Conselho Nacional de Justiça

 

Autos: PROCEDIMENTO DE CONTROLE ADMINISTRATIVO - 0005465-48.2022.2.00.0000
Requerente: MARISA DE DEUS AMADO
Requerido: TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO ESPÍRITO SANTO - TJES

 


 

EMENTA

 

 

RECURSO ADMINISTRATIVO. PROCEDIMENTO DE CONTROLE ADMINISTRATIVO. CONCURSO PÚBLICO PARA OUTORGA DE DELEGAÇÃO POR REMOÇÃO. REABERTURA DE AUDIÊNCIA DE ESCOLHA OCORRIDA EM 2009. IMPOSSIBILIDADE. COISA JULGADA ADMINISTRATIVA. FATOS NOVOS INEXISTENTES OU INSUBSISTENTES. INCONSTITUCIONALIDADE DA RESOLUÇÃO Nº 14/2008 TJES. ADI 5.681/ES. CONTROLE CONCENTRADO DE CONSTITUCIONALIDADE. SEGURANÇA JURÍDICA. MODULAÇÃO DOS EFEITOS DO JULGAMENTO E PRESERVAÇÃO DOS ATOS ADMINISTRATIVOS PRATICADOS. LEI ESTADUAL Nº 11.438/2021. REANEXAÇÃO DOS SERVIÇOS EXTRAJUDICAIS DO CARTÓRIO DE REGISTRO CIVIL E TABELIONATO DE NOTAS DO DISTRITO DE GOIABEIRAS (VITÓRIA-ES) EM CONFORMIDADE COM A DECISÃO DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL (STF). RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO.

1. Recurso administrativo no procedimento de controle administrativo (PCA) no qual se objetiva a reforma da decisão monocrática final que julgou improcedentes os pedidos formulados e determinou o arquivamento dos autos, por decisão monocrática, nos termos do inciso X do artigo 25 do Regimento Interno do Conselho Nacional de Justiça (RICNJ).

2. Questiona-se a disponibilização de serventias extrajudiciais no concurso público deflagrado pelo Edital nº 1/2009 pelo TJES, ao argumento de que o Registro Civil e Tabelionato de Notas de Goiabeiras (Vitória-ES) deveria ter sido ofertado de forma anexada, em 2009, em consequência da declaração de inconstitucionalidade da Resolução nº 14/2008 TJES pelo Supremo Tribunal Federal (STF), no julgamento da ADI nº 5.681/ES.

3. Não há como revisitar matéria já apreciada pelo Plenário do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), nos autos do PCA nº 0009291-24.2018.2.00.0000, porquanto formada a coisa julgada administrativa.

4. Na modulação dos efeitos do acórdão proferido na ADI nº 5.681/ES, cuja eficácia é imediata e dispensa aguardar o julgamento de eventuais embargos de declaração, ficou claro que o STF manteve os efeitos produzidos pela Resolução nº 14/2008 do TJES e conferiu o prazo de 12 meses, a contar de 02/12/2020, para a reorganização ou convalidação, por lei, das atribuições das serventias afetadas por esse ato normativo, sob pena de se retomar o estado original dessas unidades extrajudiciais. 

5. Uma vez que o acórdão prolatado na ADI 5.681/ES estabeleceu a preservação dos atos praticados sob a vigência do ato inconstitucional, não se deve falar em desconstituição das outorgas de delegação levadas a efeito em decorrência do concurso público inaugurado pelo Edital nº 01/2013, para possibilitar a reabertura da fase de sessão de escolha do certame anterior resultante do Edital nº 01/ 2009, sob pena de violação do princípio da segurança jurídica.

6. Não existe também possibilidade de reabertura da sessão de escolha de serventia que não foi sequer objeto do concurso de remoção de 2009 e veio a ser provida posteriormente, em novo concurso, aberto pelo Edital nº 01/2013.

7. A Lei estadual nº 11.438/2021 foi promulgada e publicada, sem dispor sobre a desanexação dos serviços de Registro Civil de Pessoas Naturais e de Tabelionato do Distrito de Goiabeiras (Vitória-ES), de modo que o serviço retornou ao status quo ante disciplinado pela Lei estadual nº 3.526/1982, não havendo de se falar em ilegalidade ou maior retroação dos efeitos do julgado do STF, por mera conveniência da recorrente.

8. Em decorrência da preservação dos atos praticados pelo TJES, em especial aqueles relativos à escolha, à delegação e remembramento do atual Registro Civil de Pessoas Naturais e de Tabelionato do Distrito de Goiabeiras (Vitória-ES), na linha do quanto decidido nos autos do PCA 0009291-24.2018.2.00.000, não se pode mais falar em desconstituição das outorgas de delegação contempladas pelo Edital nº 01/2013 e possibilidade de reabertura do certame de 2009, máxime porque isso contrariaria a determinação da conservação dos atos administrativos, conforme decidido pelo STF.

9. Pretensão da recorrente que implica na anulação dos atos de delegação dos serviços notariais e de registro realizados ao longo de mais de uma década, inclusive com interferência nos atos de delegações provenientes da realização de concursos posteriores, em afronta, mais uma vez, aos princípios da segurança jurídica e da confiança legítima.

10. O CNJ não pode fazer as suas decisões retroagirem no tempo para satisfazer requerimento extemporâneo de interessado que não se valeu da via administrativa ou judicial no momento oportuno. Precedente do CNJ.

11. Perda superveniente do objeto, com base no teor do julgamento da ADC nº 14/DF, que consiste em mero reforço argumentativo, de modo que a oposição ou o julgamento de embargos de declaração pela ANOREG/BR não interfere absolutamente nas conclusões da decisão recorrida.

12. Considerando a eficácia das decisões proferidas e os efeitos da oposição de embargados de declaração em sede de controle concentrado de constitucionalidade, no caso, não existe qualquer causa heterônoma relevante que justifique a suspensão do julgamento deste processo.

13. Pretensão de reabertura de concurso de remoção em desacordo com os parâmetros de constitucionalidade estabelecidos pelo STF no julgamento da ADC 14/DF, em 04/09/2023. Impossibilidade.

