Conselho Nacional de Justiça

Gabinete da Conselheira Jane Granzoto

 

Autos: PROCEDIMENTO DE CONTROLE ADMINISTRATIVO - 0000601-30.2023.2.00.0000
Requerente: ANA ELIZA COELHO SOBRAL
Requerido: TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SANTA CATARINA - TJSC

                              

EMENTA: PROCEDIMENTO DE CONTROLE ADMINISTRATIVO. CONCURSO PÚBLICO PARA O INGRESSO, POR PROVIMENTO OU REMOÇÃO, NA ATIVIDADE NOTARIAL E DE REGISTRO NO ESTADO DE SANTA CATARINA. RESOLUÇÃO CNJ Nº 478/2022 QUE ALTEROU A RESOLUÇÃO CNJ Nº 81/2009. REPUBLICAÇÃO DE EDITAL. RETIFICAÇÃO DO ATO CORRESPONDENTE À MENS LEGIS. RESERVA DE VAGAS PARA PESSOAS COM DEFICIÊNCIA. APLICAÇÃO DO PERCENTUAL DE 5% SOBRE CADA UMA DAS TRÊS CLASSES DE FATURAMENTO DE SERVENTIAS QUE NÃO RESULTOU EM NÚMERO SUFICIENTE PARA DESTINAR VAGAS NO CONCURSO A PESSOAS COM DEFICIÊNCIA. AUSÊNCIA DE ILEGALIDADE. IMPROCEDÊNCIA DO PEDIDO. PROPOSTA DE ALTERAÇÃO DA RESOLUÇÃO CNJ Nº 81/2009.

1. Procedimento de Controle Administrativo no qual se almeja a republicação do edital do concurso para ingresso na atividade notarial e de registro, promovido pelo Tribunal de Justiça de Santa Catarina (edital nº 1/2023), sob a alegação de o certame não ter previsto a reserva de vagas para pessoas com deficiência, bem assim por ter descumprido determinação constante na Resolução CNJ nº 478/2022, que alterou a Resolução CNJ nº 81/2009.

2.  O artigo 3º da nova Resolução, ao estabelecer a necessidade de republicação dos editais dos certames suspensos, ainda na fase preliminar de inscrição, objetivou conferir ampla divulgação sobre eventuais modificações ocorridas quanto à incorporação das novas regras estabelecidas.

3. Retificação do edital que atende a mens legis.

4. Aplicado o percentual de 5% sobre a quantidade de unidades vagas dentro de cada uma das 3 (três) classes de faturamento, sob a luz das inovações trazidas pela Resolução CNJ nº 478/2022, o resultado da operação não alcançou valor suficiente para destinar vagas às pessoas com deficiência.

5. O arrendamento das frações resultantes da aplicação do referido percentual, neste caso, desvirtuaria o intuito da ação afirmativa ao reservar quantidade de vagas em patamares superiores aos previstos na legislação de regência e, no caso em apreço, a depender da classe de faturamento, poderia destinar até 50% destas aos(às) cotistas, hipótese rechaçada pela jurisprudência dos Tribunais Superiores.

6. Pedido julgado improcedente.

7. Proposta de alteração da Resolução CNJ nº 81/2009.

 

 ACÓRDÃO

Após o voto do Conselheiro Vistor, o Conselho, por maioria, julgou improcedente o pedido, nos termos do voto da Relatora, aprovando nova alteração na Resolução CNJ 81/2009. Vencidos os Conselheiros Mário Goulart Maia, Sidney Madruga, Marcos Vinícius Jardim Rodrigues e Marcello Terto. Votou a Presidente. Ausentes, circunstancialmente, os Conselheiros João Paulo Schoucair e Luiz Fernando Bandeira de Mello. Presidiu o julgamento a Ministra Rosa Weber. Plenário, 20 de junho de 2023. Presentes à sessão os Excelentíssimos Senhores Conselheiros Rosa Weber, Luis Felipe Salomão, Vieira de Mello Filho, Mauro Pereira Martins, Salise Sanchotene, Jane Granzoto, Richard Pae Kim, Marcio Luiz Freitas, Giovanni Olsson, Sidney Madruga, João Paulo Schoucair, Marcos Vinícius Jardim Rodrigues, Marcello Terto, Mário Goulart Maia e Luiz Fernando Bandeira de Mello.

Conselho Nacional de Justiça

Gabinete da Conselheira Jane Granzoto

Autos: PROCEDIMENTO DE CONTROLE ADMINISTRATIVO - 0000601-30.2023.2.00.0000
Requerente: ANA ELIZA COELHO SOBRAL
Requerido: TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SANTA CATARINA - TJSC


 

RELATÓRIO

 

A SENHORA CONSELHEIRA JANE GRANZOTO (RELATORA): Trata-se de Procedimento de Controle Administrativo (PCA) proposto por ANA ELIZA COELHO SOBRAL em desfavor do TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SANTA CATARINA (TJSC) no qual foi requerida a republicação do edital do concurso público para ingresso, por provimento ou remoção, na atividade notarial e de registro no Estado de Santa Catarina (Edital 1/2023).

A requerente entende pela necessidade de se republicar o edital do certame em face do disposto na Resolução CNJ nº 478, de 27 de outubro de 2022, norma que alterou dispositivos da Resolução CNJ nº 81, de 9 de junho de 2009, bem como determinou a republicação dos editais de concursos suspensos na fase de inscrição preliminar.

Afirma que a comissão do concurso retificou o edital ao invés de republicá-lo, acarretando prejuízos significativos aos futuros candidatos e à Administração Pública, já que esta deverá realizar nova seleção para ofertar as serventias que vagaram após a publicação do ato (junho de 2022).

A requerente ainda se insurge contra a ausência de reserva de vagas para pessoas com deficiência no aludido concurso. Assinalou que o Tribunal justificou a conduta no fato de que a aplicação do percentual de 5% não resultou em coeficiente mínimo em quaisquer das modalidades de ingresso (provimento ou remoção).

Argumenta que a Lei Estadual nº 17.292, de 8 de outubro de 2017, e o Decreto 9.508, de 24 de setembro de 2018, determinam o arredondamento para o número imediatamente subsequente quando o percentual de vagas destinado às pessoas com deficiência for número fracionado e por isso defende a aplicação da citada legislação ao caso em comento.

