Conselho Nacional de Justiça

 

Autos: CONSULTA - 0000628-23.2017.2.00.0000
Requerente: TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE ALAGOAS - TJAL
Requerido: CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA - CNJ

 

EMENTA: CONSULTA. TJAL. POSSIBILIDADE JURÍDICA DE CONCESSÃO DE FÉRIAS A MAGISTRADO REFERENTE A PERÍODOS RETROATIVOS QUANDO SE ENCONTRAVA AFASTADO PARA EXERCÍCIO DE MANDATO CLASSISTA. AUSÊNCIA DE PREVISÃO LEGAL. ENQUANTO O MAGISTRADO ESTIVER LICENCIADO PARA O EXERCÍCIO DE MANDATO EM ENTIDADE REPRESENTATIVA DA CLASSE SUA DEDICAÇÃO É EXCLUSIVA, O QUE IMPOSSIBILITA O EXERCÍCIO DO REPOUSO DAS FÉRIAS. NECESSIDADE DE ASSEGURAR O DIREITO CONSTITUCIONAL DAS FÉRIAS. CONSULTA RESPONDIDA NO SENTIDO DE QUE O TRIBUNAL PODE CONCEDER FÉRIAS A MAGISTRADO, OU SUA RESPECTIVA INDENIZAÇÃO, REFERENTE A PERÍODO RETROATIVO QUANDO AFASTADO E LICENCIADO.

 

 ACÓRDÃO

O Conselho, por unanimidade, respondeu a consulta no sentido de que o magistrado afastado da judicatura, em razão da representação em associação de classe, pode cumular os períodos de férias adquiridos no curso do mandato, ficando garantido o direito ao gozo de férias ou sua indenização, nos termos do voto da Relatora. Votou o Presidente. Ausente, em razão da vacância do cargo, o Corregedor Nacional de Justiça. Presidiu o julgamento o Ministro Dias Toffoli. Plenário, 8 de setembro de 2020. Presentes à sessão os Excelentíssimos Senhores Conselheiros Dias Toffoli, Emmanoel Pereira, Luiz Fernando Tomasi Keppen, Rubens Canuto, Tânia Regina Silva Reckziegel, Mário Guerreiro, Candice L. Galvão Jobim, Flávia Pessoa, Maria Cristiana Ziouva, Ivana Farina Navarrete Pena, Marcos Vinícius Jardim Rodrigues, André Godinho, Maria Tereza Uille Gomes e Henrique Ávila.

Conselho Nacional de Justiça

Autos: CONSULTA - 0000628-23.2017.2.00.0000
Requerente: TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE ALAGOAS - TJAL
Requerido: CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA - CNJ


RELATÓRIO 

Trata-se de Consulta formulada pelo TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE ALAGOAS – TJAL em que questiona se magistrados afastados da judicatura, em razão de exercício de mandado eletivo em associação de classe, teria direito ao gozo de férias ao término do mandato.

O Consulente saliente que, conforme dispõe a LOMAN (LC nº 35/79), o magistrado eleito para exercício de mandato classista fica dispensado do exercício das atribuições do cargo sem prejuízo de seus vencimentos e vantagens. Contudo, quanto ao gozo de férias ao final do mandato a LOMAN é omissa.

Acrescenta, ainda, o seguinte:

“No caso concreto que suscitou a dúvida deste Tribunal, tem-se que o Presidente da Associação Alagoana de Magistrados (Almagis), afastado durante três anos para o exercício de mandato classista, pleiteia o gozo de seis meses de férias, cujos períodos aquisitivos teriam ocorrido durante o tempo em que esteve licenciado para o desempenho do referido mandato.”

É o relatório

 

 

Conselho Nacional de Justiça

 

Autos: CONSULTA - 0000628-23.2017.2.00.0000
Requerente: TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE ALAGOAS - TJAL
Requerido: CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA - CNJ


 

VOTO 

Cuida-se de Consulta formulada pelo Tribunal de Justiça do Estado de Alagoas -TJ/AL, que questiona se magistrados afastados da judicatura, em razão de exercício de mandado eletivo em associação de classe, teriam direito ao gozo de férias ao término do mandato, quando retornam ao exercício em seu Tribunal de origem.