14. Recurso conhecido e desprovido.

 

 ACÓRDÃO

O Conselho, por unanimidade, negou provimento ao recurso, nos termos do voto do Relator. Presidiu o julgamento o Ministro Luís Roberto Barroso. Plenário Virtual, 9 de fevereiro de 2024. Votaram os Excelentíssimos Conselheiros Luís Roberto Barroso, Luis Felipe Salomão, Guilherme Caputo, José Rotondano, Mônica Autran, Jane Granzoto, Renata Gil, Daniela Madeira, Giovanni Olsson, Pablo Coutinho Barreto, João Paulo Schoucair, Marcos Vinícius Jardim Rodrigues, Marcello Terto, Daiane Nogueira e Luiz Fernando Bandeira de Mello.

Conselho Nacional de Justiça

Autos: PROCEDIMENTO DE CONTROLE ADMINISTRATIVO - 0005465-48.2022.2.00.0000
Requerente: MARISA DE DEUS AMADO
Requerido: TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO ESPÍRITO SANTO - TJES


RELATÓRIO

 

Trata-se de recurso administrativo interposto por MARISA DE DEUS AMADO contra a decisão que, dada a perda superveniente do objeto, diante da existência de fato novo extintivo do direito pleiteado, bem como em razão da existência de coisa julgada administrativa - a impedir que o CNJ faça suas decisões retroagirem no tempo para satisfazer requerimento extemporâneo de interessado que não se valeu da via administrativa ou judicial no momento oportuno -, JULGOU IMPROCEDENTES os pedidos formulados e determinou o ARQUIVAMENTO do presente procedimento de controle administrativo (PCA), por decisão monocrática, nos termos do inciso X do artigo 25 do Regimento Interno do Conselho Nacional de Justiça.

A recorrente narra que tomou posse como titular do Ofício de Registro Civil e Tabelionato do Distrito da Sede da Comarca de Serra-ES, em 20/11/1991.

Anota que a Corregedoria Geral da Justiça do TJES publicou o Edital nº 01/2006, pelo qual inaugurou concurso para delegação de serventias notariais e de registro vagas por ocasião da homologação do concurso, em 24/10/2006.

Observa que, durante o andamento do concurso público, a Presidência do TJES publicou a Resolução nº 14/2008 prevendo a desanexação de serventias extrajudiciais, especialmente a do Registro Civil e Tabelionato do Distrito de Goiabeiras, na Comarca de Vitória-ES, em 15/09/2008.

Em seguida, informa a recorrente, a Presidência do TJES publicou o Edital nº 01/2009, pelo qual também abriu o concurso público para remoção de titulares de serventias de notas e de registro do Estado do Espírito Santo, para o qual se inscreveu, sabendo que incluía como serventia vaga o Registro Civil de Goiabeiras (Vitória-ES), em 11/03/2009.

Nesse ínterim, destaca que obteve a melhor nota dentre as candidatas e candidatos da entrância especial, mas desistiu de concorrer à titularidade do Ofício de Registro Civil do Distrito de Goiabeiras, para aguardar decisão do Supremo Tribunal Federal acerca da disponibilidade do 2º Ofício Tabelionato de Vila Velha-ES.

Em função disso, consigna que a CGJ-ES publicou o Edital n 43/2009, esclarecendo que o Tabelionato do Distrito de Goiabeiras (Vitória-ES), criado a partir do desmembramento levado a efeito pela Resolução nº 14/2008, e o 2º Tabelionato da Comarca de Vila Velha-ES seriam retirados do certame, em razão de decisão judicial do Supremo Tribunal Federal, no MS 27.739, em 11/11/2009.

Publicado o ato de outorga das serventias escolhidas na sessão designada para tanto, a recorrente relata que o Presidente da Comissão do Concurso publicou o Edital nº 04/2011, homologando o seu pedido de desistência do concurso de remoção, em 21/03/2011.

Por esse motivo, diz, foi deflagrado novo concurso público com a publicação do Edital nº 01/2013, com o destaque de que eventual escolha de serventia sub judice se daria por conta e risco do candidato aprovado, sob a sua total responsabilidade e sem direito a reclamação posterior de exercer nova opção ou de retornar à atividade pública anterior, caso o resultado da ação judicial correspondente frustrasse a escolha e afetasse a sua investidura e exercício na respectiva delegação, em 10/07/2013.

Em seguida, lembra que a Associação dos Notário do Brasil (ANOREG-BR) ajuizou, no Supremo Tribunal Federal (STF) a ADI nº 5.681, para a declaração da inconstitucionalidade dos artigos 1º, 2º e 4º da Resolução nº 14/2008, por violação aos princípios da impessoalidade, igualdade, reserva legal, legalidade e conformidade funcional e infração direta aos artigos 5º, XXXVI, 37 e 96, II, d, da Constituição da República Federativa do Brasil (CRFB), em 24/03/2017.

A despeito disso, registra, o Gabinete da Presidência do TJES publicou o Ato nº 152/2019, pelo qual formalizou as outorgas das serventias disponibilizadas no concurso deflagrado pelo Edital nº 01/2013, oportunidade em que as serventias do Distrito de Goiabeira (Vitória-ES) foram outorgadas às candidatas Paula Cecília da Luz Rodrigues (Registro Civil) e Graziella Guerra Bacelete (Tabelionato de Notas), ambas com registro sub judice, em 25/03/2019.

Chama a atenção para o fato de que a candidata Graziella Guerra Bacelete optou por não assumir a delegação do Tabelionato de Notas do Distrito de Goiabeiras, motivo pelo qual essa serventia era administrada por uma interina.

Nesse cenário, traz ao conhecimento o teor do dispositivo do acórdão do STF na ADI nº 5.681/ES, no qual se declarou a inconstitucionalidade da Resolução nº 14/2008/TJES e modulou os seus efeitos, conferindo o prazo de 12 meses, a contar de 02/12/2020, para a reorganização ou convalidação das atribuições das serventias afetadas por esse ato normativo, por lei, sob pena de se retomar o estado original dessas unidades extrajudiciais.

Noticia que, depois, o legislador capixaba aprovou o projeto que deu origem à Lei estadual nº 11.438/2021, que não regularizou a desanexação do Registro Civil e Tabelionato do Distrito de Goiabeiras (Vitória-ES), de modo que essa serventia retornou a sua conformação original, com ambas as competências (registro civil e tabelionato de notas).