Registra que a retificação do edital do concurso público não contemplou todas as serventias vagas e que a regra do §3º do artigo 1º da Resolução CNJ 81/2009 é aplicável apenas à cota de candidatos afrodescendentes.

Requer, caso o TJSC não republique o Edital nº 1/2023 de ofício, a concessão de liminar para suspender o certame até o julgamento deste procedimento. No mérito, pede que seja determinada a republicação do instrumento convocatório, com inclusão de todas as serventias vagas e que seja aplicado o arredondamento para o número imediatamente superior na hipótese de a reserva de vagas às pessoas com deficiência resultar em número fracionado.

Em informações preliminares (Id. 5024658), o Tribunal catarinense afirma que o concurso público para outorga de delegações de notas e de registro foi iniciado por determinação do Conselho Nacional de Justiça no PCA nº 0006089-68.2020.2.00.0000. Registra que, após formalizado o contrato com o Centro Brasileiro de Pesquisa em Avaliação e Seleção e de Promoção de Eventos (CEBRASPE), foi deferida liminar no PCA nº 0003154-84.2022.2.00.0000 para suspensão do certame, fato que ocorreu antes do início da fase de inscrições preliminares.

 Assinala que, após a retomada do concurso público, em cumprimento à Resolução CNJ nº 478, de 27 de outubro de 2022, foi realizado novo sorteio para vagas destinadas aos candidatos autodeclarados negros e às pessoas com deficiência, considerando cada uma das faixas de arrecadação das serventias ofertadas.

No entanto, alega que a aplicação do percentual destinado às pessoas com deficiência, na forma prevista pela Resolução CNJ nº 478/2022, resultaria em número inferior a 0,5 (cinco décimos) e não foi atingido o mínimo necessário para arredondamento. Defendeu a inaplicabilidade da Lei Estadual 17.292/2017 pelo fato de a legislação ser destinada ao provimento de cargos e empregos públicos, situação diversa da outorga de delegações.

Argumenta que a retificação do edital do concurso público contemplou e deu publicidade a todas as alterações promovidas na Resolução CNJ nº 81/2009 e que a republicação do instrumento convocatório demandaria a repetição de fases já exauridas com o dispêndio inesperado de recursos públicos.

Além disso, aponta a inexistência de prejuízos para os candidatos inscritos no certame.

O TJSC ressalta que as medidas adotadas foram pautadas pela razoabilidade, eficiência, conveniência e oportunidade. Frisou não haver fundamento legal para inclusão no concurso público de serventias que vagaram após a publicação do edital de abertura.

Após as informações, a requerente se manifestou nos autos refutando as alegações do TJSC (Id5024710).

Ausentes os pressupostos para a concessão da medida cautelar, o pedido foi por mim indeferido (Id. 5030095).

É o relatório.

 

 

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Autos: PROCEDIMENTO DE CONTROLE ADMINISTRATIVO - 0000601-30.2023.2.00.0000
Requerente: ANA ELIZA COELHO SOBRAL
Requerido: TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SANTA CATARINA - TJSC

 

 

VOTO

 

A SENHORA CONSELHEIRA JANE GRANZOTO (RELATORA): A requerente almeja a republicação do edital do concurso para ingresso na atividade notarial e de registro, promovido pelo Tribunal de Justiça de Santa Catarina (edital nº 1/2023), sob a alegação de o concurso não ter previsto a reserva de vagas para pessoas com deficiência, bem assim por ter descumprido determinação disposta na Resolução CNJ nº 478/2022, que alterou a Resolução CNJ nº 81/2009, a qual dispôs sobre os concursos públicos de provas e títulos, para a outorga das Delegações de Notas e de Registro, com minuta de edital.

Passo então a analisar o mérito e a primeira insurgência relativa à (des)necessidade de republicação do edital.

 

Da republicação do edital

Antes de examinar a presente  alegação, cabe uma pequena explanação dos fatos que motivaram a deflagração do concurso.

Em 10 de agosto de 2021 foi proposto neste Conselho o PCA nº 0006089-34.2021.2.00.0000, no qual se pleiteou a inclusão de serventias vagas em concurso em andamento, deflagrado no ano de 2020 pela Corte Catarinense,  mas suspenso por força das medidas de restrições sanitárias impostas pela pandemia de Covid-19.

Ao final, o relator, o e. Conselheiro Luiz Fernando Bandeira de Mello, julgou o pedido improcedente, mas ordenou ao Tribunal requerido que publicasse, no prazo de 180 (cento e oitenta) dias, novo edital ofertando as serventias então vagas.

Objetivando cumprir a determinação, o TJSC contratou a empresa especializada Cebraspe para lançamento do edital, cujo projeto básico foi também impugnado neste Conselho, sob os termos propostos no PCA nº 0003154-84.2022.2.00.0000, de relatoria da e. Conselheira Salise Sanchotene. Sustentava-se, sob os auspícios de regra revogada, o § 6º, do art. 1º, da Resolução CNJ nº 81/2009[1], a impossibilidade de delegação da responsabilidade pela realização do concurso à instituição privada.

Assim, foi concedida medida cautelar que suspendeu o contrato e, como consequência, o concurso público regido pelo Edital nº 15/2022:

*Extraído da página do TJSC:

http://www2.tjsc.jus.br/web/concursos/notarial-e-registral/edital-015-2022/suspensao-temporaria.pdf

 

Entretanto, no curso do PCA nº 0003154-84.2022.2.00.0000 e enquanto suspenso o certame, sobrevieram alterações na Resolução CNJ nº 81/2009, promovidas pela Resolução CNJ nº 478/2022, que levaram a relatora a julgar o pedido prejudicado em razão da superveniência da nova norma e por consectário lógico, revogou-se a liminar.

Com a continuidade da seleção pública, o instrumento convocatório precisou ser adaptado às novas regras, e em 20 de janeiro de 2023, o TJSC retificou o anexo que integrou o edital nº 1/2023 para informar sobre o resultado do novo sorteio das serventias reservadas aos(às) candidatos(as) negros(as) e às pessoas com deficiência (Id. 5024718).