Esclareço, de início, que havia aderido ao voto lançado pelo meu antecessor, Conselheiro Rogério Nascimento, no sentido de que “o Tribunal não pode conceder gozo de férias a magistrado, referente a período em que o mesmo esteve afastado para exercício de cargo em associação de classe”.

Todavia, com o pedido de vista do Ministro Presidente, bem como - e principalmente, após intervenção da Associação dos Juízes Federais do Brasil nestes autos na qualidade de interessada, melhor analisando a matéria em debate, penso que a solução dada deve ser diversa. Explico.

A situação trazida a este Conselho na presente consulta não encontra regência na legislação, razão pela qual deve-se recorrer a uma interpretação sistemática, norteada pelos princípios constitucionais.

A Lei Orgânica da Magistratura Nacional estabelece no artigo 73 que: “conceder-se-á afastamento ao magistrado, sem prejuízo de seus vencimentos e vantagens: III- para exercer a presidência de associação de classe”.

Em complemento à LOMAN, o CNJ editou a Resolução 133/2011, que dispõe sobre a simetria constitucional entre a Magistratura e o Ministério Público e equiparação de vantagens, in verbis: 

 

Art. 1º São devidas aos magistrados, cumulativamente com os subsídios, as seguintes verbas e vantagens previstas na Lei Complementar nº 75/1993 e na Lei nº 8.625/1993

a) Auxílio-alimentação;  

b) Licença não remunerada para o tratamento de assuntos particulares;  

c) Licença para representação de classe, para membros da diretoria, até três por entidade;  

d) Ajuda de custo para serviço fora da sede de exercício; 

e) Licença remunerada para curso no exterior; 

f) indenização de férias não gozadas, por absoluta necessidade de serviço, após o acúmulo de dois períodos. 

Art. 2º As verbas para o pagamento das prestações pecuniárias arroladas no artigo primeiro correrão por conta do orçamento do Conselho da Justiça Federal, do Tribunal Superior do Trabalho, do Superior Tribunal Militar e da dotação própria de cada Tribunal de Justiça, em relação aos juízes federais, do trabalho, militares e de direito, respectivamente. 

Nota-se que o único dispositivo da Resolução que possui ponto de contato com a Consulta, prevê direito à indenização de férias não gozadas mas por “absoluta necessidade de serviço, após o acúmulo de dois períodos”. No caso em tela, esse dispositivo não se aplica de forma automática, na medida em que o magistrado licenciado e afastado para representação classista não está exercendo atividade que atenda às necessidades de serviço jurisdicional.

Por outro lado, conforme já decidiu o CNJ nos autos do PP 1150, “o encargo de representação associativa somente poderá ser plenamente exercido pelo requerente com dedicação integral, o que pressupõe o afastamento das atividades judicantes”.

Ora, se é necessário dedicação integral, diante da relevância das atividades exercidas pela Associação na defesa nacional da Magistratura e da atuação perante todos os Poderes da República, como harmonizar o direito do gozo de férias com o desempenho da atividade classista?

Diante desse cenário de omissão legislativa, poder-se-ia cogitar a aplicação da Lei nº 8.112/90, para suprir essa lacuna. Ocorre que este diploma confere o mesmo tipo de licença ao servidor público federal, mas sem remuneração (art. 92, caput).

Portanto, o Estatuto dos Servidores Públicos Federais constitui-se em regramento com características muito peculiares, menos benéficas que aquelas previstas pela LOMAN, por expressamente não permitir pagamento de remuneração durante a licença, e que não prevê solução para a situação enfrentada.