Em seguida, a recorrente narra que, a pedido das interessadas, o Presidente do TJES proferiu a decisão que acolheu o pedido de PAULA CECÍLIA DA LUZ RODRIGUES, para que a sua serventia reassumisse os serviços notariais antes desmembrados (Processo Administrativo nº 7000449-68.2022.8.08.0000), e indeferiu o seu pedido de refazimento da audiência de escolha do Ofício do Registro Civil do Distrito de Goiabeiras (Vitória-ES) levada a efeito em 13/08/2009, no concurso aberto pelo Edital nº 01/2009, uma vez que se sentira prejudicada depois do julgamento da ADI nº 5.681 (Processo Administrativo nº 7001946-20.2022.8.08.0000).

A seu juízo, a recorrente se ressente de que a decisão pelo Presidente do TJES, nos autos do PA nº 7001946-20.2022.8.08.0000, (i) contrariou o acórdão proferido pelo STF na ADI 5681, por mitigar e relativizar os efeitos jurídicos decorrentes da declaração de inconstitucionalidade ex tunc da Resolução nº 14/2008/TJES; e, por essa razão; e (ii) vulnerou o princípio da Separação de Poderes, da legalidade e da força vinculantes de procedente formado no seio do STF, estampados nos artigos 2º e 37 da CRFB.

Dito isso, a recorrente se insurge contra a decisão ora recorrida, primeiramente, porque não coincidiriam o objeto do PCA nº 0009291-24.2018.2.00.0000 com o destes autos, cuja causa de pedir seria a declaração de inconstitucionalidade da Resolução nº 14/2008/TJES e todos os seus consectários; depois, porque não teria havido a perda superveniente do objeto em virtude de não ter ocorrido ainda o trânsito em julgado do acórdão proferido recentemente pelo STF na ADC 14.

Por esse motivo, requer “(i) seja reconsiderada a decisão proferida (Id 5312346) de modo que se suspenda o andamento deste PCA até o julgamento definitivo da ADC 14, pelo STF e, caso não seja exercido esse juízo de retratação, (ii) seja dado provimento ao recurso interposto para (a) suspender o andamento deste PCA até o julgamento definitivo da ADC 14, pelo STF; ou (b) determinar o refazimento da audiência de escolha do Ofício de Registro Civil e Tabelionato de Goiabeiras (CNS 02.136-0 e 15.338-7) levada a efeito em 13/8/2009 (Id 4845332), relativa ao Concurso regido pelo Edital nº 1/2009, disponibilizando-se às candidatas habilitadas o direito de escolha da serventia de Goiabeira (CNS 02.136-0 e 15.338-7), com as reanexadas especialidades de Registro Civil e de Tabelionato”.

Contrarrazões apresentadas por Paula Cecília da Luz Rodrigues e pelo TJES, respectivamente, nos Ids 5353129 e 5375447, vieram-nos conclusos os autos para decisão em 13/11/2023, tendo sido acostada uma espécie de réplica da recorrente às primeiras contrarrazões, no Id 5358130.

 

É o relatório, passo ao voto.


 

Conselho Nacional de Justiça

 

Autos: PROCEDIMENTO DE CONTROLE ADMINISTRATIVO - 0005465-48.2022.2.00.0000
Requerente: MARISA DE DEUS AMADO
Requerido: TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO ESPÍRITO SANTO - TJES

 


VOTO

A recorrente se insurge contra a decisão que julgou improcedentes os seus pedidos, calcados na pretensão de reabrir uma sessão de escolha de serventias extrajudiciais relacionada ao concurso público de remoção instalado a partir da publicação do Edital nº 01/2009.

Nada obstante o esforço da recorrente em reforçar a argumentação trazida na inicial e destacar a ausência de coisa julgada administrativa e de perda superveniente do objeto, no que se relaciona ao mérito das questões levantadas na sua insurgência recursal, não merece acolhimento o presente recurso, porque, ainda que superadas as questões preliminares consideradas na decisão recorrida, as questões de mérito também foram suficientemente enfrentadas, de modo que, a nosso sentir, não há razão para a reforma pretendida.

Para a melhor compreensão, reproduzo os termos das razões de decidir que fundamentaram o dispositivo da decisão monocrática objeto do levante trazido no presente recurso administrativo:

Trata-se de Procedimento de Controle Administrativo (PCA) formulado por MARISA DE DEUS AMADO contra o TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO ESPÍRITO SANTO – TJES, em que requer a reabertura da audiência de escolha do Ofício de Registro Civil e Tabelionato de Goiabeiras, ocorrida em 13/8/2009, no âmbito do concurso público deflagrado pelo Edital nº 1/2009, disponibilizando-se às candidatas então habilitadas o direito de escolha da serventia de Goiabeiras, com as reanexadas especialidades de Registro Civil e de Tabelionato de Notas.

...

É o relatório. DECIDO.

...

Preliminarmente, não há como deixar de observar que não é a primeira vez que a requerente apresenta perante este Conselho Nacional de Justiça pedido de reabertura da audiência de escolha das serventias ofertadas no Concurso Público de Títulos para Remoção de Titulares de Serventias de Notas e de Registro do Estado do Espírito Santo deflagrado pelo Edital nº 01/2009, sob o fundamento de que o Registro Civil de Goiabeiras teria sido ofertado, incorretamente, de forma desanexada, conforme se depreende do PCA nº 0009291-24.2018.2.00.0000.

No referido procedimento, a requerente se insurgiu contra a oferta das serventias, ao argumento de que a suposta incorreção na sua disponibilização teria maculado sua escolha, pugnando pela declaração de nulidade dos Editais TJES nº 10/2018 e nº 85/2018, bem como de todos os procedimentos adotados a partir deles e, subsidiariamente, a reabertura da etapa de escolha das serventias com a “oferta correta das Serventias disponibilizadas, quais sejam a Serventia do 1º Ofício de Vila Velha – ES e a Serventia de Registro Civil e Tabelionato do Distrito de Goiabeiras, Vitória –Comarca da Capital para a Entrância Especial”.