Desta retificação se insurge a requerente, já que não houve a republicação do ato, assim como previsto no art. 3º, da novel Resolução CNJ nº 478/2022:

 

Art. 3º Esta Resolução entra em vigor na data de sua publicação, aplicando-se aos concursos cujos editais ainda não tenham sido publicados ou que estejam suspensos, por qualquer motivo, na fase preliminar de inscrição, devendo o edital ser republicado em cumprimento às novas regras, se for o caso.

 

Com efeito, a terminologia disposta no artigo, “republicação”, deve ser entendida como determinação dirigida aos tribunais para que deem ampla divulgação sobre eventuais modificações ocorridas nos editais dos certames suspensos, ainda na fase preliminar de inscrição, após a edição da Resolução CNJ nº 478/2022. O objetivo da medida foi ajustar as regras do concurso aos ditames da nova norma deste Conselho, o que foi plenamente atendido com a retificação (Id. 5024718). 

Assim, o fato de o Tribunal catarinense ter utilizado o termo “retificar” não acarreta maiores consequências, já que a mens legis foi alcançada e resguardou a segurança jurídica esperada de toda e qualquer seleção pública.

Além disso, a cláusula “se for o caso” aposta no final do artigo, ainda flexibilizou o comando e submeteu à comissão do concurso a análise da conveniência de se republicar o ato inaugural, caso este não estivesse emoldurado conforme os termos da nova Resolução.

Outrossim, o encargo financeiro que poderia ser imposto ao TJSC, caso o contrato firmado com o Centro Brasileiro de Pesquisa em Avaliação e Seleção e de Promoção de Eventos (Cebraspe) fosse cancelado, acarretaria à Corte um inesperado aumento de despesa, da ordem de R$ 92.570,48 (Id. 5024721).

É da iterativa jurisprudência deste Conselho que as medidas aqui determinadas não podem impor ônus financeiro aos tribunais, sob pena de indevida ingerência na administração do orçamento destes, salvo nas hipóteses de manifesta ilegalidade:

RECURSO ADMINISTRATIVO. PEDIDO DE PROVIDÊNCIAS. TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO CEARÁ. SINDICATO DOS OFICIAIS DE JUSTIÇA DO CEARÁ. PRETENSÃO DE QUE SEJA IMPOSTA AO TRIBUNAL A REGULAMENTAÇÃO DE VERBA INDENIZATÓRIA. NOTÓRIA INTENÇÃO DE SE ALCANÇAR INCREMENTO REMUNERATÓRIO. INTERESSE INDIVIDUAL. IMPOSSIBILIDADE DE ATUAÇÃO DO CNJ. AUTONOMIA DO TRIBUNAL. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO.

1. Recurso administrativo contra decisão que não conheceu dos pedidos de que o CNJ interviesse na organização do Tribunal de Justiça do Estado do Ceará, para manter a vinculação dos oficiais de justiça à comarca de lotação originária, ou impusesse àquela Corte a regulamentação de suposta indenização por alegado acúmulo de função.

2. Tratando-se de demanda que tem a clara intenção de utilizar este Conselho como via para alcançar reajuste remuneratório, há que se reconhecer o caráter individual da pretensão. Precedentes.

3. O CNJ já assentou, em mais de uma oportunidade, que descabe a este Órgão ingerir na autonomia financeira dos tribunais (arts. 96 e 99 da CF/1988), sobretudo para lhes impor aumento de despesa ou para avaliar valores pagos a título de indenização.

4. Ausência de elementos ou fatos novos hábeis a reformar a decisão combatida.

5. Recurso conhecido, porém, no mérito, desprovido.

(CNJ - RA – Recurso Administrativo em PP - Pedido de Providências - Conselheiro - 0009156-07.2021.2.00.0000 - Rel. MAURO PEREIRA MARTINS - 107ª Sessão Virtual - julgado em 10/06/2022).

 

Lado outro, com a retificação do edital, não se autoriza a inclusão no certame de novas serventias vagas, por expressa vedação normativa constante no artigo 11, da Resolução CNJ nº 81/2009[2].

E não se olvide que, assim como dito, a abertura do concurso inaugurado pelo ato ora combatido decorreu de determinação do e. Conselheiro Luiz Fernando Bandeira de Mello, relator do PCA nº 0006089-34.2021.2.00.0000[3]. Eventual deliberação contrária poderia tangenciar a coisa julgada administrativa e comprometer a segurança dos pronunciamentos deste Conselho, hipótese não admitida pela jurisprudência:

RECURSO ADMINISTRATIVO. INTERESSE INDIVIDUAL. TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DA BAHIA. DECISÃO ADMINISTRATIVA. AUSÊNCIA DE FATO NOVO. IMPOSSIBILIDADE DE REVISÃO. RECURSO CONHECIDO E NÃO PROVIDO.

1 – Matéria anteriormente decidida. Coisa julgada administrativa.

2 – Não se admite a reiteração de pedidos já apreciados pelo Conselho, sem apresentação de fatos novos, tendo em vista a incidência da coisa julgada administrativa. Precedentes.

3 – Recurso conhecido e, no mérito, não provido.

(CNJ - RA – Recurso Administrativo em PP - Pedido de Providências - Conselheiro - 0001767-34.2022.2.00.0000 - Rel.  MARCIO LUIZ FREITAS - 113ª Sessão Virtual - julgado em 14/10/2022). (Destaquei)

 

Da reserva de vagas às pessoas com deficiência 

 

Ainda sob o pálio da regra anterior, antes, portanto, da edição da Resolução CNJ nº 478/2022, o edital de abertura do concurso havia destinado às pessoas com deficiência 1 (uma) vaga (Id. 5024661).

Com a nova regra, fez-se necessária a adaptação do instrumento convocatório, que não destinou vagas às pessoas com deficiência, nos seguintes termos (Id. 5024718):

 

Sobre isso, a requerente sustenta o desacerto da medida e defende a aplicação da Lei Estadual nº 17.292/2017[4] e do Decreto nº 9.508/2018[5], que determinam o arredondamento para o número imediatamente subsequente quando o percentual de vagas destinado às pessoas com deficiência for número fracionado.