Assim, diante dessa ausência de normas, há que prevalecer a interpretação que garante o direito de férias do magistrado afastado para cumprimento de mandato em associação. Vale dizer, havendo impossibilidade da fruição das férias enquanto afastado para o exercício do mandato associativo, em razão, repito, da necessidade de dedicação exclusiva, resta garantido o gozo desse direito ou sua respectiva indenização após o retorno do magistrado ao exercício jurisdicional, obedecidas as regras de regência e a autonomia do Tribunal, sob pena de violação, por consequência, ao direito constitucional à saúde e ao lazer.

Negar esses direito fundamental, desestimularia, inclusive, o exercício de mandato classista, na medida que lhes seria suprimido por três anos o repouso das férias, garantido a todos os trabalhadores pela Constituição.

Ante o exposto, respondo a presente Consulta no sentido de que o magistrado afastado da judicatura, em razão da representação em associação de classe, pode cumular os períodos de férias adquiridos no curso do mandato, ficando garantido o direito ao gozo de férias ou sua indenização.

É como voto.

Inclua-se em pauta.

Intimem-se.

Arquive-se, independente de nova conclusão.

À secretaria processual para providências.

 Brasília, data registrada no sistema.

 

Conselheira Maria Cristiana Simões Amorim Ziouva

Relatora

 

VOTO CONVERGENTE

 

O SENHOR MINISTRO PRESIDENTE DIAS TOFFOLI:

 

A presente consulta foi formulada pelo Tribunal de Justiça do Estado de Alagoas para que este Conselho responda, em caráter normativo e geral, se magistrados afastados da judicatura, em razão de exercício de mandado eletivo em associação de classe, teriam direito ao gozo de férias ao término do mandato.

Adiro ao judicioso voto da eminente Relatora, Conselheira Maria Cristiana Simões Amorim Ziouva.

Nos termos do art. 73, III, da Lei Orgânica da Magistratura Nacional, conceder-se-á afastamento ao magistrado, sem prejuízo de seus vencimentos e vantagens, para exercer a presidência de associação de classe. 

Por sua vez, dispõe a Resolução CNJ nº 133/2011 que são devidas aos magistrados, cumulativamente com os subsídios, a “licença para representação de classe, para membros da diretoria, até três por entidade”, bem como a “indenização de férias não gozadas, por absoluta necessidade de serviço, após o acúmulo de dois períodos” (art. 1º, alíneas “c” e “f”).

 Como se observa, a Loman e a Resolução CNJ nº 133/2011 reconhecem a relevância do exercício da atividade de representação de classe, ao preconizarem o direito do magistrado ao afastamento, sem prejuízo de seus vencimentos e vantagens.

O magistrado afastado para a representação de entidade de classe, portanto, goza dos mesmos direitos e vantagens do magistrado em efetivo exercício na jurisdição.

Assentadas essas premissas, a mera circunstância de o magistrado afastado, no período do mandato, não estar sujeito ao juízo de conveniência do tribunal a que se encontra vinculado quanto ao gozo de férias não pode aniquilar esse direito, de matriz constitucional.

Compelir-se o magistrado afastado a gozar férias no curso de sua licença, a meu sentir, contrariaria a própria finalidade desse afastamento, que é propiciar-lhe um regime de dedicação exclusiva aos elevados interesses associativos, mediante atuação e diálogo permanentes com diversos órgãos e instituições internos e externos ao Poder Judiciário.

Exemplificativamente, o mandato da(o) Presidente da Associação dos Magistrados Brasileiros, nos termos do art. 17 do seu Estatuto, é de 3 (três) anos.

Considerando-se os magistrados, nos termos do art. 66 da Loman, têm direito a 60 (sessenta) dias de férias anuais, compelir-se a(o) Presidente da AMB a gozar todas suas férias no curso do seu mandato implicaria reduzi-lo, de fato, a 2 (dois) anos e 6 (seis) meses.

 

Ante o exposto, acompanho integralmente o judicioso voto da Conselheira Maria Cristiana Simões Amorim Ziouva e respondo à Consulta nos exatos termos propostos por Sua Excelência.

É como voto.

 

Ministro DIAS TOFFOLI

Presidente