No requerimento inicial do PCA nº 0009291-24.2018.2.00.0000, a propósito, a requerente também fez menção à ADI nº 5.681/ES (STF) proposta pela ANOREG-BR em face da Resolução nº 14/2008 do TJES, que se encontrava, à época, na fase final de julgamento, já com a emissão do parecer do Ministério Público Federal pugnando pela procedência do pedido, para o reconhecimento da nulidade da citada resolução, com a invalidação das desanexações das serventias extrajudiciais constantes da referida resolução e não ratificadas por ocasião da Lei estadual nº 10.471/2015, ficando, nos seus dizeres, “viciada a oferta somente da Serventia de Registro Civil de Pessoas Naturais do Distrito de Goiabeiras – Vitória – ES, visto que deveria ter sido ofertada a Serventia originalmente criada, Registro Civil e Tabelionato do Distrito de Goiabeiras”.

Os pedidos do PCA nº 0009291-24.2018.2.00.0000 foram julgados improcedentes e a requerente interpôs o recurso administrativo de cujas razões se extrai o seguinte excerto:

Há que se ressaltar que a decisão proferida deixou de apreciar o pedido formulado em relação à oferta das Serventias de Goiabeiras aos candidatos aprovados no concurso de 2013.

O fato é que, quando da audiência de escolha da recorrente, em 2011, a Serventia de Registro Civil de Goiabeiras foi ofertada de forma desanexada, em determinação à Resolução nº 14/2008 do Tribunal de Justiça do Espírito Santo.

Contudo, foi impetrado, perante o Supremo Tribunal Federal, a ADI de nº 5681, onde se discute a (i)legalidade da dita Resolução, o que motivou o Sr. Corregedor do Tribunal de Justiça do Espírito Santo, antecipando-se à apreciação do pedido liminar nesse Procedimento, a determinar o sobrestamento dos atos destas delegações.

Diante de tal informação, a Conselheira, quando da apreciação do pedido liminar, entendeu que a decisão da Corregedoria não merecia reparos. In verbis:

Conforme se observa das informações apresentadas pelo Corregedor local, não merece reparos, de plano, a decisão referente às situações das serventias do Registro Civil e Tabelionato de Notas do Distrito de Araçatiba, no Município de Viana (2), do Registro Civil (3) e do Tabelionato do Distrito de Goiabeiras, Vitória – Comarca da Capital (4), porquanto houve determinação no sentido da suspensão da outorga da delegação ao candidato que optou pelo Registro Civil e Tabelionato de Notas do Distrito de Araçatiba, no Município de Viana (2) na sessão pública de escolha do Concurso Público de Delegatários do Edital n°01/2013, realizada em 26.9.2018, até o desfecho definitivo do procedimento instaurado na origem para verificação da regularidade das permutas realizadas, bem como das outorgas do Registro Civil (3) e do Tabelionato do Distrito de Goiabeiras, Vitória – Comarca da Capital (4), até o trânsito em julgado da mencionada ADI 5681 STF, restando sobrestados igualmente os respectivos atos de delegação.

Portanto, diante do exposto, imprescindível se torna a manifestação desta Conselheira, em sede de reconsideração ou, não sendo o caso, pelo Plenário desse Egrégio Conselho, quanto à situação específica da Serventia de Registro Civil de Goiabeiras, nos termos descritos na inicial (grifei).

A insurgência recursal não logrou êxito e, no ponto que interessa ao presente procedimento, constou do voto condutor do acórdão, em verdadeira apreciação do mérito, que, “em atendimento ao princípio da segurança jurídica, não se vislumbra razoabilidade em desconstituir outorga de delegação, contemplada no Edital nº 01/2013, para possibilitar a reabertura de certame inaugurado em 2009”, in verbis:

(...)

2.2 – IMPROCEDÊNCIA DO PEDIDO

Caso superado o entendimento quanto a impossibilidade de conhecimento da questão, entendo que não há como acolher o pedido.

Como destacado quando da análise da disponibilização do 1º Ofício de Vila Velha, o CNJ possui entendimento de que os atos praticados em cada etapa do concurso devem ser impugnados antes do início da fase seguinte, sob pena de preclusão.

No caso, além de não haver demonstração de impugnação da recorrente foi destacado pelo TJES que “na ocasião, inclusive, a Requerente manifestou expresso pedido de desistência da concorrência à referida serventia, conforme publicação no DJES de 21.8.2009” (Id nº 3359386).

Ademais, o Tribunal esclareceu em suas contrarrazões que promoveu a outorga “do Cartório de Registro Civil de Goiabeiras do Juízo de Vitória/ES aos candidatos do concurso regido pelo Edital nº 01/2013, pelo Ato n° 152/2019 (publicado no DJES de 25.03.2019), na medida em que não havia decisão judicial expressa obstando a outorga, em cumprimento à decisão Conselheira Maria Tereza Uille no PCA nº 0009351.94.2018.2.00.0000” (Id nº 3654541).

Desse modo, e em atendimento ao princípio da segurança jurídica, não se vislumbra razoabilidade em desconstituir outorga de delegação, contemplada no Edital nº 01/2013, para possibilitar a reabertura de certame inaugurado em 2009. Quanto ao ponto, destaca-se o seguinte precedente:

RECURSO ADMINISTRATIVO EM PROCEDIMENTO DE CONTROLE ADMINISTRATIVO. 7º CONCURSO PÚBLICO PARA PROVIMENTO E REMOÇÃO DE OUTORGAS DE CARTÓRIOS EXTRAJUDICIAIS DO ESTADO DE SÃO PAULO. PROVA DE TÍTULOS. RESOLUÇÃO CNJ 81/2009. IMPOSSIBILIDADE DE REVISÃO DE EDITAL DE CONCURSO PÚBLICO ENCERRADO HÁ MAIS DE QUATRO ANOS. CONCURSOS SUBSEQUENTES TAMBÉM ENCERRADOS. PRECLUSÃO. NECESSIDADE DE PRESERVAÇÃO DA SEGURANÇA JURÍDICA E DA CONFIANÇA. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO.

1. Impossibilidade de revisão de edital de concurso encerrado há mais de quatro anos. Informação nos autos de que outros três concursos posteriores ao impugnado também se encontram encerrados.

2. Aceitar a pretensão do recorrente implicaria na modificação da classificação do referido concurso e, por consequência, anulação dos atos do Poder Público de delegação dos serviços notariais e de registro realizados há mais de quatro anos, inclusive com possível interferência nas delegações decorrente dos concursos posteriores, em afronta aos princípios da segurança jurídica e da confiança.

3. Não pode o CNJ fazer retroceder no tempo para satisfazer requerimento extemporâneo do recorrente, que não se valeu da via administrativa ou judicial adequada no momento oportuno.