Nessa esteira, a primeira análise sobre a questão perpassa pelas disposições da Resolução CNJ nº 81/2009, após as alterações realizadas pela de nº 478/2022, que assim dispôs:

2.4. Após a divisão das serventias vagas em 3 (três) classes, por faixa de faturamento, na forma do Anexo do Provimento n. 74/2018 da Corregedoria Nacional de Justiça, será realizado o sorteio das serventias reservadas aos candidatos com deficiência e aos negros, devendo haver a indicação da data e do local de realização de sorteio público.

2.5. As pessoas com deficiência poderão concorrer às serventias especialmente reservadas aos candidatos com deficiência, que totalizarão 5% (cinco por cento) das serventias oferecidas no Edital.

 

Na publicação inaugural, a regra vigente era a que estabelecia a reserva de 5% do montante global das serventias vagas, e por isso, houve a destinação de 1 (uma) delas para a referida cota (Id. 5024661):


Advinda a Resolução CNJ nº 478/2022, a aplicação desse percentual passou a incidir sobre a quantidade de unidades vagas dentro de cada uma das 3 (três) classes de faturamento. Assim feito, em nenhuma delas o resultado da operação alcançou valor suficiente para destinar vagas à referida cota (Id. 5024658):

                    De fato, a consulta ao voto que deu origem à nova norma, o Ato nº 0002238-50.2022.2.00.0000, dissipa qualquer dúvida interpretativa quanto à aplicação da reserva de vagas após a divisão das vagas por faixa de renda, confira: 

 

2.6 O sorteio das serventias vagas reservadas aos candidatos negros e com deficiência 

Como sabido, as serventias ofertadas nos concursos são ordenadas cronologicamente por data de vacância, em decorrência da extinção da delegação prevista no art. 39 da Lei n. 8935/1994, conforme disposto no item 2.1.3 da minuta de edital anexo à Resolução CNJ n. 81. 

Após, procede-se à reserva de 5% das serventias destinadas aos deficientes e 20% aos cotistas negros, na forma dos itens 2.1.4 e 2.1.4A, por meio de sorteio. 

Apesar de o critério utilizado para a escolha das serventias extrajudiciais reservadas fundar-se no princípio da impessoalidade, a experiência acabou por revelar a possibilidade de utilização de critérios conjugados mais justos para o acesso de cotistas e deficientes. 

Após um amplo debate havido no âmbito da Comissão de Eficiência Operacional, Infraestrutura e Gestão de Pessoas, propõe-se que o sorteio das serventias destacadas para a concorrência de cotistas e deficientes só ocorra após a organização das serventias vagas por classes a partir de faixas de faturamento. A ideia foi inspirada no Anexo do Provimento n. 74/2018, da Corregedoria Nacional de Justiça, que organiza 3 classes de serventias extrajudiciais a partir de valores fixos, como os a seguir transcritos: 

 

 

 

Organizadas as serventias a partir dos critérios descritos, somente após passa-se à realização do sorteio das vagas reservadas em cada uma das classes, observando-se, obviamente, os limites legais de percentuais de reserva. 

 Importante consignar que levantamento feito no Justiça Aberta, base de dados deste Conselho que armazena informações sobre a renda das serventias extrajudiciais, informações cadastrais, situação jurídica, unidades interligadas, dentre outros de interesse do Poder Judiciário e da sociedade em geral, denota que há uma distribuição equânime das serventias extrajudiciais brasileiras nas três classes, nos seguintes termos: 

 

 

 

Com a nova sistemática, assegura-se o acesso de cotistas e deficientes a serventias de todas as classes, potencializando a maximização dos efeitos da norma que instituiu as respectivas ações afirmativas. 

Ainda que a aplicação da norma instituidora da ação afirmativa implique o sacrifício pessoal ou de um pequeno grupo, o fim perseguido é o efeito positivo para toda a coletividade, como o aumento da representatividade de extratos sociais até então relegados a segundo plano, quando não esquecidos. (Destaquei) 

Ante o exposto, propõe-se a inclusão do §4º no art. 3º, assim como alteração dos itens correspondentes na minuta do edital (grifos acrescidos): 

Art. 3º (...) 

§4º O critério de escolha das serventias reservadas aos candidatos negros e com deficiência será o sorteio, após a divisão das serventias vagas em 3 classes, por faixa de faturamento, na forma do Anexo do Provimento n. 74/2018 da Corregedoria Nacional de Justiça. 

Minuta do Edital: 

2.1.4 As pessoas com deficiência poderão concorrer às serventias que lhes forem especialmente reservadas, que totalizarão 5% (cinco por cento) das serventias oferecidas no Edital.  A cada vinte vagas o edital reservará uma para provimento pelas pessoas com deficiência e indicará a data e local de realização de sorteio público das serventias destinadas a estes candidatos, dentre todas as serventias oferecidas no concurso. 

(...) 

2.1.4.B Após a divisão das serventias vagas em 3 classes, por faixa de faturamento, na forma do Anexo do Provimento n. 74/2018 da Corregedoria Nacional de Justiça, será realizado o sorteio das serventias reservadas aos candidatos com deficiência e aos negros, em cada faixa de faturamento, devendo haver a indicação da data e do local de realização de sorteio público. 

2.1.4.1 Uma vez reservadas as serventias que serão ofertadas às pessoas com deficiência e aos negros, na forma do item 2.1.4.B, todas as demais serventias serão ofertadas àqueles que preencherem os requisitos legais para ingresso ou remoção. 

 

 

Lado outro, se a pretensão da requerente fosse acolhida, de se aplicar a legislação estadual nº 17.292/2017 e o Decreto nº 9.508/2018 que determinam o arrendamento para o número imediatamente subsequente quando o resultado da aplicação do percentual de vagas destinado às pessoas com deficiência for número fracionado, haveria verdadeiro desvirtuamento da ação afirmativa.

