do Poder Judiciário, pelo órgão gestor da Administração Penitenciária Estadual, Secretarias Estaduais ou Municipais responsáveis por políticas de Assistência Social, Saúde, Trabalho, Habitação, Educação, Cultura, Direitos Humanos, Igualdade Racial, Políticas para Mulheres, e pelas entidades públicas e privadas, inclusive Patronatos, Conselhos da Comunidade, Conselho Penitenciário, Federações empresariais, universidades e instituições de ensino fundamental, médio e técnico-profissionalizantes, bem como outras organizações da sociedade civil; 

CONSIDERANDO a necessidade de estabelecer medidas efetivas para implementação da Política Nacional de Alternativas Penais e da Política de Atenção às Pessoas Egressas do Sistema Prisional, mediante a previsão de dotação orçamentária e cargos públicos que viabilizem a estruturação e consolidação dessas políticas; 

CONSIDERANDO a necessidade de que as diretrizes, objetivos e metas da Administração Pública para despesas relativas à Política Nacional de Alternativas Penais e à Política de Atenção às Pessoas Egressas do Sistema Prisional estejam alinhadas entre si, tendo em vista as regras da Constituição Federal de 1988 para o planejamento e a execução orçamentárias;

CONSIDERANDO a iminência da elaboração do Plano Plurianual (PPA) 2024 – 2027 que determinará as diretrizes, objetivos e metas da Administração Pública para despesas de capital e outras delas decorrentes e para as relativas aos programas de duração continuada para os próximos quatro anos; 

CONSIDERANDO o deliberado pelo Plenário do CNJ no procedimento Ato Normativo nº 0004320-20.2023.2.00.0000, na xxxª Sessão xxx, realizada em xx de xxx de 2023; 

 

RESOLVE:

 

Art. 1º Recomendar aos Tribunais, magistrados e magistradas a adoção de medidas junto ao Poder Executivo dos Estados e do Distrito Federal para fomentar previsões orçamentárias destinadas à implementação da Política Nacional de Alternativas Penais e da Política de Atenção às Pessoas Egressas do Sistema Prisional em seus instrumentos de planejamento e orçamento (Plano Plurianual - PPA, Lei de Diretrizes Orçamentárias - LDO e Lei Orçamentária Anual - LOA).

§ 1º A previsão orçamentária de que trata o caput preferencialmente corresponderá a rubricas próprias, com recursos anuais para execução destas políticas, conforme os parâmetros nacionais.

§ 2º Sempre que possível, os Tribunais de Justiça, magistrados e magistradas devem reforçar, junto à sociedade civil e às demais instituições públicas, a necessidade e a oportunidade da programação de ações e da efetivação dos serviços públicos relativos às alternativas penais e às políticas de egressos, como boas práticas para a racionalização do sistema penal e garantia da justiça e da segurança pública em seus respectivos Estados.

 

Art. 2º Com o objetivo de viabilizar a implementação da Política Nacional de Alternativas Penais e da Política de Atenção às Pessoas Egressas do Sistema Prisional, será estimulada a previsão de dotações orçamentárias aptas aos seguintes objetivos:

 I - implementação ou criação de novos núcleos de Centrais Integradas de Alternativas Penais e do Serviço de Atendimento à Pessoa Custodiada, atentando-se para a necessidade de interiorização dos serviços de alternativas penais;

II - contratação de equipe multidisciplinar para compor as Centrais e outros serviços, a exemplo dos Escritórios Sociais;

III - execução de convênios ou tratativas afins para proporcionar e execução de grupos reflexivos e adoção de metodologias restaurativas;

IV - estruturação ou criação de espaços físicos para funcionamento dos equipamentos de alternativas penais ou de apoio aos egressos do sistema prisional;

V - outras ações destinadas à promoção da aplicação de alternativas penais, com enfoque restaurativo, em substituição à privação de liberdade.

 

Art. 3º Os Tribunais, particularmente por meio dos GMFs, envidarão esforços junto às secretarias de estado com atribuição para a gestão penitenciária e socioeducativas para criação de grupo de trabalho interinstitucional destinado ao acompanhamento do planejamento e da execução orçamentária relativamente à Política Nacional de Alternativas Penais e à Política de Atenção às Pessoas Egressas do Sistema Prisional, preferencialmente com a participação de representantes do Ministério Público, da Defensoria Pública, da Ordem dos Advogados do Brasil, conselhos e serviços públicos pertinentes e de associações de familiares de pessoas presas.

 

Art. 4º Esta Recomendação entra em vigor na data de sua publicação.

 

Ministra ROSA WEBER



[1] V. IPEA. Relatório de Pesquisa. A Aplicação de Penas e Medidas Alternativas. 2015. Disponível em: https://repositorio.ipea.gov.br/handle/11058/7517. E também IPEA. Excesso de prisão provisória no Brasil: um estudo empírico sobre a duração da prisão nos crimes de furto, roubo e tráfico (Bahia e Santa Catarina, 2008-2012) / Ministério da Justiça, Secretaria de Assuntos Legislativos. -- Brasília : Ministério da Justiça, Secretaria de Assuntos Legislativos (SAL) : Ipea, 2015. 116p.: il. color. – (Série pensando o direito; 54). Disponível em: http://pensando.mj.gov.br/wp-content/uploads/2016/02/Pod_54_Rogerio_final_web-1.pdf .