4. A revisão da Resolução nº. 81/2009/CNJ que está sendo analisada pela Comissão Permanente de Eficiência Operacional e Gestão de Pessoas.

5. Recurso Administrativo conhecido e desprovido. (CNJ - RA – Recurso Administrativo em PCA - Procedimento de Controle Administrativo - 0005430-35.2015.2.00.0000 - Rel. BRUNO RONCHETTI - 7ª Sessão Virtualª Sessão - j. 01/03/2016)”.  

Desse modo, impõe-se o não provimento do recurso, também no que diz respeito ao Registro Civil e Tabelionado do Distrito de Goiabeiras. 

A questão, portanto, foi objeto de deliberação do CNJ, que consagrou o princípio da segurança jurídica e afastou a possibilidade de desconstituição da outorga de delegação contemplada pelo Edital de 2013, como não poderia, aliás, deixar de ser.

Nesse contexto, se “a existência da coisa julgada administrativa impede a substituição das decisões, sobretudo quando não demonstrada a existência de fatos novos que ensejem a mudança do entendimento anteriormente adotado” (CNJ - RA – Recurso Administrativo em PCA - Procedimento de Controle Administrativo - 0007758-25.2021.2.00.0000 - Rel. VIEIRA DE MELLO FILHO - 107ª Sessão Virtual - julgado em 10/06/2022 ), o arcabouço probatório coligido aos autos demonstra que não há nova irregularidade grave ou teratologia apta a contornar essa prejudicial de mérito ou a ensejar a intervenção excepcional do CNJ nas competências ordinárias do TJES.

Além de ser forçoso reconhecer, nesse ponto, a existência de coisa julgada administrativa, que impossibilita a revisitação da matéria neste procedimento, nada obsta que, a respeito do mérito, acrescentemos que a presente pretensão da requerente nada mais almeja que requentar a discussão sobre a disponibilização das serventias no certame de 2009, ao argumento de que a decisão prolatada em sede da ADI 5.681 se trataria de fato novo com o condão de desconstituir os atos praticados sob a égide da Resolução nº 14/2008.

De fato, a ADI 5.681/ES foi julgada procedente e a Resolução nº 14/2008 foi declarada inconstitucional, por vício forma, porque versava sobre matéria objeto de lei formal sobre organização de serventias extrajudicais:

EMENTA: AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. RESOLUÇÃO N. 14/2008 DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESPÍRITO SANTO. DESANEXAÇÃO DE SERVENTIAS EXTRAJUDICIAIS POR RESOLUÇÃO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA. DESCUMPRIMENTO DA EXIGÊNCIA CONSTITUCIONAL DE LEI FORMAL. DISCIPLINA SOBRE ORGANIZAÇÃO JUDICIÁRIA. ALÍNEA D DO INC. II DO ART. 96 E § 1º DO ART. 125 DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA. AÇÃO JULGADA PROCEDENTE. MODULAÇÃO DOS EFEITOS DO JULGADO. ... Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros do Supremo Tribunal Federal, em Sessão Virtual do Plenário, na conformidade da ata de julgamento, por maioria, em julgar procedente o pedido formulado na ação direta para declarar a inconstitucionalidade da Resolução n. 14/2008 do Tribunal de Justiça do Espírito Santo, e conferir eficácia ex nunc à decisão para produzir efeitos a partir de doze meses contados da data de publicação da ata de julgamento da presente ação, nos termos do voto da Relatora, vencido parcialmente o Ministro Marco Aurélio, que divergia tão somente quanto à modulação dos efeitos da decisão. , nos termos do voto da Relatora, vencido parcialmente o Ministro Marco Aurélio, que divergia tão somente quanto à modulação dos efeitos da decisão. Sessão Virtual de 13.11.2020 a 20.11.2020.

(ADI 5681, Relator(a): CÁRMEN LÚCIA, Tribunal Pleno, julgado em 23/11/2020, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-285 DIVULG 02-12-2020  PUBLIC 03-12-2020)

A modulação dos efeitos dessa ação de controle concentrado de inconstitucionalidade da Resolução n. 14/2008 do TJES consistiu na atribuição de eficácia ex nunc ao dispositivo do acórdão, de modo que a produção dos seus efeitos se desse a partir de 12 (doze) meses contados da data de publicação da ata de julgamento da ADI 5681, em 03/12/2020.

Segundo a e. Ministra Càrmen Lúcia, “tendo produzido efeitos no período de sua vigência – a despeito de sua evidente inconstitucionalidade -, o princípio da segurança jurídica recomenda sejam preservados os atos praticados sob a égide da Resolução n. 14/2008 do Tribunal de Justiça do Espírito Santo”. Por esse motivo, o acórdão proferido na ADI 5681 manteve até 03/12/2021 os efeitos dos atos praticados sob a égide do ato administrativo regulamentar, para que o Estado do Espírito Santo, por iniciativa do TJES, tivesse tempo de aprovar e promulgar lei que disciplinasse e convalidasse a situação das serventias – ainda vagas – sob pena de que voltassem ao estado anterior.

Para se adequar ao determinado pelo STF, o TJES aprovou anteprojeto de lei das desanexações efetivadas pela Resolução nº 14/2008 e submeteu-o à Assembleia Legislava do Espírito Santo, que aprovou o que veio a ser a Lei estadual nº 11.438/2021.

Essa lei estadual não dispôs sobre a desanexação dos serviços de Registro Civil de Pessoas Naturais e de Tabelionato do Distrito de Goiabeiras, Vitória, Capital, de forma que o serviço retornou ao status quo ante disciplinado pela Lei estadual nº 3.526/1982, como consequência lógica do efeito repristinatório da declaração de inconstitucionalidade da Resolução nº 14/2008.

Justamente em decorrência da preservação desses atos, na linha do quanto decidido nos autos do PCA 9291-24.2018 deste CNJ, não se há de falar em desconstituição das outorgas de delegação contempladas pelo Edital de 2013, para possibilitar a reabertura do certame de 2009, máxime porque isso contrariaria a determinação da conservação dos atos administrativos.

De fato, aceitar a pretensão da requerente implicaria não apenas na violação da coisa julgada administrativa; como também, na modificação da classificação do referido concurso e, por consequência, na anulação dos atos de delegação dos serviços notariais e de registro realizados há mais de uma década, inclusive com interferência nos atos de delegações provenientes da realização de concursos posteriores, em afronta, mais uma vez, aos princípios da segurança jurídica e da confiança legítima.