A título de exemplo, no quadro acima apresentado pelo TJSC, na classe 1, na modalidade provimento, há apenas 2 (dois) cartórios foram ofertados. Considerando que o produto da aplicação do percentual de 5% sobre essas vagas resulta em 0,1 (um décimo), com o arredondamento pretendido pela requerente para o número inteiro subsequente, 1 (uma) vaga deveria ser concedida às pessoas com deficiência e a outra à ampla concorrência. Observe que essa operação contemplaria a ação afirmativa com 50% das vagas, percentual muito além do previsto na legislação de regência que lhes destina 5% do total das serventias (item 2.5 da minuta de edital da Resolução CNJ nº 81/2009).

Afastada a ilegalidade aventada, a ausência de vagas para pessoas com deficiência decorre da lógica do instituto e encontra respaldo na jurisprudência construída no âmbito da Suprema Corte e do Superior Tribunal de Justiça.

De fato, para o Supremo Tribunal Federal (STF), não se faz possível o arredondamento das frações obtidas com a aplicação do percentual quando o resultado ultrapassar os limites mínimos e máximos previstos na lei:

CONCURSO PÚBLICO - CANDIDATOS - TRATAMENTO IGUALITÁRIO. A regra é a participação dos candidatos, no concurso público, em igualdade de condições. CONCURSO PÚBLICO - RESERVA DE VAGAS - PORTADOR DE DEFICIÊNCIA - DISCIPLINA E VIABILIDADE. Por encerrar exceção, a reserva de vagas para portadores de deficiência faz-se nos limites da lei e na medida da viabilidade consideradas as existentes, afastada a possibilidade de, mediante arredondamento, majorarem-se as percentagens mínima e máxima previstas.

(MS 26310, Relator(a): MARCO AURÉLIO, Tribunal Pleno, julgado em 20/09/2007, DJe-134 DIVULG 30-10-2007  PUBLIC 31-10-2007 DJ 31-10-2007  PP-00078  EMENT VOL-02296-01  PP-00071 RTJ VOL-00202-03 PP-01134 RB v. 19, n. 529, 2007, p. 34-36)

 

Na linha do destacado, e na proporção das distinções entre as regras incidentes para a ocupação de cargos/empregos públicos e para a outorga das delegações por pessoas com deficiência, no julgamento do RE nº 1.367.352, da lavra do e. Ministro Dias Toffoli e realizado no ano de 2022, observa-se a higidez da jurisprudência de não se admitir o arrendamento de frações caso seja ultrapassado o limite legal estabelecido:

EMENTA Agravo regimental em recurso extraordinário. Direito Administrativo. Concurso público. Portadores de necessidades especiais. Reserva de vagas. Precedentes. 1. A orientação da jurisprudência do Supremo Tribunal Federal é que a reserva de vagas para portadores de deficiência deve se ater aos limites da lei, na medida da viabilidade das vagas oferecidas, não sendo possível, assim, seu arredondamento no caso de majoração das porcentagens mínima e máxima previstas. Precedentes. 2. Agravo regimental não provido.

(RE 1367352 AgR, Relator(a): DIAS TOFFOLI, Primeira Turma, julgado em 30/05/2022, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-126  DIVULG 28-06-2022  PUBLIC 29-06-2022)

 

Nessa conformidade, a mesma orientação é colhida do seguinte julgado do Superior Tribunal de Justiça ao examinar semelhante situação:

 

RECURSO ESPECIAL. ADMINISTRATIVO. CONCURSO PÚBLICO. RESERVA DE VAGAS A PORTADORES DE DEFICIÊNCIA. LIMITES MÍNIMO E MÁXIMO FIXADOS, RESPECTIVAMENTE, EM 5 E 20%, PELO DECRETO 3.298/1999 E PELA LEI 8.112/1990. ENTENDIMENTO DA SUPREMA CORTE QUE INDICA A IMPRESCINDIBILIDADE DE PREVALÊNCIA DO LIMITE MÁXIMO DE 20% QUANDO O TOTAL DE VAGAS NÃO PERMITE A OFERTA DE AO MENOS 1 POSTO DE TRABALHO SEM QUE EXTRAPOLE O REFERIDO PERCENTUAL, COMO NO CASO DOS AUTOS. POSIÇÃO À QUAL SE ADERE, DEVENDO, NO ENTANTO, SER OBSERVADA A PROPORÇÃO LEGAL SE SURGIDAS VAGAS SUFICIENTES AO LONGO DO PERÍODO DE VALIDADE DO CERTAME. RECURSO ESPECIAL DA UFRGS PROVIDO.

1. Discute-se nos autos o atendimento à regra de reserva de vagas de concurso público para os portadores de deficiência física, de modo a garantir, na hipótese, a oferta de 1 vaga, do total de 2, para pessoas com essa característica. A parte ré, ora recorrente, assevera que o pleito extrapola o comando legal que exige o máximo de 20% das vagas reservadas, defendendo que o número a ser disponibilizado aos deficientes é em relação ao total de vagas ofertadas no concurso, não para cada cargo.

2. A necessidade de preservação de vagas dirigidas aos candidatos portadores de necessidades especiais adveio com o art. 37, VIII da CF/1988, segundo o qual a lei reservará percentual dos cargos e empregos públicos para as pessoas portadoras de deficiência e definirá os critérios de sua admissão.

3. Com fundamento nessa norma, o Decreto 3.298/1999, em seu art. 37, §§ 1o. e 2o, assegurou à pessoa portadora de deficiência a reserva de percentual mínimo de 5% das vagas oferecidas, elevado até o primeiro número inteiro subsequente quando resultar em valor fracionado.

4. Por sua vez, o art. 5o., § 2o. da Lei 8.112/1990 determina que às pessoas portadoras de deficiência é assegurado o direito de se inscrever em concurso público para provimento de cargo cujas atribuições sejam compatíveis com a deficiência de que são portadoras; para tais pessoas serão reservadas até 20% (vinte por cento) das vagas oferecidas no concurso.

5. Por certo os percentuais acima referidos se referem às vagas em cada cargo, sob pena de permitir situações extremas de oferta de vagas a portadores de necessidades especiais somente para os cargos de menor expressão, deturpando a função da referida política pública de inserção do detentor de deficiência no mercado de trabalho.

Precedente do STF: RMS 25.666/DF, Rel. Min. JOAQUIM BARBOSA, DJe 3.12.2009.

6. A aplicação dos valores mínimos e máximos referidos no Decreto 3.298/1999 e na Lei 8.112/1990 não geram maiores problemas quando relacionados a concursos com número de vagas mais elevado. Por exemplo, para um cargo com 20 vagas, o mínimo seria de 1 posto de trabalho destinado aos portadores de necessidades especiais, e o máximo de 4 vagas. Seria, desse modo, mantida para a livre concorrência o total de 16 vagas.

7. O problema surge para os cargos de menor oferta de vagas, em que a ausência de vagas a PNE's deixaria de observar o percentual do Decreto 3.298/1999, e a sua previsão causaria o transbordamento do máximo de 20% estabelecido na Lei 8.112/1990. A título ilustrativo, seria o que ocorreria na hipótese de um concurso com 3 vagas; a reserva de uma delas, por si só, representaria aproximadamente 33% do total.

8. O tema já foi objeto de debate no Plenário do Supremo Tribunal Federal, na ocasião do julgamento do MS 26.310-5/DF, de relatoria do eminente Ministro MARCO AURÉLIO DE MELLO. Na oportunidade, a Suprema Corte fez prevalecer a necessidade de prestigiar o tratamento igualitário como regra, acima da política pública, quando esta extrapolar o limite máximo do art. 5o., § 2o. da Lei 8.112/1990.

9. Enfrentando hipóteses de concursos cujo edital oferecia apenas 1 vaga para o cargo intentado, esta Corte Superior de Justiça seguiu o posicionamento do STF, afastando a reserva do único posto de trabalho disponível para a concorrência. Citem-se precedentes: RMS 38.595/MG, Rel. Min. MAURO CAMPBELL MARQUES, DJe 12.11.2013; MS 8.417/DF, Rel. Min. PAULO MEDINA, DJ 14.6.2004.

10. A oferta de apenas 2 vagas indica que a reserva de uma delas, de fato, acarretará a desproporção combatida pela jurisprudência dos Tribunais Superiores, sendo certo, porém, que o eventual surgimento de vagas no período de validade do certame, em quantitativo que permita a observância do limite previsto na Lei 8.112/1990, deve garantir a nomeação do candidato PNE's primeiro colocado.

11. Recurso Especial da UFRGS provido, para reconhecer a legalidade da não nomeação do autor, enquanto não surgidas vagas suficientes a garantir que sua posse deixará de ofender o percentual máximo de 20% aos candidatos portadores de deficiência.

(REsp n. 1.483.800/RS, relator Ministro Napoleão Nunes Maia Filho, Primeira Turma, julgado em 27/11/2018, DJe de 6/12/2018.) (Destaquei)



Some-se a isso que, embora os(as) titulares dos cartórios extrajudiciais não sejam servidores públicos na essência do instituto, as ações afirmativas visam conferir igualdade de oportunidades aos(às) que historicamente estiveram em posição de desvantagem social quando comparados com outros grupos. A evolução da Resolução CNJ nº 81/2009 não deixa dúvidas sobre o gradativo progresso das medidas de enfrentamento dessas desigualdades.

Ante o exposto, julgo improcedente o pedido formulado na inicial.

Todavia, diante do caso analisado, que aponta para situação concreta não antevista pelos integrantes do grupo de trabalho que formularam a modificação implementada pela Resolução/CNJ 478, acolho a sugestão exposta no voto convergente do ilustre Conselheiro Luiz Philippe Vieira de Mello Filho, para propor nova alteração na Resolução CNJ 81/2009.

Conforme registrado pelo ilustre Conselheiro, propõe-se a inserção do §4º-A no art. 3º, para, nas hipóteses de concursos públicos de provas e títulos para outorga das Delegações de Notas e de Registro, em que não seja possível destinar pelo menos 1 vaga aos candidatos com deficiência, deixe-se de aplicar a regra contida no §4º do art. 3º, nos seguintes termos:

                        §4º-A A regra do parágrafo antecedente só será aplicada caso haja a destinação de pelo menos 1 (uma) serventia aos candidatos com deficiência e aos cotistas negros, em cada uma das faixas de faturamento.

 

É como voto.

Intimem-se as partes.

Em seguida, arquivem-se os autos, independentemente de nova conclusão.

 

Brasília, data registrada no sistema.

 

JANE GRANZOTO

Conselheira

 

 

ANEXO

 

   Resolução Nº xx, de XX de XX de 2023.

 

Altera a Resolução CNJ nº 81, de 9 de junho de 2009, que dispõe sobre os concursos públicos de provas e títulos, para a outorga das Delegações de Notas e de Registros, e minuta de edital.

 

A PRESIDENTE DO CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA, no uso de suas atribuições legais,

 

CONSIDERANDO o deliberado pelo Plenário do CNJ no PCA nº 0000601-30.2023.2.00.0000, na XX Sessão Ordinária, realizada em XX de ____________ de 2023;

 

RESOLVE:

 

Art. 1º. A Resolução CNJ nº 81/2009 passa a vigorar com a seguinte alteração:

Art. 3º ...............................................................................................................

[...]

§4º-A A regra do parágrafo antecedente só será aplicada caso haja a destinação de pelo menos 1 (uma) serventia aos candidatos com deficiência e aos cotistas negros, em cada uma das faixas de faturamento.

 

Art. 2º. Esta Resolução entra em vigor na data de sua publicação.

 

 Ministra ROSA WEBER

Presidente

 

 

 

[1] § 6º Competem à Comissão Examinadora do Concurso a confecção, aplicação e correção das provas, a apreciação dos recursos, a classificação dos candidatos e demais tarefas para execução do concurso, podendo delegar o auxílio operacional a instituições especializadas.

[2] Art. 11. Publicado o resultado do concurso, os candidatos escolherão, pela ordem de classificação, as delegações vagas que constavam do respectivo edital, vedada a inclusão de novas vagas após a publicação do edital.

[3] [...]

De ofício, determino ao Tribunal de Justiça do Estado de Santa Catarina que, no prazo máximo de 180 (cento e oitenta) dias a contar da publicação desta decisão, comprove nestes autos a publicação de edital de concurso público para oferecimento das serventias atualmente vagas e não oferecidas em concurso, independentemente da conclusão do certame atualmente em curso.