Reiteramos, portanto, o entendimento dos julgados no sentido de que o CNJ não pode fazer as suas decisões retroagirem no tempo para satisfazer requerimento extemporâneo de interessado que não se valeu da via administrativa ou judicial no momento oportuno.

Ainda que superássemos o óbice para o conhecimento deste procedimento, não haveria como atender à pretensão da requerente de reabrir a audiência de escolha ocorrida há mais de 13 (treze) anos, em prejuízo da terceira interessada, Paula Cecília da Luz Rodrigues, devidamente aprovada no concurso público deflagrado nos idos de 2013.

Para além de todo o exposto até aqui, um novo fato impede que este Conselho Nacional analise o pleito formulado pela requerente.

Conforme relatado, recentemente, em 1º de setembro de 2023, o Supremo Tribunal Federal proferiu julgamento de mérito na Ação Declaratória de Constitucionalidade – ADC n. 14, declarando a inconstitucionalidade do art. 16 da Lei federal n. 8.935/1994 e promovendo a modulação dos efeitos de sua decisão:

Ação declaratória de constitucionalidade. Lei nº 8.935/94, art. 16 (na redação dada pela Lei nº 10.506/2002). Serviço notarial e de registro. Concurso de remoção mediante simples avaliação de títulos. Inconstitucionalidade. Previsão expressa no texto constitucional quanto à exigência de concurso de provas e títulos para o ingresso, por provimento inicial ou remoção, na atividade notarial e de registro (CF, art. 236, § 3º). Precedentes.

1. Inequívoca a existência de controvérsia judicial relevante, tendo em vista que o art. 16 da Lei dos Cartórios (na redação dada pela Lei nº 10.506/2002) ainda vige, cabendo a esta Corte o equacionamento definitivo quanto à constitucionalidade do dispositivo em questão.

2. É consabido que os notários e registradores não são servidores públicos em sentido estrito, mas particulares em colaboração com o Poder Público (ADI 2.602, Red. do acórdão Min. Eros Grau, Tribunal Pleno, j. 24.11.2005, DJ 31.3.2006; RE 842.846, Rel. Min. Luiz Fux, Tribunal Pleno, j. 27.02.2019, DJe 13.8.2019). Não existe quadro de carreira no âmbito dos serviços notariais e de registro. Cada serventia ostenta características únicas, com diferentes condições de receita, despesas, encargos e dívida.

3. Ao contrário da remoção dos servidores públicos, na qual ocorre provimento horizontal em cargo idêntico, nos serviços notariais e registrais a remoção importa em investidura em serventia com características econômicas e administrativas diversas, maior grau de responsabilidade e superior complexidade de atribuições.

4. A configuração dos concursos públicos nas modalidades provas ou provas e títulos resulta da “natureza e complexidade” da atividade na qual ocorrerá a investidura (CF, art. 37, II). Por isso mesmo, tendo em vista o caráter essencial e a elevada complexidade de que se revestem os serviços notariais e de registro, a Constituição Federal define que o ingresso em tais atividades, por provimento inicial ou remoção, exige a prévia aprovação em concurso de provas e títulos (CF, art. 236, § 3º). Precedentes.

5. Ação declaratória de constitucionalidade conhecida. Pedido julgado improcedente, declarando-se, em consequência, a inconstitucionalidade do art. 16 da Lei nº 8.935/94, na redação dada pela Lei nº 10.506/2002.

(STF. ADC 14, Relator(a): ROSA WEBER, Tribunal Pleno, julgado em 04/09/2023, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-s/n  DIVULG 19-09-2023  PUBLIC 20-09-2023).

Para exata compreensão do tema, oportuna a transcrição do art. 16 da Lei federal n. 8.935/1994, com a alteração promovida pela Lei federal n. 10.506, de 9 de julho de 2002, que autorizava a realização de concurso de remoção somente por prova de títulos:

Art. 16. As vagas serão preenchidas alternadamente, duas terças partes por concurso público de provas e títulos e uma terça parte por meio de remoção, mediante concurso de títulos, não se permitindo que qualquer serventia notarial ou de registro fique vaga, sem abertura de concurso de provimento inicial ou de remoção, por mais de seis meses.

Como se observa, o Plenário da Suprema Corte definiu que referida alteração ofende o art. 236, § 3º, CRFB, regra constitucional que exige concurso de provas e títulos para provimento inicial e remoção nos serviços notariais e de registro:

Art. 236. Os serviços notariais e de registro são exercidos em caráter privado, por delegação do Poder Público.         (Regulamento)

§ 1º  Lei regulará as atividades, disciplinará a responsabilidade civil e criminal dos notários, dos oficiais de registro e de seus prepostos, e definirá a fiscalização de seus atos pelo Poder Judiciário.

§ 2º  Lei federal estabelecerá normas gerais para fixação de emolumentos relativos aos atos praticados pelos serviços notariais e de registro.         (Regulamento)

§ 3º  O ingresso na atividade notarial e de registro depende de concurso público de provas e títulos, não se permitindo que qualquer serventia fique vaga, sem abertura de concurso de provimento ou de remoção, por mais de seis meses.

No curso do julgamento da ADC n. 14, por razões de segurança jurídica, o Supremo Tribunal Federal modulou os efeitos para considerar válidas as remoções precedidas de concursos públicos exclusivamente de títulos, iniciados e concluídos, com a publicação da relação dos aprovados, no período entre a entrada em vigor da Lei 10.506/2002 (9/7/2002) e a edição das Resoluções CNJ n. 80/2019 e n. 81/2009, ambas de 9/6/2009:

Modulação dos efeitos da decisão

19. Há a analisar, finalmente, eventual possibilidade de modulação dos efeitos desta decisão no tempo.

Sobre esse aspecto, no voto por mim proferido na sessão anterior, destaquei precedentes desta Corte no sentido da inadmissibilidade da invocação do princípio da segurança jurídica ou da consumação do prazo decadencial, para a tutela de situações flagrantemente inconstitucionais, tais como a investidura na atividade notarial e registral, por ingresso inicial ou remoção, sem prévia habilitação em concurso de provas e títulos (MS 28950-AgR, Rel. Min. Rosa Weber, Primeira Turma, DJe 14.3.2018; MS 29021-ED-AgR, Rel. Min. Teori Zavascki, Relator p/Acórdão Min. Gilmar Mendes, Segunda Turma, DJe 16.2.2018; AR 2693-AgR, Rel. Min. Luiz Fux, Tribunal Pleno, DJe 17.9.2018; AR 2544-AgR, Rel. Min. Roberto Barroso, Tribunal Pleno, DJe 11.4.2017; RE 1245783-AgR Rel. Min. Edson Fachin, Segunda Turma, DJe 15.6.2021).