[4] Id 5018041:

Art. 68 [...]

§ 2º Caso a aplicação do percentual de que trata o § 1º deste artigo resulte em número fracionado, este deverá ser elevado até o primeiro número inteiro subsequente.

[5] Art. 1º [...]

§ 3º Na hipótese de o quantitativo a que se referem os § 1º e § 2º resultar em número fracionado, este será aumentado para o primeiro número inteiro subsequente.

 

Autos: 

PROCEDIMENTO DE CONTROLE ADMINISTRATIVO - 0000601-30.2023.2.00.0000 

Requerente: 

ANA ELIZA COELHO SOBRAL

Requerido:

TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SANTA CATARINA - TJSC

 

 

VOTO CONVERGENTE

 

Trata-se de Procedimento de Controle Administrativo proposto por ANA ELIZA COELHO SOBRAL em desfavor do TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SANTA CATARINA (TJSC) no qual foi requerida a republicação do edital do concurso público para ingresso, por provimento ou remoção, na atividade notarial e de registro no Estado de Santa Catarina (Edital 1/2023), em face do disposto na Resolução CNJ nº 478, de 27 de outubro de 2022, norma que alterou dispositivos da Resolução CNJ nº 81, de 9 de junho de 2009, bem como determinou a republicação dos editais de concursos suspensos na fase de inscrição preliminar.

A Conselheira Jane Granzoto concluiu não haver irregularidade no ato combatido, porquanto:

a)     A O Tribunal deu ampla divulgação às modificações inseridas no edital;

b)     A retificação do edital não autoriza a inclusão no certame de novas serventias vagas, por expressa vedação normativa constante no artigo 11, da Resolução CNJ nº 81/2009

c)     Quanto à reserva de vagas às pessoas com deficiência, o edital republicado deu cumprimento à nova regra da Resolução CNJ nº 478/2022, que determina que, após a divisão das serventias vagas em 3 (três) classes, por faixa de faturamento, deve ser realizado o sorteio do percentual de 5% de serventias reservadas aos candidatos com deficiência em cada grupo.

d)    A consequência necessária da aplicação da regra foi a não destinação de vagas para as pessoas com deficiência.

Em que pese o bem elaborado voto da Relatora, que acompanho integralmente, limito-me a sugerir nova alteração na Resolução CNJ 81/2009, de modo a corrigir situação não antevista pelos integrantes do grupo de trabalho que formularam a modificação da norma.

Propõe-se que, nas hipóteses de concursos públicos de provas e títulos para outorga das Delegações de Notas e de Registro, em que não seja possível destinar pelo menos 1 vaga aos candidatos com deficiência, deixe-se de aplicar a regra contida no §4º do art. 3º. A alteração está contida na inserção do §4º-A, agora proposta, com a seguinte redação:

§4º-A regra do parágrafo antecedente só será aplicada caso haja a destinação de pelo menos 1 (uma) serventia aos candidatos com deficiência e aos cotistas negros, em cada uma das faixas de faturamento. 

 É como voto.

Ministro LUIZ PHILIPPE VIEIRA DE MELLO FILHO

 

Conselheiro Vistor 

Ministro LUIZ PHILIPPE VIEIRA DE MELLO FILHO

Conselheiro Vistor

 

 

 

 

VOTO VISTA DIVERGENTE

 

O EXMO. SR. CONSELHEIRO MÁRIO GOULART MAIA: Trata-se de Procedimento de Controle Administrativo formulado por Ana Eliza Coelho Sobral, em face do Tribunal de Justiça do Estado de Santa Catarina (TJSC), no qual se insurge “contra a ausência de reserva de vagas para pessoas com deficiência” e requer a republicação do Edital “em face do disposto na Resolução CNJ nº 478, de 27 de outubro de 2022, norma que alterou dispositivos da Resolução CNJ nº 81, de 9 de junho de 2009, bem como determinou a republicação dos editais de concursos suspensos na fase de inscrição preliminar”.

Peço vênia para divergir da conclusão apresentada pela ilustre Conselheira Jane Granzoto.

Com efeito, no que tange à ausência de vagas para pessoas com deficiência, entendo que a requerente apresentou argumentos válidos e aptos a ensejar a procedência do pedido.

A eminente Relatora consigna em seu voto que “antes, portanto, da edição da Resolução CNJ nº 478/2022, o edital de abertura do concurso havia destinado às pessoas com deficiência 1 (uma) vaga (Id. 5024661). Com a nova regra, fez-se necessária a adaptação do instrumento convocatório, que não destinou vagas às pessoas com deficiência, nos seguintes termos (Id. 5024718)”.

 

Como se verifica, a alteração do Edital nesse ponto foi efetivada pelo TJSC em decorrência da regra inserida na Resolução CNJ nº 81/2009, pela Resolução CNJ nº 478/2022 (§ 4º do art. 3º).

Art. 3º. [...]

§ 4º O critério de escolha das serventias reservadas aos candidatos negros e com deficiência será o sorteio, após a divisão das serventias vagas em 3 (três) classes, por faixa de faturamento, na forma do Anexo do Provimento n. 74/2018 da Corregedoria Nacional de Justiça.

 

Entendo, todavia, que o percentual de 5% (cinco por cento) para pessoas com deficiência, deve ser aplicado em relação ao total de vagas ofertadas no concurso, tal como oferecido inicialmente pelo TJSC, no Edital inaugural.

 

A modificação do Edital, feita a partir da Resolução CNJ 478/2022, evidenciou a exclusão das pessoas com deficiência do concurso, pois, como dito pela ilustre Relatora, com a nova regra o Tribunal precisou fazer a adaptação do instrumento convocatório, passando a dividir o total de vagas existentes, por classes de faturamento:

 

Com clareza que a aplicação dessa divisão por categorias impactou diretamente na atribuição do percentual estabelecido para pessoas com deficiência, retirando a destinação de vagas.