20. Observo, no entanto – tal como enfatizado no voto do Ministro Gilmar Mendes – que os precedentes em referência foram firmados por esta Corte no contexto de ações de mandado de segurança ajuizadas por ex-titulares de serventias extrajudiciais contra os atos do Corregedor Nacional de Justiça praticados com base na Resolução CNJ 80/2009, que declarou “a vacância dos serviços notariais e de registro cujos atuais responsáveis não tenham sido investidos por meio de concurso público de provas e títulos específico para a outorga de delegações de notas e de registro, na forma da Constituição Federal de 1988” (Resolução CNJ 80/2009, art. 1º).

21. É de destacar, no ponto, que a própria Resolução CNJ nº 80/2009 ressalvou expressamente a situação dos titulares de serventias investidos mediante concurso de remoção, realizado por meio de simples prova de títulos, no período entre a vigência da Lei nº 10.506/2002 e a publicação de referida Resolução. Confira-se:

“Resolução CNJ nº 80/2009

…...................................................................................................

Art. 4º. (…)

…...................................................................................................

Parágrafo Único – Excluem-se das disposições de vacância do caput do art. 1º desta Resolução as unidades dos serviços de notas e registro cujos notários e oficiais de registro:

…...................................................................................................

c) foram aprovados em concurso de títulos para remoção concluídos, com a publicação da relação dos aprovados, desde a vigência da Lei n. 10.506 de 09 de julho de 2002, que deu nova redação ao artigo 16 da Lei n. 8.935/1994, até a publicação desta Resolução em sessão plenária pública, ressalvando-se eventual modulação temporal em sentido diverso quando do julgamento da Ação Declaratória de Constitucionalidade n. 14 pelo C. Supremo Tribunal Federal.”

22. Como se vê, o Conselho Nacional de Justiça deliberou pela tutela da confiança e da boa-fé dos titulares de serventias extrajudiciais que participaram dos concursos de remoção realizados pelos Tribunais de Justiça estaduais com base nas regras previstas na Lei n. 10.506/2002, cuja constitucionalidade, até a edição da Resolução nº 80/2009, não havia ainda sido ainda infirmada por esta Suprema Corte ou pelo próprio Conselho Nacional de Justiça.

(...)

Conclusão

26. Ante o exposto, conheço da ação declaratória de constitucionalidade e julgo improcedente o pedido, declarando, em consequência, a inconstitucionalidade do art. 16 da Lei nº 8.935/94, na redação dada pela Lei nº 10.506/2002.

Quanto à modulação dos efeitos da decisão, reajusto o voto anteriormente proferido, para, acompanhando o Ministro Gilmar Mendes, estabelecer “a validade das remoções realizadas com base na norma declarada inconstitucional, quando precedidas de concursos públicos exclusivamente de títulos iniciados e concluídos, com a publicação da relação dos aprovados, no período compreendido entre a entrada em vigor da Lei 10.506/2002 (9.7.2002) e a edição da Resolução CNJ 81/2009 (9.6.2009)”.

É como voto.

(STF. ADC 14, Relator(a): ROSA WEBER, Tribunal Pleno, julgado em 04/09/2023, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-s/n  DIVULG 19-09-2023  PUBLIC 20-09-2023).

Compulsando-se os autos, observa-se que o Edital n. 1, que disciplinou o Concurso de Remoção mediante prova exclusivamente de títulos a que alude a requerente, foi publicado em 11/5/2009 (Id 4845336), a Sessão Pública de escolha da serventia foi realizada no dia 13/8/2009 e os resultados foram publicados no diário oficial em 21/8/2009 (Id 4845332).

Constata-se, pois, que o concurso de remoção em discussão, promovido pelo TJES no ano de 2009, não se amolda aos critérios de modulação de efeitos estabelecidos pelo STF no julgamento da ADC 14.

Com efeito, apenas foram validadas as remoções realizadas com base na norma declarada inconstitucional que estavam perfectibilizadas em 09/06/2009, data da edição da Resolução CNJ 81/2009.

Assim, tendo em vista que a requerente pretende a reabertura da audiência de escolha – resultante de concurso de remoção amparado apenas em prova de títulos - do Ofício de Registro Civil e Tabelionato de Goiabeiras ocorrida em 13/8/2009, data posterior ao marco temporal fixado na modulação dos efeitos estabelecidos pelo STF no julgamento da ADC 14, deve ser reconhecida a perda superveniente do objeto do presente procedimento, pois a discussão jurídica proposta pela requerente não é mais factível, dada a inconstitucionalidade do referido certame.

Por todo o exposto, dada a perda superveniente do objeto, diante da existência de fato novo extintivo do direito pleiteado, bem como em razão da existência de coisa julgada administrativa - a impedir que o CNJ faça suas decisões retroagirem no tempo para satisfazer requerimento extemporâneo de interessado que não se valeu da via administrativa ou judicial no momento oportuno -, julgo improcedentes os pedidos formulados e determino o ARQUIVAMENTO do presente procedimento por decisão monocrática, nos termos do inciso X do artigo 25 do Regimento Interno do Conselho Nacional de Justiça. 

Ante essas razões que levaram à improcedência dos pedidos da ora recorrente, é importante consignar a posição do Plenário do CNJ no sentido de que a mera repetição de argumentos expostos na inicial e refutados na decisão monocrática não autoriza a reforma do julgado, in verbis:

RECURSO ADMINISTRATIVO. PEDIDO DE PROVIDÊNCIAS. REPETIÇÃO DOS ARGUMENTOS CONTIDOS NO REQUERIMENTO INICIAL. AUSÊNCIA DE FATOS NOVOS. INOVAÇÃO DO PEDIDO EM SEDE RECURSAL. RECURSO CONHECIDO E NÃO PROVIDO.