Essa modificação feita pelo TJSC está contrária a todo o arcabouço normativo sobre a matéria e à jurisprudência existente no âmbito do Supremo Tribunal Federal:

EMENTA: RECURSO ORDINÁRIO EM MANDADO DE SEGURANÇA. CONCURSO PÚBLICO. PORTADORES DE NECESSIDADES ESPECIAIS. ISONOMIA. PROPORCIONALIDADE E ALTERNÂNCIA NA DISTRIBUIÇÃO DAS VAGAS. INEXISTÊNCIA DE VIOLAÇÃO DOS PRINCÍPIOS DO CONTRADITÓRIO, DA AMPLA DEFESA OU DO DEVIDO PROCESSO LEGAL. PRECLUSÃO DO DIREITO DE CONTRA-ARRAZOAR O RECURSO ORDINÁRIO. LISTA DE CLASSIFICAÇÃO. CONFORMAÇÃO AOS DITAMES DA CONSTITUIÇÃO. COMPETÊNCIA DA ADMINISTRAÇÃO. ASSUNÇÃO DE OUTRO CARGO PÚBLICO. PERDA SUPERVENIENTE DO OBJETO. NÃO OCORRÊNCIA. AGRAVO REGIMENTAL NÃO PROVIDO.

1. Inviável falar-se em violação dos princípios do devido processo legal, do contraditório ou da ampla defesa, por ausência de intimação para contra-arrazoar o recurso ordinário, pois, embora devidamente intimada de todos os subsequentes atos processuais, a União só apresentou sua irresignação quando da prolação da decisão monocrática em sentido contrário à sua pretensão. Preclusão configurada.

2. Não se mostra justo, ou, no mínimo, razoável, que o candidato portador de deficiência física, na maioria das vezes limitado pela sua deficiência, esteja em aparente desvantagem em relação aos demais candidatos, devendo a ele ser garantida a observância do princípio da isonomia /igualdade.

3. O Supremo Tribunal Federal, buscando garantir razoabilidade à aplicação do disposto no Decreto 3.298/99, entendeu que o referido diploma legal deve ser interpretado em conjunto com a Lei 8.112/90. Assim, as frações, mencionadas no art. 37, § 2º, do Decreto 3.298/99, deverão ser arredondadas para o primeiro número subsequente, desde que respeitado o limite máximo de 20% das vagas oferecidas no certame. Precedentes: MS nº 30.861/DF, Relator o Ministro Gilmar Mendes, Segunda Turma, DJe de 8/6/12; MS nº 31.715/DF, Relatora a Ministra Rosa Weber, decisão monocrática, DJe de 4/9/14.

4. Agravo regimental não provido.

(STF. RMS 27710 AgR, Relator(a): DIAS TOFFOLI, Tribunal Pleno, julgado em 28/05/2015, ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJe-128  DIVULG 30-06-2015  PUBLIC 01-07-2015) (grifo nosso)

 

 

EMENTA: ADMINISTRATIVO. CONCURSO PÚBLICO. RESERVA DE VAGAS PARA PORTADORES DE DEFICIÊNCIA. ARTIGO 37, INCISO VIII, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. A exigência constitucional de reserva de vagas para portadores de deficiência em concurso público se impõe ainda que o percentual legalmente previsto seja inferior a um, hipótese em que a fração deve ser arredondada. Entendimento que garante a eficácia do artigo 37, inciso VIII, da Constituição Federal, que, caso contrário, restaria violado. Recurso extraordinário conhecido e provido.

(STF. RE 227299, Relator(a): ILMAR GALVÃO, Tribunal Pleno, julgado em 14/06/2000, DJ 06-10-2000 PP-00098  EMENT VOL-02007-04 PP-00757) (grifo nosso)

 

Inclusive, foi exatamente nesse sentido que o PCA 0002978-71.2023.2.00.0000, de relatoria do Conselheiro João Paulo Schoucair, foi julgado, por unanimidade, na 9ª Sessão Virtual deste Conselho, ocorrida entre os dias 7 e 16 de junho de 2023. O CNJ julgou procedente o pedido para reconhecer que a aplicação do percentual de vagas destinadas a pessoas com deficiência/negros seja sobre o total de vagas oferecidas aos candidatos para cada cargo público, definido em função da especialidade.

Logo, o quantitativo das vagas para pessoas com deficiência e cotistas deve levar em consideração o total das vagas ofertadas no certame. 

Dessa forma, não há como conceber o prosseguimento de um concurso que exclua candidatos deficientes a partir de uma interpretação que, s.m.j., não se atentou para o espírito preconizado pela Resolução CNJ 81/2009 e para as normas existentes de proteção do direito dos vulneráveis.

Ademais, ainda que a discussão esteja circunscrita a apenas uma vaga, este Conselho não pode consentir que o Tribunal negue vigência à Constituição Federal[1] e à lei[2], que garantem o acesso a pessoas com deficiência a cargos públicos. Se o percentual estabelecido no Edital é de 5% (cinco por cento), que esse valor seja aplicado à totalidade de cargos oferecidos.

Apesar de as provas objetivas para os candidatos inscritos na modalidade de ingresso por provimento terem sido realizadas no dia 18.6.2023, entendo consubstanciar maior prejuízo a exclusão da possibilidade de pessoas com deficiência participarem do certame.

Diante disso, exsurge a necessidade de anulação das provas objetivas realizadas na modalidade de ingresso por provimento e, consequentemente, seja realizada a reabertura das inscrições apenas para os candidatos com deficiência, dada a existência de vaga.

Em relação à proposta de nova alteração da Resolução CNJ 81/2009, acredito que seja mais adequado o encaminhamento à Comissão Permanente de Eficiência Operacional e Gestão de Pessoas, para análise.

Com essas breves anotações, divirjo da eminente Relatora e julgo procedente o pedido para:

a)    aplicar adequadamente o percentual de 5% destinado a pessoas com deficiência sobre o total de vagas oferecidas no concurso;

b)    determinar a reabertura das inscrições aos candidatos com deficiência;

c)     anular a prova objetiva realizada no dia 18.6.2023, na modalidade de ingresso por provimento.

 

É como voto.

Brasília, data registrada no sistema.

 

Mário Goulart Maia

Conselheiro



[1] Art. 37, inciso VIII; Art. 24, inciso XIV; e, Art. 7º, inciso XXXI.

[2] Decreto 3.298/99.