1. Recurso administrativo no qual se pretende a reforma da decisão terminativa que julgou os pedidos improcedentes ao não reconhecer a ilegalidade de dispositivos constantes na Resolução nº 5, de 19 de junho de 2019, do Tribunal de Justiça do Pará, que regulamentou a remoção dos servidores do Poder Judiciário do Estado.

2. A repetição de argumentos expostos na inicial e refutados na monocrática não autorizam a reforma do julgado.

3. Em que pese constituir ampliação do objeto, a referência de que a norma combatida resultaria em convocação deficitária dos cotistas não se confirma, pois, as informações constantes no sítio do Tribunal demonstram que as nomeações dos aprovados têm observado a ordem de classificação nas cotas para negros e para pessoas com deficiência, de modo a lhes permitir o ingresso no serviço público.

4. Recurso conhecido e não provido.

(CNJ – PP – Pedido de Providências nº 0008469-64.2020.2.00.0000 – Rel. TANIA REGINA SILVA RECKZIEGEL – 94ª Sessão Ordináriaª Sessão – j. 08.10.2021)” (Grifo nosso)

De outro lado, os argumentos trazidos em sede recursal sobre a coisa julgada administrativa e à perda superveniente do objeto também não convencem.

Primeiro, porque, em relação à alegada nova causa de pedir calcada na declaração pelo STF de inconstitucionalidade da Resolução nº 14/2008/TJES, não se pode ignorar que a própria recorrente reconhece que desistiu de concorrer à titularidade do Registro Civil do Distrito de Goiabeiras (Vitória-ES), para aguardar decisão do Supremo Tribunal Federal acerca da disponibilidade do 2º Tabelionato de Vila Velha-ES.

Ante a resignação dos candidatos em disputa, a recorrente também lembrou que a Corregedoria Geral de Justiça do TJES (CGJ-ES) publicou o Edital n 43/2009, com a retirada do Tabelionato do Distrito de Goiabeiras (Vitória-ES), criado a partir do desmembramento levado a efeito pela Resolução nº 14/2008 do certame aberto pelo Edital nº 01/2009, em razão de decisão judicial do Supremo Tribunal Federal, no MS 27.739/DF.

Por ambos os motivos, não existiria a mínima possibilidade de deferir o pedido de reabertura da sessão de escolha de serventia que não foi sequer objeto do concurso de remoção, vindo a ser provido posteriormente, em novo concurso, aberto pelo Edital nº 01/2013.

Ademais, na modulação dos efeitos do acórdão proferido na ADI nº 5.681/ES, cuja eficácia é imediata e dispensa aguardar o julgamento de eventuais embargos de declaração, ficou claro que o STF manteve os efeitos produzidos pela Resolução nº 14/2008 do TJES.

De fato, o acórdão proferido na ADI 5681 manteve até 03/12/2021 os efeitos dos atos praticados sob a égide do ato administrativo declarado inconstitucional, para que o Estado do Espírito Santo, por iniciativa do TJES, tivesse tempo de aprovar e promulgar lei que disciplinasse e convalidasse a situação das serventias – ainda vagas – sob pena de que voltassem ao estado anterior.

A Assembleia Legislava do Espírito Santo aprovou o que veio a ser a Lei estadual nº 11.438/2021, sem dispor sobre a desanexação dos serviços de Registro Civil de Pessoas Naturais e de Tabelionato do Distrito de Goiabeiras, Vitória, Capital, de modo que o serviço retornou ao status quo ante disciplinado pela Lei estadual nº 3.526/1982, não havendo de se falar em ilegalidade ou maior retroação dos efeitos do julgado do STF, por mera conveniência da recorrente.

Justamente em decorrência da preservação dos atos praticados pelo TJES, em especial aqueles relativos à escolha e à delegação do atual Registro Civil de Pessoas Naturais e de Tabelionato do Distrito de Goiabeiras (Vitória-ES), na linha do quanto decidido nos autos do PCA 0009291-24.2018.2.00.000 deste CNJ, não se pode mais falar em desconstituição das outorgas de delegação contempladas pelo Edital nº 01/2013 e possibilidade de reabertura do certame de 2009, máxime porque isso contrariaria a determinação da conservação dos atos administrativos, conforme decidido pelo STF.

De fato, aceitar a pretensão da recorrente implicaria não apenas na violação da coisa julgada administrativa, como também na modificação da classificação do referido concurso e, por consequência, na anulação dos atos de delegação dos serviços notariais e de registro realizados ao longo de mais de uma década, inclusive com interferência nos atos de delegações provenientes da realização de concursos posteriores, em afronta, mais uma vez, aos princípios da segurança jurídica e da confiança legítima.

Reitera-se, portanto, o entendimento dos julgados no sentido de que o CNJ não pode fazer as suas decisões retroagirem no tempo para satisfazer requerimento extemporâneo de interessado que não se valeu da via administrativa ou judicial no momento oportuno.

Enfim, quanto à perda superveniente do objeto, com base no teor do julgamento da ADC nº 14/DF e diante de todas as considerações anteriores, cuidou-se tão somente de reforço argumentativo, de modo que a oposição ou o julgamento dos embargos de declaração da ANOREG/BR absolutamente não interferirá nas conclusões da decisão recorrida.

Diante disso, até considerando a eficácia das decisões proferidas e os efeitos da oposição de embargados de declaração em sede de controle concentrado de constitucionalidade, no caso, não existe qualquer causa heterônoma relevante que justifique a suspensão do julgamento deste processo.

Afinal, ao lado de tudo aquilo anteriormente exposto, a pretensão da recorrente mais uma vez consiste na reabertura de um concurso de remoção em desacordo com os parâmetros de constitucionalidade estabelecidos pelo STF no julgamento da ADC 14/DF, em 04/09/2023.

Assim, conheço do recurso interposto, vez que cabível e tempestivo, e, no mérito, nego-lhe provimento.

É como voto.

Após as comunicações de praxe, arquivem-se.

 

Conselheiro Marcello Terto e Silva

Relator



[1] Assim, com fundamento no art. 27 da Lei n. 9.868/1999, proponho a modulação temporal dos efeitos da declaração de inconstitucionalidade, estabelecendo o prazo de doze meses a contar da data de publicação da ata de julgamento para ser regularizada por lei, se for a decisão política estadual, a situação das serventias ou voltar-se, então, ao estado anterior.